POLUIÇÃO
DO RIO UNA: UMA ABORDAGEM DIDÁTICA DE QUESTÕES AMBIENTAIS PARA A CONSTRUÇÃO DE
CONCEITOS QUÍMICOS NO ENSINO MÉDIO
Júlio César M.M.F. Santos
Licenciado
em Química pela Faculdade de Formação de Professores da Mata Sul/FAMASUL –
Palmares/PE-Brasil.
Júlio
César R. de Freitas
Licenciado
em Biologia pela Faculdade
Frassinetti do Recife – Recife/PE
Adriana
Cristina Nascimento de Melo
Professora
de Química da Faculdade de Formação de Professores da Mata Sul/FAMASUL –
Palmares/PE-Brasil.
João
Rufino de Freitas Filho, Dr
Professor
da Unidade Acadêmica de Garanhuns / Universidade
Federal Rural de Pernambuco e Coordenador do projeto
joaoveronice@yahoo.com.br
RESUMO
A poluição da água indica que um ou mais de seus usos foram
prejudicados, podendo atingir o homem de forma direta, pois ela é usada por
este para ser bebida, para tomar banho, para lavar roupas e utensílios e,
principalmente, para sua alimentação e dos animais domésticos. Além disso,
abastece nossas cidades, sendo também utilizada nas indústrias e na irrigação
de plantações. Este trabalho teve como objetivo proporcionar aos estudantes a
utilização de contextos próximos, a saber, a POLUIÇÃO DO RIO UNA, como elemento
para uma boa prática de educação ambiental, construção de conceitos químicos e
melhoria da qualidade do ensino de química. O público-alvo foi formado por 60
alunos, correspondente a 1ª, 2ª e 3ª séries do ensino Médio da Escola Estadual
Professora Galtemir Lins, localizada no município de Palmares-PE. Diferentes
atividades foram realizadas buscando facilitar o processo de aprendizagem,
através da aproximação do aluno com a realidade local. Os resultados obtidos
proporcionaram aos alunos, além de uma melhor aprendizagem dos conteúdos
abordados uma maior percepção dos problemas ambientais locais, mostrando que
esse estudo se caracteriza na atitude de defesa da natureza e no
desenvolvimento do senso crítico, melhorando a forma de expressão e
participação dos alunos envolvidos.
Palavras-chave: Meio ambiente; poluição, ensino de química; conceitos químicos.
1. INTRODUÇÃO
Nas
últimas décadas a humanidade vem se defrontando com vários
problemas-ambientais, sociais, financeiros, econômicos etc. Por isso a
preocupação com o ambiente e principalmente com água torna-se cada vez mais
importante, devido à degradação da qualidade da água dos rios, represas
(REBOUÇAS, 2002). A existência de água de qualidade e quantidade suficiente,
devido a sua interferência na saúde das populações, é um fator de
desenvolvimento de uma região.
É
interessante ressaltar que a água de um rio é considerada de boa qualidade
quando apresenta menos de mil coliformes fecais e menos de dez microorganismos
patogênicos por litro (como aqueles causadores de verminoses, cólera,
esquistossomose, febre tifóide, hepatite, leptospirose, poliomielite etc.).
Portanto, para a água se manter nessas condições, deve-se evitar sua
contaminação por resíduos, sejam eles agrícolas (de natureza química ou
orgânica), esgotos, resíduos industriais, lixo ou sedimentos vindos da erosão.
O modo como à sociedade se relaciona com a natureza é uma
preocupação que surgiu há muito tempo. Entretanto, só na década de 70 foi
reconhecida a necessidade de se efetivar um processo educativo em torno da
questão ambiental. A Educação Ambiental (EA) passou assim a integrar os temas
transversais propostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais e, para CARVALHO
(2002), a inserção do tema meio ambiente como transversal, proporcionou um
avanço considerável no desenvolvimento da EA formal, já que ampliou as
discussões da área.
Em
1999, AZEVEDO, no seu artigo Poluição vs. Tratamento de Água: duas faces da
mesma moeda, discute a poluição do meio ambiente e, mais especificamente, a das
águas. Apresenta as várias formas de poluição que afetam as nossas reservas
d’água, exemplos de minimização de rejeitos e uma síntese das tecnologias
disponíveis para o tratamento de efluentes.
Em relação ao ensino de Ciências Naturais observa-se que este, em
muitas situações, ainda está voltado para a memorização de conceitos
científicos. Para VYGOTSKY (1987, apud MORTIMER e SCOTT, 2004), “o processo de
conceitualização é equacionado com a construção de significados, o que
significa que o foco é no processo de significação, que são criados na
interação social e então internalizados pelos indivíduos”. Portanto, há
necessidade de mudar a prática pedagógica aplicada, a fim de melhorar o
processo ensino-aprendizagem, de forma que os alunos não apenas memorizem
conceitos, mas que tenham a oportunidade de dar significado ao conhecimento
adquirido, a partir de suas vivências, e que possam participar da tomada de
decisões nas relações de ciência, tecnologia, sociedade e ambiente.
LOPES PINA et al. (2004) buscaram explorar conteúdos nas disciplinas
das áreas de Ciências da Natureza – Biologia, Química
e Física - de forma a desencadear uma aprendizagem significativa que
possibilitasse o entendimento de uma situação contextual: O rio Capibaribe - um
ecossistema numa situação de estudo interdisciplinar no Ensino Médio.
FREITAS FILHO et al. (2008) descreve uma experiência
desenvolvida e vivenciada por professores e alunos do Ensino Médio sob a ótica
de uma situação de estudo. A situação de estudo apresentada pelos professores
foi “O rio Carimã”, a qual foi estudada por meio da problematização: O que acontece quando jogamos lixo e resíduos no rio
Carimã? Nesse contexto, a temática foi explorada de forma
contextualizada e interdisciplinar. A intervenção interdisciplinar proposta
permitiu o desenvolvimento de atividades diversas, favorecendo a integração de
conteúdos da biologia, da física e da química. A metodologia de estudo
consistiu na visita às margens do rio, exibição de vídeo, pesquisas em fontes
variadas (livros didáticos, revistas, periódicos, internet, etc.), montagem de
documentário dentre outras. Desta forma pretendeu-se conscientizar a população
barreirense, a buscar soluções para o uso sustentável da água, já que este é um
recurso vital à manutenção da vida na terra.
Logo o presente trabalho, teve como objetivo proporcionar aos
estudantes a utilização de contextos próximos, a saber, a POLUIÇÃO DO RIO UNA,
como elemento para uma boa prática de educação ambiental, construção de
conceitos químicos e melhoria da qualidade do ensino de química.
2. METODOLOGIA
A experiência foi desenvolvida no período de março de 2007 a dezembro de 2007, com alunos da 1a , 2 a e 3 a séries do Ensino Médio, num total de 60 alunos, na faixa etária de 14 a 20 anos, da Escola Professora Galtemir Lins, localizada no interior do Estado de Pernambuco, na
cidade de Palmares. A maioria dos alunos da Escola é de periferia e de baixo
poder aquisitivo. Perfazendo um total de aproximadamente 50 h/aula, o trabalho
abordou a temática - POLUIÇÃO DO RIO UNA: UMA ABORDAGEM DIDÁTICA DE QUESTÕES
AMBIENTAIS PARA A CONSTRUÇÃO DE CONCEITOS QUÍMICOS NO ENSINO MÉDIO.
Para sistematização dos trabalhos foram realizados: a) encontros de
estudo e planejamento coletivo das atividades b) elaboração de um plano de
trabalho; c) coleta e organização de materiais, d) seminários temáticos sobre o
tema em foco com auxílio de vídeo documentário; e) visita in locus ao
Rio Una; f) montagem e realização de experimento com as amostras coletadas; g)
montagem de oficina; h) apresentação oral do trabalho a comunidade escolar.
Foi
elaborado e aplicado um questionário contendo 5 (cinco) perguntas, aos estudantes,
em relação ao tema abordado. Os dados obtidos do questionário foram analisados
e dispostos em gráficos. Entrevista semi-estruturada foi aplicada a
professores.
A
princípio propôs-se uma produção de texto sobre a temática, sem nenhuma
referência prévia, para verificar o conhecimento dos alunos sobre a temática e
de que forma eles percebiam em sua vida cotidiana.
Num
segundo momento distribuiu-se um texto aos alunos para leitura e discussão.
Após a discussão do texto, a sala de aula foi dividida em 5 grupos para
construção de um painel interativo.
Na organização e análise dos dados envolveu conhecimentos
matemáticos, como proporcionalidade, volume dentre outros. Para trabalhar estes
dados contou-se com a ajuda da informática aliada ao processo de ensino.
A apresentação oral do trabalho a comunidade escolar e entrega do
relatório escrito, consta nas etapas desenvolvidas durante o processo de
investigação e realização da pesquisa.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Etapa 1: Concepções
levantadas
A temática Água do Rio Una possibilitou a
identificação de conceitos científicos sobre o meio ambiente, os quais foram
sistematizados e posteriormente levaram a uma conscientização da população de
Palmares, principalmente a classe estudantil. Ao vivenciar a temática, a
relação entre o sujeito e o objeto (real socialmente construído) podem ser
analisados sob o ponto de vista das várias abordagens científicas nas
disciplinas biologia, física, química, dentre outras, levando em consideração a
interdisciplinaridade e contextualização, numa perspectiva inter-objetiva e
inter-relacional. Segundo SILVA (1999), entende-se por inter-relacional a via
para lidar com estrutura e organização dos saberes científicos, superando sua
fragmentação e/ ou integração e as conseqüências no ensino e na pesquisa, bem
como o seu próprio processo de produção e de viabilização.
Logo o presente projeto foi desenvolvido na
perspectiva de conscientização, contextualização e formação de cidadãos, de
modo que professores / alunos / comunidade em geral
venham a intervir de forma consciente e mais ativamente na sua realidade. O
esquema 1 abaixo sumariza os eixos norteadores no estudo da temática do
trabalho.

Esquema 1: Eixos norteadores no estudo da
temática do projeto
Etapa 2: Pesquisa de
campo
A pesquisa de
campo foi iniciada a partir de uma visita programada e orientada ao Rio Una,
que teve como finalidade proporcionar a aproximação dos alunos ao objeto de
estudo, a fim de coletarem dados e informações, sobre a realidade local, que
foram utilizados nos conteúdos de Ciências Naturais. O trabalho de campo é
sugerido na Proposta Curricular da escola, com vista a contribuir para o
desenvolvimento dos conteúdos das Ciências, dando enfoque ao tema transversal
Água. (BRASIL, 2002).
Procurou-se,
inicialmente, levantar a percepção de diferentes atores sociais que utilizam o
Rio, sobre como eles viam a preservação do local. Esta etapa foi realizada,
através de um questionário aberto e teve por finalidade, apenas, conhecer como
alguns dos envolvidos vêem a questão ambiental do lugar e recuperar parte de
sua história natural.
Este
momento proporcionou aos alunos um pouco da história local, pois os moradores,
durante a entrevista, fizeram comentários sobre a região, à forma de utilização
do Rio pelos moradores e as mudanças ocorridas no local.
O trabalho teve início com uma pesquisa de campo onde as perguntas
chave foram as seguintes: “Para que água do Rio Una seja própria para consumo o
que é necessário? Com relação à resposta dada pelos estudantes, Observou-se que
60%, dos 60 estudantes pesquisados, direcionam o trabalho de purificação da
água para o Governo, 22% dizem que é necessário primeiramente haver uma
conscientização da comunidade e 18% optaram por criar uma Organização não
Governamental para criarem meios para conter a poluição. Veja resultados
sumarizados no gráfico I.

Gráfico I: Tratamento da água do Rio Una
Diante dos
resultados obtidos do questionário aplicado aos estudantes, entrevista
semi-estruturada a professores e comunidade em geral, passou-se
a uma outra etapa de estudo que foi o desenvolvimento de atividades em sala de
aulas.
Etapa 3:
Pesquisa no contexto da sala de aula
As atividades desenvolvidas no contexto da sala
de aula ocorreram em momentos. O primeiro momento consistiu na divisão da turma
em 5 (cinco) grupos com 8 (oito) componentes, onde os grupos debateram as
possíveis estratégias para minimizar a situação do rio Una. No segundo momento,
cada estudante dos 5(cinco) grupos formou novos grupos e socializaram as
questões levantadas na primeira etapa. Os trabalhos
desenvolvidos pelos estudantes foram apresentados em forma de oficinas.
Para o aprofundamento da temática, trabalhou-se questões
problematizadoras tais como: a) Existem problemas de impactos ambientais na
comunidade palmarense que você conhece? b) Existem outras situações enfrentadas
pelas comunidades ribeirinhas palmarense? As perguntas propostas teveram como
objetivo a identificação dos impactos na comunidade palmarense pelos
estudantes. E dentre estes, destaque maior é dado ao rio Una (92% das
citações). A partir daí trabalhou-se com mapas dos bairros, localizando as
regiões onde os problemas ocorrem levando em conta os aspectos físicos,
químicos e biológicos.
Um dos
motivos que justifica esse fato é por considerarem a mesma difícil. Percebeu-se
também que a grande maioria dos estudantes entrevistados vê à Química como uma
matéria pouco relacionada com o cotidiano e que as aulas são, quase em sua totalidade,
expositivas com a participação de alguns alunos. A maior parte da sala sente
falta de um trabalho mais dinâmico. A prática experimental foi considerada
importante pelos alunos por permitir compreenderem os conceitos teóricos com
mais propriedade.
Os estudantes buscaram na literatura Química
idéias e métodos para purificação da água do rio estudado como a Desinfecção (com uso do gás cloro), Filtros
de areia rápidos (para eliminar a turvação das águas), Separação/Filtração
(embora não sejam suficientes para purificar completamente
a água, é uma etapa preliminar necessária), Filtração por carbono
(Utilizando-se carvão de lenha, um tipo de carbono com uma
extensa área, que absorve diversos compostos, inclusive alguns tóxicos. Filtros
domésticos podem ainda conter sais de prata),
Destilação (O processo de destilação envolve ferver a água transformando-a em vapor. O vapor de água é conduzido a uma
superfície de refrigeração onde retorna ao estado líquido em outro recipiente.
Uma vez que as impurezas (solutos) não são vaporizados, permanecem no primeiro
recipiente. Observe-se que mesmo a destilação não purifica completamente a
água, embora a torne 99,9% pura). Esses foram os mais citados, e feitos
experimentalmente no laboratório da escola com materiais recicláveis
aproximando essa prática ainda mais com o seu cotidiano.
Assim, no que tange o ensino da disciplina de química, os PCNs
(Parâmetros Curriculares Nacionais) sugerem que:“... o conhecimento químico não
deve ser entendido como um conjunto de conhecimentos isolados, prontos e
acabados , mas sim uma construção da mente humana em contínua mudança”.
Desta
forma, a experiência desenvolvida neste trabalho buscou meios de abordar a
temática ambiental em sala de aula, aproximando o aluno das questões ambientais
ocorridas no município e consequentemente construção de conceitos científicos.
Numa avaliação final da vivência da proposta percebeu-se que a mesma
estimulou a percepção dos estudantes no que se refere às inter-relações entre,
fenômenos, tecnologia, questões ambientais dentre outras, permitindo o
desenvolvimento de uma visão articulada para as transformações do meio ambiente
e do próprio homem (construtor e transformador) e seu meio.
4. CONCLUSÕES
A escola vem sendo um dos agentes fundamentais para a
divulgação dos princípios da EA. Entretanto, a sua prática deve estar atenta à
complexidade das relações entre sociedade e ambiente visando à construção
coletiva do conhecimento e o acolhimento da complexidade da vida.
A partir das atividades de sensibilização realizada na
escola foi utilizada uma das técnicas de Freinet, conhecida como aula-passeio,
a qual visou ultrapassar os limites da sala de aula e contribuir para uma
aprendizagem mais significativa.
Os trabalhos desenvolvidos pelos alunos foram apresentados em forma
de oficinas. Nestas oficinas foram construídos e trabalhados: Painéis
interativos, montagem de documentário, experimentação dentre outros.
Os estudantes demonstraram sensibilização quanto às
questões ambientais relacionadas ao rio Una, através de conceitos construídos
como: ecossistema, mata ciliar, densidade, poluição, substâncias,
microorganismos, ambiente, misturas, substâncias, transformações, etc.
Embora exista a idéia de que o processo educacional no
Ensino Médio das escolas públicas dificulte o desenvolvimento de atividades
práticas, principalmente em relação ao trabalho de campo, ao transversalizar o
tema meio ambiente no cotidiano escolar através de novas atividades tornou-se
possível ultrapassar os limites da sala de aula e do ensino tradicional,
contribuindo para a construção de conceitos próprios dos estudantes a respeito
da temática abordada, além da sensibilização dos mesmos quanto à situação do
Rio Una.
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