Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Relatos de Experiências
11/09/2016 (Nº 57) ESTAÇÕES DE TRATAMENTO DE ESGOTO: UMA FORMA DE MELHORAR A QUALIDADE DE VIDA DO AGRICULTOR FAMILIAR
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ESTAÇÕES DE TRATAMENTO DE ESGOTO: UMA FORMA DE MELHORAR A QUALIDADE DE VIDA DO AGRICULTOR FAMILIAR

 

JEFFERSON DE QUEIROZ CRISPIM1; FERNANDO HENRIQUE VILLWOCK2, SANDRA TEREZINHA MALISZ3, JOSÉ ANTONIO DA ROCHA4

 

1 Professor Doutor do Departamento de Geografia, Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR – Campus de Campo Mourão), jeffersoncrispim@hotmail.com;

2 Licenciado em Geografia, Mestrando pela Universidade Estadual de Maringá, fernandovillwock@hotmail.com

3 Professora mestre do Departamento de Geografia, Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR- Campus de Campo Mourão), sandramalysz@hotmail.com

4 Professor mestre do Departamento de Geografia, Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR- Campus de Campo Mourão), jrochastone@yahoo.com.br

 

RESUMO:

No Brasil o tratamento de esgoto ainda é muito baixo, especialmente em áreas rurais de agricultura familiar. Com a falta de tratamento do esgoto, se tornaram indispensáveis à criação de tecnologias alternativas para a recuperação dessas áreas contaminadas no campo, em especial em propriedades agrícolas que se encontram próximas as margens de rios, nascentes ou mesmo solos litólicos, dificultando escavações de fossas negras e sumidouros para recebimento de efluentes de banheiros, lavanderia e cozinha (águas negras e cinzas).

O projeto nº470703/2014 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, fomentou a pesquisa com saneamento rural por meio da implantação de três estações de tratamento de esgoto modelo Bacia de Evapotranspiração (BET) na comunidade Muquilão no município de Iretama no Estado do Paraná. Esta alternativa sustentável e de baixo custo visa à redução da poluição e a contaminação das águas nas propriedades atendidas, pois na maioria das residências ainda são usadas fossas negras e sumidouros podendo provocar contaminações do solo e água, além da formação de gases e odores desagradáveis. Análises realizadas no efluente das BET’s, apontam redução nos parâmetros de Demanda Química de Oxigênio e Demanda Bioquímica de Oxigênio.

 

PALAVRAS CHAVE:Tratamento de esgotos; agricultores; águas; saneamento rural.

 

 

 

TREATMENT PLANTS OF LOW COST WASTEWATER: A BETTER WAY THE QUALITY OF FARMER'S FAMILY LIFE

 

ABSTRACT:

In Brazil the treatment of sewage is still very low, especially in rural areas of family farming. With the lack of sewage treatment, they have become indispensable to the creation of alternative technologies for the recovery of these contaminated areas in the field, especially in farms that are close to the banks of rivers, springs or even litholic soils, difficult excavation of black tanks and sinks for bathrooms receive effluent, laundry and kitchen (black water and gray).

The project number  470703/2014 of the National Scientific and Technological Development Council promoted research on rural sanitation through the implementation of three sewage treatment plants Basin Evapotranspiration Model (BET) in Muquilão community in Iretama municipality in the State of Paraná. This sustainable alternative, low-cost aims to reduce pollution and water contamination in serviceable properties because most homes are still used black drains and sinks may cause contamination of the soil and water, in addition to the formation of unpleasant odors and gases. Analyses carried out in the effluent of BET's point reduction in demand parameters Chemical Oxygen and Biochemical Oxygen Demand.

 

KEYWORDS: Sewage Treatment Plants; farmers; water; rural sanitation.

 

 

 

INTRODUÇÃO

            Um dos maiores problemas ambientais da população brasileira é a falta de tratamento do esgoto doméstico. Segundo o IBGE (2010), no Brasil, 47,2% da população não possui rede coletora de esgoto nem ao menos fossa séptica. Isso significa que quase 100 milhões de habitantes não dispõem desses serviços; o problema é ainda mais grave nas comunidades rurais e de baixa renda.

            O esgoto doméstico não tratado ainda é considerado uma das maiores fontes de poluição dos corpos hídricos no Brasil (JORDÃO, 2009).  A importância do tratamento de esgoto não corresponde apenas à melhoria da qualidade dos corpos hídricos, mas que investimentos em saneamento básico reduzem significativamente os gastos com serviços públicos de saúde, segundo dados da Fundação Nacional da Saúde (2006), a relação de investimento em saneamento significa que a cada R$1,00 investido no setor tem-se cerca de R$4,00 reais economizados com saúde.

            Segundo o (IPARDES, 2010), 83,6% dos domicílios são atendidos pelos serviços de abastecimento de água potável, mas apenas 37,6% são atendidos por rede coletora de esgoto; e o percentual é ainda mais reduzido quando se trata de tratamento adequado do esgoto coletado. A falta de saneamento básico é apontada como um dos fatores atuais que estão fortemente associados aos problemas de saúde pública e à poluição das águas.

       Para Teixeira (2010), o saneamento básico no Brasil constitui um grande desafio a ser alcançado, e necessita de um maior envolvimento da sociedade como um todo. Os serviços de saneamento devem promover a qualidade de vida da população, bem como proteger os recursos naturais. Em relação ao saneamento rural, as dificuldades também são significativas, uma vez que a falta de cuidado pode gerar problemas com a qualidade da água e o meio ambiente, representando um risco à saúde das pessoas.

Para Guimarães et. al. (2007), o saneamento associa sistemas constituídos por uma infraestrutura física e uma estrutura educacional, legal e institucional, que abrange os seguintes serviços: abastecimento de água às populações, coleta, tratamento de esgotos sanitários e controle de vetores como insetos, roedores, moluscos, entre outros.

       Os problemas relativos ao saneamento rural podem ser ainda maiores, pois a falta de investimentos e de infraestrutura em saneamento básico em comunidades rurais, tem propiciado a evolução de estudos e pesquisas de métodos alternativos aos convencionais para o tratamento de esgotos em regiões que não são atendidas por esse serviço (SABEI, 2015).

Na zona rural, o déficit é de 17,5% para abastecimento de água é de 96% para coleta de esgoto, situação agravada porque 38% das pessoas não possuem sanitários em suas residências e cerca de 50%fazem uso de fossas negras (BRASIL, 2003).

O saneamento básico nas comunidades rurais brasileiras se apresenta desestruturado, uma vez que muitas dessas se encontram desprovidas de sistemas de tratamento eficientes. Quando se fala em saneamento básico no meio rural, praticamente inexiste o tratamento de esgotos, o problema se torna ainda mais agravante, pois estes poluentes oriundos de águas da cozinha, lavanderia (águas cinzas) e banheiros (águas negras) são lançados em fossas negras, sumidouros ou mesmo, escoam por valas.

A comunidade Muquilão foi selecionada como área de estudo por estar situada sobre áreas de NeossoloLitólico e fossas negras escavadas com profundidades inferiores a 2,5 metros e nascentes localizadas a jusante, apresentando riscos de contaminação.Neste contexto, devido as dificuldades das famílias manterem estas fossas ativas por um longo período devido a geologia local. Foram implantadas três estações de tratamento de esgotos por zona de raízes modelo bacia de evapotranspiração (BET) no ano de 2015 para acompanhamentos de pesquisa, objetivando a redução de contaminantes do solo e da água.

A Bacia de Evapotranspiração é um sistema que utiliza um processo de filtragem física em entulhos de construção civil, uma câmara de pneus, brita e areia, constituindo um biofiltro, associado a plantas, estas formam uma zona de raízes que auxiliam no processo de evapotranspiração e buscam aproveitar-se da capacidade da natureza de autodepuração.

 

 

MATERIAIS E MÉTODOS

           

A implantação de bacia de evapotranspiração (BET) diferencia-se de outros sistemas ecológicos utilizados, devido ao modelo de construção e dimensionamento com escavação de duas caixas. A primeira, é a séptica que recebe os dejetos provenientes dos banheiros (águas negras) e lavanderia (águas cinzas), construída em alvenaria, seguindo as NBR 13969. O tanque séptico é uma unidade de fluxo horizontal, para tratamento de esgotos por processo de sedimentação, flotação e digestão. Com medidas de 2,30 x 1,50 x 1,0 m, é projetado para receber todos os despejos domésticos (águas cinzas e negras), lavanderia, cozinha, banheiros, lavatórios, entre outros.

A segunda caixa instalada na sequência da séptica, nominada de Bacia de Evapotranspiração, recebe apenas o material líquido, visto que o material sólido fica retido na primeira.  Esta caixa é escavada na profundidade de 1 metro e dimensionada de acordo com o número de moradores, ou seja, 2 m3 por habitante. Utiliza-se uma camada de lona plástica de 200 micras como impermeabilizante no interior da BET que impedirá a infiltração do efluente no solo (Figura 1).

 

Figura 1 – Localização da Bacia de Evapotranspiração do terreno

 

 

No interior do sistema, introduz-se pneus de automóveis no sentido vertical na área central da caixa, formando uma tubulação. As laterais entre os pneus e a parede da BET são preenchidas com entulhos de construção, até cobrir totalmente os pneus. Na sequência, cobre-se o entulho com uma manta geotêxtil e sobre esta, é distribuída uma camada de pedra brita nº 02 com 20 cm de espessura, em seguida, uma camada de 20 cm de areia grossa e por fim uma camada de 20 cm de terra, onde será plantada a vegetação.Os pneus dispostos em linha no sentido vertical no interior do sistema recebem o efluente proveniente da séptica em seu interior e distribuirá lateralmente para a área preenchida com entulhos, pedra e areia, local onde as bactérias aeróbicas realizarão a transformação do material.

Sobre asbacias de evapotranspiração foram plantadas aCanna Indica Lily (Bananeirinha de jardim) que por meio de suas raízes absorvem a umidade excedente do sistema. A utilização desta espécie é interessante, pois apresenta crescimento rápido com alto poder de evapotranspiração e necessita para seu desenvolvimento os nutrientes disponíveis na bacia de evapotranspiração epor ser uma planta com potencial ornamental e possuir aerênquimas desenvolvidos no caule e raízes fasciculadas ou tuberosas, as quais ficção bactérias que recebem oxigênio e nitrogênio trazidos pelas plantas por meiodos seus aerênquimas bem desenvolvidos e em troca fazem a degradação da matéria orgânica (Prancha de figuras 2,3,4,5,6,7, 8 e 9).

Figura 2 - Participação dos agricultores nos trabalhos de montagem dos sistemas;

Figura 3 - Caixa séptica em alvenaria com capacidade para 3,4 m3;

Figura 4 - Impermeabilização com lona plástica e instalação dos pneus;

Figura 5 - Preenchimento com entulhos de construção civil e detalhe parainstalação datubulação de inspeção;

Figura 6 – Preenchimento com pedra brita e na sequencia areia grossa;

Figura 7 - Bacia de evapotranspiração pronta. Detalhe para a caixa séptica ao fundo;

Figura 8     - coleta de efluentes para análise de DBO e DQO em laboratório.

Figura 9 - Povoamento de plantas no interior da BET para melhorar a eficiência de evapotranspiração.

 

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

Para Thiollent (2005), as ações técnicas direcionadas ao saneamento básico esbarram sempre em uma mesma situação, a não sustentabilidade das tecnologias implantadas, predominância de coletores públicos, com estações elevatórias, que demandam elevados gastos de implantação e operação. Situação essa decorrente da ausência de políticas públicas que promovam a disseminação de conhecimentos relacionados ao saneamento básico com uma ecoeficiência de forma interativa e participativa, por meio de uma pedagogia educacional voltada para a importância da preservação ambiental.

A ecoeficiência é alcançada mediante o fornecimento de bens e serviços a preços competitivos que satisfaçam as necessidades humanas e que tragam qualidade de vida, ao mesmo tempo em que ocorre a busca da redução progressiva do impacto ambiental (CEBDS, 2004).

Foram realizadas duas amostragens de efluentes após 90 e 120 dias de instalação das BET’s. Os dois parâmetros analisados para obtenção da eficiência, foram a Demanda Química de Oxigênio (DQO) e Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO), obtendo resultados satisfatórios de 69 % para DQO e 78% para DBO. 

Em pesquisa realizada por   Ávila (2005), a autora obteve média de 70% na DQO e 91% na DBO em tanques sépticos. Sabei (2015) obteve média de 71,39 de DQO e 67,19% de DBO em trabalhos realizados na Região de Curitiba.

O quadro 1 apresenta os custos para instalação de um sistema de Bacia de Evapotranspiração de 4 m2.

 


Quadro 1 – Valores de materiais para construção de 1 BET de 4 m2.

 

Os custos para implantação do sistema são baixos quando relacionamos o tempo de vida útil da BET, em torno de 12 a 15 anos se for realizada a manutenção exigida, ou seja, construir a caixa de evapotranspiração em lugar ensolarado, utilizar plantasque possuem raízes profundas e alto poder de evapotranspiração, auxiliando a reduzir o efluente na bacia. Outro fator importante, é a limpeza da caixa séptica utilizando caminhão auto fossa a cada dois anos. Estes pequenos cuidados elevam o tempo de eficiência do sistema, evitando contaminações no solo, água e ar.

Para dissipação dos odores produzidos no interior da câmara de pneus, sugere-se que o agricultor instale uma mangueira na tubulação de vistoria e a eleve ou amarre em alguma árvore próxima a uma altura superior a 3 metros.

 

 

CONCLUSÃO

A decomposição do esgoto é um processo que demanda vários dias, iniciando-se com uma contagem elevada de DBO, que vai decrescendo e atinge seu valor mínimo ao completar-se a estabilização e no interior da BET este processo é realizado com grande eficiência, devido ao tempo de permanência do efluente entre caixa séptica e a bacia de evapotranspiração.

Esse sistema consiste de tecnologia sustentável pode ser utilizado em pequenas comunidades, escolas e residências, ocupando pouco espaço na área externa da propriedade, eliminação de odores e ainda pode ser integrado de forma não agressiva ao ambiente proporcionando um jardim ornamental.

Os usos de sistemas ecológicos para tratamento de efluentes domésticos vem se apresentando como uma técnica adequada por se adaptar à realidade das áreas rurais, tendo em vista que esses processos de tratamento além de baixos custos e de fácil manutenção.

 

 

REFERÊNCIAS

 

ÁVILA, R. O. Avaliação do desempenho de sistemas tanque séptico-filtro anaeróbico com diferentes tipos de meio suporte. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tese de doutoramento. Rio de Janeiro, 2005.

 

CARVALHO, V. S. Educação ambiental e desenvolvimento comunitário. Rio de Janeiro: WAK, 2002. Censo 2010. Disponível  em Acesso em: 26 ag. 2015.

 

Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável. (CEBDS, 2004).

 

CRISPIM, J. Q.; PAROLIN, M. Saneamento ambiental rural em áreas de neossololitólico. CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Projeto: chamada MCTI/ CNPq/ MEC/ CAPES N° 22/2014 – Ciências humanas, sociais e sociais aplicadas. 2014. (Em andamento).

 

GUIMARÃES, A. J. A.; CARVALHO, D. F. de; SILVA, L. D. B. da. Saneamento básico. Disponível em: . Acesso em: 12 set. 2015.

 

IBGE. (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 2013. Disponível em:>. Acesso em 15 de Janeiro de 2015.

 

IPARDES- INSTITUTO PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL. Caderno Estatístico do município de São José dos Pinhais. Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social. 14 jun. 2009.

 

JORDÃO, E. P.; PESSOA, C. A. Tratamento de esgotos domésticos. 5. ed. Rio de Janeiro: ABES, 2009.

 

LEMES, J.L.V.B.; SHIRMER, W.N.; CALDEIRAC, M. V.; KAICKD, T. V.; ABELE, O.; BÁRBARA, R. R. Tratamento de esgoto por meio de zona de raízes em comunidade rural. Revista Acadêmica Ciências Agrárias e Ambientais, Curitiba, v. 6, n. 2, p. 169-179, 2008.

SABEI, T. R. Educação ambiental não formal voltada para o saneamento ambiental na comunidade rural Colônia Mergulhão, São José dos Pinhais – PR. Dissertação de Mestrado. UTFPR. Curitiba, 2015.

 

TEIXEIRA, J. B. Saneamento rural no Brasil: perspectivas. In: Rezende, S.C. (org.). Cadernos temáticos.(Vol. 7). In: Heller, L.; Moraes, L. R. S.; Britto, A. L. N. P.; Borja, P. C.; Rezende, S. C. (coord.). Panorama do saneamento básico no Brasil.Brasília: Ministério das Cidades, 2010.

 

THIOLLENT, M. Metodologia da pesquisa-ação. 14. ed. São Paulo: Cortez, 2005.

Ilustrações: Silvana Santos