Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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27/11/2016 (Nº 58) OS USOS DO JARDIM BOTANICO ENQUANTO ESPAÇOS DE CONSCIENTIZAÇAO AMBIENTAL
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OS USOS DO JARDIM BOTÂNICO ENQUANTO ESPAÇOS DE CONSCIENTIZAÇÃO AMBIENTAL E DE PROMOÇÃO DO ESTUDO DA BIODIVERSIDADE NA AMAZÔNIA

Janise Maria Monteiro Rodrigues Viana, Mestranda em Gestão de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia, Núcleo de Meio Ambiente, Universidade Federal do Pará,

janise@ufpa.br

 

Sérgio Cardoso de Moraes, Doutor em Educação, Núcleo de Meio Ambiente, Universidade Federal do Pará,

scmoraes@ufpa.br

 

Wellington da Silva Fonseca, Doutor em Engenharia Elétrica, Universidade Federal do Pará,

fonseca@ufpa.br

 

RESUMO

 

Este artigo objetiva analisar as atividades desenvolvidas com os alunos da escola E.E.F.M. Eneida de Moraes no Jardim Botânico do Museu Emilio Goeldi. Com os resultados busca-se através de vivências nesses espaços educativos, práticas de ensino que visem a interdisciplinaridade e a conservação ambiental.

 

Palavras-chave: jardim botânico, interdisciplinaridade, conservação ambiental.

 

ABSTRACT


This article aims to analyze the activities with school students E.E.F.M. Eneida de Moraes in the Botanical Garden of the Emilio Goeldi Museum. With the results to search through experiences in these educational spaces, educational practices aimed at interdisciplinary and environmental conservation.
 
Key-words: botanical garden, interdisciplinary, environmental awareness.

 

1- INTRODUÇÃO

            As Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006) recomendam o desenvolvimento de práticas fora do espaço escolar, apontando os estudos do meio como atividade motivadora para os alunos, já que deslocam o ambiente de aprendizagem para fora de sala de aula.

            As diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino médio (2012) reforçam a mesma ideia, orientando que várias alternativas pedagógicas, incluindo ações, situações e tempos diversos, bem como diferentes espaços – para atividades educacionais e socioculturais favoreçam a iniciativa, autonomia e protagonismo social dos estudantes (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO e CNE, 2012).

O processo de ensino-aprendizagem pode ter sua eficácia melhorada quando o conhecimento trabalhado se torna mais facilmente assimilável pelo aluno. Esta assimilação é facilitada, em maior ou menor grau, de acordo com os métodos e técnicas pedagógicas empregados.

            O uso de ambientes não formais possibilita a contextualização, aplicação e associação de conceitos e conhecimentos já aprendidos com as informações novas do ambiente, reduzindo as exigências de abstração do aprendiz e permitindo uma compreensão mais eficiente dos conhecimentos. Esse processo de associação de informações novas com outras já incorporadas, de forma inter-relacionada, denomina-se aprendizagem significativa (MOREIRA, 2000).

            Com a visível dificuldade de absorção do conteúdo pelos alunos do Ensino Médio, as disciplinas curriculares, necessitam de exemplificações práticas e concretas para melhor compreensão. A utilização de espaços diversificados pode ser eficiente no processo da aprendizagem significativa tanto quanto a própria sala de aula. Nesse aspecto, Cibelle e Junior (apud PINTO E FIGUEIREDO, 2010) ressaltam que os museus, espaços interativos de ciência, se apresentam como um ambiente educativo complementar à educação formal, possibilitando a ampliação e a melhoria do conhecimento científico de estudantes, bem como, da população de um modo geral.

            Então, porque aula de Botânica no Jardim Botânico? No presente trabalho procurou-se mostrar que um local como o Jardim Botânico, não é apenas um espaço de lazer, mas também um local de aprendizado, caracterizado como uma extensão da sala de aula. Em que, além de disseminar a ideia da necessidade de serem mantidas relações harmônicas e equilibradas entre sociedade e natureza, evidenciou-se o quanto à botânica mesclada com outros assuntos, pode fazer parte do cotidiano dos alunos de uma forma prazerosa e estimulante, o que quase nunca ocorre no ambiente de sala de aula de forma adequada.

            Entende-se que as situações de aprendizagem acontecem em contextos reais e diversificados. Possibilitando, assim, que os educandos, opinem, debatem, construam sua autonomia e seu compromisso social, formando-se como sujeitos culturais.

            A partir de algumas experiências realizadas com o ensino de Biologia, em classes de nível médio, da Escola E. E. F. Eneida de Moraes, da cidade de Ananindeua -PA, constatou-se logo de início, que os sujeitos envolvidos não possuíam uma participação ativa no processo ensino - aprendizagem. As aulas, meramente, teóricas, não contextualizavam a realidade do educando.

            Dentre as temáticas da área de Biologia, um dos conteúdos em que se percebe uma dificuldade em se envolver professores e alunos é o de Botânica. Outro dado, que por sua vez que é positivo e merecedor de destaque é que os alunos demonstram interesse em conhecer sobre as plantas. Nesse contexto, observa-se a falta de material didático e de uma metodologia que estimule a busca de conhecimentos significativos, bem como constata-se uma frequente prática pedagógica centrada na fragmentação, memorização e transmissão dos conteúdos, fora do contexto social, cultural e ambiental do educando.

            A preocupação com um melhor e mais efetivo ensino de Botânica, tem incentivado os professores a buscarem por alternativas para minimizar as dificuldades encontradas. A redescoberta e utilização de metodologias como: uso de cartilhas  – história de planta e pessoas, passeios no jardins, aula prática no laboratório, organização de jardim botânico na escola e oficinas de aprendizagem, podem ilustrar experiências bem sucedidas de ensino (GÜLLICH, 2004).

            A educação para a cidadania representa a possibilidade de motivar e sensibilizar as pessoas para que transformem as diversas formas de participação em potenciais caminhos de dinamização da sociedade e de concretização de uma proposta de sociabilidade, baseada na educação para a participação (LEFF, 2010).

            Esse trabalho foi realizado no Jardim Botânico do Museu Paraense Emilio Goeldi, por ser um espaço de fácil acessibilidade para toda a região, que apresenta uma grande biodiversidade de fauna e flora, o que justifica a criação desse tipo de infraestrutura urbana. Está situado em uma região central, com uma área de 5,2 ha. Foi inaugurado em 06 de outubro de 1866, pelo naturalista Domingos Soares Ferreira Penna, através da Associação Philomática, com o objetivo de fundar uma instituição de pesquisa na Amazônia. Recebeu esta denominação em homenagem ao cientista Emílio Goeldi, figura esta de extrema importância para a ciência brasileira, e um dos Diretores da Instituição (www.museu-goeldi.br, 2016). Por essas características peculiares é que se escolheu esse espaço para desenvolver a proposta de implementação.

            Este trabalho teve como objetivo geral mostrar que os conteúdos de Botânica podem ser apreendidos de forma significativa quando realizados fora do ambiente de sala de aula; como objetivos específicos foram estabelecidos os seguintes: a) interagir com os docentes das disciplinas de Língua Portuguesa, Física, Química e Matemática em torno de um tema comum, a Botânica; b) promover a sensibilização dos alunos por meio de vivências que lhes permitam compreender que a Botânica pode fazer parte do cotidiano das pessoas de uma forma prazerosa e estimulante e c) incentivar a prática de comportamentos voltados para a conscientização ambiental e a consequente melhoria da qualidade vida.

 

2. O JARDIM BOTÂNICO COMO SALA DE AULA: UMA METODOLOGIA DIFERENCIADA.

            A proposta deste trabalho foi executada com os integrantes do 1º ano e 2º Ano do Ensino Médio da Escola E.E.F. Eneida de Moraes, localizada no Conjunto Júlia Seffer, cidade de Ananindeua, Estado do Pará, totalizando 50 alunos. Muitos desses adolescentes e jovens não tem a oportunidade de visitar um Jardim Botânico, em sua maioria, desconhecendo a importância dessa reserva biológica urbana, bem como as atividades desenvolvidas nesse espaço.

            O trabalho foi dividido em duas etapas: inicialmente, os alunos realizaram visita técnica monitorada ao Jardim Botânico do Museu Emilio Goeldi, em parceria com os professores das turmas das disciplinas anteriormente citadas, conforme Figura 1 e Figura 2.

 

    

Figura 1. Visita dos alunos ao Jardim Botânico.               Figura 2. Explicação técnica e monitorada

 

            Ao chegarem ao Museu Emílio Goeldi, foram recebidos com uma palestra, cuja temática abordava tópicos sobre o surgimento do Jardim Botânico do Museu Goeldi) e também sobre questões ambientais, além da importância da Botânica, o incentivo ao estudo da mesma e seus benefícios. A segunda etapa ocorreu no espaço escolar. Os professores das disciplinas Biologia, Língua Portuguesa, Física, Química e Matemática escolheram um tema de sua disciplina que tivesse relação com a Botânica e assim preparam a aula com esse enfoque.

            Cada professor pesquisou assuntos que tivessem haver com a sua disciplina e a Botânica, relacionando a visita ao Jardim Botânico do Museu Emilio Goeldi, nessa proposta.

            A primeira disciplina com atividade realizada foi a de Língua Portuguesa. O professor solicitou aos alunos que fizessem um texto descritivo, a fim de abordar o conteúdo em gêneros textuais. E para produzir o texto, os alunos deveriam estar atentos do início ao término da visita ao Jardim Botânico, registrando os pontos positivos e negativos, aprazíveis e exóticos do mesmo, ressaltando também a importância do estudo da botânica para cotidiano dos alunos e para o desenvolvimento de práticas voltadas para a conscientização ambiental.

            A disciplina Biologia foi trabalhada da seguinte forma: o professor solicitou aos alunos que fizessem grupos e escolhessem uma espécie de vegetais de um determinado local do Jardim Botânico, que foi destaque para eles. Os alunos realizaram um relatório sobre a espécie escolhida, contendo: nome científico, nome popular, as características morfológicas, as suas funcionalidades, se a mesma encontra-se em extinção ou não. Os relatórios deveriam conter o máximo de informações possíveis, como por exemplo: importância econômica, modos de utilização, nomes populares distintos e se houve algum fato histórico, deveria ser mencionado para que os alunos pudessem saber o quanto os vegetais são importantes para a vida dos seres humanos.

            Na disciplina Matemática foi solicitado aos alunos que relacionassem as formas geométricas presentes nas plantas. Os alunos do 1º ano apresentaram os trabalhos em equipes através de seminários, já os alunos do 2º ano realizaram uma pesquisa e apresentaram a mesma por escrito. Nestes trabalhos os alunos dos respectivos anos descreveram a simetria radial encontrada na flor "dente-de-leão", sobre a concavidade das folhas da "Paxiúba" e das suas formas triangulares que suas raízes formam com o solo, conhecida também como a árvore que anda.

            Ainda na disciplina Matemática foi ensinado sobre as plantas e suas diferenças através do seu número de pétalas e também os alunos fizeram a análise da planta "Vitória-régia", identificando as suas estruturas e formas, para relembrarem conceitos de Geometria. Realizaram ainda, associações das espécies com as lendas amazônicas existentes e suas importância para a cultura do povo amazônico.

            Na disciplina Química, o professor direcionou os alunos para o estudo das reações das plantas com o ser humano, mostrando de forma clara a importância dos vegetais para a manutenção da espécie humana. Foi estudada a reação positiva da fotossíntese das plantas relacionada com os impactos ambientais, como por exemplo, o efeito estufa, que em seu estado normal é importante para a vida na terra, mas com a agressão dos seres humanos com o meio ambiente, torna o efeito estufa algo negativo para os habitantes do planeta. Os alunos também apresentaram propostas de como mitigar os impactos ambientais diversos provocados pelos atores sociais.

            O professor da disciplina Física solicitou que os alunos realizassem uma pesquisa sobre os processos que são cruciais para o funcionamento do meio ambiente e do planeta. Estudos como: temperatura, umidade, vento e pressão, foram aprofundados e exemplificados para determinar quais são as suas relações com os vegetais, fazendo com que a relação indivíduo x meio ambiente seja concretizada de forma equilibrada e harmônica.

            A metodologia aqui proposta estabeleceu uma forma de trabalho onde a experiência de aprendizagem foi ativa, significativa, articulada com a realidade do alunos, e principalmente, direcionada à elaboração de idéias, à vivência de tentativas e ao desenvolvimento de ações concretas de ensino e  aprendizagem em um espaço rico de informações das mais diversas categorias.

 

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

            As atividades foram organizadas com o objetivo de sensibilizar os alunos por meio de vivências que lhes permitiram: a) perceber-se a si mesmos como parte do ambiente e a importância da flora para o manutenção da vida; b) compreender o entendimento do seu papel, enquanto sujeito no dia-a-dia da escola somada à comunidade onde estão inseridos, com a sua integração à natureza; c) adotar comportamentos voltados para práticas ambientais sustentáveis; d) proporcionar a aprendizagem significativa em um espaço não-formal de educação e e) compreender a importância e o uso do Jardim Botânico enquanto espaços de interdisciplinaridade, conservação ambiental e de promoção do estudo.

            As atividades realizadas fora do contexto escolar estimularam e motivaram os alunos, tornando-os muito mais permeáveis ao aprendizado dos conteúdos; pois o próprio espaço aberto – a Sala de Aula “Jardim Botânico” – além de ser um ambiente rico em informações, propiciou a melhoria da relação professor - aluno na medida em que essa oportunidade contribuiu para a socialização e ampliação a auto-estima desses alunos.

 

Figura 5. Sala de aula "Jardim Botânico"

 

            Toda ação educativa é uma relação de pessoas e de gerações. O professor nesse processo torna-se um eterno aprendiz, pesquisador e produtor do conhecimento. E nessa cultura da aprendizagem é que a Jardim Botânico e Escola precisam transmitir conhecimentos e ensinar valores, pois a formação de atitudes e valores perpassa pelas atividades de ensino e aprendizagem em diferentes contextos (GUTIÉRREZ, 2013).

            Esse trabalho se constitui em uma opção a mais como recurso metodológico para o professor realizar suas aulas, com dois aspectos relevantes: o primeiro foi mostrar que a Botânica, um assunto que normalmente é tratado de forma desestimulante e desarticulado da realidade do educando, pode ser trabalhada de forma lúdica, interativa contudo, sem perder a cientificidade. O segundo aspecto refere-se à metodologia com enfoque interdisciplinar, ressaltando que a articulação da equipe de professores em torno de um tema abrangente, é possível e também enriquecedora, capaz de articular ciência e educação ambiental, contribuindo assim para a propagação de atitudes ambientalmente éticas e incentivo a práticas voltadas para a conservação ambiental e melhoria da qualidade de vida (FERREIRA, 2013).

 

REFERÊNCIAS

 

FERREIRA, C. E. A. O meio ambiente na prática de escolas públicas da rede estadual de São Paulo: intenções e possibilidades. Ambiente & Educação, São Paulo, v. 18, n.1, p.185-209, 2013.

 

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, CNE. Câmara de educação básica. Resolução nº 2, de 30 de janeiro 2012. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio.http://pactoensinomedio.mec.gov.br/images/pdf/resolucao_ceb_002_30012012.pdf

 

PINTO, L. T.; FIGUEIREDO, V. A. O ensino de Ciências e os espaços não formais de  ensino. Um estudo sobre o ensino de Ciências no município de Duque de Caxias/RJ. II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia, 07 a 09 de outubro de 2010.

 

GÜLLICH, R.  I. da C. Desconstruindo a imagem do livro didático no ensino de ciências. Revista SETREM., V. 4, n. 3, p. 43 – 51, jan. 2004.

 

GUTIÉRREZ, Francisco e PRADO, Cruz. Ecopedagogia e Cidadania Planetária. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 2013.

 

LEFF, Henrique. Discursos Sustentáveis.Trad. Silvana Leite. São Paulo: Cortez, 2010.

 

LEFF, Henrique. A Complexidade Ambiental.Trad. Eliete Wolff. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2010.

 

MUSEU GOELDI. Disponível em: Acesso em 01 de Jul. 2016.

 

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA. Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação, 2006. 239 p.

 

Ilustrações: Silvana Santos