Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2018 (Nº 52) A PRÁTICA DE UMA EDUCAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EM UMA ESCOLA FUNDAMENTAL DA REDE PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO
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A PRÁTICA DE UMA EDUCAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EM UMA ESCOLA FUNDAMENTAL DA REDE PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PRACTICE OF AN EDUCATION FOR SUSTAINABLE DEVELOPMENT IN A FUNDAMENTAL PUBLIC SCHOOL OF SÃO PAULO STATE

Maíra Cunha Marques

Especialista em gestão ambiental

Secretaria de Meio ambiente – Cerqueira César

Rua Porfírio dias,74, Centro, Cerqueira César/SP, CEP 18.760-000

(14) 3714-11

mer_marques@hotmail.com

Universidade Estadual do Maranhão

Av. Beija Flor, 10C-Araçagy, São José de Ribamar-MA

(98) 992343333

clanaros@yahoo.com.br

 

RESUMO

O desenvolvimento sustentável emergiu em meio à década de 1980 e tornou-se global na Conferência Rio-92. Ele aglutinou as necessidades de preservar os recursos e a natureza através de novas práticas sociais. Para sua efetivação no corpo da sociedade, mudanças comportamentais foram sugeridas e para sua efetividade a educação formal e não formal foi elevada à categoria de executora. No intuito de avaliar a prática de uma educação transformadora para uma sociedade sustentável, pesquisamos o ensino praticado na escola Estadual Jardim Primavera, na cidade de Cerqueira César-SP através do uso de entrevistas, questionários e análise dos discursos. A educação focada no desenvolvimento sustentável é uma prática comum à maioria das disciplinas dessa escola isoladamente e os professores têm ciência do conceito, porém as práticas pedagógicas não ultrapassam os limites do ensino da reciclagem e não há projetos interdisciplinares.

Palavras Chave: Desenvolvimento Sustentável; Educação Ambiental; Ensino Fundamental.

 

 

ABSTRACT

Sustainable development emerged through the 1980s and became global in Rio-92 Conference. He added the needs of preserving resources and nature through new social practices. Order to be effective in the dynamics of society, behavioral changes were suggested and their effectiveness formal and non-formal education was elevated to the rank of executing. In order to evaluate the practice of transformative education for a sustainable society, we research the teaching practiced at the State Garden Spring school (escola Estadual Jardim Primavera in portuguese) in the city of Cerqueira César-SP using interviews, questionnaires and analysis of speeches. Education focused on sustainable development is a common practice for most of the subjects of this school alone and teachers have concept of knowledge but the pedagogical practices do not go beyond the teaching of recycling and no interdisciplinary projects.

Keywords: Sustainable development; Environmental Education; Elementary Education.

 

 

 

 

INTRODUÇÃO

No embate iniciado em meio ao século passado entre os paradigmas desta sociedade que tem a natureza como infinita e utilitária ao homem e o que integra o homem à ela e pensa nas relações e ciclos ecológicos, veio surgir outro que abarca a essencialidade dos opostos, o Desenvolvimento Sustentável (DS) que tem no alicerce da educação um dos fundamentos das mudanças necessárias a uma sociedade integrada à natureza.

Três parâmetros são fundamentos na construção desse paradigma: a gestão participativa; o diálogo das partes envolvidas que escolhem com sentido ecológico e cientificamente embasados; e a educação (CAVALCANTI, 1997).

O texto Educação para o Desenvolvimento Sustentável (UNESCO, 2002) esboça o que se pensou no sentido da educação para a efetividade desse paradigma, construídos nos dez anos entre a Rio-92 e a Rio+10 em Johanesburgo, afirmando que já em 1987, quando da publicação do relatório Brundtland, que define o DS, a educação foi pensada como o meio mais importante nesse caminho. Justifica que somente, como sempre se pensou, a melhoria da educação é fundamental para desenvolver uma nação e promover a melhoria de vida de sua população, unindo crescimento e qualidade de vida.

Os objetivos de uma Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) elencados nesse documento fazem referência ao empoderamento dos cidadãos e as ações participativas dos vários segmentos no sentido de mudanças sociais e ambientais, obtidos pelo desenvolvimento de uma visão crítica proporcionada pela educação culminando na reflexão dos valores que devam ser alterados pela sociedade.

Cavalcanti (1997) afirma que em uma educação dirigida para o sentido da sustentabilidade a educação formal é imprescindível, especialmente em regiões de urbanização ainda precária e cuja consciência quanto às ações coletivas de melhoria das condições de vida não se estabeleceu no seio da comunidade. Neste caso podemos incluir a grande maioria das pequenas cidades de nosso país.

Nossa intencionalidade foi, pois, desvendar a EDS em uma escola de uma cidade do interior de São Paulo, a EEPSG Jardim Primavera, no município de Cerqueira César, há 330 quilômetros no sentido Oeste da capital do Estado habitada por pouco mais de 17,5 mil de habitantes. A escola tem alunos do sexto ano do ensino fundamental ao 3º do ensino médio, atendida por 52 professores onde realizamos as entrevistas entre março e maio de 2011.

 

           

Figura 1 – Localizaão da cidade de Cerqueira César

Fonte: http://cidades.ibge.gov.br/painel/painel.php?codmun=351140

 

 

Neste breve trabalho objetivamos em primeiro lugar analisar as práticas do ensino para a construção do DS, através do olhar dos atores - alunos e professores – consequentemente, melhorando a percepção do conceito e da prática docente. Secundariamente o que se pretendeu foi avaliar o conhecimento do conceito pelos educadores; entender as práticas ambientais que ajudam na consolidação da sustentabilidade; identificar as variáveis que o DS vem apresentando no ensino dessa escola.

 

MÉTODO

Um desafio lançado na construção dos objetivos propostos foi como entender a realidade expressa nos discursos de sustentabilidade dos envolvidos mantendo a distância necessária dos pesquisadores, outro foi qual a melhor maneira de encaminhamento para haver pouco constrangimento para os envolvidos expressarem-se sobre os temas e questões a serem revelados e um último foi qual universo pesquisar para garantir a proximidade de uma relação mais verdadeira com o que se quer entender no universo estudado.

            Na busca de quais ferramentas poderiam auxiliar na solução das questões propostas pelos objetivos, Chizzotti (2003, p.222-226) vem propor que entrevistas, observação participante e análise dos discursos, dentre outras, podem ser usadas na busca de ciência dos fatos e fenômenos. Assim lançamos mão de entrevistas e perguntas escritas abertas e objetivas que permitiram discernir os caminhos que os conceitos, definições, práticas cotidianas e intenções vêm tomando no ensino de uma escola pública estadual da cidade de Cerqueira César, no Estado de São Paulo. Como bem lembra o autor,entrevistas abertas podem ser usadas através de perguntas não diretivas, revelando a intencionalidade das ações.

            As perguntas objetivas visaram introduzir a questão fundada na prática educacional quanto ao ambiente, à sustentabilidade e desenvolvimento, à fundamentação paradigmática praticada pelos professores. As questões objetivas levaram sempre a outras de caráter mais aberto, onde os entrevistados puderam expor sua particularidade quanto aos aspectos averiguados. Esta opção pode fornecer-nos a oportunidade de abstrair as percepções de qual paradigma baliza as ações do ensino focado na boa relação homem-natureza proposto pela EDS, qual a percepção dessa educação e em que medida ela vem sendo implementada na educação formal dessa escola.

            As análises de algumas respostas se fizeram pela técnica de análise de discurso, já que as respostas enveredaram pela pessoalidade e individualidade dos entrevistados e em alguns casos aplicaram-se as entrevistas em forma de conversa o que permitiu o uso desta abordagem. Para esta técnica nos pautamos em Brandão (1993, p.10) que afirma que o enunciado, ou seja, a parte perceptível observada objetivamente na exterioridade da palavra, é elaborado mentalmente pelo indivíduo e é orientado socialmente no contexto imediato da fala, especialmente quando se trata de interlocução concreta.

            Após o contato com a direção da escola e a devida permissão para a pesquisa, seguiram-se duas reuniões com os professores em horário de trabalho pedagógico onde todos têm obrigatoriedade de participar. Posteriormente fizeram-se algumas entrevistas com professores e alunos para adequação do questionário final. Depois de analisados os primeiros resultados e feitas as correções de rumo, aplicamos questionários e entrevistamos 15 professores do total de 48 da escola.

           

 

O SURGIMENTO DO TERMO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E O PAPEL DA EDUCAÇÃO.

 

Após a Conferência de Estocolmo, em 1972, que firmou a idéia de que os recursos naturais poderiam findar-se e a humanidade teria que agir no sentido de mudar nossa relação com a natureza, a Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas apresentou ao mundo um relatório (denominado de Relatório Brundland) sobre o tema desenvolvimento. Nele apresentou-se a noção do desenvolvimento sustentável além de afirmar que um desenvolvimento sem melhoria da qualidade de vida das sociedades não poderia ser considerado como desenvolvimento.

            No relatório, Desenvolvimento Sustentável é “[...] aquele que atende ás necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades” (BRUNDLAND: 1988, p.46), considerando-se como desenvolvimento aquele que trata de forma múltipla e relacional a qualidade de vida, o ambiente, a diminuição das desigualdades e a variável econômica, social e ambiental.

No ano de 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro (Rio-92), veio firmar o DS no mundo todo, quando as Nações aprovaram um documento contendo compromissos para mudança do padrão do desenvolvimento para este novo século, a Agenda 21. Essa Agenda foi um modelo para que nas várias escalas das atividades humanas se fizessem "acertos" de ordem ecológica, onde pensava-se um contexto real de centro/periferia mundial, assumindo-se um mesmo patamar de estratégias para os diversos países do mundo (OLIVEIRA, 2003, p5). A Agenda 21 pretendia criarem-se planos de governo, com estratégias adaptadas às peculiaridades de cada país cujo discurso deveria abarcar o local e o global.

As principais propostas do DS pela implementação da Agenda do século 21focaram-se na racionalização do uso da energia ou no desenvolvimento de técnicas substitutivas do uso de bens não-renováveis, impetrando o discurso da Sustentabilidade, bem como a alienação dos consumidores, invocando-os a consumir conscientemente os bens ditos sustentáveis. Buscavam-se parâmetros aceitáveis para a convivência do ser humano em uma base justa e equilibrada, sem, contudo, abalar a base da sociedde, a economia e a escala de produção. As alternativas foram reduzir o uso irresponsável, produzir pensando no recurso finito e no meio-ambiente sem relacionar-se a efetivação de um novo sistema social. Uma das formas mais importantes preconizada para chegarmos ao DS foi a Educação Ambiental em seus níveis formal e não formal.

            Foi na Rio-92 também que surgiu o documento “Tratado de Educação ambiental para sociedades sustentáveis”, elaborado pelo fórum das ONGs e a “Carta brasileira para a Educação Ambiental”, elaborada pela Coordenação de Educação Ambiental no Brasil que estabeleceu as recomendações para a capacitação de recursos humanos. Na década de 1990, o Ministério da Educação-MEC, aprova os novos "Parâmetros Curriculares Nacionais" (BRASIL, 1998) que incluem a Educação Ambiental como tema transversal em todas as disciplinas. Desde então as escolas devem tratar do DS interdisciplinarmente. Este trabalho vem pois averiguar em que medida vem-se execcutando o ensino formal com essa premissa.

 

RESULTADOS

O que se pretendeu revelar com as perguntas, tanto nos questionários abertos quanto nas entrevistas, foram separados nos temas inter-relacionados, cujo resultado mostramos abaixo:

- Quisemos saber se há temas que tratem da relação sociedade-natureza tratados em sala de aula e de que forma eles são trabalhados. As respostas indicaram que essa relação está presente no cotidiano escolar, somente a disciplina de educação física afirmou não o trabalhar. Quanto aos temas relatados pudemos perceber a supremacia dos ligados à reciclagem, depois os de higiene alimentar e uso da água. Em menor número apareceram cidadania, poluição e aquecimento global. Já para quanto as formas de se trabalhar esses conteúdos, a leitura de texto, jornais e filmes foram os mais comuns, projetos interdisciplinares não foram relatados, somente a disciplina de Ciência desenvolveu projeto de reciclagem em sala de aula.

- Outro aspecto buscado foi se na escola há ações focadas diretamente na sustentabilidade . Todos os professores responderam positivamente, e a reciclagem foi a ação relatada quase unanemente.

- Quanto ao DS, especificamente, procuramos saber quais conceitos tinham os professores. Todos dizem saber o que é e em seus relatos o conceito foi expresso como: técnicas que não causem mal ao meio ambiente, possibilitando a produção sem prejucar a natureza; combinação de desenvolvimento econômico e social com preservação ambiental e; o fim do homem causado pelo fim da natureza ocasionada por nós com o uso inadequado dos recursos.

- Perguntados se o DS é essencial ao ensino promovido por eles, as opiniões centraram-se no mais elevado grau, como podemos ver a proporção no gráfico 1. O que demonstra juízo positivo de valor ao conceito independentemente de ser ele conhecido ou praticado.

- Focando mais ainda nosso olhar, procuramos saber se eles usam o DS em suas disciplinas e como o fazem. Em três disciplinas as respostas foram negativas, como podemos observar proporcionalmente no gráfico 2. Nas outras ele aparece na forma de conscientização, reciclagem, reaproveitamento de materiais e alimentos, preservação da natureza e leis.

 

 

 

CONSDIERAÇÕES

O DS é um termo elaborado para uma melhor relação da sociedade contemporânea com a natureza, e seus fundamentos baseiam-se no consumo irresponsável e vem alertando a humanidade para o fim dos recursos e problemas de perpetuidade da humanidade. Assumido no início da década de 1990 pelas Nações participantes da Rio-92, fundamenta as mudanças de comportamento e de paradigma promovido pela educação formal e não formal.

A Escola Jardim Primavera, na cidade de Cerquria César-SP, tem ciência e usa dos fundamentos de uma educação para a sustentabilidade, mas as ações limitam-se à recilagem, uso responsável dos recursos, da água e cuidados com higiene pessoal. Os recursos utilizados para a prática docente em EDS são convecionais, onde os filmes e a leitura de textos são largamente utilizados e a escola carece totalmente de projetos que envolvam uma aprendizagem menos diretiva e mais construtiva.

            Para a mehoria de uma educação transformadora, baseda no paradigma do DS, é necessário a concretização de projetos que envolvam grande parte das disciplinas que sejam eaborados coletivamente nos horários de trabalho coletivos da escola.

 

 

Referências

BRANDÃO, M. H. N. Introdução a análise do discurso. ed. 2ª. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1993.

BRUNDTLAND, Gro H. Nosso Futuro Comum. Rio de Janeiro: FGV/CMMAD, 1988.

CAVALCANTI, C. Meio Ambiente, Desenvolvimento Sustentável e Políticas Públicas. São Paulo: Cortez, 1997.

CHIZZOTTI. A. A pesquisa qualitativa em ciência humanas e sociais: evolução e desafios. Revista Portuguesa de Educação, v. 16, n.2. Braga: Univ. Minho, 2003. p.221-236

OLIVEIRA , L D. O Ensino de Geografia e o Desenvolvimento Sustentável: Espectros de uma idéia dominante de nossa época. In: 7º ENPEG – Encontro Nacional de Prática de ensino de Geografia, Vitória. Novos desafios na formação do professor de geografia. Vitória: AGB – Espírito Santo. 2003

UNESCO, Education for Sustainability – from Rio to Johannesburg: Lessons Learnt from a Decade of Commitment, 2002. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127100e.pdf >. Acesso em: 21 ago. 2014.

BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Brasília, DF: MEC/SEF, 1998.

 

Ilustrações: Silvana Santos