Não podemos pensar em desenvolvimento econômico, reduzir as desigualdades sociais e em qualidade de vida sem discutirmos meio ambiente. - Carlos Moraes Queiros
ISSN 1678-0701 · Volume XXII, Número 88 · Setembro-Novembro/2024
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Arte e Ambiente
13/09/2022 (Nº 80) UM CONVITE À CONTEMPLAÇÃO
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UM CONVITE À CONTEMPLAÇÃO



Cláudia Mariza Mattos Brandãoi



Resumo: Neste texto proponho um exercício de contemplação das ruínas de São Miguel (Santo Ângelo, RS), através de um conjunto de imagens que simultaneamente nos (re)conectam ao presente e ao passado. Amparo-me no pensamento de Emanuele Coccia para discutir simbolicamente a emergência de uma “vida sensível”.



Vivemos porque podemos ver, ouvir, sentir, saborear o mundo que nos circunda. E somente graças ao sensível chegamos a pensar: sem as imagens que nossos sentidos são capazes de captar, nossos conceitos, tal qual já se escreveu, não passariam de regras vazias, operações conduzidas sobre o nada. (COCCIA, 2010, p. 9)



Com essas palavras, Emanuele Coccia inicia o livro “A vida sensível” (2010), no qual articula um pensamento em prol do reconhecimento dos seres humanos como antenas sensíveis do mundo. O autor reafirma a importância de reflexões sobre as corporeidades, ou seja, a relação interpessoal entre um corpo, os demais e o meio em que vive.

É possível considerar que a nossa cultura é fortemente impactada pela máxima do filósofo, físico e matemático francês René Descartes (1596 - 1650): “Penso, logo existo”, numa exaltação do próprio eu como referência máxima para as interações mundanas. O egocentrismo que funda a modernidade ocidental nos trouxe à situação contemporânea de intensa degradação das relações humanas entre si e com o ambiente natural. Sendo assim, o alerta de Coccia ecoa a urgência de (re)assumirmos o hábito de contemplar o mundo através de todos os nossos canais perceptivos. E percepção exige envolvimento ... exige disponibilidade, tempo!

Refletindo como uma observadora, identifico (sem qualquer dificuldade) o turbilhão de imagens que assola e banaliza o nosso olhar numa velocidade cada vez mais vertiginosa, compassada pelas novas tecnologias da informação e da comunicação e suas redes sociais. Dependentes e compulsivos, agimos como “coletores de sensações” (BAUMAN, 2001) para quem o tempo da observação, analítica, reflexiva e crítica, desaparece, sucumbe.

O que proponho nesta coluna é um exercício de contemplação, de ativação sensorial da imaginação criativa, dos cheiros, sonoridades e histórias que emanam das imagens de um lugar muito especial e representativo de quem somos, nós, povo brasileiro. Refiro-me à região de Sete Povos das Missões, em especial, às ruínas de São Miguel Arcanjo (1687), que resultam da estratégia do governo espanhol para a colonização da região do Rio da Prata, na América Espanhola.

Neste reduto silencioso, uma algazarra distante no tempo ecoa e povoa a nossa imaginação. Num misto de vida e morte, o passado se mostra aos olhares e mobiliza os corpos. São diferentes sensações que ultrapassam a moldura das imagensii, apelam aos sentidos e superam a beleza do espetáculo arquitetônico.