Revista Educação Ambiental em Ação 23
O Dia
“D” do Consumo
Por Redação Akatu
A cada ano que passa, o consumo da humanidade supera mais rapidamente a
capacidade de regeneração do planeta.
Em 2007, no dia 6 de outubro, faltando quase três meses para o Reveillon, a
humanidade já havia consumido todos os recursos naturais que o planeta seria
capaz de repor naquele ano. Como estamos gastando cada vez mais rápido os
recursos naturais, esse dia “D” acontece cada vez mais cedo. Em 1987, o ano
do primeiro Ecological Debt Day, como é chamado o dia em que a humanidade passa
a estar em débito em relação ao meio ambiente, ocorreu no meio de dezembro.
Em 1995, ele pulou para o dia 21 de novembro. E no ano passado, chegou à marca
histórica de 6 de outubro.
Essa diferença entre o que o planeta é capaz de regenerar e o consumo efetivo
das populações humanas provoca um saldo ecológico negativo que vem se
acumulando ano após ano, desde a década de 80, e compromete, no longo prazo, a
capacidade de sobrevivência da humanidade e de manutenção da vida no planeta
como a conhecemos hoje.
O cálculo é feito pela Ong internacional Global Footprint Network, que tem
entre seus integrantes o ambientalista e conselheiro do Instituto Akatu, Fábio
Feldman e o pesquisador William Rees, da universidade canadense de British
Columbia. Ress é co-autor da ferramenta conhecida como Pegada Ecológica, que
serve de base para a análise de impacto do consumo apresentada ao mundo pela
Ong.
A pegada ecológica permite calcular qual é a área (em hectares) necessária
para produzir tudo aquilo que consumimos e, ainda, absorver os resíduos desses
processos, em um ano. A conta é feita considerando toda a quantidade de água e
de espaço físico necessários para o plantio, pastagem, pesca etc.. Todo esse
conjunto é chamado de “biocapacidade” do planeta, ou seja, a habilidade dos
sistemas ecológicos de gerar recursos e absorver resíduos em um determinado
período.*
Ao calcular o dia em a Pegada Ecológica total da Humanidade é igual à
biocapacidade da Terra (ambos medidos em hectares por ano), os pesquisadores
identificam em qual data a população da Terra atinge o seu limite de consumo
para o período. De modo simples, esse é o dia em que começamos a usar mais
recursos ambientais do que a Terra é capaz de renovar, em um ano. A partir
desta data, o planeta funciona no vermelho.
Juros Os “juros” cobrados pela natureza devido ao excesso de consumo já são
conhecidos. Eles podem ser percebidos na forma de perda de bens e serviços
ambientais - como a manutenção do equilíbrio climático. Modificar o padrão
de exploração dos recursos e passar a usar apenas o que a natureza é capaz de
produzir é a resposta para saldar a dívida e resolver um problema que se
agrava continuamente.
“A humanidade tem várias saídas para mudar esse quadro, mas se permanecermos
na inércia a e não fizermos nada, já sabemos que as conseqüências serão
gravíssimas”, analisa o Prof. Genebaldo Freire Dias, Doutor em Ecologia e
autor de diversos livros sobre a Pegada Ecológica. Infelizmente, os dados
indicam que as mudanças adotadas até hoje são tímidas para alterar o rumo
dessa história. Pelo contrário, os impactos parecem ser cada vez maiores.
Em 1961, quando os cálculos da Pegada Ecológica começaram a ser realizados
pela Global Footprint Network, a população humana já usava 70% da capacidade
produtiva da Terra. Mas foi em 19 de dezembro de 1987, a primeira vez que
consumimos mais recursos do que o planeta era capaz de renovar, em um ano.
Segundo os cálculos da pegada ecológica, feitos pela Global Footprint Network
e publicados pelo WWF (World WildLife Fund) no relatório “Living Planet
Report 2006”, em 2003 a população da Terra já consumia 25% a mais do que os
sistemas biológicos poderiam renovar. Hoje, dados da mesma organização
apontam um saldo negativo de 30%. Esse excedente de consumo (conhecido como
“overshoot” pelos pesquisadores) significa que seriam necessários 1 ano e
110 dias - 475 dias - para que a Terra pudesse ser capaz de produzir novamente o
que a população mundial consumiu no período de um ano, ou seja, em 365 dias.
E, segundo a Global Footprint Network, o acúmulo desse consumo excedente ao
longo dos anos acaba gerando um “déficit ecológico”, que compromete a
integridade dos sistemas naturais.
Para entender a situação, na prática, imagine uma floresta, onde as árvores
são cortadas mais rápido do que as novas mudas podem nascer e se desenvolver.
Em algum tempo, o número total de árvores na floresta irá diminuir. Frutos,
sombra, raízes etc. que ajudam a manter a qualidade do solo, a temperatura e a
disponibilidade da água e alimentos também passarão a existir em menor
quantidade, comprometendo a possibilidade da flora e fauna sobreviverem naquele
ambiente. O mesmo pode acontecer com outros recursos, como as espécies de peixe
comercialmente pescadas, as áreas agriculturáveis etc.
Se um processo semelhante ocorre em diversos locais da Terra continuamente, o
que acontece é a diminuição dos recursos existentes no planeta assim como da
capacidade da natureza de responder aos impactos e se recompor. Desse modo, é
como se alguém gastasse muito mais dinheiro em um ano do que é capaz de
ganhar. Com o passar do tempo, sua dívida ficaria tão grande que mesmo que
trabalhasse muito e ganhasse mais dinheiro, seria difícil saldar o déficit. O
risco é a exaustão da capacidade do sistema de gerar recursos, assim como das
forças do trabalhador.
Em termos globais, hoje, precisaríamos de 1,3 planetas Terra para manter os
atuais padrões de consumo, sem comprometer a capacidade de renovação da
natureza. Naturalmente, o grande problema é que vamos continuar a ter apenas
um, enquanto as demandas de consumo e a própria população não param de
crescer.
No ano 2000, por exemplo, gastou-se no nosso planeta em compras de produtos ou
serviços domésticos, mais de 20 trilhões de dólares, quatro vezes mais do
que em 1960, quarenta anos antes. Porém, nesse mesmo período a população da
Terra dobrou, o que significa que cada pessoa, em média, passou a consumir duas
vezes mais.
Não é possível prever até que ponto a Terra será capaz de resistir aos avanços
consumistas da humanidade, diz Brooking Gatewood, gerente da Global Footprint
Network, responsável pelos cálculos da Pegada Ecológica da Humanidade. “Nós
não temos uma estimativa de quanto tempo levará até um ‘colapso ecológico’
ou a exaustão da capacidade da Terra de regenerar os recursos. Isso é impossível
dizer, mas nós podemos afirmar que nossas analises mostram que, se a humanidade
continuar adotando o modelo de desenvolvimento e consumo atuais, nós
precisaremos de 2 planetas Terra em 2050, para prover os recursos que
demandaremos”, afirma Gatewood.
Na realidade, os cenários futuros traçados com base nos números da pegada
ecológica mostram que há que se buscar, sem demora, um modo de consumir
diferente, que inclua a consciência dos impactos que causamos ao nosso redor,
sob pena de transformar a crise ecológica num processo irreversível. “É
necessário buscar uma mudança profunda de paradigma para efetivamente
solucionar os problemas que estamos vivendo no momento. A compreensão pode vir
pelo bolso, pela educação ou pelo sofrimento. Resta saber qual maneira a nossa
sociedade vai escolher”, analisa o Prof. Freire.
Agindo para solucionar - Mas o que cada um de nós pode fazer individualmente
para diminuir a pegada ecológica da humanidade? Em primeiro lugar tomar consciência
do problema e procurar saber quais são os impactos do seu estilo de vida - na
sociedade, na natureza e sobre si mesmo. Há muita coisa que se pode fazer,
partindo do princípio de reavaliar o consumo, seja de bens materiais ou de
recursos naturais, ao tomar consciência de que dependemos destes para
sobreviver. “As pessoas hoje esquecem que existe uma base biológica de
sustentação da vida. Principalmente nas grandes cidades, onde o consumo é
maior e a distância da natureza é grande. Sem essa base (biológica), não tem
carro novo, nem shopping center, nem viagem para o Caribe”, desabafa o
professor Freire.
O Brasil tem uma pegada ecológica média de 2,1 hectares por habitante por ano,
número superior à média mundial sugerida para que atingíssemos um padrão de
consumo sustentável hoje, que seria de 1,8 (hectares/hab./ano), mas bastante próxima
da média mundial per capta de 2,2.
Você pode descobrir qual é a sua pegada ecológica no endereço
www.earthday.net/Footprint/index.asp. Vale a pena fazer uma visita, descobrir
como anda o seu ritmo de consumo dos recursos naturais e ver se não está na
hora de repensar os hábitos. Para ajudá-lo nessa missão, o Akatu confeccionou
os 12 Princípios do Consumidor Consciente que estão disponíveis na home-page
do Akatu (http://www.akatu.org.br) na seção de Publicações/Manuais Práticos
de Consumo Consciente.
Saiba mais sobre a Pegada Ecológica e mobilize-se:
A Global Footprint Network e seus 85 parceiros internacionais realizam todos os
anos uma campanha internacional de mídia para divulgar o Ecological Debt Day e
a Earth Day Network organiza em abril a comemoração do Dia da Terra, em todo
mundo.
Quem quiser participar das campanhas internacionais pode acessar o http://www.footprintnetwork.org
ou www.earthdaynetwork.net.
O relatório do WWF “Living Planet Report 2006”, que reúne informações
gerais sobre a Pegada ecológica e os dados citados nessa reportagem pode ser
encontrado no link http://www.footprintnetwork.org/download.php?id=303.
* O conceito foi desenvolvido pelos pesquisadores Mathis Wackernagel e Willian
Hees e pode ser aplicado tanto para medir o impacto de um indivíduo de uma nação,
ou até mesmo de toda a população humana sobre o planeta.
(Envolverde/Akatu)
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Fonte: http://envolverde.ig.com.br/?materia=43883