Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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11/06/2019 (Nº 68) UMA ANÁLISE PRELIMINAR DA QUALIDADE DA ÁGUA SUBTERRÂNEA NO ABASTECIMENTO DE COMUNIDADES RURAIS DE CONCEIÇÃO DA BARRA-ES
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UMA ANÁLISE PRELIMINAR DA QUALIDADE DA ÁGUA SUBTERRÂNEA

NO ABASTECIMENTO DE COMUNIDADES RURAIS

DE CONCEIÇÃO DA BARRA-ES



Ismael Paranaguá1, Rogério Danieletto Teixeira2, Ediu Carlos Lopes Lemos3

paranaguaismael@gmail.com ; rdanielettoteixeira@gmail.com; ediulemos@hotmail.com

¹Pós-graduado em Gestão Ambiental, Instituto Federal do Espírito Santo

2Professor da Pós-graduação em Gestão Ambiental, Instituto Federal do Espírito Santo

3 Professor da Pós-graduação em Gestão Ambiental, Instituto Federal do Espírito Santo



RESUMO

Este trabalho fez um diagnóstico preliminar da qualidade das águas utilizadas por comunidades rurais do município de Conceição da Barra, tendo por finalidade trabalhar a educação ambiental quanto aos problemas de doenças de veiculação hídrica, associadas a ingestão ou manuseio de águas contaminadas. Na metodologia utilizada foram realizadas visitas de campo para o georreferenciamento dos poços, acervo fotográfico e entrevistas com os moradores das comunidades além de coleta de águas para análises físico-químicas e bacteriológicas. Os resultados obtidos demonstraram que águas subterrâneas das comunidades rurais estão dos padrões de potabilidade estabelecidos pelo Ministério da Saúde, podendo trazer sérios prejuízos a saúde das comunidades.

Palavras-chave: Educação ambiental, Qualidade das águas, Conceição da Barra

A PRELIMINARY ANALYSIS OF THE QUALITY OF THE UNDERGROUND WATER IN THE PROVISIONING OF RURAL COMMUNITIES

OF CONCEIÇÃO DA BARRA -ES

ABSTRACT

This work made a preliminary diagnosis of the quality of the waters used by rural communities of the municipal district of Conceição da Barra, tends for purpose to work the environmental education as for the problems of diseases of veiculação hídrica, associated the ingestion or handling of polluted waters. In the used methodology field visits were accomplished for the georreferenciamento of the wells, photographic collection and interviews with the communities' residents besides collection of waters for physiochemical and bacteriological analyses. The obtained results demonstrated that the rural communities' underground waters are of the established potability patterns for Ministry of Health, could bring serious damages the communities' health.

Palavras-chave: environmental education, water quality, Conceição da Barra



INTRODUÇÃO

Em função da escassez de águas superficiais, bem como do comprometimento de sua qualidade, o uso de águas subterrâneas tem aumentado cada vez mais. Estima-se que aproximadamente 39% dos municípios brasileiros são abastecidos exclusivamente com água subterrânea (ANA, 2011).

Em várias regiões do país, a água subterrânea representa o principal manancial hídrico das comunidades, sendo utilizada tanto para irrigação e lazer, quanto para consumo humano. Entretanto, em sua grande maioria, não existe um controle efetivo da qualidade dessa água, o que pode colocar em risco a saúde de seus consumidores.

No Brasil, a qualidade da água é regulamentada pela portaria 2914/11 do Ministério da Saúde, cujo objetivo é proteger a saúde pública, através do controle de substâncias potencialmente prejudiciais, tóxicas ou venenosas e microrganismos patogênicos que podem estar presentes na água de consumo humano (BRASIL, 2011). No caso específico dos recursos hídricos subterrâneos, a determinação de seu uso para consumo humano depende fundamentalmente da qualidade físico-química e bacteriológica da água (FREITAS et al., 2013).

Segundo o censo demográfico realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Brasil cerca de 29,9 milhões de pessoas residem em localidades rurais, em aproximadamente 8,1 milhões de domicílios (IBGE, 2010). Nessas regiões, especialmente em populações remanescentes de quilombolas, assentamentos rurais e ribeirinhas, a Fundação Nacional de Saúde – FUNASA - promove o fortalecimento das instituições estaduais e municipais, implementando ações de saneamento (FUNASA, 2013).

Em assentamentos rurais, a água para consumo humano normalmente é proveniente de mananciais subterrâneos e é captada através de poços ou cisternas (SANTANA, 2014). No município de Conceição da Barra (ES), 25 comunidades rurais utilizam sistemas alternativos de abastecimento. Elas realizam suas captações de água através de poços tubulares rasos que, em sua maioria, foram perfurados de forma irregular, sem levar em consideração critérios técnicos adequados que permitam condições básicas de saneamento.

As águas são bombeadas diretamente dos poços, sem qualquer tipo de tratamento, para as caixas de armazenamento e, delas, para as torneiras das residências. Tais condições podem gerar o aparecimento de doenças e trazer prejuízos à saúde pública. Sendo assim, é importante conhecer as condições dos mananciais subterrâneos dessas comunidades, especialmente em relação à qualidade físico-química e microbiológica da água de abastecimento humano a fim de que se busque fazer um trabalho de educação ambiental voltado para manuseio adequado destas águas, bem como, técnicas de melhorar a qualidade destas, uma vez que, são nestas localidades a única fonte de água para suprir suas necessidades.

A segregação vivenciada pelas comunidades quilombolas no Brasil acarretou consequências de desigualdades no acesso à saúde e a programas sociais, e além de entraves no acesso a bens e serviços diversos. Dessa forma, existem poucas pesquisas realizadas em comunidades quilombolas que evidenciam o acesso adequado ao saneamento básico e as precárias condições de vida (BEZERRA et al., 2014; GUERRERO et al., 2007). Nesse sentido, tal realidade expressa a vulnerabilidade da população quilombola no município de Conceição da Barra e, evidencia a necessidade da realização de pesquisas relacionadas a essas comunidades.

METODOLOGIA

O presente estudo foi realizado em 3 (três) etapas, sendo inicialmente feita uma caracterização da área de estudo, em seguida foram utilizados programas de análises de imagens para determinação da localização espacial e definição do grupo amostral, além de um levantamento populacional e social dos moradores, bem como, um acervo fotográfico dos poços que abastecem as comunidades e por fim, foram feitas coletas de águas dos poços para análises laboratoriais a fim de se analisar a qualidades destas e comparar com os padrões de potabilidade estabelecidos pelo Ministério da Saúde.

Caracterização da Área de Estudo

O município de Conceição da Barra localiza-se na região Norte do Estado do Espírito Santo. Sua extensão territorial é de 1.187,62 Km², o que corresponde a 2,25% da área total do estado, é constituído pela Sede, Distritos Braço do Rio e Itaúnas. Sua área limítrofe se estende ao norte até divisa com a Bahia, ao sul com São Mateus, à oeste com Pinheiros e Pedro Canário e à leste com o Oceano Atlântico (PROATER, 2011- 2013).

Conforme os dados do Censo de 2010, a população residente de Conceição da Barra é composta por 28.449 habitantes, e uma população estimada em 2016 de 31.353 habitantes. A densidade demográfica do município em relação ao último Censo em 2010 era de 24,01 hab./km².

Segundo o PNUD (2010), a população urbana correspondia a 22.575 habitantes, bem maior do que a população rural, que abrigava somente 5.874 habitantes. Conceição da Barra ocupa o 42º lugar no ranking do IDH dentre os municípios do estado, com 0,681 em relação ao estado do Espírito Santo e o 2.412º considerando-se os 5.565 municípios brasileiros (IBGE, 2010).

A localização do município de Conceição da Barra está representada pelas coordenadas planas UTM (391307,7983965 N) e (429773,7929886 E), compreendendo uma área de 118.804,0 ha (OLIVEIRA e RIBEIRO, 2005). Neste município estão localizadas cinco unidades de conservação (UC’s), correspondendo a aproximadamente 13,25% de seu território (15.741,45 ha). A hidrografia é composta pelo rio principal, o rio Itaúnas e, dentre os principais afluentes, os Rios Itauninhas, Palmeirinha, do Sul, e pelos Córregos Barreto, Limoeiro, Palmeiras, Vinhático, da Cruz, da Estiva, do Angelim, Dezoito e do Meio. A bacia hidrográfica do Rio Itaúnas apresenta uma área territorial de cerca de 4.480 Km². Ela integra os municípios de Montanha, Pinheiros, Conceição da Barra, Mucurici, Pedro Canário, Boa Esperança, Ponto Belo e São Mateus no estado do Espírito Santo, e Mucuri na Bahia (DTP, 2017).

A bacia do Rio Itaúnas está inserida numa região com baixa pluviosidade média anual que variam entre 950/1000mm e 1100/1150mm, e densidade de drenagem reduzida. As características típicas dessa região se comparam ao do semiárido, onde o escoamento é esparso e muitas vezes intermitente (ANA, 2016).

O baixo índice pluviométrico da bacia pode afetar a produção agrícola no município. Dentre as principais atividades econômicas que estão sob a área da bacia no município, podem-se destacar: lavoura permanente de coco e palmito, lavoura temporária de cana-de-açúcar e mandioca, silvicultura de eucalipto, agroindústria de destilaria de álcool, extrativismo mineral do petróleo e gás e serviços turismo (PROATER, 2011 - 2013).

Sobre o aspecto geomorfológico, o município está localizado em terrenos sedimentares de origem do período terciário e quaternário da era Cenozóica, cujos domínios agregam a faixa litorânea no sentido norte-sul, expandindo-se do litoral norte do Espírito Santo ao litoral sul da Bahia, conhecido como Formação Barreiras. Possui feição morfológica aplainada, distribuídas desde o sopé das elevações cristalinas interioranas aos terraços arenosos ou aluviões quaternárias litorâneas (INCRA/UFES/APAGEES, 2005, p. 8).

O potencial de uso dos recursos hídricos subterrâneo da formação Barreira apresentam uma produtividade bastante variável com vazões localmente elevadas (46m³/h) e capacidade específica de até 13m³.h/m. Esse potencial atualmente assume um papel significativo no abastecimento de comunidades e núcleos rurais e mesmo de áreas urbanas como é observado em Conceição da Barra (DTP, 2017).

Comunidades Rurais e localização dos pontos de amostragem

Segundo a PROATER (2011 – 2013), no município de Conceição da Barra existem 25 Comunidades rurais, uma diversidade social que resulta em diferentes percepções. Cada realidade expressa uma divergência de opinião sobre os problemas sociais e econômicos existentes e as questões prioritárias para o desenvolvimento rural em cada comunidade. Essa miscigenação resultou na formação das diferentes comunidades, como por exemplo: comunidades quilombolas, assentados de reforma agrária, pescadores e marisqueiras, além de agricultores familiares migrantes de outras regiões com origens diversas.

As comunidades quilombolas de Angelim, Linharinho e Córrego do Macuco, são objeto de estudo da pesquisa de campo desse trabalho. Dentro do processo histórico, sua tradição, identidade étnica, organização política e a noção de uma unidade integrada de pessoas ligadas pelos laços de parentesco, viu-se a relevância de incluir essas comunidades nessa pesquisa. O Assentamento jundiá, em que vivem 58 famílias, também é outra Comunidade que está inserida no estudo de campo dessa pesquisa (PROATER 2011 – 2013).

Para a localização dos pontos de coleta de amostras de água para as análises qualitativas utilizando parâmetros físico-químicos e microbiológicos, inicialmente foi feito uma visita às comunidades, relatório fotográfico e coleta das coordenadas geográficas de cada poço.

Na Figura 1 estão localizadas as comunidades remanescentes quilombolas e a comunidade do Assentamento Jundiá, todas as comunidades estão sob a área da bacia do rio Itaúnas. A escolha dessas Comunidades justifica-se pela localização rural, pelo fato de não serem atendidas pela CESAN.

Figura 1 – Mapa de Distribuição espacial das Comunidades rurais e localização dos pontos de amostragem. Fonte: Elaborado pelo Autor

Coleta das Amostras

Os poços analisados possuem profundidades médias entre 2 a 15 m, e em cada ponto de coleta realizaram-se 3 replicações das medidas a fim de permitir uma maior confiabilidade aos parâmetros analisados. Para avaliação da potabilidade do corpo hídrico subterrâneo, foram coletadas amostras em cinco poços de abastecimento domiciliar para análise física, química e microbiológica, no mês de junho de 2018.

As amostras foram coletadas em recipientes devidamente esterilizados, rotulados e refrigerados a 4°C até serem levadas ao laboratório do Instituto Federal do Espirito Santo – IFES, Campus Nova Venécia, seguindo a orientação da NBR 9898 e dos “métodos padrão para o exame de água e águas residuais” (ABNT,1987; APHA, 2005).

As análises de pH, Oxigênio Dissolvido (DO) e Condutividade Elétrica (EC) foram realizadas no local, utilizando-se um Medidor Multiparâmetros para Análise de Água - KR8405, de calibração automática, que possibilita a medição de vários parâmetros da água.

Na análise para avaliar o parâmetro cor aparente das amostras, utilizou-se um medidor de cor ALFAKIT, com precisão relativa 0,2 %. Na análise do parâmetro Turbidez, utilizou-se Turbidímetro microprocessador Plus – ALFAKIT, com resolução de 0,01 NTU e espectro emissão de 860 nm.

Já os parâmetros Amônia (NH3), Nitrato (NO3-), Nítrito (NO2-) e Fosfato (PO43-) foram analisados utilizando-se o Ecokit Técnico, que é composto por frascos, cartilhas para leitura no fotocolorímetro, reagentes e todos os materiais necessários para realização de análises físico-químicas.

As análises do parâmetro microbiológicas das amostras de águas subterrâneas foram realizadas com o auxílio do Kit microbiológico COLIPAPER – ALFAKIT, diploide de papel, pelo número mais provável de coliformes em 100 mL, com faixa de análise 80 à 25000 UFC.

A potabilidade da água, considerando-se todos os parâmetros analisados, foi avaliada comparando-se os resultados obtidos nas análises bacteriológica e físico-químicas, com os valores máximos permissíveis (VMP) recomendados pela Portaria nº 2914/11 - norma de potabilidade da água para consumo humano do Ministério da Saúde (BRASIL, 2011).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nesta pesquisa foram analisados parâmetros físico-químicos e microbiológicos para avaliar a qualidade da água em cinco pontos, nas quatro comunidades: Linharinho (Núcleo Oscarina), Linharinho (Núcleo do Morro), Córrego do Macuco, Angelim e Assentamento Jundiá, bem como as condições de proteção sanitária dos poços tubulares onde as amostragens foram realizadas.

Os poços na comunidade Linharinho, não atendem as condições de construção previstas nas normas vigentes (ABNT- NBR nº.12.212). As bocas estão no mesmo nível do solo, desrespeitando altura mínima de 0,5 metros acima da superfície e estão cobertos por telhas de amianto, não possuindo, portanto, uma laje de concreto com as especificações necessárias (Figuras 2 e 3).

Figura 2 – Poço Núcleo Oscarina-Comunidade Linharinho

Fonte: Elaborado pelo Autor

Figura 3 – Poço Núcleo do Morro-Comunidade Linharinho.

Os demais poços das outras comunidades também se encontram em desacordo com as normas estabelecidas para a construção dos poços em especial para os padrões de proteção sanitária.

Quanto as análises físico-químicas e bacteriológicas das águas dos poções das comunidades, os resultados são apresentados na Tabela 1, nela identifica-se os parâmetros selecionados para o objetivo desta pesquisa com os valores identificados por tipo de amostra considerando os VMP apresentados pela Portaria.

Tabela 1- Resultado das análises das águas dos poços

*VMP – Valor Máximo Permitido pela Portaria

Identificação das Comunidades: (Núcleo Oscarina -1; Núcleo Morro-2; Córrego do Macuco 3; Angelim-4; Assentamento Jundiá-5)

Os resultados obtidos da análise do parâmetro Coliformes Totais mostraram que somente as amostras de águas coletadas na comunidade de Angelim e Assentamento Jundiá estavam em desacordo com a legislação, conforme se verifica na figura 4. A presença de coliformes totais ressalta a importância desse grupo de bactérias como indicador de precárias condições higiênico-sanitárias e alto risco de contração de doenças de veiculação hídrica. Já os resultados das comunidades Linharinho Núcleo Oscarina, Núcleo do Morro e Córrego do Macuco apresentaram resultados de ausência de Coliformes Totais.

A Portaria nº 2914/11 (BRASIL, 2011) estabelece que em água para consumo humano, incluindo fontes individuais como poços, não é permitida a presença de Coliformes Totais em 100 mL da água. O artigo 27, §1º, desta Portaria, determina que no controle da qualidade da água, quando forem detectadas amostras com resultado positivo para coliformes totais, o consumo humano só deve ocorrer após novas amostras em dias imediatamente sucessivos até que revelem resultados satisfatórios.

Figura 4 – Resultado microbiológicos das amostras de água subterrânea das Comunidades.

Fonte: Elaborado pelo Autor

Portanto, pode-se dizer que, microbiologicamente, a maioria das amostras de água analisadas (60%) são potáveis. De acordo com Richter (2009), a desinfecção tem por finalidade a destruição de microrganismos patogênicos presentes na água. Por exemplo, o vírus da hepatite e da poliomielite não são completamente destruídos ou inativados por técnicas usuais de desinfecção. A desinfecção é necessária porque não é possível a remoção total dos microrganismos pelos processos físico-químicos usualmente utilizados no tratamento de água.

Quanto a análise de pH, o Ministério da Saúde prevê valores aceitáveis para consumo humano situados entre 6,0 e 9,0 (BRASIL, 2011). O termo pH (potencial hidrogeniônico) segundo Sawyer et, al. (1994) é usado para expressar a intensidade da condição ácida ou básica de uma solução e é uma maneira de expressar a concentração do íon hidrogênio (Figura 5).

Figura 5 - Resultado do pH das amostras de água subterrânea das Comunidades.

Fonte: elaborado pelo Autor. VMP - Valor Máximo Permitido

Diante dos resultados obtidos verificou-se que as águas das comunidades se encontravam levemente ácidas, com ênfase para as comunidades do Linharinho Núcleo Oscarina e do Morro e também o Angelim, onde apresenta pH inferior a 5,0. Provavelmente, os valores encontrados, estão associados com as características do solo e parâmetros físico-químicos da água subterrânea. Outro fator que pode ter influenciado os valores de pH, foi a presença de grande quantidade de matéria orgânica a ser decomposta.

Água com pH baixo compromete o gosto e a palatabilidade, além de comprometer alguns aspectos da saúde humana. O consumo de líquidos muito ácidos favorece uma situação metabólica no nosso corpo que estimula a perda óssea. Podendo surgir também doenças do trato intestinal como gastrites e úlceras.

O próximo parâmetro analisado e apresentado na figura 6 é de Oxigênio Dissolvido. Em águas subterrâneas, o Oxigênio Dissolvido ocorre pela ação do oxigênio, visto que não existe contato direto com o ar e que o O2 é consumido na decomposição de material biológico abundante.

Figura 6 - Resultado do Oxigênio Dissolvido das amostras de água subterrânea das Comunidades.

Fonte: Elaborado pelo autor

Os resultados obtidos de OD dos poços amostrados não variam muito, estão entre 2,6 mg/L a 3,5 mg/L. O Núcleo Oscarina da Comunidade Linharinho apresenta o menor valor 2,63 mg/L. A baixa concentração de oxigênio proporciona ambiente ideal para seres anaeróbios nocivos à saúde humana. A ausência de oxigênio dissolvido pode causar mau cheiro na água em função da presença de bactérias que decompõem a matéria orgânica em compostos de odor desagradável como aminas, amônias e sulfato de hidrogênio. 

A baixa presença de oxigênio pode caracterizar também um processo de eutrofização em curso, fator que gera um grande impacto ambiental, principalmente por ser em aquíferos de água doce, importante para o consumo e realização de atividades diárias.

Com relação a Turbidez das águas subterrâneas, os resultados descritos na figura 7 mostram que nas comunidades de Linharinho Núcleo Oscarina e Córrego do Macuco foram encontrados valores acima do estipulado pela legislação vigente, considerando que a Portaria nº 2914/2011- MS estipula o valor máximo de 5,0 UNT (unidade Jackson ou nefelométrica de turbidez) para a água de abastecimento humano (BRASIL, 2011).

Figura 7 - Resultado de Turbidez das amostras de água subterrânea das Comunidades

Fonte: Elaborado pelo autor. VMP - Valor Máximo Permitido

Esses valores acima do permitido podem estar relacionados à presença de substâncias em suspensão, como matéria orgânica e inorgânica das águas dos poços coletados. Turbidez excessiva reduz a penetração da luz na água. “[...] Além disso, afeta adversamente os usos doméstico, industrial e recreacional de uma água” (CETESB, 2011). Inclusive com aumento nos custos de um possível tratamento para consumo humano.

Para a Condutividade (Figura 8), as análises foram realizadas seguindo os métodos estabelecidos pelo Standard Methods for the Examination of Water and Wasterwater (APHA, 2005). É um parâmetro diretamente relacionado com a quantidade de íons dissolvidos na água. Os íons são levados para um corpo d’água através das águas pluviais ou do despejo de esgotos contaminados, por exemplo, com íons de cloro oriundos de substâncias como água sanitária (ZUMACH, 2003).

Figura 8 - Resultado de Condutividade das amostras de água subterrânea das Comunidades.

Fonte: Elaborado pelo autor

Os valores das amostras variaram entre as comunidades. No Linharinho Núcleo do Morro e Angelim os valores ultrapassam 100 uS/cm, o que indica uma maior presença de sólidos dissolvidos totais na água, quando comparadas as outras 3 comunidades. Esses valores mais elevados de condutividade significam maior taxa de decomposição de matéria orgânica, o que pode indicar problemas com poluição da água.

Os resultados analíticos para Cor Aparente das águas subterrâneas das Comunidades Linharinho Núcleo Oscarina e do Morro, Córrego do Macuco, Angelim e Assentamento Jundiá, estão apresentados na figura 9.

A cor aparente é um parâmetro físico exigido pela Portaria nº 2914/2011 - MS para águas destinadas ao consumo humano, devido à aparência e estética adequada que esta, obrigatoriamente, deve apresentar. O valor máximo permissível é de 15 uH (BRASIL, 2011).

Figura 9 - Resultado de Cor Aparente das amostras de água subterrânea das Comunidades.

Fonte: Elaborado pelo autor. VMP – Valor Máximo Permitido

Os resultados mostram valores diferentes entre as Comunidades. Para Linharinho Núcleo do Morro e Angelim, há uma ausência de dados.

Córrego do Macuco apresenta o maior valor para esse parâmetro 50,75 uH, muito acima do que determina a Portaria nº 2914/2011 – MS. Linharinho Núcleo Oscarina também apresenta valores acima do permitido. Essa relação tem causas através das substâncias em solução, como, por exemplo, a presença de ácidos húmicos/fúlvicos e compostos de ferro.

A cor, em sistemas públicos de abastecimento de água, é esteticamente indesejável. A sua medida é de fundamental importância, visto que, água de cor elevada provoca a sua rejeição por parte do consumidor e o leva a procurar outras fontes de suprimento muitas vezes inseguras.

A implicação dos dados de cor aparente amostrados é mais estética, sem grande significado sanitário, pois uma água isenta de cor pode ser menos potável do que uma água colorida.

Outra ação indesejada da cor aparente elevada é o amarelamento de roupas brancas e das peças de louças sanitárias, causadas pela presença de ferro residual nessas águas.

Os parâmetros analisados para Amônia N-NH3, Nítrito N-NO2 e Fosfato tem valores ausentes nas amostras. Na figura 10 verificam-se os valores das amostras para Nitrato N-NO3.

O nitrato é uma substância química derivada do nitrogênio que, em baixas concentrações, se encontra de forma natural na água e no solo. O valor máximo permitido que é de 10 mg/L, e regulamentado de acordo com a Portaria nº 2914/2011.

Figura 10 - Resultado de Nitrato N-NO3 das amostras de água subterrânea das Comunidades.

Fonte: Elaborado pelo autor. VMP: Valor Máximo Permitido

Os valores para Nitrato N-NO3 estão abaixo do determinado segundo a Portaria nº 2914/2011. Essa relação pode estar associada ao fato das comunidades praticarem a agricultura familiar, onde a utilização de fertilizantes é baixa.

Segundo Rossi et al. (2007), essas concentrações podem ser alteradas devido ao uso intensivo de fertilizantes na agricultura e disponibilização inadequada dos esgotos domésticos. Outrossim, a presença de nitrato na água de consumo das comunidades pode se justificar pela nitrificação oriunda do ciclo do nitrogênio.

O nitrato, em particular, pode alcançar os lençóis freáticos e cursos de água, causando enfermidades pelo consumo de água contaminada (cianose infantil ou metaemoglobinemia e câncer no estômago).

CONCLUSÃO

A pesquisa realizada neste trabalho demonstrou que as águas subterrâneas utilizadas pelas comunidades rurais amostradas, encontram-se fora dos padrões de potabilidade estabelecidos pelo Ministério da Saúde o que pode acarretar em agravos a saúde pública nas localidades da área de estudo.

A secretaria municipal de saúde, informou que o município não possui um sistema de controle de casos de veiculação hídrica por comunidade rural. Todavia, é notório que as políticas de saúde pública não têm alcançado satisfatoriamente os objetivos de melhoria dos indicadores sanitários nessas comunidades.

Se faz importante uma presença maior do Estado em serviços de saneamento e saúde voltada para as comunidades quilombolas que habita estas localidades de forma a melhorar a qualidade de vida das pessoas da região.

REFERÊNCIAS

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Ilustrações: Silvana Santos