Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início Cadastre-se! Procurar Área de autores Contato Apresentação(4) Normas de Publicação(1) Dicas e Curiosidades(7) Reflexão(3) Para Sensibilizar(1) Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6) Dúvidas(4) Entrevistas(4) Saber do Fazer(1) Culinária(1) Arte e Ambiente(1) Divulgação de Eventos(4) O que fazer para melhorar o meio ambiente(3) Sugestões bibliográficas(1) Educação(1) Você sabia que...(2) Reportagem(3) Educação e temas emergentes(1) Ações e projetos inspiradores(25) O Eco das Vozes(1) Do Linear ao Complexo(1) A Natureza Inspira(1) Notícias(21)   |  Números  
Artigos
11/06/2019 (Nº 68) IMPLANTAÇÃO DE UM POMAR COMO FERRAMENTA DE INSERÇÃO SOCIOAMBIENTAL E INTERDISCIPLINARIDADE EM UMA COMUNIDADE TERAPÊUTICA
Link permanente: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=3719 
  

IMPLANTAÇÃO DE UM POMAR COMO FERRAMENTA DE INSERÇÃO SOCIOAMBIENTAL E INTERDISCIPLINARIDADE EM UMA COMUNIDADE TERAPÊUTICA



Maycon Alan Bruscagin1; Cleiltan Novais da Silva2; Eduardo Chierrito-Arruda3; Plínio Andrade Vieira3; Rute Grossi Milani4; Edneia Aparecida de Souza Paccola5



1 Graduando em Agronomia no Centro Universitário de Maringá - UNICESUMAR, Maringá (PR).

2 Pós-Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Tecnologias Limpas do Centro Universitário de Maringá – UNICESUMAR, Maringá (PR).

3 Mestrandos no curso de Pós-Graduação em Tecnologias Limpas no Centro Universitário de Maringá – UNICESUMAR.

4 Docente dos Programas de Pós-Graduação em Tecnologias Limpas e Promoção da Saúde do Centro Universitário de Maringá - UNICESUMAR. Bolsista de produtividade do Instituto Cesumar de Ciência, Tecnologia e Inovação – ICETI, Maringá (PR). E-mail: rute.milani@unicesumar.edu.br

5 Docente do Programa de Pós-Graduação em Tecnologias Limpas do Centro Universitário de Maringá - UNICESUMAR. Bolsista de produtividade do Instituto Cesumar de Ciência, Tecnologia e Inovação – ICETI, Maringá (PR). E-mail: edneia.paccola@unicesumar.edu.br

RESUMO

As dinâmicas sócio interativas incentivaram as crianças e adolescentes de um centro terapêutico a incluir frutas na alimentação com a implantação de um pomar e propiciando a socialização entre o grupo. Além disso, observou-se um comportamento pró-ambiental relacionado com a produção sustentável de alimentos.

Palavras-Chave: Agricultura sustentável; Educação infantojuvenil; Segurança alimentar; Socialização.

IMPLANTATION OF AN ORCHARD AS A TOOL FOR SOCIAL AND ENVIRONMENTAL INSERTION AND INTERDISCIPLINARITY IN A THERAPEUTIC COMMUNITY

ABSTRACT

The socio therapeutic dynamics encouraged the children and adolescents to include fruits in the diet and allowed the socialization among the group. In addition, there was a pro environmental behavior related to sustainable food production.



Keywords: Sustainable agriculture; Education for children and youth; Food safety; Socialization.

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento sustentável visa o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico, o meio ambiente e as questões sociais, podendo também ser definindo como um processo contínuo de melhoria das condições de vida das pessoas, enquanto minimiza a utilização dos recursos naturais, reduzindo assim os desequilíbrios ao ecossistema (ALENCASTRO, 2012).

Ao longo do tempo, temáticas relacionadas com o desenvolvimento sustentável foram amplamente discutidas por diferentes esferas da sociedade. Mais recentemente, lideres mundiais se reuniram na sede da ONU (Organização das Nações Unidas) para adotar formalmente a Agenda 2030 de desenvolvimento sustentável (ONU, 2015).

A agenda é composta por um conjunto de 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 metas que abordam diversos temas fundamentais para o desenvolvimento humano, desdobrados em cinco vertentes: pessoas, planeta, prosperidade, parceria e paz (ONU, 2015).

Em linhas gerais, a agenda 2030 contempla ações nas áreas de erradicação da pobreza, segurança alimentar e agricultura sustentável, saúde, educação, igualdade de gênero, gestão sustentável da água, saneamento e energia, promoção do crescimento econômico e industrialização inclusivos, construção de infraestruturas sustentáveis, redução da desigualdade, padrões sustentáveis de produção e consumo, mudança do clima, proteção dos oceanos e ecossistemas, promoção de sociedades pacíficas e inclusivas, acesso à justiça e fortalecimento dos meios de implementação, além de ações que visam revitalizar a parceria global (ONU, 2015).

Dentro de alguns destas ações insere-se os problemas relacionados com o aumento do consumo de substâncias psicoativas. Pois, de acordo com o relatório Nações Unidas sobre Drogas e Crime no Brasil (UNODC, 2016) o problema do uso de drogas é global e interligado com os aspectos do desenvolvimento sustentável. O relatório enfatiza que a análise e consequente resposta, através dos ODS, revelam essa interação, transversalizando a natureza e a dinâmica do problema, no âmbito individual, comunitário e nacional.

De modo que, a dificuldade em aceitar ou entender que a dependência química é uma condição que fortalece o ciclo de marginalização e afeta pessoas com transtornos relacionados ao uso de drogas, dificulta o tratamento e integração social (UNODC, 2016). Ou seja, o uso de drogas pode contribuir para a marginalização em função do estigma sofrida por pessoas, tendo impacto negativo, levando exclusão em algumas situações sociais (RONZANI e ANDRADE, 2006; RONZANI e FURTADO, 2010). Nesse caso, a problemática se insere no ODS 10, que aborda entre outras temáticas, a redução da desigualdade.

Além disso, o uso de drogas geralmente afeta as pessoas durante seus anos mais produtivos, prejudicando o seu desenvolvimento e da comunidade o qual faz parte, tornando-se um obstáculo para alcançar ODS 1 (acabar com a pobreza em todas as suas formas), uma vez que os dependentes geralmente não estão inseridos no mercado de trabalho.

O uso de drogas desencadeia diferentes níveis de violência, relacionados com o seu efeito psicoativo ou como meio de obter recursos para sua compra (UNODC-2016), tornando-se uma barreira para alcançar o ODS 16, que refere-se a promoção de sociedades pacíficas e inclusivas, influenciando no combate do crime organizado.

O ODS 3 que propõe a promoção de vidas saudáveis e o bem-estar, interliga-se com o fortalecimento da prevenção e tratamento de abuso de substâncias psicoativas. Assim, programas voltados à prevenção, ao tratamento, à reabilitação e à reinserção social desempenham um papel fundamental e podem reduzir os impactos negativos tanto sociais como para a saúde, relacionados ao uso de drogas.

Neste contexto, destacam-se as Comunidades terapêuticas (CT). As comunidades terapêuticas surgiram como alternativa ao tratamento dos usuários de substâncias químicas, sendo locais onde o paciente é protagonista de sua própria cura e seus princípios se baseiam no resgate da cidadania, reabilitação física e psicológica e reinserção social (SERRAT, 2002)

Os objetivos das CT não se referem apenas aos resultados do tratamento, mas também conferem uma reabilitação social em outros espaços (POZAS, 1996), configurando-se como um ambiente, onde os internos se responsabilizam pelos cuidados e manutenção da instituição como um todo (MELLO et al., 1999) e em função de que a maioria das instituições localizam se fora do perímetro urbano, em alguns casos são incluídas atividades relacionadas ao trabalho rural.

Apesar dos esforços no desenvolvimento de atividade nas CTs, a taxa de abandono desse tipo de tratamento é alta. Em contrapartida, Arnau (2006) afirma que o tratamento nessas instituições oferece resultados animadores, desde que as pessoas atendidas possam se envolver nas atividades oferecidas pela instituição e usufruir dos serviços oferecidos.

Desse modo é importante que no decorrer do tratamento, o envolvimento do interno com atividades multidisciplinares. Assim, a implantação de um pomar dentro das instalações do CT constitui uma alternativa viável para complementar ações participativas. Além disso, o pomar tem como objetivo o fornecimento sistemático de frutas “in natura” e/ou processadas para o consumo, contribuindo para segurança alimentar e nutricional dos internos. Ademais, a produção excedente pode ser comercializada, tornando uma fonte de geração de renda. Assim o projeto objetivou-se promover a integração entre os internos do centro terapêutico, mediante a implantação de um pomar, sendo este utilizado como ferramenta para atividades multidisciplinares de socialização e percepção ambiental. Buscou-se a partir do princípio da agricultura sustentável, a realização de um projeto de extensão interdisciplinar entre universidade e um serviço de tratamento de dependentes de substâncias psicoativas, tornando esta reflexão, parte do tratamento de reintegração social do interno.

MATERIAL E MÉTODOS

O método utilizado para o desenvolvimento do projeto foi o da Pesquisa-Ação. Mediados inicialmente pelas dinâmicas de socialização, procurando estimular a objetivação do conhecimento sobre segurança alimentar, produção sustentável de alimentos e incentivar a participação das crianças e adolescentes na implantação de um pomar.

O projeto foi desenvolvido no centro terapêutico localizado no município de Maringá, estado do Paraná. A unidade de tratamento de crianças e adolescentes dependentes de drogas e álcool está situada em uma chácara que abrange uma área de 88.203m², com capacidade para acolhimento de 30 crianças e adolescentes com faixa etária entre 8 à 18 anos, todas do sexo masculino.

De acordo com os coordenadores o objetivo do centro terapêutico é oferecer a oportunidade dos internos em participarem de um processo sócio-terapêutico-educativo, em regime de abrigo, que os incentive a buscarem novas alternativas positivas de vida nos aspectos físico, psíquico, espiritual e cívico, preparando-os para um retorno à família biológica e/ou substituta e a sociedade.

Dinâmicas de socialização e sensibilização: Nesta etapa do projeto foram realizadas duas dinâmicas para a socialização do grupo de adolescentes com os discentes do curso de Agronomia e Psicologia, voluntários do projeto.

A primeira dinâmica consistiu em um jogo de futebol em que cada equipe que realizava um gol recebia uma peça de um quebra cabeça com partes de frutas para ser montado. Essa dinâmica foi realizada na quadra esportiva do centro terapêutico e nomeada como “Conhecendo de gol em gol”. Para sua realização foi utilizado bolas, apitos e quebra cabeça com desenhos de frutas.

O primeiro passo foi separar os participantes em equipes (Figura 1), onde cada membro recebeu um número de identificação. O instrutor da dinâmica chamava um número aleatório dentre os distribuídos e os membros da equipe sorteado se deslocava até o centro da quadra e quem conseguia fazer o gol primeiro recebeu uma peça do quebra cabeça. A imagem formada no quebra cabeça estava relacionada com a alimentação saudável, desta forma foi possível, após a montagem do quebra cabeça, abrir uma discussão sobre a importância do projeto de implantação do pomar e o comprometimento que eles deveriam ter após a sua implantação. No final da prática foi entregue um passarinho de dobradura e um bombom para cada criança e adolescente que participou da dinâmica.

FIGURA 1. Dinâmica de socialização e sensibilização do grupo de adolescentes (A) com os discentes do curso de Agronomia e Psicologia, voluntários do projeto (B).

A segunda dinâmica de integração foi realizada na quadra esportiva. Os materiais utilizados foram latas, venda para os olhos, três bolinhas, balde, cadeado, diferentes tipos de chaves, dois pesos, vara de pesca e cestinha. Essa dinâmica teve o propósito de demonstrar a importância das frutas para a saúde.

Foi montado um circuito com cinco atividades que exigiu dos participantes, desempenho das funções corporais, como audição, coordenação motora, raciocínio e força. O primeiro passo foi vendar um dos participantes de um lado da quadra e alocar a lata distante dele. A pessoa com o olho vendado teve que se dirigir até a lata seguindo o barulho feito pelas batidas na mesma;

O segundo passo foi abrir o cadeado da lata testando diferentes tipos de chaves, onde apenas uma poderia abrir o cadeado; O terceiro passo do circuito consistiu em levantar e carregar dois pesos até o outro lado da quadra; No quarto passo da dinâmica, os participantes tinham que acertar três bolinhas dentro de um balde; E o quinto e último passo consistiu na atividade de pescar uma cestinha (Figura 2).

Todos os participantes tiveram seus tempos cronometrados para realização das cinco etapas e o que conseguiu terminar o circuito em menos foi contemplado com um prêmio.

FIGURA 2. Dinâmica de integração com cinco atividades na quadra esportiva, com o objetivo de demonstrar a importância das frutas para a saúde.

Após o término da dinâmica foi realizado uma discussão sobre a importância das vitaminas, nutrientes e fibras contidas nas frutas, legumes e verduras para o desenvolvimento da força, concentração e coordenação motora e audição. Atrelado á alimentação saudável foi discutida a produção sustentável de alimentos e a importância da preservação dos recursos naturais.

Em seguida foi realizada uma prática no campo, onde foram abordadas questões sobre a importância da preservação do solo. Além da introdução de como seria a etapa prática de implantação do pomar.

Implantação do pomar: A primeira etapa da implementação foi a escolha do local, cuja localização estivesse próxima as instalações da comunidade (Figura 3). Sendo que a área delimitada para a implementação totalizou 600 m2.

FIGURA 3. Área selecionada para implantação do pomar próxima as instalações da comunidade.

Antes da etapa de escolha do local para a implantação, foi realizada uma palestra para informá-los dos benefícios do pomar na CT, sendo abordadas questões sociais, nutricionais e ambientais em todas as etapas pertinentes a instalação e manutenção do pomar. Como todas as atividades de implantação foram realizadas de forma manual, essa palestra também teve a função de reassumir o compromisso dos internos em atividades que ainda seriam realizadas na comunidade.

Antecedendo o plantio, foi realizado o preparo e a análise físico-química do solo mediante a coleta de três amostras com profundidades de 0-20 cm e de 20-40 cm utilizando enxada e cavadeira. Dessas três amostras foi obtida uma amostra composta de cada profundidade seguindo recomendações de Núcleo de Estudo em Fruticultura no Cerrado - NEFC (2015) e estas encaminhadas ao laboratório para análise granulométrica e de macronutrientes e micronutrientes da Universidade Estadual de Maringá - UEM. A partir dessas análises foi recomendada a adubação para implantação do pomar.

Escolha das mudas: O pomar formado pela instituição foi composto por mudas de diferentes espécies de fruteiras com o objetivo de promover a maior diversidade ecológica. Constituindo exemplares de manga Haden (Mangifera indica L. Anacardiaceae), tangerina ponkan (citrus reticulata blanco), limão taiti (Citrus aurantifolia), mamão papaya (Carica papaya), laranja pêra (Citrus sinensis), goiaba vermelha (Psidium guajava), caqui chocolate (Diospyros kaki), acerola (Malpighia emarginata) e ameixa (Prunus salicina).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O presente trabalho torna-se relevante pela lacuna existente na literatura sobre estudos sistematizados envolvendo dependentes de substâncias psicoativas e os três pilares do desenvolvimento sustentável. Frente aos objetivos estabelecidos neste projeto, que consistiu na elaboração de uma proposta de intervenção para crianças e adolescentes do sexo masculino em uma comunidade terapêutica, as dinâmicas contemplaram ações de reinserções sociais, segurança alimentar e produção sustentável de alimentos.

Todas as ações realizadas comtemplam o que propõem os objetivos para desenvolvimento sustentável (ODS). De modo que a prevenção do uso de drogas é uma ação que contribui para a sustentabilidade do país, pois atua na construção do autodesenvolvimento e da autoconfiança, construindo novas práticas e valores individuais, grupais e coletivo (MASSAL e BACELLAR, 2010).

Interação entre o grupo e as atividades aplicadas

Durante o período de implantação do pomar, as dinâmicas promoveram a socialização e integração do grupo, familiarizando os participantes com o tema. Além de promover a interação, despertou o interesse pelas atividades práticas no decorrer de todo processo de implantação do pomar e sua conscientização ambiental.

No entanto, no momento que foram iniciadas as dinâmicas, os internos não ficaram à vontade com a presença dos voluntários do projeto. Mas iniciada a primeira dinâmica, eles começaram a interagir com a equipe de trabalho, mostrando-se curiosos e participaram com entusiasmos das brincadeiras, despertando interesse pelas próximas atividades.

No decorrer das dinâmicas, ficou evidente que o objetivo das mesmas foi atingido. Os internos se divertiram com as brincadeiras, o que propiciou a interação entre eles e deles com a equipe de trabalho. Todos os internos se propuseram a participar e demonstraram interesse nas informações trocadas no decorrer das brincadeiras. Desta forma, as atividades além de proporcionarem uma descontração para os participantes, abordou alguns aspectos relacionados com a importância de uma boa alimentação e sobre a produção agrícola sustentável.

Implantação do Pomar

Inicialmente, baseado nos resultados da análise de solo, verificou-se a deficiências de alguns nutrientes no solo. Recomendando-se a adubação orgânica, uma vez que esta alternativa se mostra eficiente e com menores custos. Esses materiais proporcionam efeitos sobre o solo, podendo acarretar na melhoria da estrutura, aeração, armazenamento de água e drenagem interna (TRANI et al., 2013).

Na ocasião, foi explanado para os participantes, sobre as vantagens e o potencial da reutilização de materiais derivados da atividade agrícola e agroindustrial, podendo evitar o acúmulo de resíduos no ambiente e auxiliar na redução da dependência de fertilizantes químicos viabilizando a produção agrícola sustentável (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, 2012).

No entanto, os materiais orgânicos possuem composição variável conforme sua origem, teor de umidade e processamento (GONÇALVES et al., 2018), devendo ter cautela na sua aplicação. Dessa forma, recomendou-se, com base no resultado da análise de solo, a aplicação de 10 Kg de esterco de aves por planta. Além da utilização de 10 kg da torta de filtro (resíduo da indústria sucroalcooleira) por planta.

Ressalta-se, que comumente em sistema agrícola convencional, o ambiente natural é transformado, pois se cultiva uma única espécie vegetal em áreas extensas, acrescentando-se de corretivos e fertilizantes químicos inorgânicos (ROEL, 2002).

Neste projeto preconizou-se a adubação orgânica, minimizando o impacto da adubação química no solo, além do plantio de diferentes espécies de frutíferas priorizando a diversidade.

A agricultura possui relação direta com aspectos sociais, econômicos e ambientais. Nesse sentido, Reis et al. (2016), ressaltam o papel decisivo da agricultura para o alcance de alguns dos ODS como acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição, promover a agricultura sustentável (ODS 2) e a tomar medidas para combater a mudança climática (ODS 13).

Tendo conhecimento sobre o impacto do setor agrícola, faz-se necessárias ações voltadas a sensibilização da comunidade no sentido de mitigar os impactos negativos para o ambiente. Assim, a educação ambiental torna-se uma ferramenta essencial para potencializar os efeitos positivos de produção sustentável de alimentos.

Com relação ao dia da implantação do pomar (Figura 4), não foram todos os internos que se mostraram interessados para a realização das atividades. Foi observado que faltou incentivo dos coordenadores do CT em estimular as atividades quem vinham ocorrendo durante e após a implantação do pomar.

No momento do plantio, os internos acompanharam as atividades e todas as etapas do plantio foram explicadas durante a prática. Ao passo que, na medida em que surgiam dúvidas e/ou questionamentos as mesmas imediatamente foram respondidas. Os internos ajudaram a realizar todas as etapas desde a abertura da cova até a finalização do plantio.

Após o plantio, foi recomendado que eles regassem as mudas diariamente, ou no início da manhã ou no final da tarde. A equipe de trabalho também solicitou a ajuda dos coordenadores para organizar um calendário de irrigação das mudas fazendo um rodízio entre os internos, estabelecendo um cronograma para que todos eles regassem as plantas.

FIGURA 4. Atividade de implantação do pomar. (A) Primeira etapa da implantação do pomar, onde os internos aprenderam a realizar a abertura da cova; (B) o transplante da muda de limão taiti (Citrus aurantifolia); (C) até a finalização do plantio com a rega de água.

No geral, a participação dos internos na realização das atividades relacionadas a implantação do pomar foi positiva. Alguns internos mostraram-se mais interessados que outros, mas foi possível promover a interação deles com as atividades que estavam sendo desenvolvidas.

O aumento do uso de substâncias psicoativas tem desafiado as políticas públicas, fazendo com que novas ações sejam implantadas. Neste sentido, as CTs desenvolvem atividades de reinserção social, interação e práticas auxiliem no retorno ao mercado de trabalho.

Em pesquisa realizada por Zanatta et al., (2012) em Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas, os pacientes relataram a importância das atividades desenvolvidas, entre elas o artesanato foi considerado a principal atividade trazendo benefícios, tais como aprender algo novo, distrair-se, ter momentos de lazer e ocupar-se com algo.

De modo geral, o projeto de intervenção socioambiental alcançou os objetivos propostos, promovendo mudanças no hábito alimentar, socialização e comportamento pró-ambiental dos participantes.

Além disso, o projeto respaldou-se na interdisciplinaridade, pois envolveu profissionais das áreas de serviço social, agrárias, psicologia, administração, enfermagem e os coordenadores de tratamento, promovendo a sensibilização não somente aos internos, mas a todos os envolvidos no processo. Alvarez et al., (2012) destacou que a abordagem aos dependentes químicos precisa ser multidisciplinar e integrada. Em virtude da gênese multifatorial da dependência química, o usuário precisa ser assistido nas diversas áreas, focando especialmente as estratégias de prevenção de recaída (OLIVEIRA et al., 2015).

Este estudo refletiu sobre a importância de uma equipe que atue transversalmente para o melhor desenvolvimento das atividades elaboradas no projeto, pois a principal limitação encontrada na intervenção referiu-se ao não engajamento dos colaboradores do centro.

A vulnerabilidade de crianças e adolescentes, em relação ao consumo de substâncias psicoativas é alta, pois ideia de socialização e os ciclos de amizade influenciam a experimentação de substâncias químicas, verificando-se um aumento do consumo por essa classe.

Essa situação afeta tanto o crescimento econômico quanto a redução das desigualdades sociais, comprometendo os ODS nº10 (“reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles”), nº1 (“acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares”), nº10 (“reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles”) e nº3 (“assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades”). Outro aspeto das correlações entre consumo de sustâncias químicas pauta-se no nº 16 (promoção de sociedades pacíficas e inclusivas e combate ao crime organizado).

Considera-se que os objetivos do projeto foram atingidos. Os resultados das dinâmicas foram importantes para subsidiar a construção da singularidade dos adolescentes. Faz-se necessário que os estigmas conferidos aos usuários de substancias químicas sejam combatidos, para que as pessoas com este tipo de problema possam ser vistas de forma igualitária e que diante do processo de reabilitação possam retomar a vida em sociedade.

Estudos nessa área são importantes e devem ser constantemente incentivados, para ampliação do conhecimento acerca deste assunto e a partir daí sejam possíveis à elaboração, novas propostas de intervenção que promova o desenvolvimento humano e conseguintemente o alcance dos objetivos do desenvolvimento sustentável.

CONCLUSÃO

A realização das dinâmicas sócio interativas no centro terapêutico estimularam a percepção das crianças e adolescentes sobre a importância da inclusão de frutas na sua alimentação. Além disso, estabeleceu a socialização entre os internos e deles com a equipe de trabalho.

A implantação do pomar, precedidos de debates sobre o meio ambiente promoveu a sensibilização para questões relacionadas com a produção sustentável de alimentos.

REFERÊNCIAS


ALENCASTRO, M. S. C. Empresas, Ambiente e Sociedade: introdução a gestão socioambiental corporativa. Curitiba: Intersaberes, 2012. – (Série Desenvolvimento Sustentável). 125p.

ALVAREZ SQ, GOMES GC, OLIVEIRA AMN, XAVIER DM. Grupo de apoio/suporte como estratégia de cuidado: importância para familiares de usuários de drogas. Rev Gaúcha Enferm. v. 33, n. 2, 2012.

ARNAU, D. C. Comunidades terapêuticas: la transformatión invisible. Adicciones, v. 18, p. 323-326, 2006.

BORDIN, S; FIGLIE, N. B.; LARANJEIRA, R. ACONSELHAMENTO EM DEPENDÊNCIA QUÍMICA. 1ª edição. São Paulo: Roca, 2004.

COSTA, S. F. As políticas públicas e as comunidades terapêuticas nos atendimentos à dependência química. Serviço Social em Revista, v.11, n.2, p.1- 14, 2015.

Centro De Produções Técnicas – CPT. 2015. Pomar de frutas diversificadas: uma estratégia de sucesso. Disponível em: <encurtador.com.br/wyDKL>

Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais-EMATER. 2012. Pomar doméstico - orientações técnicas e recomendações gerais. Disponível em: http://www.emater.mg.gov.br/

Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) e Organização das Nações Unidas (ONU-Brasil). Disponível em: https://nacoesunidas.org/

GONÇALVES, J. C.; GASPAROTTO, F.; SILVA, C.N.; ANDREAZZI, M. A. PACCOLA, E. A. S.; FILHO, E. S. Análise socioambiental da geração de resíduos da atividade avícola e sucroenergética. Educação Ambiental em Ação, n 62, Ano XVI, 2018. Disponível em: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=3016

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA. Diagnóstico dos Resíduos Sólidos Urbanos, 2012. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/relatoriopesquisa/121009_relatorio_residuos_solidos_urbanos.pdf>.

MASSAL, A. A.; BACELLAR, R. P. A interface da prevenção ao uso de drogas e o poder judiciário em uma perspectiva de sustentabilidade. Cad. ESM-PA, Belém, v. 3, p. 1-92, 2010.

MELLO, C. O.; PECHANSKY, F.; INCIARDI, J. A.; SURRAT, H. A comunidade terapêutica como modalidade de tratamento para dependentes químicos: relato de uma observação participante. Revista HCPA, v. 19, p. 91-107, 1999.

Núcleo de estudo em fruticultura no cerrado - NEFC. 2015. Pomar doméstico. Disponível em: < http://www.fruticultura.iciag.ufu.br/domestico.htm>

OLIVEIRA, N. E., et al. Projeto terapêutico de usuários de crack e álcool atendidos no centro de atenção psicossocial. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, 2015.

Organização das Nações Unidas (ONU-Brasil). Transformando Nosso Mundo: A Agenda 2030 para o Desenvolvimento sustentável. 2015. Disponível em: https://nacoesunidas.org/pos2015/agenda2030/

POZAS, J.E.M. Comunidades terapêuticas en España: evolución histórica, situación actual y perspectivas. 1996.

REIS, J. C. dos; RODRIGUES, R. de A. R.; CONCEIÇÃO, M. C. G. da; MARTINS, C. M. S. Integração Lavoura-Pecuária-Floresta no Brasil: uma estratégia de agricultura sustentável baseada nos conceitos da Green Economy Initiative. Sustentabilidade em Debate, v. 7, n. 1, p. 58-73, 2016.

ROEL, A. R. A agricultura orgânica ou ecológica e a sustentabilidade da agricultura. Interações, v. 3, N. 4, p. 57-62, 2002.

RONZANI, T.M.; ANDRADE, T. A estigmatização associada ao uso de substâncias como obstáculo à detecção, prevenção e tratamento. In: SENAD. Sistema para Detecção de Uso Abusivo e Dependência de Substâncias Psicoativas, Brasília, DF: SENAD; 2006, p. 25-32.

RONZANI, T. M.; FURTADO, E.F. Estigma social sobre o uso de álcool. J. bras. psiquiatr.,  Rio de Janeiro ,  v. 59, n. 4, p. 326-332,    2010.  

SERRAT, S.M. Comunidades terapêuticas: mecanismo eficiente no tratamento de dependentes químicos. 2002.

TRANI, P E.; TERRA, M. M.; TECCHIO, M. A. TEIXEIRA, L. A. J.; HANASIRO J. Adubação orgânica de hortaliças e frutíferas. Instituto Agronômico de Campinas, IAC, 2013.

ZANATTAA A.; GARGHETTI B. F. C.; LUCCA S. R. Centro de Atenção Psicossocial Álcool E Drogas Sob a Percepção do Usuário. Revista Baiana de Saúde Pública, v.36, n.1, p. 225-237, 2012.





Ilustrações: Silvana Santos