Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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12/03/2015 (Nº 51) EDUCAÇÃO AMBIENTAL PLANETÁRIA: POR UMA ABORDAGEM EXTRATERRESTRE
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EDUCAÇÃO AMBIENTAL PLANETÁRIA: POR UMA ABORDAGEM EXTRATERRESTRE

 

Keylor Bronzato1, Lucyani Nascimento2, Kelly Alves de Souza3, Gizele Alves Carvalho4

 

1,3 UNIFOA, Volta Redonda-RJ

2 ABF - Associação Balbina Fonseca, Valença-RJ

4 CBM – Centro Universitário Barão de Mauá, Ribeirão Preto-SP

 

 

Resumo

 

Num primeiro momento, o termo “extraterrestre” pode incitar a relativização com formas de vida desenvolvidas em outros planetas. Sem intenção de acalorar tal discussão, o escopo deste artigo permeia o combate às dificuldades de compreensão da necessidade de manutenção planetária através da estratégia educação ambiental, partindo de uma revisão de conhecimentos de Astronomia – uma fuga do perímetro planetário terrestre – para comparar eventos externos em seus contrastes, semelhanças e influências que exercem sobre temas geradores relativos à problemática ambiental global. Através de uma proposta de abordagem das grandezas conflitadas com uso de filmes em sala de aula, o estudo sugere que a educação para a sustentabilidade também pode ser alcançada a partir dos saberes do cosmo, numa conexão interdisciplinar.

 

Palavras-chave: educação ambiental, interdisciplinaridade, Astronomia, ferramentas didáticas.

 

 

1. Introdução

 

            Langhi e Nardi (2005), e Barroso e Borgo (2010) demonstraram que existem dificuldades relacionadas às fontes de informações de fenômenos astronômicos para docentes, que estes podem ser vistos como eventos distantes do mundo dos alunos, e que grande parte da população não presencia sua explicação. Justifica-se, assim, uma proposta de prática de sala de aula que almeje modificar estes preceitos resultantes da pesquisa dos autores citados, considerando que a educação ambiental é passível de incrementos inter e transdisciplinares, e buscando um meio de comparar os temas geradores globais com a dinâmica do Sol, magnetismo e gravidade de corpos celestes, e características de outros planetas do Sistema Solar; evidenciando, com isto, segundo Vechi et al. (2013), a estreita relação entre Astronomia e as Ciências Físicas.

            A preocupação com o estudo do universo nos remete a Aristóteles, Ptolomeu, Brahe, Kepler, Galilei, Copérnico e Newton. Estrelas, planetas, satélites e outros astros; seus movimentos, interações e influências de um sobre o outro configuram “um dos fundamentos da história das idéias e do desenvolvimento científico” (VECHI et al., 2013). Barroso e Borgo (2010), concordando com as palavras de Anderson de Vechi, assim descreveram a fundamentação científica proporcionada pela Astronomia:

 

Parece haver um consenso, nas formulações dos currículos de praticamente todos os países, que o ensino dos fenômenos astronômicos básicos, com a construção do modelo dos movimentos da Terra, Sol e Lua, e a explicação para o dia e a noite, as fases da Lua, os eclipses, entre muitos outros, é crucial para o desenvolvimento da juventude, principalmente no desenvolvimento das habilidades que contribuem para termos uma população "cientificamente letrada".

 

            Ora, os mesmos Barroso e Borgo (2010) encerram melhor a proposta da interdisciplinaridade. Subentende-se que há uma cadeia de relacionamentos entre aspectos da ciência dos astros e aspectos das ciências naturais específicos e internos ao planeta Terra. Ficou claro, com a citação anterior, que o ensino dos fenômenos astronômicos é crucial para o desenvolvimento de habilidades tidas como contribuintes para uma população capaz de:

 

usar o conhecimento científico, de identificar questões e chegar à conclusões baseadas em evidências, de modo a compreender e a ajudar na tomada de decisões a respeito do mundo natural e as mudanças causadas a ele pela atividade humana (OECD, 1999 apud BARROSO e BORGO, 2010).

 

            Considerando a disposição reforçadora de Rios e Rios (2014), por qual a intervenção responsável e a relação de respeito com o meio ambiente tornam-se um simples slogan quando da incompreensão do mundo natural, então, o estudo de tópicos nomeados pelo presente trabalho como extraterrestres auxilia o desenvolvimento científico dos povos, influenciando assim a compreensão dos dilemas ambientais planetários e as alterações na dinâmica do meio ambiente provocadas pela ação do homem. Fica deveras exposto que a educação ambiental, ao utilizar tópicos de Astronomia, instiga o processo decisório consciente acerca de temas geradores levantados sobre o planeta Terra.

 

 

2. Tópicos de Astronomia como integrantes da abordagem ambiental terrestre

 

            Estes temas geradores são, antes de tudo, geradores de processos educativos ambientais, sendo tomados como aqueles relacionados a problemáticas globais do meio ambiente planetário, a saber, os citados por Tozoni-Reis (2006) como comumente tratados nas propostas de educação ambiental: recursos hídricos, resíduos sólidos, desmatamento, queimadas, mata ciliar, e extinção de espécies. Estes itens remetem a conceitos maiores, escalonares, de dimensão mais abrangente quando em âmbito global, como o efeito estufa, a deterioração da camada de ozônio, e o derretimento das geleiras.

            Três linhas de demonstração podem ser seguidas para promover o relacionamento entre grandezas internas e externas ao planeta Água. Todas se baseiam na escala de três abordagens distintas. Temas locais, globais e universais podem ser arranjados partindo do mais específico ao mais abrangente (1), do mais abrangente ao mais específico – abordagem inversa – (2), ou adotando o ponto central como eixo de abordagem em direções opostas, do centro para as extremidades (3). Desse modo, temos as seguintes linhas: local-global-universal, universal-global-local, e global-local/global-universal. Já que estamos afoitos de interesse “por uma abordagem extraterrestre”, utilizaremos a forma inversa – a segunda forma, posicionando os tópicos de Astronomia à frente dos outros – do que foi proposto por Rios e Rios (2014), que defenderam o papel da escola em promover a compreensão sobre os temas relacionados ao mundo natural utilizando, para tanto:

 

uma abordagem didática que parta de elementos concretos, relacionando o ambiente próximo à vida do estudante, e seja ampliada para abstrações sistêmicas, como as mudanças climáticas e o desaparecimento de biomas inteiros, partindo do simples para o complexo.

 

            I – Gravidade, luz, energia e ventos solares. Será considerado o estudo do Sol como semelhante ao estudo das estrelas. Sobre o brilho, poucas variam definitivamente. A potência energética irradiada pela fusão do hidrogênio no Sol é difícil de ser quantificada, tamanha a sua proporção, por ser espalhada por toda direção no entorno do globo solar, e devido ao fato da atmosfera terrestre defletir e absorver parte desta luz. A energia que alcança o planeta define as estações do ano a partir do movimento de rotação. A gravidade do Sol é a força que incide sobre todo o movimento do Sistema Solar, mantendo os planetas na sua órbita (VECHI et al., 2013; HORVATH, 2013) . Íons de hidrogênio e elétrons formam a atmosfera externa do Sol que, devido ás altas temperaturas, se expande continuamente, criando um fluxo de gás supersônico chamado de vento solar. Este vento, durante sua viagem, encontra obstáculos diversos, momento em que o magnetismo do vento solar interage com o magnetismo ou a atmosfera destes obstáculos. Quando o corpo obstacularizador não possui campo magnético ou atmosfera, o vento solar defronta-se diretamente com sua superfície. Em ambos os casos o vento solar é defletido. A aurora polar é um fenômeno derivado da entrada do vento solar na área de contato entre este e o campo magnético terrestre, na penúltima parte mais superior da atmosfera (ionosfera) quando da inclinação do globo no período da noite (ECHER, 2010). Globais: O que não é defletido do vento solar pela atmosfera alcança a superfície terrestre. A superfície não utiliza toda energia entrante e, assim, uma pequena quantidade de dióxido de carbono é responsável por não permitir que o calor refletido pela superfície retorne ao espaço em sua totalidade, mantendo-o na atmosfera. Esta é a definição de efeito estufa. Numa proporção controlável, este efeito é fundamental para que a Terra não encare outra Era do Gelo. Mas, o que se observa é o aumento da temperatura terrestre acima do esperado, devido às altas emissões de dióxido de carbono provenientes da ação antrópica. O ozônio contido na estratosfera é formado pela captação da radiação solar pelo oxigênio lá contido – um processo que aumenta a temperatura daquela camada. Pelo fato da estratosfera conter alta concentração de ozônio, normalmente, encontra-se o uso do termo “camada de ozônio”, de espessura variada e grande absorvente da energia carregada pelos ventos solares (KLEBER et al., 2011). Emissões de Clorofluorcarbonetos potencializam a diminuição da espessura do ozônio (MOÇAMBIQUE, 2008). Em escala global, o aquecimento do planeta pode provocar o aumento do nível dos oceanos, devido ao derretimento das geleiras. Locais: A dinâmica de adaptação à exposição à luz solar que os organismos possuem (BEZERRA, 2008), a geração de glicose pela fotossíntese vegetal e a síntese de vitamina D pela pele humana geram o entendimento de que os organismos vivos reconhecem a força do Sol. Porém, segundo o governo de Moçambique (2008), “para cada 1% de diminuição do ozono, haverá um aumento de 2% de radiação UV-B [...] que pode acarretar um aumento de 1 a 3% de novos casos de cancro de pele por ano” (p. 15), considerando ainda que o descontrole do efeito estufa pode, em nível local, diminuir a espessura das camadas de gelo nos pólos e nos topos de montanhas, e promover a extinção de espécies endêmicas, dependentes da estabilidade da temperatura de determinados ecossistemas.

            II – Gravidade e rotação da Terra. A atmosfera da Terra é a responsável por conter o excesso de energia proveniente da expansão contínua da coroa solar. Durante o dia, o campo magnético terrestre é comprimido pela colisão desta energia contra a atmosfera. Na noite, o campo é esticado. O campo magnético é gerado a partir de correntes elétricas que percorrem o núcleo aquecido, e se estende além da superfície planetária (ECHER, 2010). É o planeta mais denso do Sistema Solar, e o material mais denso encontra-se em seu núcleo, que foram para lá empurrados, nos primórdios, pela ação da gravidade, que trouxe à crosta materiais mais leves. Esta mesma gravidade proporcionou a retenção dos gases que formam a atmosfera. O movimento da Lua em torno da Terra é uma dinâmica resultante desta gravidade. A Terra move-se em torno de si mesma com base no seu eixo central que vai de pólo a pólo, e possui inclinação de aproximadamente 23 graus e 30 minutos em relação ao plano perpendicular da Terra em relação ao Sol. Esta inclinação, junto ao movimento de translação e a incidência de raios solares na região intertropical, promove as estações do ano (MOÇAMBIQUE, 2008). A Rotação permite que dias e noites ocorram. Globais: Considerando que a rotação dura 23 horas, 56 minutos e aproximadamente 4 segundos, qualquer alteração no magnetismo da Terra poderia prolongar ou diminuir o ciclo noite-dia. Se o dia se prolongar, espécies de hábitos noturnos poderiam ter que alterar suas práticas, a exemplo das mariposas que trocaram a noite pelo dia para fugir dos morcegos (FERNANDES, 2014). Há que se considerar ainda que as marés variam conforme tempo e localização geográfica, sendo resultantes da interação entre as gravidades do Sol, Lua e Terra, que deformam a superfície terrestre com freqüência, sendo que, consoante às palavras de Paolo e Molina (2008), “a distribuição de massa da Terra controla o nível em que a água do mar vai se encontrar em um dado instante”, onde há um ajuste da superfície do mar de forma instantânea, de acordo com a gravidade. Variações do campo gravitacional da Terra refletem na distribuição de massa. Lugares que possuem altitudes extremamente distintas não precisam, necessariamente, ter o seu peso em valores distantes. Locais: Entendendo que a gravidade influencia na atmosfera, atraindo os gases para o núcleo terrestre, e considerando ainda que a variação gravitacional incide na distribuição de massa na crosta terrestre, percebe-se que pressão atmosférica e gravidade estão relacionadas a ponto de, havendo variação brusca no equilíbrio gravitacional, espécies que reagem a mudanças de pressão do ar, como as estudadas por Alisson (2014), poderiam ter seus modos de vida igualmente alterados. De semelhante forma, a irregularidade das marés pode influenciar os ecossistemas costeiros, passíveis de extinção ou deslocamento para o interior (GUIMARÃES, 2014).

            III – Física da Terra em contrastes e semelhanças com Mercúrio, Vênus, Marte e Júpiter. Mesmo não possuindo atmosfera (BARROSO e BORGO, 2010), (1) Mercúrio possui campo magnético que permite interações com o vento solar numa camada muito menor do que a terrestre – em concordância, Echer (2010) afirma que Mercúrio não possui uma atmosfera significativamente dinâmica. Não é uma grandeza constante, tendo seus átomos frequentemente perdidos para o espaço enquanto outros são incorporados (KLEBER et al., 2011). Parte significante de Mercúrio é ocupada pelo seu núcleo (de ferro, com 3.800km de diâmetro) e uma crosta de aproximadamente 600km. (2) Vênus apresenta atmosfera rica em dióxido de carbono (efeito estufa), e dióxido de enxofre (chuvas ácidas). Possui planícies, poucas montanhas, e vulcões gerando lava suficiente para cobrir maior parte da sua superfície (o que permite o entendimento de que, em semelhança à Terra, Vênus possui um manto de rocha derretida). Proximidade orbital, tamanho, densidade e composição química também fornecem à Vênus uma identidade terrestre. As diferenças entre ambos estão na temperatura, proximidade do Sol, velocidade e sentido da rotação, presença de núcleo sólido, pressão atmosférica e magnetismo crustal.  A atmosfera de (3) Marte é fina, porém densa o suficiente para provocar tempestades de areia. Composta de cerca de 95% de dióxido de carbono, tendo pressão ínfima, a ponto de não chegar a 1% da pressão da Terra. Sua superfície apresenta as maiores altitudes do sistema Solar (o Monte Olympus chega a 24km de altitude), e depressões do tipo canyons. Seu magnetismo concentra-se em pequenas porções da crosta, sem o evento em núcleo. (4) Júpiter é uma planeta gasoso, com massa equivalente a 318 vezes a massa da Terra, sendo composto por 90% de hidrogênio (normalmente encontrado na forma metálica líquida, possível devido à presença de pressões acima de 4 milhões de atmosferas) e o restante de hélio. Núcleo provavelmente rochoso com tamanho de 10 a 15 massas terrestres. Possui a maior zona de interação entre campo magnético e ventos solares em comparação com os outros planetas do Sistema Solar, com extensão de cauda chegando até a órbita de Saturno, o que permite a ocorrência de auroras polares. (BARROSO e BORGO, 2010; ECHER, 2010). Globais: Dependendo da posição de Mercúrio e Vênus, conforme suas translações, poderiam estes planetas formar obstáculos para a energia do Sol endereçada à Terra, causando assim uma menor densidade dos ventos solares que se encontram com a atmosfera terrestre; porém, este aspecto não foi observado nesta pesquisa. Assim, concordando com a Agência Espacial Russa, considerando que aspectos físicos de outros planetas não influem significativamente nos aspectos físicos da Terra[1], uma abordagem global pode se concentrar em comparar a temperatura superficial terrestre em relação à Marte, Júpiter, Mercúrio e Vênus, abordando, principalmente, a questão da desertificação que as alterações térmicas podem acarretar, observando os desertos ocorrentes em planetas quentes ou frios ao extremo. Para condensar esta perspectiva, uma tabela de apresentação das temperaturas nestes planetas (Tabela 1) se justifica. Abordando a questão “temperatura”, assuntos correlatos, como o efeito estufa na Terra e em outros planetas, espécies sensíveis à variação térmica (como os ovos de insetos), e desertificação, poderiam ser tomados como instigadores de reflexões. Locais: O desmatamento é um dos problemas ambientais propiciadores da desertificação. Sua influência na problemática ambiental é considerável, visto que a morte de florestas incide em catástrofes como extinção de espécies (queda dos níveis de biodiversidade), degradação do solo, baixa na qualidade do ar, e influência direta no regime de chuvas. A destruição de biomas como a Amazônia, conforme salienta Morais (2014), “vem sendo apontado como a maior ‘contribuição’ do Brasil para o processo de aquecimento global” (p. 48). A Amazônia é um complexo de ecossistemas extremamente importante, por abrigar cinco mil espécies diferentes de árvores, trezentas de mamíferos, mais de mil pássaros variados, abriga um terço de toda madeira tropical do mundo, e trinta mil espécies de plantas das cem mil existentes na América do Sul; é a maior bacia hidrográfica do planeta, lançando aproximadamente 175 milhões de litros de água por segundo no mar (MORAIS, 2014).

 

Tabela 1 - Comparação entre temperaturas médias superficiais aproximadas[2] (NASA; ASU; BARROSO e BORGO, 2010; ECHER, 2010; OAL, 1998).

 

Planeta

Alta

Baixa

Mercúrio

420ºC

-180ºC

Vênus

460ºC

377ºC

Terra

57ºC

-93ºC

Marte

20ºC

-120ºC

Júpiter

-143ºC

-143ºC

 

 

3. A garantia de sobrevivência da espécie humana: uso de filmes como ferramenta didática no processo ensino-aprendizagem

 

            A revolução industrial aumentou o potencial poluente e extrativista da sociedade capitalista. As cidades daquela época se tornam superpopuladas para atender a demanda do trabalho fabril. Eram os grandes centros urbanos antro de doenças provindas da falta de saneamento. O campo começa a desenvolver a agricultura em larga escala, exaurindo o potencial químico dos solos, que não conseguem promover uma renovação equilibrada dos seus recursos. Surge, neste ponto, a preocupação com a perpetuação da espécie humana, pois as proposições futuras que as sociedades capitalistas pós-século XIX projetam, fundamentadas na teoria de produção e consumo inconscientes, levam o planeta Terra a ser desenganado no que tange a balança de reposição dos recursos naturais (BOFF e LÖWY, 2008; MARX, 1991).

            Esta visão foi citada por Capra (1985) como “uma cosmovisão que concebe o mundo como uma máquina e não como um conjunto de ecossistemas vivos e em equilíbrio”. Para fugir deste cosmo induzido, diversos autores apresentaram suas idéias com o fito de promover a alternância para a consciência ambiental promotora da vida:

 

[...] para fortalecer nossa resiliência e até por razões de sobrevivência da espécie, urge estabelecer a causa da sustentabilidade [...] sendo necessário religar seres e saberes (FAZENDA e GUEVARA, 2013, p. 12).

 

Se não lutarmos agora para salvar o rio, amanhã os nossos filhos e netos sentirão o impacto disso (NETO, 2014, p. 31).

 

Nossa existência depende da vontade política de querer viver, porque, ao deixar a lógica do sistema operante, podemos conhecer o destino dos dinossauros, podemos desaparecer. Assim, temos que partir desse nível de consciência, compreendendo que o processo de criar e destruir não é mais coisa de Deus, é coisa dos seres humanos (BOFF e LÖWY, 2008, p. 88).

 

            Religar saberes. Lutar agora para salvar o rio. Partir deste nível de consciência. Este estudo sugere o uso de filmes para alcançar as ressalvas que os autores citados emitiram acerca da necessidade de proteger o planeta hoje para garantir a existência de amanhã. Três filmes foram escolhidos: Armageddon, O Livro de Eli, e 2012. Todos abordam, direta ou indiretamente, tópicos de Astronomia em incidência sobre o planeta Terra, além de mencionarem a questão do “futuro incerto” para a espécie humana.

            As explanações de Langhi e Nardi (2005) sobre erros em ferramentas didáticas moldando o perfil de determinadas concepções de alunos e docentes, com questões que incluem o tema Astronomia, incentivou esta proposta de uso de filmes em sala de aula para a promoção de saberes de ciências, numa pauta que relaciona aspectos de Astronomia – influenciadores da dinâmica ambiental terrestre – como estratégia para uma educação ambiental consistente. Ao sugerir Armageddon, O Livro de Eli e 2012 como ferramentas no processo ensino-aprendizagem, deseja-se “colocar em jogo diferentes opiniões sobre o que os filmes nos ensinam e o que se aprende com eles” (DUARTE, 2012), pois, introduzindo novas possibilidades de análises visuais, via representações visuais, os limites das imagens, da educação e das subjetividades, são superados (FERRARI e CASTRO, 2012).

            Armageddon. Classificação: 12 anos. Neste filme, um asteróide de grande porte ameaça a vida na Terra. A solução para a NASA foi enviar perfuradores de petróleo para inserir uma carga atômica no interior do asteróide e implodi-lo (ARMAGEDDON, 1996). As reflexões que podem ser inseridas em sala de aula remetem a corpos celestes que possuem capacidade de colidir contra a Terra (asteróides, cometas, meteoros), a proteção natural da atmosfera terrestre contra estes corpos, as conseqüências que uma explosão nuclear no vácuo espacial pode ocasionar, e questões sobre a extinção da vida na Terra.

            O Livro de Eli. Classificação: 16 anos. O filme mostra uma situação futura em que a degradação ambiental chegou a um nível tal que os seres humanos não contam mais com a totalidade da proteção da atmosfera. Desertos são os habitats cosmopolitas. Água, óculos escuros e protetores de pele são os produtos de maior valor (O LIVRO, 2010). Reflexões que o filme pode trazer à tona recaem sobre os motivos que levariam àquele território a tornar-se um deserto, sobre a importância da água, poluição do ar (efeito estufa), e capacidade aumentada de receber luz solar que a lesão atmosférica proporcionou (numa ligação com a atual discussão sobre a camada de ozônio).

            2012. Classificação: 14 anos. Um desastre global é descrito neste filme como já previsto pela cultura Maia para o ano de 2012, marcando assim o fim do mundo. Tal instabilidade seria derivada de um Tsunami que afetaria o magnetismo do planeta. Os sobreviventes, durante a trama, deslocam-se para naves tripuladas, com fins de perpetuar a espécie humana (2012, 2009). Propõe-se a abordagem dos pólos magnéticos da Terra (gravidade e magnetismo), tectonismo e suas influências na geração de ondas gigantes, e possibilidades de alinhamento dos planetas do Sistema Solar. Sugere-se ainda um aprofundamento, com questões de sobrevivência na superfície e nas profundezas do ambiente aquático.

 

 

4. Considerações

 

Este trabalho teve seu resumo expandido submetido ao VIII Colóquio Técnico-Científico da cidade de Volta Redonda-RJ, demonstrando os resultados sem completude. Apresentamos, aqui, a versão integral do trabalho, sem fins de apenas mostrar resultados, mas de realizar aprofundamentos sobre eles.

A chamada para a interdisciplinaridade entre diferentes campos do conhecimento alcança, com este trabalho, um caminho que passa pela complexidade dos tópicos de Astronomia, pelos saberes relativos ao meio ambiente, pela interação e influências promovidas por ambos, no intuito de promover a qualidade da educação ambiental global.

A complexidade dos temas, por vezes, instiga a adoção de alternativas que acelerem a transição para uma sociedade de consciência. Logo, entende-se que “para trabalhar com a complexidade dos ecossistemas no mundo globalizado e hiperconectado, é necessário recorrer a uma visão e uma metodologia interdisciplinares” (FAZENDA e GUEVARA, 2013, p. 11).

            Pretendeu-se, com esta abordagem integralizadora, não se ater ao tipo de informações que o teoricismo científico proporciona, consideradas por Librero et al. (2009) como peças de um quebra-cabeças que não se encaixam, compartimentadas, lineares, distintas e longínquas, do tipo “... uma floresta aqui..., um homem ali..., o cosmos mais adiante...” (p. 49). Para Capra (1985, p. 307), estas distinções disciplinares podem ser superadas quando diferentes aspectos multidisciplinares relacionam-se à realidade por meio de uma linguagem adequada.

            A escalada do nível extraterrestre para a vivência ambiental regionalizada, passando por aspectos globais, inversa ao modelo proposto por Rios e Rios (2014), imita a tendência da gravidade em atrair a matéria para o centro magnético, e permite uma gama de possibilidades para a educação ambiental como estratégia no alcance de um planeta sustentável. É de vital importância estender o conceito de que a Terra pode se tornar um de seus vizinhos caso a preservação ambiental seja colocada em segundo plano: um território ardente, ou congelado, como se estivesse tão próximo ou tão afastado do Sol como Mercúrio e Júpiter; de atmosfera densa e baseada em carbono, como em Vênus, onde o efeito estufa promove temperaturas que alcançam 460ºC. Essa extensão é devida para justificar (ou tentar) os já existentes cálculos do Pentágono para uma expedição à Marte quando a Terra for completamente envenenada (BOFF e LÖWY, 2008, p. 80).

            Ampliar a aprendizagem ambiental global a partir de contextos extraterrestres, usando filmes como ferramenta didática, vai de encontro ao desafio lançado por Doering (2013, p. 44), no qual professores devem atuar de forma a proporcionar aos alunos aprendizagens mais amplas e conectadas com a realidade; partindo do pressuposto que é necessário ultrapassar as resistências na busca por um sentido do educativo presente nas imagens: a nova Terra, o novo socioambientalismo, os novos paradigmas conceituais que nos envolvem (FERRARI e CASTRO, 2012); articulando, assim, a teoria à percepção individual do que está sendo exibido na tela, para “produzir novas possibilidades de compreensão da existência humana” (DUARTE, 2012).

            Desse modo, busca-se uma forma de enxergar a Terra a partir do universo, tomar questões ambientais globais a partir da dinâmica extraterrestre[3], e entender o Sistema Solar e sua influência nos organismos vivos. Inicialmente, este artigo permite o retorno ao geocentrismo a partir do heliocentrismo. Uma permissão poética, visto que a Terra deve ser cuidada, pois está dentro do alcance social. Ela permite seu estudo e conhecimento quase em totalidade, diferente da permissão dada pelo domínio espacial, pouco mapeado.

            A visão dos astronautas encerra melhor o cerne deste estudo, que a acolhe, assim como Michael Löwy acolheu:

 

de suas naves espaciais, olhando para baixo, diziam: a Terra é pequenina e cabe na palma de nossa mão, escondo-a atrás de meu polegar, ela é irradiante, belíssima, azul e branca, tudo que é sagrado e grande está lá, é a nossa única casa, daqui de cima não há diferença entre Terra e humanidade, são uma coisa só. E todos eles se propunham, quase uma promessa, a andar pelo mundo para ajudar a amar a Terra, salvar a Terra, pois podemos destruí-la. (BOFF e LÖWY, 2008, p. 95)

 

 

5. Bibliografia

 

 

2012. Direção: Roland Emmerich. Produção: Jonh Cusack. Columbia Pictures, 2009. 1 DVD (120min).

 

ALISSON, Elton. Insetos conseguem prever tempestades. Ecológico. Ano 6, n. 67, pp. 56-58, Mar-2014.

 

ARMAGEDDON. Direção: Michael Bay. Produção: Jerry Bruckheimer. Touchstone Pictures, 1996. 1 DVD (151min).

 

ASU - Arizona State University. World: Highest Temperature. Tempe: WMO Weather and Climate Extremes Archive. Disponível em: . Acesso em: 15 jul. 2014.

 

BARROSO, Marta F.; BORGO, Igor. Journey into the Solar System. Revista Brasileira de Ensino de Física v. 32, n. 2, p. 1–12 , jun. 2010. Acesso em: 10 jul. 2014.

BEZERRA, Sarita Maria de Fátima Martins de Carvalho. Efeitos da radiação solar crônica e prolongada sobre o sistema imunológico de pescadores do Recife. Anais Brasileiros de Dermatologia v. 83, n. 1, p. 95–95 , fev. 2008. Acesso em: 10 jul. 2014.

BOFF, Leonardo. LÖWY, Michael. A natureza e o meio ambiente: os limites do planeta. In: MENEGAT et al. (orgs.). Dilemas da humanidade: diálogos entre civilizações. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008. pp. 75-126.

 

CAPRA, Fritjof. El punto crucial. Barcelona: Integral, 1985.

 

DARWIN, Charles. A origem das espécies. Coleção a obra prima de cada autor. 4 edição. 7 reimpressão. São Paulo: Martin Claret, 2014. p. 85.

 

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[1] Федеральное космическое агентство. Парад планет. Disponível em: . Acesso em 15 jul. 2014.

 

[2] A tabela usa temperaturas superficiais, e não a temperatura do planeta em si, visto que o calor nos núcleos sólidos, móveis, e na atmosfera pode alcançar níveis muito elevados. De acordo com o governo de Moçambique (2008), o centro da Terra pode chegar a 5.270 kelvin; e segundo Kleber et al. (2011), na termosfera, algumas partículas de gás podem chegar a 2.500ºC. Optou-se por exibir apenas a média da temperatura superficial de Júpiter – 130 kelvin, segundo o Observatório Astronômico de Lisboa (OAL, 1998) – exatamente pela diferença térmica entre núcleo e superfície.

[3] Digna de nota é a citação de Darwin (2014) à comparação que Fries fez para explicar a variedade de espécies de um mesmo gênero como grupos de formas desigualmente relacionadas entre si e agrupadas em torno de suas espécies ancestrais: “pequenos grupos de espécies costumam ‘gravitar’ como satélites ao redor de outras”.

Ilustrações: Silvana Santos