Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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12/03/2015 (Nº 51) DESCARTE DE RESÍDUOS LABORATORIAIS NA UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO: OPORTUNIDADE PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO SUPERIOR
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DESCARTE DE RESÍDUOS LABORATORIAIS NA

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO: OPORTUNIDADE PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO SUPERIOR

 

 

 

Geruza Rodrigues Sales; Leonardo Luiz de França; Isabelle Maria Jacqueline Meunier

 

Esse artigo é parte da Monografia de conclusão de curso de Especialização dos dois primeiros autores, sob a orientação da Profa. Isabelle Meunier (imjmeunier@gmail.com), todos servidores da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, Pernambuco.

 

 


 

RESUMO

 

Este trabalho se propôs a avaliar o descarte de resíduos em laboratórios Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), analisando o potencial de causar problemas ambientais e a percepção desse fato pelos atores envolvidos. Foram realizadas visitas nos setores responsáveis e em alguns pontos de coleta de resíduos e entrevistas semiestruturadas com pessoal encarregado. Para conhecer a percepção de professores, estudantes e técnico-administrativos foram aplicados questionários a usuários do laboratório 6A, do Departamento de Química da UFRPE. As condições atuais de coleta e destinação de resíduos laboratoriais na UFRPE são desuniformes, havendo bons exemplos de gestão convivendo com situações precárias, em franco desacordo às normas e aos cuidados exigidos para segurança ambiental, que reflete a inexistência de programa de gestão de resíduos na UFRPE. As normas técnicas e legais para manuseio dos descartes químicos e adoção de procedimentos adequados devem ser objeto de um programa de gerenciamento de resíduos químicos, com forte componente educativo. No Laboratório 6A do Departamento de Química não há estratégias reconhecidamente eficazes para destinação segura dos descartes. Recomendam-se a adequação das instalações físicas, estabelecimento e divulgação de normas, fiscalização e supervisão das atividades, realização de capacitações periódicas e inclusão de questões ambientais no conteúdo das disciplinas.

 

 

PALAVRAS-CHAVE: Laboratório; Gerenciamento; Percepção; Rejeitos.

 

 

1  INTRODUÇÃO

 

 

A ausência de tratamento e a incorreta disposição dos resíduos laboratoriais levam à contaminação do solo, do ar e dos recursos hídricos, comprometendo a saúde pública. Segundo Alberguini; Silva; Resende (2005), as universidades, faculdades e centros de formação de recursos humanos geram cerca de 1% dos resíduos perigosos, que se caracterizam por apresentarem pequeno volume e elevada diversidade, o que dificulta a padronização das formas de tratamento e disposição adequada. Ainda que esse volume seja reduzido comparativamente em relação às indústrias, às universidades não podem nem devem ignorar sua posição de geradoras de resíduos.

As atividades desenvolvidas nos laboratórios universitários empregam substâncias e produtos de diversas classes. Entre eles estão os considerados materiais perigosos, por apresentarem características de inflamabilidade, corrosividade, reatividade, patogenicidade e toxicidade, que oferecem risco potencial aos seres vivos e ao ambiente (FONSECA, 2009).

A preocupação com a mudança da visão nos laboratórios de química visando diminuir a geração de resíduos é extremamente bem-vinda, pois favorece a redução de custos, com a racionalização dos procedimentos e redução do consumo de reagentes, além de colaborar com a segurança dos profissionais envolvidos e da comunidade, uma vez que previne a contaminação ambiental, por despejos gasosos, sólidos ou líquidos (NOGUEIRA; REGITANO; GONZALEZ, 2006).

A implementação de uma política interna de gerenciamento de resíduos nas instituições de ensino é uma das maneiras de despertar a todos os envolvidos a percepção da importância do seu envolvimento com o tema e promover um comportamento ambiental e socialmente correto (GIMENEZ et al., 2006). Uma das maiores metas do ensino técnico e superior deve ser capacitar os estudantes para lidarem com materiais perigosos de maneira correta e responsável. No entanto, a forma tradicional de ensino é um paradoxo, pois, enquanto praticam-se as diversas aulas experimentais e estágios, uma grande quantidade de resíduos é gerada sem a correta destinação.

A gestão de resíduos em laboratórios de pesquisa e ensino é uma necessidade e sua implementação é de extrema importância ambiental, sanitária e econômica. Além disso, esse sistema permite ao aluno uma melhor conscientização acerca da problemática que é a geração, processamento e o descarte de resíduos, tendo a oportunidade de ampliar e consolidar os seus conhecimentos em benefício ao meio ambiente.

De maneira geral, esse problema tem sido relegado a um plano secundário. Na maioria dos casos, os resíduos são estocados de forma inadequada e fica aguardando um destino final, isso quando são estocados e não descartados indevidamente, já que a maioria das instituições públicas brasileiras de ensino e pesquisa não tem uma política institucional clara que permita um tratamento global do problema (GILONI-LIMA; LIMA, 2008).

O objetivo geral deste estudo foi diagnosticar os processos de descarte dos resíduos de laboratórios da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), avaliando as práticas adotadas frente às normas técnicas e legais existentes, e analisar a percepção de professores, técnicos de laboratórios e estudantes da UFRPE, sobre questões e problemas ambientais, mais especificamente os problemas provenientes dos resíduos das aulas práticas do laboratório 6A do Departamento de Química da UFRPE.

 

2 METODOLOGIA

 

A forma de descarte de resíduos químicos da UFRPE foi descrita a partir de visita realizada ao setor responsável por meio de observação e entrevista com funcionário encarregado.

Os pontos de coleta de laboratórios de outros setores da UFRPE foram visitados, obtendo-se informações com servidores e realizando registros fotográficos.

Para conhecer a percepção dos impactos ambientais gerados pelos laboratórios da UFRPE, escolheu-se o Laboratório 6A do Departamento de Química como objeto de estudo de caso. Para isso, foram aplicados questionários a nove professores e cinco técnicos de laboratório do Departamento de Química e a sessenta e três estudantes dos cursos de Engenharia de Pesca e Aquicultura, Medicina Veterinária, Engenharia Florestal, Engenharia Agrícola e Ambiental, Licenciatura em Química e Zootecnia, matriculados entre o primeiro e quinto período dos seus cursos.

 

3 RESULTADOS

 

Coleta e destinação de resíduos de laboratórios da UFRPE

O recolhimento dos resíduos da UFRPE se dá sob a responsabilidade do Departamento de Área Verdes e Vias, com destinação final realizada por empresa especializada contratada pela UFRPE, que recolhe os resíduos nos departamentos e em seguida leva-os para a incineração.

 Profissionais terceirizados responsáveis pela limpeza recolhem os resíduos nos setores, depositando nas bombonas deixadas em locais apropriados para que se faça o recolhimento, levando para incineração.

Os departamentos de Química, Zootecnia, Pesca, Veterinária, Morfologia e Fisiologia Animal (área de Anatomia) e Qualidade de Vida são os que contam com depósitos próprios para guarda do material até recolhimento, denominados bombonas, confeccionados material plástico resistente. Lixos biológicos são colocados em sacos brancos, também recolhidos pela empresa.

Quanto ao fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPI) e de informações e capacitações, foi informado ser de responsabilidade de técnicos de segurança do Departamento de Qualidade de Vida da UFRPE, como também da própria empresa terceirizada, não se tendo oportunidade de presenciar essas atividades. Também não foram vistos trabalhadores portando EPI.

Pontos de coleta de laboratórios

- Departamento de Química: Conforme informações do departamento responsável pela coleta, o Departamento de Química reúne seus resíduos em áreas do seu entorno e através de correspondência ou telefonema, comunica-se com o setor responsável para recolhê-los. Não foram observadas bombonas nos locais de coleta, por que as mesmas não foram solicitadas ao setor logístico, segundo informações de funcionários da Divisão de Área Verdes e Vias. Foram observadas vidrarias ao ar livre, em locais impróprios e sem acondicionamento adequado.

- Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal: Os resíduos são colocados em garrafas e um funcionário da empresa de limpeza se responsabiliza em colocá-las nas bombonas, que ficam em uma área externa do Setor de Anatomia. Observaram-se, em um dos depósitos, restos de formol nos quais foram lavadas peças para aula de Anatomia que, em seguida, foram jogados em canal de drenagem. Também foram observadas peças de animais dispostas ao livre.

- Departamento de Medicina Veterinária: A coleta de resíduos laboratoriais é realizada por funcionário da empresa terceirizada. As cinco bombonas ficam ao lado do Setor de Necropsia, duas delas protegidas e as demais dispostas sob o solo, ao ar livre. Observou-se total falta de higiene e inobservância dos padrões de segurança e proteção ao meio ambiente. Foi registrada a presença de material hospitalar sem proteção, com risco de contaminação e má conservação do ambiente em torno das bombonas, com acúmulo de lama devido às chuvas.  

- Departamento de Qualidade de Vida: Materiais como tubos de ensaio com sangue e os perfuros cortantes como lâminas e agulhas vão para uma caixa coletora própria para material perfuro cortante. Contaminantes são acondicionados em sacos brancos, todos depositados em bombonas que ficam em um local separado e gradeado à espera do recolhimento pela empresa responsável. 

- Departamento de Engenharia de Pesca e Aquicultura: Todo o material residual é colocado em bombonas, recolhidas duas vezes por semana. As bombonas ficam em galpão fechado a chave, com acesso apenas dos responsáveis. 

- Departamento de Zootecnia: Os resíduos e rejeitos são colocados em sacos plásticos e posteriormente depositados nas bombonas, que ficam em local reservado e gradeado, na parte externa do prédio, para posterior recolhimento semanal pela empresa responsável. A segurança do laboratório é feita por portões eletrônicos e senhas. Os alunos trabalham devidamente equipados com luvas, batas e botas, conforme as normas de segurança. Encontra-se em processo de construção instalações para evitar o desperdício de água do destilador, que por sua vez, vai para o meio ambiente, como forma de reaproveitar e reduzir os impactos sobre os recursos naturais.

Observou-se que o armazenamento e coleta dos resíduos laboratoriais, na amostra avaliada, não obedecem a critérios uniformes e dependem de decisões de gestão dos próprios departamentos responsáveis. Em alguns casos, houve flagrante desrespeito às normas, com possível contaminação ambiental.

Segundo Alberguini; Silva; Resende (2005), atualmente, existem meios exequíveis de gestão e gerenciamento de resíduos de laboratórios, sendo fundamental promover a consciência preventiva, especificamente no que se refere à nocividade de produtos perigosos em ambientes de trabalho, levando-se em consideração as instalações operacionais e os possíveis riscos ocupacionais.

Nessa perspectiva, o tratamento de resíduos é viável. Contudo, para que esse gerenciamento tenha êxito é necessário desenvolver uma consciência ética em relação ao uso e ao descarte de produtos, visando à prevenção da poluição e à redução, reaproveitamento e recuperação de materiais. As universidades deveriam ser exemplo no tratamento dos resíduos gerados e na sua reutilização.

Para que haja gestão dos resíduos, deve-se, obedecer a uma hierarquia de ações, que envolve a redução da produção de resíduos na fonte; a reutilização e recuperação de resíduos; a redução da toxicidade e volume e, por último, tratamento ou disposição de resíduos de forma ecologicamente correta (JARDIM, 1998).

 Como formadores de profissionais especializados, é necessário despertar a atenção dos alunos de graduação e pós-graduação para essa questão e lhes fornecer as ferramentas básicas, que lhes permitam exercer suas atividades profissionais de forma correta.

Além do compromisso ambiental e da ética, que devem ser sempre presentes dentro das atividades que se desenvolvem nos laboratórios, existe também a questão da legislação sobre o assunto. No Brasil, Agência de Vigilância Sanitária (ANVISA) e o Conselho Nacional do Meio Ambiente - (CONAMA) são as principais instâncias responsáveis por criar normas relativas ao gerenciamento de resíduos provenientes de laboratórios.

Enquanto a ANVISA foca a saúde pública, o CONAMA preocupa-se com o meio ambiente e o controle da poluição. Em linhas gerais, as normas estabelecem diretrizes para o manuseio, acondicionamento, descarte, sistema de coleta, transporte e destinação de substâncias oriundas do meio laboratorial, o que envolve necessariamente o estabelecimento de um Programa de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRSS) para seguir os procedimentos que se fazem necessários (ZANETI; ALMEIDA, 2009).

Entende-se que a implantação de um PGRSS depende em grande parte, dos recursos humanos de um laboratório. O pessoal de laboratório deve possuir alta formação, integridade, consciência profissional e um elevado senso de responsabilidade.

Dessa forma, configura-se como uma obrigação dos gestores dos serviços promover uma capacitação constante dos profissionais conforme o que é estabelecido na Resolução da Diretoria Colegiada da ANVISA (RDC) 302. De acordo com a RDC 302, o laboratório deve promover capacitações e educação permanente aos seus funcionários mantendo disponíveis os registros dos mesmos (BRASIL, 2005).

 

Percepção ambiental de professores, técnicos e estudantes usuários do laboratório 6A do Departamento de Química da UFRPE

- Opinião dos Professores

Dos nove professores entrevistados, oito afirmaram que questões ambientais são raramente tratadas em reuniões departamentais e apenas um informou que isso se dá eventualmente.  Entre os assuntos citados como tema dessas discussões, esteve uma menção a disciplina específica - Ecologia Química e Reciclagem de Materiais - e três referências aos resíduos laboratoriais, com a ressalva de um dos entrevistados de que se tratava de abordagem pontual, sem desdobramentos efetivos em mudanças de atitudes.  A necessidade de incorporar a temática ambiental nas disciplinas também foi citada por um dos professores como outro tema já discutido em reunião de departamento, assim como o plantio de árvores na área livre do departamento.

A maioria dos professores (sete entre os nove entrevistados) informou não saber como é feito o descarte de resíduos laboratoriais e qual o seu destino final, e apenas um deles informou que as condições desse descarte são adequadas.

O Laboratório 6A não parece estar devidamente equipado para dar a correta destinação aos descartes e rejeitos químicos das aulas práticas, ou pelo menos isso não está claro para os professores do departamento. Quatro entre os nove professores entrevistados informou que o laboratório não está equipado e o mesmo número ou não respondeu ou não disse não saber. Apenas um dos professores entrevistados assegurou que existem condições reais para destinar adequadamente os rejeitos.

 

Embora não tenha havido elevada concordância, os professores disseram perceber alguma preocupação dos estudantes com o destino dos rejeitos de aulas práticas.

A falta de adequação à destinação dos rejeitos é preocupante, considerando que oito professores entrevistados reconheceram que as atividades do Laboratório 6A contribuem para a poluição ambiental e apenas um deles não respondeu. Da mesma forma, os oito professores indicaram haver a necessidade de mudanças para conseguir a desejada adequação ambiental. Todos os entrevistados julgaram importante a inclusão de questões ambientais no conteúdo das disciplinas pelas quais são responsáveis.

As aulas experimentais são momentos privilegiados para apresentar aos estudantes a forma correta de agir no laboratório, minimizando possibilidades de acidentes e assim, quando o professor decide pela aula prática, deve considerar aspectos relacionados à segurança, tais como regras de manuseio, acondicionamento e armazenagem de produtos químicos, além da disposição final de resíduos gerados (MELCHIOR, CARDOSO, DEL MOLIN, 2003).

Nessa mesma linha, para minimizar os riscos inerentes às atividades, os professores devem adotar todos os procedimentos de segurança, educando também por meio do exemplo e debatendo previamente com os alunos normas de segurança a serem adotadas nas práticas (MACHADO, 2005).

 

- Opinião dos Técnico-Administrativos

Os cincos técnicos do Departamento de Química entrevistados disseram conhecer a forma de descarte adotada para os rejeitos dos laboratórios do departamento. No entanto, a maioria (3 dos 5 entrevistados) declarou não conhecer o destino final dos materiais.

Os entrevistados não se mostraram convictos sobre a preocupação dos professores com aos possíveis impactos ambientais dos rejeitos (dois concordaram com a existência dessa preocupação, dois discordaram e um concordou parcialmente) e, por outro lado, foram unânimes em reconhecer que os estudantes não se preocupam com essa questão.

A contribuição do Laboratório 6A à poluição ambiental foi reconhecida pela quase totalidade dos técnicos entrevistados (4 entre os 5) e todos concordaram que seriam necessárias mudanças no laboratório, tendo como objetivo sua adequação às necessidades de segurança ambiental.

Um dos pontos fundamentais parece ser a instituição de ações de supervisão e fiscalização quanto à correta destinação dos rejeitos de aulas práticas, o que todos perceberam como inexistente. Todos os entrevistados, por sua vez, concordaram com a necessidade de realização de cursos para melhor cuidar da coleta e destinação dos descartes e rejeitos químicos dos laboratórios. Apenas um dos entrevistados informou já ter participado de algum curso que tratava de questões ambientais relacionadas ao seu ambiente de trabalho. 

Conforme Machado (2005), uma ação focada no indivíduo não elimina as condições para um acidente porque, mesmo havendo normas definidas e conhecidas, se essas não são cobradas, possibilita que algumas pessoas hajam de maneira contrária à ideal, influenciando as ações de outras. Por isso, é  necessário que a direção da instituição avalie constantemente a organização em busca de falhas, apesar da responsabilidade pela segurança ser, obrigatoriamente, compartilhada por todos envolvidos.

Ainda segundo Machado (2005), é dever da instituição, entre outras responsabilidades:

• dotar o laboratório de infraestrutura básica;

• exigir que as normas de segurança sejam seguidas pelos usuários do laboratório;

• planejar a compra de produtos químicos, evitando excesso e prevendo estocagem segura;

• organizar e executar, em conjunto com os professores, um plano de disposição final dos resíduos provenientes das práticas laboratoriais.

 

- Opinião dos Estudantes

As discussões de questões ambientais foram julgadas importantíssimas por 76,2% dos estudantes, e interessante por 19,0%. Em relação ao desejo de receber mais informações sobre conservação ambiental e sustentabilidade, 96,8% responderam positivamente.

A preocupação com o meio ambiente por parte dos professores do Departamento de Química, demonstrada nas aulas teóricas e práticas, foi raramente percebida por 61,9% dos alunos, sendo considerada frequente por 36,5% dos estudantes. A turma para qual essa preocupação foi considerada mais rara foi justamente a do curso de Licenciatura em Química (9 dos 10 entrevistados afirmaram raramente perceber essa preocupação), enquanto os 7 entre os 10 alunos de Medicina Veterinária apontaram-na como frequente.

A maioria dos estudantes informou sentir-se seguro ou mais ou menos seguro em relação às práticas laboratoriais que poderiam causar danos ao meio ambiente, e 46% informaram observar a preocupação dos professores quanto à destinação dos rejeitos das aulas práticas, enquanto 26,9% disseram não haver essa preocupação e o restante não soube opinar  se isso acontecia. 

Não se observou convicção clara quanto às condições do laboratório 6A destinar corretamente os seus resíduos químicos e o percentual de estudantes que consideraram esse laboratório insuficientemente equipado para isso (31,7%) foi discretamente superior ao daqueles que o consideram equipado (28,6%).

É interessante observar que os estudantes que consideraram o laboratório equipado estiveram representados em todos os cursos, exceto no curso de Licenciatura em Química, permitindo deduzir que esses alunos, que vivenciam mais o laboratório e que se apresentavam em um estágio mais avançado do seu curso, foram os que mostraram maior capacidade de questionamento sobre as condições de segurança ambiental do laboratório.

Apesar de se apresentarem, em parte, seguros em relação às condições do laboratório 6A de lidar com os rejeitos químicos, 96,8% dos estudantes informaram não saber a destinação desses rejeitos. Mesmo desconhecendo o destino dos rejeitos, apenas 11,1% disseram considerar que os resíduos químicos do Laboratório 6A contribuem para a poluição ambiental e a maior parte (41,1%), ainda dessa vez, não se mostrou segura quanto a isso, optando pela alternativa mais ou menos. Por outro lado, 36,5% mostram-se convictos de que não há risco ambiental no descarte dos resíduos das aulas práticas.

Ainda que tenham conhecimento quanto aos riscos ambientais das práticas laboratoriais, a maioria (68,2%) entendeu que seriam necessárias mudanças no Laboratório 6A para torná-lo mais adequado ambientalmente.

Nos laboratórios, as causas de acidentes podem estar relacionadas ao não conhecimento de normas de segurança, à falta de conhecimento ou aplicação inadequada dessas normas, condutas impróprias, falta de supervisão e cobrança ou ainda devido ao desrespeito consciente e intencional aos procedimentos de segurança (CARVALHO, 1999; CIENFUEGOS, 2001).

A utilização de laboratórios de estudos práticos exige cuidados especiais por diversos aspectos, criados por situações como inadequação do ambiente, grande número de alunos, inexperiência e agitação típicas dos jovens. Assim, de acordo com Hirata; Mancine Filho (2002), é necessário que os alunos sejam previamente conscientizados sobre a quais riscos são submetidos durante as aulas práticas no laboratório, assim como das medidas a serem adotadas para a manutenção desses riscos aos níveis mínimos, principalmente em relação aos usos das soluções para com a saúde. 

Os estudantes devem saber como proceder em caso de acidentes e especialmente orientados sobre o descarte de materiais, químicos ou não. Essas orientações podem ser oferecidas no início do curso, abordando aspectos gerais de segurança em laboratório e, de forma complementar, nos laboratórios de disciplinas específicas. Tal abordagem é necessária uma vez que cada laboratório didático oferece tipos diferenciados de risco e gravidade variável (UNISEPE, 2010).

Segundo Andrade (2008), um dos principais aspectos a serem destacados nas práticas é a aprendizagem efetiva, que por sua, pode ser contextualizada e interdisciplinar. Os alunos devem entender que fazer ciência não é experimentar de improviso, mas exige metodologia, investimento e compromisso.  Esse compromisso deve se estender à responsabilidade frente às condições ambientais e aos efeitos das suas práticas na qualidade ambiental.

 

 

CONCLUSÕES

 

Observa-se que a preocupação com as condições de descarte de rejeitos de aulas práticas e resíduos sólidos de laboratórios de ensino e pesquisa vem adquirindo importância crescente no ambiente acadêmico, embora isso não se reflita, às vezes, em providências efetivas. Existem normas técnicas e legais que podem garantir o armazenamento, manuseio e descarte seguros de materiais com diferentes níveis de perigo ao ambiente e a adoção desses procedimentos deve ser objeto de um programa de gerenciamento de resíduos químicos, para o qual é fundamental a participação de profissionais e estudantes. As atividades práticas em laboratórios, além de informar conteúdos, devem ter também o papel educativo para permitir a formação de cidadãos conscientes da sua responsabilidade ambiental.

As condições atuais de coleta e destinação de resíduos laboratoriais na UFRPE são desuniformes, havendo bons exemplos de gestão convivendo com situações precárias, em franco desacordo às normas e aos cuidados exigidos para segurança ambiental. A inexistência de programa de gestão de resíduos na UFRPE, com processos e responsabilidades definidas e supervisão eficaz, contribui para as condições insatisfatórias de coleta e destinação de resíduos.

Tomando-se o Laboratório 6A do Departamento de Química como exemplo, cujas atividades que implicam em risco ao meio ambiente são reconhecidas por professores e técnicos, vê-se que não há estratégias reconhecidamente eficazes para destinação segura dos descartes. As estratégias a serem adotadas envolveriam adequação das instalações físicas, estabelecimento de normas a serem amplamente divulgadas, fiscalização e supervisão das atividades, realização de treinamentos e capacitações periódicas e inclusão de questões ambientais práticas no conteúdo das disciplinas.

Os estudantes da UFRPE, principalmente aqueles que cursam os semestres iniciais, necessitam da experiência e dos conhecimentos de professores e técnicos para compreender a responsabilidade que envolve suas atividades de aprendizagem nos laboratórios e precisam ter o exemplo da instituição para, no futuro, assumirem seus papeis de profissionais conscientes.

Além de fundamental à segurança das atividades e necessária à futura prática profissional, a análise crítica dos processos de produção e destinação de resíduos laboratoriais pode ser um exercício prático de educação ambiental no ensino superior.

 

REFERÊNCIAS

 

ALBERGUINI, L.B.A.; SILVA, L.C.; REZENDE, M.O. Tratamento de resíduos químicos:  Guia Prático para a Solução dos Resíduos Químicos em Instituições de Ensino Superior. São Carlos: RiMa, 2005.

ANDRADE, M. Z. Segurança em laboratórios químicos e biotecnológicos. Caxias do Sul: Educs, 2008.

BRASIL, Ministério da Saúde. ANVISA Resolução RDC nº 302, dispõe sobre Regulamento Técnico para funcionamento de Laboratórios Clínicos. Congresso Nacional, Diário Oficial da União, 14 de outubro de 2005.

CARVALHO, P. R. Boas práticas químicas em biossegurança. Rio de Janeiro: Interciência, 1999.

CIENFUEGOS, F. Segurança no laboratório. Rio de Janeiro: Interciência, 2001.

FONSECA, J. C. L. Manual para gerenciamento de resíduos perigosos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009. Disponível em http://www.unesp.br/pgr/manuais/residuos.pdf Acesso: 12 ago. 2014.

GILONI-LIMA, P. C.; LIMA, V. A. de. Gestão integrada de resíduos químicos em instituições de ensino superior. Química Nova, São Paulo, v. 31, n. 6, p. 1595-1598, 2008.

GIMENEZ, S. M. N. et al,  Diagnóstico das condições de laboratórios, execução de atividades práticas e resíduos. Química Nova na Escola, v. 23, p. 32 - 36, 2006.

HIRATA, M.H; MANCINI FILHO, J. Manual de biossegurança. São Paulo: Manole, 2002.

JARDIM, W. F.. Gerenciamento de resíduos químicos em laboratórios de ensino e pesquisa. Química Nova, v. 21, n.5, p. 671 - 673, 1998.

MACHADO P. F. L. Resíduos e rejeitos de aulas experimentais. Química Nova na Escola. v. 29, p.38 - 41, ago., 2008.

MELCHIOR, M.; CARDOSO, C. D.; DAL MOLIN, V. T. S. Aprendendo a conhecer a química com segurança. 33º ENCONTRO DE DEBATES SOBRE O ENSINO DA QUÍMICA, Ijuí, 2013. Ijuí: UNIJUI, 2013. Disponível em: https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/edeq/article/viewFile/2627/2207 Acesso em 12 ago. 2014.

NOGUEIRA, A. R. A; REGITANO, L. C. A; GONZALEZ, M. H. Gerenciamento de resíduos dos Laboratórios da Embrapa Sudeste. Disponível em: http://www.cppse.embrapa.br/050pesquisa/laboratorio-de-tratamento-de-residuos químicos/artigoforum.pdf  Acesso em: 12 jun 2014.

UNISEPE Manual institucional de biossegurança. São Paulo: Faculdade Integrada do Vale do Ribeira, 2010. Disponível em: www.scelisul.com.br/manuais  Acesso: 10 jun. 2014.

    

Ilustrações: Silvana Santos