Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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12/03/2015 (Nº 51) DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PARA DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE BIOLOGIA
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DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PARA DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE BIOLOGIA

 

 

Ana Carla Iorio Petrovich1 e Magnólia Fernandes Florêncio de Araújo2.

 

1 Doutoranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, carla.iorio@gmail.com

2 Professora Titular do Departamento de Microbiologia e Parasitologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, mag@cb.ufrn.br

 

Resumo

No contexto de crise socioambiental que vivenciamos, a educação para o desenvolvimento sustentável pode ser considerada a principal proposta de implementação das transformações necessárias para a garantia de melhoria da situação atual. Neste aspecto, a introdução da educação para desenvolvimento sustentável como tema transversal nos currículos formais de formação de professores de biologia, como instrumento que estimule os indivíduos à reflexão e à ação acerca dos desafios impostos pela crise socioambiental, não tem se mostrado uma tarefa simples. Isso se torna particularmente verdadeiro quando se pensa nas estruturas dos currículos tradicionais dos cursos superiores de maneira geral. Atualmente considera-se que as sementes da pesquisa em Educação para Desenvolvimento Sustentável têm sido implantadas, mas que o suporte para tais pesquisas, especialmente no ensino superior, parece ainda bastante limitado.

Palavras-chaves: Professores em formação; questões ambientais; educação para desenvolvimento sustentável; sustentabilidade.

 

 

1 Introdução

No contexto de crise socioambiental que vivenciamos, a educação pode ser considerada a principal proposta de implementação das transformações necessárias para a garantia de melhoria da situação atual. No entanto, é importante salientar que a educação é apenas estratégia de transformação social, pois para que seja efetiva é preciso que esteja associada com mudanças técnico-cientificas e políticas (VILCHES e GIL-PEREZ, 2009).

A educação para a sustentabilidade ou educação para desenvolvimento sustentável pode ser considerada como temática transversal e necessária nos cursos de formação de professores de ciências e biologia. No entanto, representa um obstáculo para muitos professores e alunos.  De acordo com Bybee (1991), estamos vivenciando uma situação de emergência planetária que está relacionada com ações humanas, e que, a sustentabilidade constitui a ideia central unificadora necessária neste momento da história da humanidade. Porém, pelo fato de o conceito de desenvolvimento sustentável ter surgido como resposta a uma situação de insustentabilidade do modo de vida atual, que coloca em perigo as gerações vindouras, proporciona a elaboração de dúvidas sobre os seus objetivos prejudicando a convergência dos esforços necessários para o enfrentamento dos problemas atuais.

Este artigo tem como objetivo discutir as dificuldades relacionadas com a inserção desta temática de educação para desenvolvimento sustentável nos cursos de formação inicial de professores de ciências e biologia, tendo por base documentos da UNESCO sobre educação para o desenvolvimento sustentável e bibliografia pertinente ao tema.

2 O conceito de sustentabilidade

Um fato que prejudica a eficiência e a legitimidade da definição de desenvolvimento sustentável está centrado em críticas que precisam ser esclarecidas e bem definidas para proporcionarem um melhor entendimento e aplicabilidade desse conceito.

No ano de 1987, a Comissão Mundial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento apresentou o conhecido documento chamado Our Common Future (Nosso Futuro Comum), também denominado Relatório Brundtland. No seu primeiro capítulo intitulado Um futuro ameaçado encontramos um dos primeiros relatos do conceito de sustentabilidade: "desenvolvimento sustentável é desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas próprias necessidades".

Diante deste conceito, surgiram várias críticas, uma das primeiras é a de que seria apenas a expressão de uma ideia comum, pois seria possível que várias civilizações já intuíssem a necessidade de preservar os recursos para as gerações futuras (MACEDO, 2005). Esta crítica pode estar baseada em relatos de antigas civilizações que residiam em locais isolados em que os recursos eram escassos, no entanto, é necessário clarificar que o conceito formulado foi proveniente da compreensão que os recursos do nosso planeta não são ilimitados e alguns não são renováveis, como muitos acreditavam, e que as atividades humanas podem modificar a qualidade e a quantidade dos recursos naturais.  

O livro Proteger a Terra: Estratégia para uma Vida Sustentável (MUNRO e HOLDGATE, 1991) contém a definição sobre desenvolvimento sustentável, a qual complementa a definição encontrada em Nosso Futuro Comum, em que o conceito de desenvolvimento sustentável foi definido como “melhorar a qualidade da vida humana respeitando a capacidade do ecossistema”. Esta definição esclarece uma outra crítica levantada sobre desenvolvimento sustentável, visto que, alguns acreditam que sustentabilidade é sinônimo de preservação apenas de recursos naturais.

O atual padrão de desenvolvimento tem ressaltado a ideia de insustentabilidade do nosso modo de vida, pois a degradação ambiental ainda não é visível e aceita por todos. Nesse sentido, a sustentabilidade avança com certa dificuldade, pois, algumas sociedades denominadas como avançadas até pouco tempo, acreditavam que a natureza era ilimitada e se poderia centrar a atenção nos desejos e necessidades humanas sem preocupações com as consequências ambientais (ZARAGOZA, 2000). A inquietação surgida recentemente pela preservação do nosso planeta pode ser considerada como indicativo de uma mudança de pensamento, uma metamorfose cultural, científica e social que faz cessar uma cultura de indiferença e de agressão com o meio ambiente. Segundo Vilches e Gil-Perez (2003), estamos assistindo a integração ambiente-desenvolvimento, e não podemos ver desenvolvimento e meio ambiente como contraditórios e sim desenvolvimento agregado ao meio ambiente e meio ambiente limitando o desenvolvimento.

De acordo com Macedo (2005), outra crítica está relacionada ao fato de alguns acreditarem que, no conceito de sustentabilidade, não está explícito que deve haver solidariedade intrageração. De fato, pode parecer ambígua a expressão “satisfazer as necessidades da geração presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações de satisfazerem suas próprias necessidades”, porém, na mesma página do documento Nosso Futuro Comum (1987), podemos ler “o conceito de sustentabilidade implica a preocupação pela igualdade social entre as gerações, preocupação que deve logicamente se estender à igualdade dentro de cada geração”. Pelo exposto, está claro que a definição propõe a solidariedade intrageração.

O conceito de sustentabilidade é realmente complexo. Para Hill et al. (2003), sustentabilidade refere-se a modos de se pensar o mundo e as formas de prática pessoal e social que conduzem os indivíduos a possuírem valores éticos, serem autônomos e realizados; as comunidades alicerçadas com compromissos coletivos, tolerância e igualdade; os sistemas sociais e instituições serem participativas, transparentes e justas; e a existência de práticas ambientais que valorizam e sustentam a biodiversidade e os processos ecológicos de apoio à vida. Nesse contexto, demonstra que aspectos relacionados à interação entre homem e meio ambiente necessitam de harmonia para coexistirem de forma pacífica.

Possivelmente existe uma tendência humana de tentar resolver problemas pontuais sem levar em consideração as interconexões existentes com outros problemas. Nesse aspecto, é necessário salientar que os sistemas complexos que governam nossas vidas necessitam ser contemplados como um todo ao invés de seus componentes separadamente, pois ao se ignorar que existem vinculações com outros problemas se impedem o tratamento e resoluções adequadas (VILCHES e GIL-PÉREZ, 2009). Pelo exposto, torna-se visível que a abordagem complexa do conceito de sustentabilidade pode contribuir para que se consiga que, a partir da visualização dos problemas ambientais locais, seja possível entender que existe uma interconexão com os problemas globais, estimulando desta maneira para a elaboração de soluções coerentes, duradouras e não apenas remediações transitórias.

A defesa de desenvolvimento sustentável pode ser compreendida como uma proposta catalítica de mudança, tão vinculada a metas de paz, direitos humanos e justiça, como a conceitos de ecologia e processos de proteção ambiental - é uma questão de cultura que integra conceitos científicos e preceitos morais (MATSUURA, 2002 apud PEDROSA e MORENO, 2007). Compartilha-se da noção dos referidos autores sobre desenvolvimento sustentável, pois se trata de uma aceitação de que para garantirmos uma transformação no nosso modo de vida, precisamos encarar que a crise ambiental está interconectada com nossas ações cotidianas em toda nossa complexidade cultural.

Pelo exposto, observa-se que o conceito de desenvolvimento sustentável evolui constantemente e por esse motivo é sempre necessário esclarecer tanto o seu significado quanto os seus objetivos no intuito de garantir êxito na educação para o desenvolvimento sustentável (GUIMARÃES e TOMAZZELO, 2004). Sendo necessário possibilitar uma ampla compreensão desse conceito, no intuito de contribuir para a maior aplicação e integração com a prática pedagógica durante a formação inicial de professores.

3 Educação para desenvolvimento sustentável (EDS) – Educação para a sustentabilidade

Para Gadotti (2008), educar para a sustentabilidade é, essencialmente, educar para uma vida sustentável, o que significa, entre outras coisas, educar para a simplicidade voluntária e para a quietude. Nossas vidas precisam ser guiadas por novos valores, destacando a simplicidade, austeridade, paz, serenidade, saber escutar, saber viver juntos, compartilhar, descobrir e fazer juntos. Porém, para garantir uma educação sustentável precisamos estar atentos à formação dos futuros professores, para que eles não repitam métodos de transmissão do conhecimento e acabem contribuindo para uma ciência e uma cultura que, de alguma forma, incentivem a destruição e o desperdício dos recursos naturais. Nesse aspecto, observa-se a grande necessidade de pesquisas que visem contribuir para a formação de futuros professores, para que sejam capazes de refletir constantemente sobre como a sua prática docente, através da conscientização da necessidade continuar aprendendo e procurando os conhecimentos que o habilitem a tomar decisões compatíveis com o desenvolvimento sustentável.

De acordo com a UNESCO (2005) a Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) apresenta as características como explicitado na Figura 1. Pode-se destacar a característica de ser interdisciplinar e holística; esta característica é extremamente importante pois se preocupa que o ensino do desenvolvimento sustentável perpasse por todas as áreas de conhecimento e por todas as disciplinas que compõem a estrutura curricular de um curso de formação de professores, e que não seja ministrada como disciplina isolada. Outra característica importante está centrada na sua aplicabilidade e na necessidade de se utilizar diferentes métodos com o intuito de sensibilizar o maior número de pessoas sobre a importância de viver sustentavelmente.

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Figura 1: Características da Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Fonte: adaptado de UNESCO, 2005

Para Cambers e Diamond (2012), a Educação para o Desenvolvimento Sustentável é uma abordagem pedagógica que procura dar autonomia e incentivos a pessoas de todas as idades para que se responsabilizem por criar um futuro sustentável do qual poderão desfrutar. A EDS prepara pessoas de todas as camadas sociais para que enfrentem e solucionem os problemas que ameaçam a sustentabilidade do nosso planeta, e também para que mudem o seu comportamento com vista a um futuro mais sustentável. Nesse contexto, as pessoas, com o intuito de garantir condições de tomar decisões coerentes, se tornam sensíveis sobre a necessidade de aprender não só no ensino formal, mas também em contextos sociais e cotidianos.

 Os processos educacionais estão no centro da investigação para resolver os grandes problemas da humanidade para a garantia do desenvolvimento sustentável. No entanto, vários outros fatores influenciam diretamente os objetivos do desenvolvimento sustentável como questões políticas e econômicas. Assim, a educação precisa ser considerada apenas como o instrumento de maior importância para a conquista dos valores que o desenvolvimento sustentável requer. Para Cambers e Diamond (2012), a educação deixa de ser um fim em si mesma e passa a ser um instrumento do qual dispomos para promover as mudanças necessárias com o objetivo de assegurar o desenvolvimento sustentável.

Um dos valores mais importantes do desenvolvimento sustentável é o da responsabilidade universal, ou seja, o sentido de responsabilidade pelo papel que cada pessoa desempenha e pelo impacto que cada ação pessoal pode ter, não apenas a nível local, mas também a nível global. Este valor está intimamente relacionado com a intercomunicabilidade, outra temática também nuclear ao desenvolvimento sustentável. Esta temática tem a ver com a tomada de consciência da multiplicidade de reações em cadeia que uma ação pode suscitar em diferentes áreas. Por esse motivo, quando se pensa em desenvolvimento sustentável, não se pode considerar separadamente os aspectos sociais, os econômicos, os ecológicos, os culturais, os políticos, ou os espirituais (CAPUCHA, 2006).

Hopkins e McKeown (2007) relatam que existem estudos de caso provenientes de diversos continentes, que refletem esforços, a título pessoal e institucional, no sentido da reorientação de políticas, programas, currículos e práticas para responder a desafios de sustentabilidade em instituições de formação de professores. Porém, estas iniciativas encontram diversas dificuldades para sua aplicação. Como afirma Springett (2005), a introdução da educação para a sustentabilidade nos currículos formais, como instrumento que estimule os indivíduos à reflexão e à ação acerca dos desafios da sustentabilidade, não tem se mostrado uma tarefa simples. Isso se torna particularmente verdadeiro quando se pensa nas estruturas dos currículos tradicionais dos cursos superiores de maneira geral.

Com o intuito de enfatizar que a educação é um elemento indispensável para que se atinja o desenvolvimento sustentável, em dezembro de 2002, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou a Resolução nº 57/254 na qual proclama a Década da Educação das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (DEDS), cuja duração será de 2005 a 2014 (Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas A/RES/57/24, de 21 de fevereiro de 2003). A UNESCO foi escolhida para liderar a Década e elaborar um plano internacional de implementação. 

De acordo com a UNESCO (2005), o objetivo global da DEDS é integrar os valores inerentes ao desenvolvimento sustentável em todos os aspectos da aprendizagem com o intuito de fomentar mudanças de comportamento que permitam criar uma sociedade sustentável e mais justa para todos. Pode-se observar na Figura 2 os demais objetivos da DEDS.

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Figura 2: Objetivos da Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável

Fonte: adaptado de UNESCO, 2005

 

A Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável (DEDS) fundamenta-se na visão de um mundo onde todos tenham a oportunidade de se beneficiar da educação e de aprender os valores, comportamentos e modos de vida exigidos para um futuro sustentável e para uma transformação positiva da sociedade. Além disso, é necessário incentivar situações em que seja possível reunir diferentes atores para criar oportunidade de aperfeiçoamento das formas e estratégias para levar o entendimento do conceito de desenvolvimento sustentável ao maior número de pessoas, potencializando desta maneira os objetivos propostos (UNESCO, 2005).

Para Vilches et al. (2007), a DEDS constitui-se em um chamado aos educadores de todas as áreas e níveis, pela via da educação formal e não formal, para contribuir para a formação de cidadãos e cidadãs conscientes da gravidade dos problemas ambientais enfrentados hoje pela humanidade e preparados para participar em tomadas de decisões adequadas.

4 A importância da sustentabilidade como tema interdisciplinar na formação inicial de professores

A disciplinarização do conhecimento, que se encontra em todos os graus de ensino, torna-se também um entrave à abordagem holística e sistêmica que este tipo de questão requer. É impossível reconstruir o todo unicamente a partir da análise das partes. Há que se compreender os padrões e os processos de interação entre os constituintes do todo, bem como a sua dimensão histórica (FIGUEIREDO, 2006). Repensar a formação inicial dos docentes de ciências e biologia pode ser a base para que eles sejam capazes de reelaborar as situações de aprendizagem e contribuírem significativamente para mudanças no âmbito escolar do ensino básico.

Para Krasilchik (2004), o ensino de Biologia tem a função de contribuir para que cada indivíduo seja capaz de compreender e aprofundar explicações atualizadas de processos e de conceitos biológicos, a importância da ciência e da tecnologia na vida moderna, aumentando assim o interesse pelo mundo dos seres vivos. Isso levaria, segundo a autora, a que o cidadão seja capaz de usar o que aprendeu na tomada de decisões de interesse individual e coletivo, com ética, responsabilidade e respeito pelo planeta. Pelo exposto, a formação geral do cidadão tem estado cada vez mais em pauta, com a perspectiva de que a educação científica seja promotora de igualdade, justiça social, diversidade e sustentabilidade ambiental, o que poderá contribuir para a transformação social e, assim, para uma vida melhor.

Para Morin (1990), é importante que se perceba que o planeta Terra, com sua biosfera e a sua humanidade, constitui um conjunto complexo. Neste contexto, é importante salientar que a biologia qualifica os seres vivos como estruturas complexas que se relacionam de maneira complexa com o ambiente onde vivem. A formação do professor de biologia deve enfocar a importância e relevância dessa abordagem complexa para dar conta de entender a complexidade dos problemas ambientais atuais (GUIMARÃES, 2010). Neste contexto, é importante contribuir para a formação de profissionais reflexivos e criativos, com capacidade de considerar a existência de complexas relações entre processos naturais e sociais, para operar no ambiente com uma perspectiva global, mas diferenciado pela realidade local. 

A UNESCO (2012) ressalta que o grande desafio para o Brasil está em fazer com que os investimentos realizados no ensino de ciências cheguem cada vez mais de forma homogênea à população e possam efetivamente melhorar a sua qualidade de vida. No entanto, é importante destacar que para que isso aconteça se faz necessário que os sistemas formais de educação auxiliem os estudantes a desenvolverem uma cidadania na perspectiva do desenvolvimento sustentável.

Existe uma ampla aceitação sobre a imprescindibilidade de uma alfabetização científica que permita preparar as cidadãs e os cidadãos para a tomada de decisões (PRAIA et al, 2007). Neste aspecto é importante salientar que as soluções para se resolver a complexa crise ambiental, que tem envolvimentos sociais, econômicas, tecnológicas entre outros, provavelmente não virão de uma única fonte, e sim de um somatório de esforços de toda a sociedade. Além disso, é importante salientar que, de maneira geral, a perda excessiva dos recursos naturais do presente, deverá refletir diretamente na qualidade de vida das pessoas mais necessitadas.

Para garantir que os cidadãos sejam capazes de empreender em direção a um futuro sustentável, faz-se necessário mudar os padrões de desigualdades, descriminação e exclusão ainda presentes em diversas sociedades. Quando se pensa em uma sociedade sustentável, agrega-se valores em que todos possuem a capacidades de contribuir e se responsabilizar pela equidade no acesso a aprendizagem de qualidade. Nesse contexto, Maathai (2010) afirma que chegou o tempo de reconhecer que o desenvolvimento sustentável, a democracia e a paz são indivisíveis.

Os problemas ambientais da atualidade atribuem a professores e alunos, novos obstáculos que necessitam ser trabalhados no âmbito acadêmico. Nesse aspecto, Santos e Sato (2001) consideram que, aparentemente a universidade não se encontra preparada para enfrentar os desafios, tanto mais que esses apontam para transformações profundas e não para simples reformas parcelares.

É possível encontrar no cursos de formação de professores, disciplinas que, embora sejam caracterizadas por ministrarem conteúdos interdisciplinares, acabam não conseguindo atingir seus objetivos. Para Rohde (2001), não mais é possível que ciências que sejam ambientais se espremam em vazios epistemológicos entre as ciências sociais e da natureza, apenas adjetivando disciplinas existentes. É necessário que esse saber construído seja interdisciplinar. Neste aspecto, observa-se que a inserção de uma educação voltada para a sustentabilidade na universidade parece ser uma prática indispensável para sensibilizar os graduandos sobre os valores e atitudes necessários para assumirem uma posição crítica e reflexiva com relação aos complexos problemas ambientais e, desta maneira, contribuírem positivamente com a melhoria da qualidade de vida de todos.

Para Pedrosa (2008) importa que os programas de investigação universitária enderecem questões de desenvolvimento sustentável e que, os currículos e os programas educativos, em geral, as contemplem, de modo a que o desenvolvimento sustentável se transforme numa meta orientadora de processos de gestão e funcionamento universitários. Uma vez que, as instituições de ensino superior contribuem para formação de profissionais que podem trabalhar por um futuro mais promissor na sociedade. Além disso, é importante que também sejam realizadas pesquisas acadêmicas que possam indicar alternativas, tanto educacionais quanto técnicas, para o melhor enfrentamento dos problemas ambientais.

Estudos realizados com docentes relatam que as concepções dos professores acerca da sustentabilidade e dos problemas do mundo são fragmentadas e não revelam uma consciência da gravidade da situação que coloca em perigo a nossa própria sobrevivência (Viches et al, 2008). A questão que se levanta é se, neste início de século, a sociedade se pode dar ao luxo de ter professores com concepções sobre sustentabilidade e educação para a sustentabilidade pobres, ingênuas e afastadas de uma perspectiva sistêmica e holística (FIGUEIREDO, 2006).

Para Jacobi (2013), um dos grandes desafios na formação de professores é o desenvolvimento de dinâmicas de forma coletiva para entender a natureza de um problema comum, cooperando entre si para aprofundar o conhecimento e buscar respostas para resolver os problemas relacionados à degradação de recursos naturais. Assim, é importante incentivas que os professores em formação participem de projetos em que se utilizem metodologias participativas para a produção do conhecimento que os levem a entender como se deve ser a gestão compartilhada dos recursos naturais. Projetos em que atores sociais, pesquisadores de áreas disciplinares diferentes, técnicos e estudantes possam participar de processos decisórios na resolução de problemas.

As inovações educativas em todas as áreas disciplinares devem orientar-se no sentido de EDS, promovendo o desenvolvimento de competências essenciais para aprender ao longo da vida (PEDROSA, 2010).  Segundo Vilches e Gil-Perez (2009), a EDS constitui uma dimensão essencial na formação de professores e, diante disso, estes autores apresentam as seguintes questões: Como contribuir para fazer possível, como impulsionar a sensibilização e o desenvolvimento das competências para a sustentabilidade e como fomentar em definitivo a cultura da sustentabilidade? Nesse aspecto, considera-se essencial a realização de investigações neste campo, para consolidá-lo, impulsioná-lo e fundamentá-lo e assim contribuir para detectar quais são os obstáculos e como superá-los (VILCHES et al., 2008). Para promover um futuro sustentável não se pode continuar a tentativa de solucionar problemas ambientais específicos e pontuais, fato este, derivado da educação fragmentada que acaba por impedir que se elaborem soluções mais consistentes e exitosas.

5 Considerações finais

Na metade da Década de Educação para Desenvolvimento Sustentável, foi realizada uma análise e considera-se que as sementes da pesquisa em EDS têm sido implantadas, mas que o suporte para tais pesquisas, especialmente no ensino superior, parece ainda bastante limitado (UNESCO, 2009). A educação é um pilar do desenvolvimento sustentável. As sociedades do amanhã serão moldadas pela capacitação e pelos conhecimentos adquiridos hoje (UNESCO, 2012). De maneira particular, no caminho por um desenvolvimento sustentável na Terra, impõe-se continuarmos a sensibilização dos futuros professores e dos professores em exercício para a mudança de atitude face ao ensino das ciências, através do confronto com novas propostas didáticas inovadoras, enquanto resultados de investigação (PAIXÃO et. al., 2010). 

O ensino de ciências e biologia precisa estar focado nas tendências atuais que definem uma educação para o desenvolvimento sustentável e, faz-se necessária a implementação de pesquisas que contribuam com dados relevantes que possam ser utilizados para a discussão e maior aplicabilidade dos princípios do desenvolvimento sustentável. Na formação do futuro profissional de educação com postura ética e cidadã, tendo como foco a relação sociedade e natureza, estes devem atuar em uma nova prática educativa no sentido de promover, junto às escolas, um modelo de desenvolvimento sustentável local, partindo de uma visão interdisciplinar sobre sustentabilidade.

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Ilustrações: Silvana Santos