Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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12/03/2015 (Nº 51) CONDIÇÕES DE VIDA, EDUCAÇÃO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE
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CONDIÇÕES DE VIDA, EDUCAÇÃO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE

 

Fábio dos Santos Massena1, Salvador Dal Pozzo Trevisan2, Christiana Cabicieri Profice3 

 

1Doutorando em Desenvolvimento e Meio Ambiente pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC). E-mail: fabiomassena@gmail.com

2Orientador e professor do Departamento de Ciências Agrárias e Ambientais da UESC. Email: salvador@uesc.br

3Co-orientadora e professora do Departamento de Filosofia e Ciências Humanas da UESC. Email: ccprofice@uesc.br

 

RESUMO

Com base na legislação nacional e em reflexões teóricas publicadas sobre a relação sociedade-conservação de recursos ambientais em unidades de conservação, particularmente, em Áreas de Proteção Ambiental (APA), assim como em observações de campo, busca-se, neste artigo, estabelecer vínculos ou vislumbrar as distâncias que persistem entre a teoria/o discurso e a prática sobre o assunto. Resultante dessas relações traz-se uma caracterização de como se encontram as condições de vida e a relação com o ambiente das comunidades do Retiro e da Tibina, situadas na APA da Lagoa Encantada e Rio Almada, localizadas no município de Ilhéus, BA. A partir deste diagnóstico apresenta-se uma análise sob o olhar da Educação Ambiental. Os dados foram coletados através de um questionário e de observação in loco, que possibilitaram o desenvolvimento descritivo e analítico desta pesquisa. O fato das comunidades estarem inseridas em uma Unidade de Conservação não tem afetado a forma como os indivíduos interagem com o ambiente. A falta de informação, de orientação, de projetos ou programas de educação ambiental podem ser fatores geradores desta situação. Para que os aspectos teóricos e ideais sejam colocados em prática a realização de propostas e ações de sensibilização para uma mudança de valores éticos e morais frente aos problemas socioeconômicos e ambientais.

 

Palavras-chave: Área de Proteção Ambiental, Qualidade de Vida, Comunidades Rurais.

 

ABSTRACT

Based on national legislation and in theoretical reflections published on the society-conserving environmental resources in conservation units, particularly in Environmental Protection Areas (APA), as well as in field observations , search, in this article, establish ties or glimpse the distances that exist between the theory/discourse and practice on the subject. Resulting from these relations brings a characterization of how are the conditions of life and the relationship with the environment of the communities of the Retiro and  Tibina, situated in the APA of "Lagoa Encantada" and "Rio Almada", located in  Ilheus, BA. From this diagnosis presents an analysis under the gaze of Environmental Education. The data were collected through a questionnaire and observation spot, which enabled the development descriptive and analytical research. The fact that the communities are inserted in a Conservation Unit has not affected the way in which individuals interact with the environment. The lack of information, guidance and projects or programs of environmental education can be factors generating this situation.For the theoretical aspects and ideals are put into practice the realization of proposals and awareness-raising for a change of ethical and moral values across the socioeconomic and environmental problems.

 

Keywords: Environmental Protection Area, Quality of Life, Rural Communities.

 

 

1 Introdução

Problemas ambientais e sociais, crises econômicas e políticas, são cada vez mais divulgados e popularizados, pelas diversas mídias disponíveis. Esses problemas afetam a qualidade de vida de diversas populações, tanto no Brasil quanto no mundo. “As pressões diárias das dinâmicas urbanas e rurais colocam em questão o atual estado de desenvolvimento psicossocial das pessoas que nelas vivem e seus desdobramentos aos próprios limites naturais que as subsidiam” (PASSIG, 2011, p.7).

É nessa relação com o ambiente que o ser humano se desenvolve, estabelecendo conexões de interdependência, que afetam sua vida cotidiana bem como resultam em alterações no próprio ambiente (FERNANDES, 2002).

Embora seja um equívoco estabelecer uma relação de causalidade entre conservação do meio ambiente e pobreza, inúmeros estudos destacam a importância de se ultrapassar a fantasia da conservação desvinculada das condições de vida das populações humanas que vivem nessas áreas ou no seu entorno (SANTOS, 2004; ROMÃO et al. 2005; SCHERL et al.,2006; SACHS, 2008; entre outros). Neste sentido, a redução da pobreza das comunidades localizadas nas áreas de proteção ambiental, embora esta não seja uma função expressamente prevista na Lei é um mecanismo que pode trazer importantes contribuições para a conservação dos recursos ambientais dessas unidades.

Estudos desenvolvidos por The World Conservation Union (Apud SCHERLS et al., 2006) ressaltam a importância em se estabelecer uma relação entre criação e gestão dessas áreas com a pobreza em países em desenvolvimento. Por questões práticas, uma vez que as populações mais pobres, inseridas nestas áreas, estabelecem um grau de maior dependência com a terra, o que deve ser levado em consideração na gestão desses locais. Também por uma questão ética, pois não se pode falar em justiça social se as aspirações e os direitos daquelas comunidades, não forem incorporados nas estratégias de conservação. É a partir desta perspectiva que a educação ambiental se enuncia como uma estratégia de gestão de territórios, atualizando junto à comunidade seus riscos e oportunidades, integrando-as de fato à iniciativa de proteção e manejo de seus recursos.De acordo com as recomendações da International Union for Conservation of Nature (IUCN), no seu V Congresso Mundial de Parques, “as áreas protegidas não devem ser concebidas como ilhas de conservação isoladas do contexto social, cultural e econômico na qual estão inseridas” (SCHERL et al., 2006).

Com base na legislação nacional e em reflexões teóricas publicadas sobre a relação sociedade-conservação de recursos ambientais em unidades de conservação, particularmente, em Áreas de Proteção Ambiental (APA), assim como em observações de campo, busca-se, neste artigo, estabelecer vínculos ou vislumbrar as distâncias que persistem entre a teoria/o discurso e a prática sobre o assunto. Resultante dessas relações traz-se uma caracterização de como se encontram as condições de vida e a relação com o ambiente das comunidades do Retiro e da Tibina, situadas na APA da Lagoa Encantada e Rio Almada, localizadas no município de Ilhéus, BA. A partir deste diagnóstico apresenta-se uma análise sob o olhar da Educação Ambiental.

Para a coleta de dados ocorreu através da aplicação de um questionário e de observação in loco, que possibilitaram o desenvolvimento dos aspectos descritivos e analíticos deste estudo.

 

2 Áreas de Proteção Ambiental e sua função socioambiental

A lei 9985/00 que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) estabelece que as unidades de conservação, criadas pelo Poder Público, são territórios com limites definidos, compostos por recursos naturais especiais e tem o objetivo primordial de conservá-los. Outros instrumentos legais como o Novo Código Florestal (Lei 12651/651) que revoga as Leis 4.771/65, 7.754/89 e a Medida Provisória 2.166/67, de 24 de agosto de 2001, que altera ainda a Política Nacional de Meio Ambiente (Lei 6.938/81), o próprio SNUC (Lei 9.393/96) e a Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428/06), também dão atenção especial à conservação e preservação dos recursos naturais.

Estes e outros documentos corroboram a ideia controversa da atenção especial aos recursos naturais, muitas vezes, sem considerar a realidade das pessoas e grupos humanos que vivem no local. Controversa, pois a preocupação com os recursos naturais é, muitas vezes, objeto apenas de leis e discursos, porém, muitas vezes, estas proposições teóricas não são colocadas em prática.

Evidentemente que a proteção dos recursos naturais é de fundamental importância para a manutenção de todos os sistemas ambientais do planeta, porém, pensar na conservação ambiental sem considerar o homem é, a nosso ver, uma escolha equivocada de planejamento e consequentemente de gestão.

A Agenda 21[1], em seu terceiro capítulo, destaca que “uma política de meio ambiente voltada sobretudo para a conservação e a proteção dos recursos deve considerar devidamente aqueles que dependem dos recursos para sua sobrevivência, ademais de gerenciar os recursos de forma sustentável” (CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE, 1997, p. 31).

As APAs, que estão inseridas no Grupo de Unidades de Conservação de Uso Sustentável pelo SNUC, são áreas geralmente extensas com características naturais, paisagísticas e culturais especiais (BRASIL, 2000). Para o Ministério do Meio Ambiente, considerar essas características é de fundamental importância quando se trata da manutenção da qualidade de vida e bem-estar das comunidades nela inseridas. Além disso, devem primar pela proteção da biodiversidade, pelo ordenamento do uso do solo e pela sustentabilidade dos recursos naturais (MMA, 2014).

Scherl et al (2006) ressaltam que avaliar a relação entre criação e gestão de áreas protegidas com a pobreza é algo de fundamental importância, principalmente em países em desenvolvimento, tanto por questões práticas quanto por questões éticas. Os autores referem-se aos aspectos práticos, em função do alto grau de dependência que as populações mais pobres estabelecem com a terra nestas áreas e aos aspectos éticos devido à necessidade de se considerar as aspirações e os direitos daquelas comunidades nas estratégias de conservação.

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente (1997) dá ênfase a essa mesma linha de pensamento, quando reconhece e recomenda que planos estratégicos voltados para a redução da pobreza devem ser traçados, uma vez que é um fator determinante para o alcance do desenvolvimento sustentável.

A pobreza é considerada não apenas em casos onde há insuficiência de renda, pois fatores como más condições de educação e saúde, a falta de acesso a ambas, restrição do uso e disponibilidade a comunicação, a ausência de confiança e autorrespeito e o exercício da cidadania devem ser inseridos quando se pretende conceituar e/ou pesquisar parâmetros referentes à pobreza (SALAMA e DESTREMAU, 2001 e SEN, 2000; 2001). A percepção sobre pobreza é algo bastante particular e poderá variar de acordo com cada indivíduo ou grupo humano, ou seja, não se pode simplificar ou classificar uma determinada pessoa ou grupo como em certa escala de pobreza, apenas pela sua capacidade de consumo.

Scherl et al (2006, p. 15) ressaltam que a concepção de pobreza “é uma condição multifacetada envolvendo diversas, e normalmente interconectadas, dimensões econômicas e sociais”. Por isto, a falta de estratégias e ações que levem estes aspectos em consideração, principalmente em comunidades inseridas em áreas protegidas, poderá ameaçar a própria conservação dos recursos naturais, que é o objetivo principal das APAs e de outras Unidades de Conservação. McNeely (1992) ressalta que as populações locais devem ser inseridas tanto no processo de planejamento e gestão das áreas protegidas quanto nos benefícios gerados por esta relação.

Phillips (2003) destaca que existe uma evolução nos planos de criação e gestão nas categorias de áreas protegidas, onde a responsabilidade dessas áreas, perspectivas e necessidades das populações locais estão sendo levadas em consideração. Esse envolvimento das comunidades locais na gestão de áreas protegidas, já vem acontecendo e é fortemente incentivado em diversos países do mundo (WESTERN e WRIGHT, 1994; HULME e MURPHREE, 2001).

Diversos são os estudos, documentos e relatórios que recomendam e ressaltam a importância de inserir as comunidades locais no planejamento e gestão das áreas protegidas, bem como de estender a elas os seus benefícios (McNEELY e MILLER, 1984; WESTERN e WRIGHT, 1994; HULME e MURPHREE, 2001; PHILLIPS, 2003). No IV Congresso Mundial de Parques (Declaração de Caracas) foi unânime o reconhecimento de que a gestão de áreas protegidas deve ser realizada considerando as necessidades e preocupações das comunidades locais (McNEELY, 1993).

O Plano de Ação de Caracas fortalece esse argumento quando reconhece em suas recomendações que os interesses das comunidades locais devem ser levados em consideração, principalmente daquelas inseridas em áreas protegidas. Dentre estas orientações, ressaltam que os governantes devem garantir que os processos de planejamento de áreas protegidas, estejam integrados com as propostas de desenvolvimento sustentável das economias e culturas locais, bem como utilizem e aumentem “os conhecimentos locais e mecanismos de tomada de decisão [...] e encontrem formas inovadoras e efetivas de incluir as áreas protegidas nas estratégias de desenvolvimento sustentável e redução da pobreza” (SCHERL et al, 2006, p. 5).

Em meio a esta discussão, surgem os seguintes questionamentos: O que se endente por sustentabilidade ambiental? Como tornar a sustentabilidade ambiental um conceito relevante para as comunidades inseridas em APAs?

Entendendo que as discussões avançam para a necessidade de entendimento da interconexão entre os elementos que compõem o ambiente, cabendo um destaque para colocação feita por Behrens (1999), quando diz que pensar ciência enquanto paradigma quântico, é reconhecer a total interdependência entre todos os seres. Assim, a forma como o indivíduo se comporta e consequentemente interage com o ambiente, são fatores importantes e determinantes na construção da realidade estudada. Este novo paradigma de sustentabilidade deve primar pelo coletivo e não pelo individual, levando a construções sociais sólidas e responsáveis (TRISTÃO, 2010; BOSSEL, 1999).  Faz-se necessário uma ruptura com os padrões de desenvolvimento atual, para que seja possível priorizar o equilíbrio ambiental, a qualidade de vida e a justiça social. Esta interação sociedade/natureza, só será possível com a valorização dos saberes locais, da participação social e do respeito aos valores éticos em todos os sentidos e por todos (JACOBI, 2003; RUSCHEINSKY, 2010).  As colocações de Max-Neef, Elizalde e Hopenhayn (2010) tornam-se pertinentes para este estudo uma vez que destacam que, não se pode pensar em sustentabilidade ambiental, sem que haja melhoria da qualidade de vida dos indivíduos em todos os seus aspectos.

Partindo dessas premissas, adota-se para esta pesquisa a concepção de comunidades sustentáveis estabelecida por Egan (2004), que a concebe a partir de sete dimensões que foram adaptadas em três, da seguinte forma: Dimensão Econômica (disponibilidade de empregos, trabalho e renda para todos; possibilidades de incremento na produção, no comércio e nos serviços locais; disponibilidade de serviços bancários, empréstimos, financiamentos, comércio em geral (farmácias, mercados, mercearias, padarias etc); condições do transporte público, das vias de acesso, dos meios de comunicação); Dimensão Social (senso de identidade da comunidade e de pertencimento local; Comportamento amigável e cooperativo entre vizinhos; baixos níveis de crime e comportamento antissocial com policiamento visível, eficaz; todas as pessoas com oportunidades de vida semelhantes; disponibilidade e oportunidade de serviços de saúde pública, recreação e lazer, educação formal, serviços sociais, esportes e habitação para todos; sistemas de governo responsáveis ​​que permitam a participação ativa e eficaz dos indivíduos e organizações; liderança e parcerias que levem a uma comunidade forte e informada; um senso de valores cívicos, responsabilidade e orgulho local); Dimensão Ambiental (espaços públicos e verdes bem conservados e acessível para todos; alta qualidade do  ambiente construído; eficiência energética, do uso da terra, dos recursos hídricos e minimização de resíduos visando a mitigação dos impactos negativos e aumento dos positivos).

            O nosso segundo questionamento, o de como tornar a noção de sustentabilidade relevante para as comunidades orientando suas concepções e práticas referentes aos recursos do território, será abordado ao longo de nossa discussão sobre os desafios que se colocam para a educação ambiental.

 

3 Percepção como uma dimensão primordial de sustentabilidade

Sobre a percepção e compreensão da realidade, Siqueira e Osório (2001), descrevem que a compreensão do mundo a nossa volta é determinada pela percepção que temos dele. Além disso, afirmam que somente percebê-lo não é suficiente, ações sobre ele são necessárias. Por fim, destacam que o nosso sistema nervoso central se desenvolveu, em sua maior parte, interagindo com o ambiente e através das interações socioculturais nele estabelecidas. Portanto, percepção e ação se encontram intimamente vinculadas não sendo possível tratar de uma sem abordar a outra.

Vasco e Zakrzevski (2010) ressaltam que a forma como cada indivíduo irá perceber, reagir e responder as alterações sobre o local em que vivem é particular, pois a percepção é um processo psicológico complexo, que sofre influências culturais que irão moldar a história de cada pessoa e serão responsáveis pelas expectativas construídas por cada um. Contudo, isso não significa que a percepção seja um processo exclusivamente individual, há uma dimensão social que faz com que as pessoas percebam e ajam de forma semelhante em um mesmo ambiente. Estas mesmas autoras destacam ainda que “estudos da percepção ambiental são de fundamental importância para compreender as inter-relações entre o homem e o ambiente, suas expectativas, anseios, satisfações e insatisfações, julgamentos e condutas em relação ao espaço onde está inserido” (p. 18). Conhecer essa inter-relação possibilita que estratégias para a resolução de problemas socioambientais sejam implantadas e implementadas com maior potencial de eficiência e sucesso.

Ainda tomando como referência o estudo de Vasco e Zakrzevski (2010), corroboramos a ideia de que a forma como o indivíduo sente e percebe os estímulos irá variar em função da sua história de vida, que é construída nas relações sociais por ele estabelecidas. As mudanças ambientais, segundo Harris (1979) e Laraia (2007), irão resultar em mudanças comportamentais, assim como os atributos da linguagem, dos valores e do comportamento são dependentes do ambiente, sendo ele um produtor de cultura.

Importante destacar as colocações de Loureiro (2007) quando ressalta a premência de se enfatizar uma educação voltada para construção de valores e práticas mais sustentáveis, considerando a integridade ambiental, a viabilidade econômica e a justiça social. Esta abordagem educacional possibilitará o entendimento da complexidade e das inter-relações de problemas relacionados à pobreza, degradação dos recursos naturais, violação dos direitos humanos entre outros aspectos que ameaçam o futuro de todos.

Nasce desse contexto a necessidade de dar ênfase a uma perspectiva psicológica quando se discute sustentabilidade de comunidades, uma vez que cada grupo humano é único, assim como cada indivíduo que o compõe. Mendes (2009) considerara esse aspecto como uma Dimensão Psicológica, que deve compor as dimensões de sustentabilidade.

Esta dimensão é descrita por Mendes (2009) como aquela que leva em consideração as emoções do indivíduo, indo além do aspecto social, pois é particular e pode ser determinante entender a forma com que a pessoa se identifica no espaço e no tempo. A percepção tem um papel preponderante para a consolidação dessa proposta, pois é através dela que as interações ocorrerão, como já foi descrito.

Estudos dessa natureza podem ser verificados em Kuhnen (2009), que discutiu a inter-relação entre os contextos ambientais, políticos, sociais, econômicos, culturais, institucionais e os conhecimentos psicológicos, sociais e físicos com foco na sustentabilidade, riscos e vulnerabilidade ambiental.

A dinamicidade que existe entre homem e ambiente é explicada quando “os indivíduos agem sobre o ambiente (por exemplo, construindo-o), mas esse ambiente, por seu turno, modifica e influencia as condutas humanas. Logo, não estamos estudando nem o indivíduo per se, nem o ambiente per se” (MOSER, 1998, p. 122). Quando se trata desta relação, o espaço físico e a dimensão temporal devem ser considerados, por terem relevância e por serem importantes para o estudo das percepções ambientais.

A forma como o indivíduo projeta seu futuro e entende e reconhece sua história, são componentes importantes quando se discute a dimensão temporal, pois é através disso que ele constrói sua identidade local, que também irá influenciar em todo o contexto que será estabelecido na relação do homem com o ambiente.

Wiesenfeld (2005) e Moser (2003) entre outros, enfatizam essa questão, ressaltando a importância de se conceber o desenvolvimento sustentável a partir das percepções dos indivíduos em relação ao ambiente e entre si, considerando suas emoções, aspirações, desejos, visões de mundo, perspectivas de vida, que entre outros fatores, moldam seu comportamento e que influenciam toda a relação sistêmica homem/ambiente.

 

O desenvolvimento sustentável poderia vir a ser uma referência, desde que servisse para construir novas formas de relação entre os seres humanos e desses com o ambiente. [...] o grande para­doxo do desenvolvimento sustentável é manter a sustentabilidade, uma noção das ciências da natureza, com o permanente avanço na produção exigida pelo desenvolvimento, cuja matriz está na sociedade (RIBEIRO, 2001 apud PAULISTA, VARVAKIS e MONTIBELLER-FILHO, 2008, p. 192).

 

Essa relação paradoxal é a responsável pela discussão em debate. Portanto, conhecer/identificar como o indivíduo percebe seu ambiente, como o avalia, como se sente em relação a ele, é fator preponderante para o estudo e implica levar em consideração os comportamentos associados a esta inter-relação, bem como considerar as inúmeras combinações entre fatores que podem existir (bem-estar, qualidade de vida etc), que são específicas para cada indivíduo e ou família (MOSER, 2003).

Segundo Moser (2003), não há desenvolvimento sustentável sem que as necessidades do indivíduo sejam satisfeitas, ou seja, deve haver congruências entre sustentabilidade e qualidade de vida e bem estar das pessoas.

A discussão sobre este tema, está fundamentada no entendimento de que comunidades sustentáveis são construídas a partir da forma com que os indivíduos que nela residem, sentem, percebem e consequentemente inter-relacionam-se com aquele ambiente. Sendo assim, documentos, leis, e quaisquer outras diretrizes só terão eficiência quando os grupos humanos ao qual foram dirigidos estiverem sensíveis ao que se propõe e entenderem que fazem parte de toda a dinâmica do sistema.

 

4 Material e Métodos

O Município de Ilhéus, localizado ao Sul da Bahia e a 456 km da Capital Salvador, possui uma área territorial de 1.760,111 Km2, 94 estabelecimentos de Saúde (SUS) para uma população de residente de 184.236 pessoas, sendo 89.440 homens e 94.796 mulheres, do total 146.114 são alfabetizadas. O valor médio de rendimento per capita dos domicílios particulares da área rural é de 246,25 reais (1.104,83 reais por situação domiciliar) e do meio urbano de 400,00 reais (2.081,58 reais por situação domiciliar) (IBGE, 2010).

No dia 14 de julho de 1993 foi formalizada a criação da Unidade de Conservação na categoria de Área de Proteção Ambiental (APA), denominada APA da Lagoa Encantada e Rio Almada, através do Decreto n° 2.217/93. Além da lagoa, sua poligonal abrangia os povoados de Castelo Novo, Juerana, Areias, Sambaituba, Urucutuca e Aritaguá, todos pertencentes ao município de Ilhéus. Em função dos aspectos geográficos, geológicos, geomorfológicos, pedológicos e climáticos, a APA possui um aspecto sui generis apresentando em um único espaço uma grande quantidade de ecossistemas com alta diversidade, que são o centro dos debates em torno da crise ambiental, por serem proporcionalmente frágeis (V&S, 1996).

Supõe-se que as comunidades inseridas no contexto da APA, deveriam possuir em sua essência (principalmente por orientações e intervenções do poder público, que estabeleceu essas áreas) a proposta de sustentabilidade, na sua perspectiva mais ampla, aliando conservação do ambiente, justiça social, equilíbrio econômico e respeito a cultura dos povos locais. Sendo assim, este estudo, que se propõe a ser descritivo e analítico, envolveu as comunidades do Retiro e da Tibina, pertencentes ao Distrito de Aritaguá, do município de Ilhéus – Bahia - Brasil. Povoados com características muito singulares, se comparados às demais comunidades pertencentes ao mesmo Distrito.

Retiro e Tibina, que são compostas por 162 domicílios e um contingente populacional de 571 pessoas, possuem um acesso restrito ao centro urbano e a influência externa do que se refere aos aspectos social, político, ambiental, cultural entre outras é de baixa intensidade. Não há evidências de fluxo turístico, muito menos industrial de grande porte em nenhuma delas. Nas duas comunidades selecionadas, seus moradores se autoclassificam como pertencentes a uma comunidade rural. Em função do número de domicílios[2] identificados e do entendimento de que a opção por levantamento populacional e não por amostra traria maior precisão ao estudo, em ambos os povoados optou-se pelo N Total. Assim, o questionário foi aplicado a 162 pessoas maiores de 18 anos, sento 66% do gênero feminino e 34% do masculino. Cada aplicação levou em média 20 minutos.

A coleta de dados[3] foi realizada através de um questionário e de observações in loco, o que possibilitou desenvolver os aspectos descritivos deste estudo. Os dados que são apresentados por meio de escala, possuem valores crescentes que vão de 0 a 4. Proposição alicerçada no trabalho de Likert, Roslow e Murphy, conhecida como Escala de Likert, que é recomendada por White, et al (2005). Os valores foram definidos da seguinte forma: o zero (0) representou o nível menos aceitável, ou seja, de total insatisfação ou discordância e o quatro (4) representou o mais aceitável, ou seja, de total satisfação ou concordância. Aqueles contidos entre zero e quatro foram apresentados como: insatisfação ou discordância (1), média satisfação ou concordância (2) e satisfação ou concordância (3).

Os autores acima mencionados referem-se principalmente ao uso de um número ímpar de escalas. Neste estudo optou-se pelo intervalo de 0 a 4 e não de 1 a 5 ou qualquer outro intervalo, porque na realização do pré-teste, verificou-se que alguns indivíduos sentiam-se contrariados ou insatisfeitos em ter que pontuar como 1 (um), uma determinada situação que, na sua opinião, era totalmente ruim, ou seja, o número um (1) ainda representava alguma coisa e o zero (0), para ele não significava nada, o que refletiria melhor sua resposta/opinião.

 

5 Condições de vida das comunidades rurais inseridas em APA

Os dados discutidos a seguir, têm como base, além dos aspectos teóricos já apresentados, a concepção de Comunidade Sustentável estabelecida por Egan (2004), com as devidas adaptações.

Pesquisas realizadas em órgãos Municipais, Estaduais e Federais demonstraram que inexistem informações referentes às comunidades estudadas, portanto, todos os dados apresentados são resultado desta pesquisa.

Percebe-se que as casas construídas no povoado possuem características diversas, tanto em relação ao tipo de material utilizado quanto ao tamanho. Quanto à matéria prima utilizada, verifica-se o uso de madeira, alvenaria e até mesmo de pau a pique. Referente ao tamanho dos domicílios é possível encontrar casas que possuem desde um cômodo apenas até domicílios com mais de 3 quartos, mas todos com  características bastante simples.

Inexiste qualquer tipo de unidade de saúde, fazendo com que as demandas neste sentido exijam um deslocamento ao centro urbano, uma vez que na Ponta da Tulha, local mais próximo que dispõe de um Posto de Saúde, a presença de médico é rara e imprevisível. Não há um local de recreação e encontro dos moradores (com exceção dos templos religiosos).

Quando se faz referência ao consumo de produtos por parte da comunidade, é importante destacar que no povoado não há estabelecimentos comerciais como mercados, farmácias, padarias ou mercearias. Observam-se apenas alguns bares que suprem necessidades mínimas da comunidade. Além disso, não existe nenhuma unidade de policiamento ou qualquer outro tipo de serviço que seja oferecido ou disponibilizado para a comunidade, além de uma unidade escolar que é gerida pelo município.

Referente à unidade escolar as comunidades possuem “salas Isoladas” de Educação Infantil e Ensino Fundamental nas séries iniciais, que pertencem à Escola Sede de Aritaguá II, localizada na Ponta da Tulha. A denominação “sala isolada” é assim definida, pois são pequenas unidades escolares pertencentes a escolas matrizes, mas apesar do nome, são estruturalmente compostas por duas salas, dois banheiros, uma cozinha e um local que serve como biblioteca, sala de professores entre outras funções.

A aparente proximidade que as comunidades possuem do centro urbano de Ilhéus (em média 35 quilômetros, sendo 7 de uma estrada de terra), apresenta estradas em condições precárias, que raramente recebem manutenção. Na maioria das vezes, os trechos mais críticos são recuperados pelos próprios moradores. Esta precariedade transforma o acesso a estas comunidades uma tarefa demorada e, a depender das condições climáticas, uma missão quase impossível, experiência vivenciada na ocasião de coleta de dados desta pesquisa. Por ser a principal via que a comunidade possui para acessar outras localidades, inclusive o centro urbano de Ilhéus, gera uma forte dependência quanto a sua acessibilidade, ou seja, se a estrada está inacessível, o morador não consegue sair ou entrar na comunidade, características essas que refletem na forma com que os moradores a qualificam, gerando um índice de percepção de 0,43, que de acordo com a escala adotada e se avaliada isoladamente, expressa a total insatisfação dos locais.

Aliado às condições ruins da estrada, o povoado conta com apenas três horários de transporte coletivo, distribuídos da seguinte forma: um pela manhã, um no início da tarde e outro ao final da tarde. O nível de 1,18 representa a insatisfação dos moradores quanto à disponibilidade deste serviço.

Foi possível identificar a existência de Associações de Moradores, reconhecidas por alguns dos entrevistados como representantes de seus anseios e necessidades. Porém o índice de participação é muito pequeno, ou seja, apenas 18,5% dos indivíduos participam.

Com relação à fonte de renda, o resultado que merece destaque é a multiplicidade de atividades desenvolvidas pelos moradores, não havendo uma predominância de agricultores, o que era de se esperar em um contexto rural. Apenas 14% possuem algum vínculo com a agricultura; mais de 23% são aposentados; 4,3% são assalariados; 9,3% não possuem um emprego fixo, realizando prestações de serviços diversos; 3,1 % tem atividades no comércio; 19,8% tem como única fonte de renda o Bolsa Família; 2,5% são pescadores e os demais não possuem qualquer tipo de renda. Esta realidade vem corroborar as colocações de Abramovay (2000), quando ressalta que são fortes as evidências de uma multiplicidade de atividades econômicas desenvolvidas no meio rural, que não estão necessariamente vinculadas à agricultura.

Bispo; Mendes (2012), Oliveira; Mendes (2012) e Wanderley (2001), entendem que a complexidade do rural, vai além da compreensão dos aspectos econômico, político e urbanístico, ou seja, deve-se levar em conta o modo de vida, as representações sociais e os aspectos culturais de cada espaço. Abramovay (2000) coloca ainda que uma comunidade rural não é definida necessariamente pela sua atividade produtiva, até mesmo porque, apesar da oportunidade de emprego e renda que são geradas pelas atividades agrícolas nas comunidades rurais, existem fortes evidências de que nestes locais sejam realizadas diversas atividades econômicas, não necessariamente voltadas para o uso da terra.

Os aspectos acima descritos poderão facilitar a compreensão dos dados apresentados a seguir, pois a criação de animais praticamente inexiste nas comunidades, seja para consumo ou para a venda, chegando a apenas 2% do total de domicílios. Apesar de existir espaço disponível para criação de animais, mesmo que reduzido em algumas situações, não foi possível perceber um desejo por parte dos indivíduos em dar início a este tipo de prática.

Das culturas produzidas nas comunidades a mandioca é a que predomina. Esta predominância pode ser percebida em um primeiro contato na área, pois está presente em diversas residências. A respeito do tamanho dos imóveis, a peculiaridade dos locais é que não existem grandes áreas produtivas, mas sim pequenos espaços que normalmente estão associados aos limites da residência.

Algumas características da mandioca (Manihot esculenta) podem explicar esta predominância, pois além da grande importância econômica na região; é uma fonte de carboidratos na alimentação humana; é uma planta perene, ou seja, pode ser cultivada e produzir o ano todo; possui uma boa adaptabilidade a diversos tipos de solo e clima; não tolera temperaturas abaixo de 15ºC, o que praticamente não ocorre na região; quando atendidas as necessidades nutricionais e de tratos culturais, apresenta boa produtividade, porém, mesmo sem o manejo adequado ainda produz em quantidade significativa, pois é tolerante a seca e solos com baixa fertilidade; possui múltiplas utilidades, que vão desde a produção da farinha, da fécula, do beiju, do carimã entre outros.

Bananas, hortaliças, cacau e coco, depois da mandioca estão entre os mais produzidos, pois apesar de necessitarem de tratos culturais mais rigorosos, produzem mesmo sem esse manejo adequado. Em quaisquer que sejam as espécies apresentadas, em nenhuma delas há utilização de máquinas, equipamentos agrícolas movidos a combustíveis fósseis, nem uso de insumos (adubos, inseticidas, herbicidas) em larga escala. Em raros casos e de forma esporádica os insumos agrícolas são utilizados. Estas últimas características podem refletir positivamente na conservação dos recursos naturais.

Todos os aspectos descritos influenciam na renda das famílias e com base no Decreto 8.232/14, que foi um dos critérios utilizados como referência para estabelecer os parâmetros a respeito da renda, é possível verificar que pelo menos 18,9% da população encontra-se em situação de pobreza e extrema pobreza (4,5% extrema pobreza e 13,5% pobreza). Além disso, 68,5% não possuem renda per capita acima de ½ salário mínimo.

Em relação às condições sociais e econômicas, os aspectos mais críticos presentes nas comunidades estão relacionados à total inexistência de serviços de saúde no local, ao atendimento das reivindicações das comunidades, à disponibilidade de emprego, a pouca participação na Associação de Moradores e na Cooperativa, à qualidade das vias de acesso, à frequência dos indivíduos na escola já que 89% deles não frequentam a escola.

A figura 1 apresenta os aspectos socioeconômicos das comunidades, a partir da percepção local e das condições de renda. O que chama à atenção é que, apesar da baixa renda, da inexistência de serviços de saúde, das péssimas condições de emprego no povoado, do descaso do poder público no atendimento às necessidades locais, os moradores expressam grande prazer em viver na comunidade, refletindo nas suas pretensões em continuarem vivendo ali. Além disso, há uma sensação de segurança, mesmo sem policiamento local.

 

Figura 1 – Nível de satisfação e condição de vida dos moradores em relação aos aspectos socioeconômicos.

Fonte: Dados de pesquisa (2014)

 

Na figura 2 apresenta-se um panorama geral sobre o uso dos recursos e a gestão dos resíduos pela comunidade, identificando os aspectos referentes ao uso da água, de energia, da gestão dos resíduos e seu destino final.

 

Figura 2 – Nível de satisfação e condição de vida dos morados em relação aos aspectos ambientais.

Fonte: Dados de pesquisa (2014)

 

A principal fonte de água disponível no povoado são as cisternas (88,2% dos casos), que abastecem as casas de forma coletiva, e a depender da sua vazão pode abastecer entre 3 a 6 famílias. Suas construções são realizadas sem um planejamento adequado, inclusive no que se refere a melhor localização. Algumas estão próximas a locais onde criam animais, em outros casos estão próximas a fossas construídas pelos próprios moradores. Por estes motivos, é uma água passível de diversas contaminações. Ainda que de fonte duvidosa, seu volume disponível é bom e por isto são poucos os momentos em que falta este recurso nas residências. Isso ocorre basicamente quando as bombas que exercem a função de levar a água até os domicílios sofre algum tipo de dano. Por isso o alto nível de satisfação dos moradores, expressado pelo índice de 3,52.

Apesar da quantidade de espaço e de recursos disponíveis para que a comunidade possa fazer uso de plantas medicinais, ainda é mínima a sua utilização. Situação que merece atenção, pois, se fosse gerida de uma forma adequada, reduziria a necessidade de deslocamento da comunidade para o centro da cidade em busca de resolução de problemas simples de saúde, potencializando o uso do tempo e de recursos financeiros.

Os resíduos orgânicos gerados na residência praticamente não são perdidos, sendo disponibilizados aos animais e plantas (85,8%) o que reduz os potenciais impactos que gerariam ao ambiente (3,10). É uma prática adotada pela maioria dos moradores.

Materiais inorgânicos não são reaproveitados e raramente ocorre a coleta por parte do poder público, levando os moradores a enterrarem (1,9%) ou queimarem (75,9%) o lixo. Esse comportamento faz com que o índice da variável destino final seja de 2,04 e uma Moda de 2, ou seja, é um comportamento adotado pela maioria dos moradores.

Uma boa parte (77,2%) dos domicílios faz o uso de lâmpadas fluorescente (3,12), porém alguns indivíduos relatam que, mesmo entendendo que as lâmpadas fluorescentes sejam mais econômicas, as incandescentes duram mais tempo. Esta situação gera neles impressão de economia, uma vez que não precisam estar comprando novas lâmpadas com frequência. No que se refere ao consumo, é percepção equivocada, pois segundo o Ministério de Minas e Energia, as lâmpadas fluorescentes podem chegar a 80% de economia em relação às incandescentes e apresentarem uma vida útil 25 vezes maior. Porém, sobre a compra de novas lâmpadas, pode existir certa coerência, uma vez que certas marcas fluorescentes possuem uma durabilidade duvidosa.

O fornecimento de energia é feito pela concessionária responsável pela distribuição no Estado da Bahia e segundo os moradores não há uma falta constante de energia, o que leva o nível desta variável para 2,90. Os moradores que estão localizados em áreas mais isoladas sofrem um pouco mais, alegando que a descontinuidade do fornecimento ocorre às vezes.

O destino dado ao esgoto gerado na residência é basicamente reduzido a dois tipos: fossas sem tratamento (62,3%) e in natura em 37,7% dos casos. Isso gera um baixo nível de sustentabilidade de uso do ambiente (0,69).

 

6 Considerações Finais

Diante das discussões apresentadas, um destaque especial merece ser dado à Bolsa Família, recurso que compõe a renda de muitas das famílias do local e que demonstrou ser um instrumento interessante de comando e controle da melhoria das condições de qualidade de vida das crianças, pelos seguintes motivos: os moradores declaram que anualmente são obrigados a comprovar que a carteira de vacinação da criança beneficiada está em dia, que a frequência escolar está sendo cumprida e que demandam a atenção e o cuidado necessário quanto a nutrição e manutenção das condições físicas do filho ou filha. As primeiras exigências são comprovadas através de documentação e as duas últimas através de pesagem e da observação por parte de técnicos (alguns moradores relatam até que as mãos das crianças são avaliadas para verificar a existência de calos - o que poderia significar trabalho infantil). Com base nestas observações urge o seguinte questionamento para debates vindouros: Este programa social e os pré-requisitos por ele estabelecidos, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das crianças beneficiadas, é potencialmente benéfico para manutenção da sustentabilidade ambiental?

Quanto aos aspectos que se referem especificamente à APA, a comunidade nunca foi consultada ou informada quanto a sua criação; desde sua implementação, nenhum tipo de orientação foi oferecida aos moradores; não bastasse a falta de informações prévias, não se verificou a realização de qualquer projeto ou programa; a única percepção que os locais tem sobre a criação da Unidade de Conservação, é o fato de saber que ela existe, mais nada.

Nota-se na realidade posta que, um dos objetivos principais da educação ambiental que segundo Loureiro (2012) deveria ser a mudança comportamental e de atitudes a partir da compreensão do ambiente, não foi atendido na implantação da APA. Corrobora-se com o autor que esta seria uma ação importante, pois assim haveria a possibilidade de que a realidade fosse problematizada potencializando assim os comportamentos e atitudes mais sustentáveis.

Pode-se inferir, portanto, que a instalação da APA em nada influenciou nas condições de vida das comunidades que vivem dentro dos seus limites. Esta observação demonstra a verticalidade com que são feitos esses planejamentos, sem levar em consideração as necessidades, os anseios e até mesmo sem conhecer o uso que as comunidades fazem dos recursos ali existentes. Loureiro (2007) destaca que no processo de gestão ambiental pública é necessário que haja uma educação que fortaleça o processo participativo dos sujeitos e dos grupos sociais, possibilitando a apropriação das políticas públicas e a reversão das desigualdades no uso e domínio dos recursos naturais.

Urge a necessidade de realização de propostas e ações de sensibilização para uma mudança de valores éticos e morais frente aos problemas socioeconômicos e ambientais. A novidade da questão aqui posta, é que esta sensibilização não deve ser somente direcionada aos moradores das comunidades que estão inseridas em APAs, mas sim para os gestores em todos os níveis e áreas, que são os responsáveis pelas leis, propostas, empreendimentos e gestão dessas áreas e que, consequentemente afetam as vidas de todos.

 

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[1] Documento resultante da conferência realizada em 1992 no Rio de Janeiro, conhecida como Eco 92 ou Rio 92. Seu conteúdo está pautado em propostas de comprometimento dos países participantes da conferência, para a solução dos problemas socioambientais globais, regionais e locais.

[2] O critério estabelecido para a seleção dos indivíduos por domicílio foi o de que ele ou ela deveria ser um dos responsáveis pela residência. Na maioria dos casos o outro representante também estava presente (Quando existia).

[3] A coleta de dados só foi iniciada após a emissão do Parecer Consubstanciado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Santa Cruz, em 14 de março de 2014, sob o CAAE: 14034713.8.0000.5526

Ilustrações: Silvana Santos