Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Práticas de Educação Ambiental
10/09/2018 (Nº 42) WEB 2.0 E A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO DE FORMA INTERATIVA: EDUCAÇÃO E MEIO AMBIENTE
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WEB 2.0 e a construção do conhecimento de forma interativa: educação e meio ambiente.

 

Valdir Lamim-Guedes

Biólogo e Mestre em Ecologia pela Universidade Federal de Ouro Preto.

E-mail: dirguedes@yahoo.com.br

 

Resumo: A interatividade e criação de conteúdos permitidos pela web 2.0 é uma das grandes revoluções em curso atualmente. Apesar dos distintos domínios das ferramentas da web 2.0 (nativos digitais X migrantes digitais), esta barreira deve ser superada, de forma que as atividades educativas possam ser enriquecidas e diversificadas. Neste contexto, a educação ambiental pode usufruir de tais ferramentas, ampliando o seu raio de ação. Por fim, neste texto são apresentadas sugestões do uso da internet em atividades de educação ambiental.

Palavras-chave: web 2.0; Ciberativismo; Educação Ambiental;

 

O conceito de web 2.0 refere-se à “facilidade de publicação online e a facilidade de interação entre os cibernautas” (CARVALHO, 2008, p. 7). “Ela [a Web 2.0] tem sido considerada como a segunda geração de comunidades e serviços, que visa incentivar a criatividade, o compartilhamento e a colaboração de conteúdos e serviços entre os usuários da rede” (COSTA e MARTINS, 2012, p. 2). Em torno deste conceito existe uma grande polêmica, alguns acusando seus criadores de oportunismo, outros enxergando na web 2.0 uma nova forma de utilização da internet que será permanente.

George Gilder, em seu livro Life after television (1992), traz afirmações acerca dos benefícios da tecnologia, além de apostar que a televisão cairá em desuso, uma vez que não há espaço para competir com a internet. Segundo o autor, a informática da comunicação tem um sentido libertador para o indivíduo, pois vivemos uma nova era, em que não haverá mais lugar para a tirania da comunicação de cima para baixo, uma época menos padronizada e mais democrática. Para ele, a revolução da microinformática liquidou com o problema da falta de informação (GILDER, 1992).

Com a web 2.0, a internet passa a ser encarada como uma plataforma, na qual tudo está facilmente acessível e publicar online deixa de exigir a criação de páginas internet ou de saber alojá-las num servidor. A facilidade em publicar conteúdos e em comentar os posts fez com que as redes sociais se desenvolvessem online. Postar e comentar passaram a ser duas realidades complementares, que muito têm contribuído para desenvolver o espírito crítico e aumentar o nível de interação social online. Hi5, MySpace, Linkedin, Facebook, Ning, dentre outros, facilitam e, de certo modo, estimulam o processo de interação social e de aprendizagem (CARVALHO, 2008, p. 8).

Como está apresentado no site de Tim O'Reilly: “o sucesso da web 2.0  O sucesso no mundo da Web 2.0 depende de uma bem-sucedida experiência dos usuários” (O'REILLY, 2005). Portanto, é essencial avançarmos na utilização das ferramentas de interação da web 2.0. Uma área que tem muito a desenvolver é o uso educacional, tanto formal como informal, inclusive na educação ambiental. Dado o volume de informação que pode ser acessado pela internet, “argumenta-se que o papel do professor nesse novo cenário se torna ainda mais essencial” (YUKIHARA, 2012).

Neste ponto, é importante tratar da alfabetização informática, uma barreira muito grande para muitos professores. No entanto, esta barreira precisa ser superada, porque as gerações de jovens atuais. Como apresentado por Cassany e Ayala (2008), é bastante difundida a ideia de que, atualmente, coexistem duas gerações diferentes, uma de jovens – incluindo crianças – e outra de adultos, que compartilham uma mesma tecnologia informática, móvel e multimodal, contudo, a utilizam e a transformam de maneiras distintas e peculiares. Os primeiros a conhecem (chamados nativos digitais), e a segunda que não os conhece (chamados migrantes digitais).

De acordo com Machado e Mandelbaum (2010):

 “os alunos de hoje dificilmente recusam a utilização das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) na aprendizagem. Para eles, as TIC não representam uma barreira à aprendizagem, pois são instrumentos que eles conhecem desde sempre, que apreciam e que dominam com naturalidade. Por outro lado, os docentes, em sua maioria, ainda são da mesma geração da década de 90, que não conviveram com as TIC desde pequenos e aprenderam a aprender e a ensinar com outros tipos de recursos. Os professores, então, têm de se adaptar ao mundo das tecnologias e muitas vezes, têm dificuldade em ‘tirar os pés totalmente do passado’, como um imigrante”.

Neste cenário, torna-se urgente compreender que a nossa sociedade está em constante mutação. Nesse caso, se a educação não acompanhar o ritmo, ficará fora de sintonia com a sociedade e sua qualidade será considerada aquém do desejável. Logo, não é admissível que, em uma sociedade em constante mudança, a educação permaneça imutável (MACHADO e MANDELBAUM, 2010).

A web 2.0 facilita a construção do conhecimento de forma interativa, nos moldes da visão sociointeracionista (VYGOTSKY, 1998), segundo a qual o desenvolvimento cognitivo se dá por meio da interação social em que, no mínimo, duas pessoas estão envolvidas ativamente, trocando experiência e ideias, gerando novas experiências e conhecimento (MOREIRA, 2009). Recentemente, a web 2.0 vem consolidando um novo paradigma de ensino pautado na interatividade, no uso crescente dos recursos oferecidos pelas tecnologias de informação e comunicação (TIC) e na ideia de que a aprendizagem envolve um processo de participação entre elementos de uma comunidade, visando a construção e a reconstrução do conhecimento.

Na educação formal ou escolar, pode-se inserir ferramentas como blogues ou Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA, como o moodle) para colaborar com as ações educativas, ressaltando que a utilização destas ferramentas devem ser auxiliares à prática docente, ou seja, utilizada de forma a contribuir com a atividade educativa. Por exemplo, pode-se criar um blogues para publicar notícias referentes aos assuntos tratados em sala de aula ou favorecer que os alunos debatam algum assunto.

A maior disponibilidade de aulas disponíveis na internet de universidades como do Massachusetts Institute of Technology (MIT), Universidade Stanford e, mais recentemente, da Universidade de São Paulo (USP) (veja, por exemplo, o Veduca[i]) tem trazido novo ímpeto à discussão do papel do professor na sala de aula (YUKIHARA, 2012).

Ações educativas não-escolares são facilmente acessadas por vídeos no Youtube ou em blogues, assim como no Veduca. Neste sentido, podemos obter informações sobre os problemas socioambientais ou participar de campanhas através da internet. Quando se trata de educação ambiental, isto torna-se essencial.

A Educação Ambiental é entendida como a formação de uma consciência que, sensibilizada com os problemas socioambientais, volta-se para a formação de uma sociedade sustentável, na qual a compreensão da interdependência entre os fenômenos sociais e naturais permite que humanidade e natureza busquem uma forma de vida mais harmônica e compartilhada (WEID, 1997). Dentre os objetivos da educação ambiental apresentados em Tbilisi (1977), destacam-se: promover meios de mudanças de atitudes e valores que geram sentimentos de preocupação com o ambiente e motivam ações que o melhorem e o protejam; desenvolver capacidades que possam ajudar indivíduos e grupos a identificar e resolver problemas ambientais; e promover o envolvimento ativo dos indivíduos em todos os níveis da proteção ambiental (SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE DE SÃO PAULO, 1994, p. 28).

A educação ambiental, devidamente entendida, deve ser constituída por uma prática educacional permanente, geral, que reaja às mudanças produzidas em um mundo em rápida evolução (DIAS, 2001, p. 105). Neste sentido, o acesso à informação pela internet permite que o indivíduo possa aumentar seu conhecimento sobre os problemas socioambientais. Sobretudo, porque estes problemas são variáveis quanto à escala (de locais a globais) e apresentam-se de forma dinâmica no tempo e no espaço.

Aliado à difusão da informação, a web 2.0 permite o envolvimento dos indivíduos com a causas ambientais, por exemplo, participando de campanhas veiculadas pela internet. Um exemplo recente foi a campanha “#VetaTudoDilma” (o símbolo # indica as hashtags utilizadas no Twitter), que pressionou a Presidenta Dilma Rousseff para vetar o Novo Código Florestal. Este tipo de iniciativa tem sido chamada de ciberativivmo, uma forma de ativismo pela internet, também conhecida como ativismo online ou digital, e utilizada para divulgar causas, fazer reivindicações e organizar mobilizações (VASCONCELOS, 2008).

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Figura 1: banner da campanha #vetaTudoDilma, com o ator Wagner Moura (Fonte: http://dilmavetatudo.tumblr.com).

A importância das redes sociais para o debate sobre os problemas ambientais fica clara nesta mensagem, publicada no perfil do Portal Ecodebate, da rede social Facebook.

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Figura 2: mensagem publicada no perfil do Portal Ecodebate, na rede social Facebook.

A participação da web 2.0 nas nossas vidas é um caminho sem volta. Portanto, o que devemos fazer é buscar colocá-la como uma aliada para as nossas vidas. Além de uma forma de lazer (por exemplo, no caso das redes sociais), também percebê-la como um meio de facilitar a interação entre as pessoas em diversos contextos, inclusive em ações educativas ou referentes ao meio ambiente.

 

Sugestões de Atividades usando a web 2.0

1. Criação de um blogue ou página no Facebook.

Atualmente, pode-se criar facilmente um blogue gratuito, por exemplo, na plataforma Blogger ou Wordpress, assim como existem vários tutoriais disponíveis online, explicando como criar e administrar um blogue. Este blogue pode virar um espaço gratuito e de fácil manutenção, voltado para receber denúncias, divulgação de informação ou notícias e convergir à comunidade em prol da qualidade ambiental.

As páginas no Facebook tornaram-se um importante e bastante democrático veículo de comunicação, já que basta ter acesso a internet, uma conta do facebook, que é gratuita, e assim acompanhar as páginas, ou seja, “curtir” as páginas para ter acesso às informações. Exemplo da mobilização que um espaço deste permite é a página “Diário de Classe”[ii], mantida por Isabela Faber, de 13 anos, que publica fotos da infraestrutura da sua escola, localizada em Florianópolis-SC, e questionamentos sobre comportamentos de profissionais da escola. O caso desta página teve grande repercussão nacional (mais de 511 mil pessoas acompanhando a página em dezembro de 2012), levando, entre outras coisas, a uma melhor gestão da escola.

Apesar desta página não se tratar exatamente da temática ambiental, ela também é um indutor de comportamento desejáveis, por exemplo, a habilidade de mobilização, trabalho em grupo. Além disto, permite que os alunos tenham iniciativa, que defendam seus direitos.

2. Participar de uma campanha vinculada pela internet

O professor pode incentivar os alunos a participarem de uma campanha que é veiculada pela internet. Temos alguns exemplos recentes, como boa parte da movimentação em relação às alterações ao Código Florestal (uma das campanhas era a #VetaTudoDilma), sobre a construção da hidrelétrica de Belo Monte (foto abaixo), defendendo o desmatamento zero (Campanha Desmatamento Zero) ou a campnha em defesa do índios da etnia Guarani Kaiowá, que as pessoas eram convidadas a adicionar “Guarani Kaiowá” ao nome do perfil no Facebook.

É importante que o professor não deixe os alunos entrarem em uma campanha como estas sem que entendam do que se trata o movimento ou a importância do que defendem - por exemplo, no caso da campanha desmatamento zero, o papel das florestas para nós. Desta forma, eles poderão ser críticos e verdadeiramente atuantes quanto ao movimento, não sendo apenas uma atividade carente de sentido.

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Figura 3: foto utilizada na campanha contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte (Fonte: http://tcktcktck.org/2012/06/amazon-citizens-occupy-belo-monte-dam-site-restore-rivers-natural-flow/29382).

3. Produção de um vídeo

A produção de vídeos até cerca de cinco anos atrás era muito trabalhosa e dependia de equipamentos, como uma filmadora, ou uma câmera digital. No entanto, como muitos alunos tem celulares que gravam vídeos, tornou-se muito simples criar pequenos documentários, com entrevistas e filmagens de locais, por exemplo. Além disto, pode-se “hospedar” o vídeo no Youtube ou postá-lo no blogue da turma. Esta integração de diferentes mídias com a web 2.0 são atividades naturais para quem é nativo digital.



[i] Veduca (http://www.veduca.com.br), site brasileiro que hospeda cursos em vídeo de diversas universidades de alta qualidade, trabalhando para democratizar a educação de alta qualidade no Brasil.

[ii] Diário de Classe (https://www.facebook.com/DiariodeClasseSC).

 

Referências Bibliográficas

CARVALHO, A. A. A. Introdução. In: CARVALHO, A. A. A. (org.). Manual de Ferramentas da Web 2.0 para professores. Brasília: Ministério da Educação. 2008. p. 7-14.

CASSANY, D.; AYALA, G.. Nativos e inmigrantes digitales en la escuela. CEE Participación Educativa, 9, noviembre 2008, pp. 53-71.

COSTA, R. M. E. M.; MARTINS, V. Aula 4 – Ferramentas da Web 2.0 e as Comunidades de Prática. Material didático da disciplina Ambientes Virtuais e Mídias de Comunicação. Curso Planejamento, Implementação e Gestão da EaD. Universidade Federal Fluminense, 2012.

DIAS, G. F. Educação Ambiental: princípios e práticas. São Paulo: Gaia. 2001.

GILDER, G. Life after television. Nova York: W W Norton & Co Inc. 1992.

MACHADO, P. E.; MANDELBAUM, R. Por que inovar na educação? Educarede. 2010. Disponível em <http://www.educared.org/educa/index.cfm?pg=internet_e_cia.informatica_principal&id_inf_escola=829>. Acesso em 10/12/2012.

MOREIRA, M. A. Teorias de Aprendizagem. São Paulo: Epu, 1999.

O'REILLY, T. “What Is Web 2.0: Design Patterns and Business Models for the Next Generation of Software”. Publicado em 30/set/2005. Disponível em <http://oreilly.com/web2/archive/what-is-web-20.html>. Acesso em 14/jun/2012.

SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE DE SÃO PAULO. Educação Ambiental e desenvolvimento: documentos oficiais, São Paulo; 1994. 62p.

VASCONCELOS, Y. O que é ciberativismo. Blog Planeta Sustentável. 2008. Disponível em <http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/atitude/conteudo_281598.shtml>. Acesso em 13/Dez/2012.

VYGOTSKY, L. S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

WEID, N. V. A formação de professores em educação ambiental à luz da Agenda 21. In: PÁDUA, S. M., TABANEZ, M.F. (Orgs). Educação Ambiental: caminhos trilhados no Brasil. Brasília: MMA; 1997. p. 73-87.

YUKIHARA, E. Invertendo os papéis na sala de aula. Blog Ciência Prática. 2012. Disponível em <http://cienciapratica.wordpress.com/2012/12/03/invertendo-os-papeis-na-sala-de-aula/>. Acesso em 13/Dez/2012.

 

Ilustrações: Silvana Santos