Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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09/03/2005 (Nº 12) Relato de experiência: Um projeto em torno do filme "A corrente do bem"
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Um projeto em torno do filme "A corrente do bem"

Por Ricardo Pires Armada: Professor Titular de Inglês no Ensino Fundamental e Médio em duas escolas da Rede Pública de São Paulo (estadual e municipal) na periferia da cidade, região de Sapopemba. 

Num momento em que toda a sociedade brasileira está sendo conclamada a lutar contra a violência promovendo ações em prol da paz (o estatuto do desarmamento e a entrega de armas pela população), tomo a liberdade de divulgar  um projeto em torno do filme "A corrente do bem",  que meus alunos e eu desenvolvemos em 2002 e cujas atividades continuo a trabalhar até o dia de de hoje.

A propósito do filme - vale a pena assistir e exibí-lo na escola - o enredo resumido é mais ou menos o seguinte: um garoto, filho de pais separados (que é o perfil do nosso aluno),  e todos seus colegas, têm como missão de seu professor  desenvolver três boas ações que, por sua vez, iriam desencadear três novas boas ações por quem as recebesse gerando uma progressão geométrica para o bem. O garoto não foi muito feliz no seu intento, mas a semente já estava plantada. Outra parte que gostaria de esclarecer é que o trabalho com este filme é um projeto da rede estadual de ensino de São Paulo mas as atividades aqui relatadas foram desenvolvidas por meus alunos e eu.

Como sou professor de inglês, o foco do meu trabalho é a língua inglesa - através da interdisciplinaridade. Bem, da mensagem do filme extraímos várias "palavras  do bem": esforço alegria, paixão, solidariedade, diálogo, família, Deus, caridade, paciência, fé, esperança, perdão, saúde, respeito, educação, amizade, satisfação, amor, união, carinho, harmonia, felicidade, dignidade, caráter, vida, honra, humildade e afeto (estas foram as  principais mas a lista pode ser diferente, desde que as palavras sejam "do bem"). Cada uma dessas palavras forma vertidas para o inglês. Ressalto aqui o gosto pelo uso/manuseio do dicionário manifesto pelos alunos em atividades como esta, sempre um componente/ingrediente a mais, como sempre gosto de ressaltar.  

Em metade de uma folha de sulfite, o aluno desenhou várias argolas unidas em forma de uma corrente, dentro delas o aluno foi escrevendo as palavras (não todas, cerca de 10)  inglês/português, alternadamente. Depois de pronto, decorou seu desenho com lápis de cor e colou a folha em varetas (espeto para churrasco), o trabalho tomou o formato de uma bandeira, "a bandeira do bem", conforme a mensagem do filme. 

Com as mesmas palavras do parágrafo anterior, foram elaboradas "frases do bem" (Eu gosto de carinho/Eu preciso ter paciência/Amor é essencial/Alegria é muito bom/Ter esperança é ter fé/Minha amizade é sincera/Eu tenho caráter,  etc) aproveitando conteúdos gramaticais anteriormente trabalhados. Passamos todas para o inglês e o aluno escolhia a que significasse mais para ele. Numa folha de sulfite o aluno escreve a frase em inglês/português e faz uma ilustração (desenho e pintura ou  recorte e colagem ou com o clipart) que combine com o significado da frase. O trabalho pronto é colocado em uma moldura simples de madeira e o aluno tem um quadro em suas mãos!

A mais recente atividade foi o seguinte: numa folha de sulfite riscada ao meio o aluno monta palavras cruzadas tendo por frase central, na vertical, "A corrente do bem" e vai encaixando na horizontal e vertical as palavras citadas anteriormente, em inglês. Do outro lado do sulfite o aluno enumera  as mesmas palavras,  em português, em colunas (uma  só para as verticais e outra para as horizontais) para orientar quem vê o trabalho. Creio que dessa forma, a atividade funcionou como um dicionário facilitando a fixação do vocabulário. 

Este trabalho pode ser desenvolvido transversalmente podendo envolver as disciplinas de inglês na pesquisa de vocabulário, artes, no recorte, colagem e montagem dos painéis, história e geografia poderão falar sobre as guerras, a fome na África, a violência e o apelo ao desarmamento, etc, português poderá pedir uma produção de texto, uma Composition: “Pay it forward” (o título original), porém, com o texto em português. Cabe lembrar que, mesmo na parte que envolve outros componentes curriculares além da língua inglesa, as palavras chave como o cabeçalho propriamente dito: (date, school, components, class), título do trabalho e títulos internos, sempre são mantidos em inglês e, quanto às atividades que são desenvolvidas em português, poderão ser feitas em inglês se for uma série mais elevada. Creio que cada tipo de atividade citada acima pode se adequar a uma série diferente.

Ocorreu-me agora a possibilidade de utilizar as seguintes canções (que dispensam qualquer apresentação) para serem trabalhadas junto com este filme: "We are the world", “Heal the world”, "Give peace a chance" e "Imagine" que poderão ser ensaiadas em forma de um coral ou um clip - aqui estarão sendo trabalhados o listening e o speaking. Aceito sugestões de outras canções.         

Caso esse trabalho seja feito totalmente no computador, para a parte do desenho, pintura e vocabulário, pode ser usado como recurso o “paint”, e o clip art para uma ilustração isolada, para a parte da "Composition", exercícios, letra das músicas e vocabulário especifico, no “word” . Para a apresentação de suas várias fases no computador, à medida que vai se passando de uma etapa à outra, vai sendo tocada uma ou mais das músicas jás gravadas no computador previamente.

        

Como muitas vezes a escola é acusada de omissão e apatia com relação ao que se passa na sociedade pois não estaria fazendo a conexão com a realidade nos conceitos que trabalha,  creio que nesse caso teremos feito a nossa parte ainda que, como o aluno do filme, são sejamos muito felizes no nosso intento, mas a semente já estará plantada.

Relato: “My team is the best / Working on cardinal and ordinal numbers”

Como nosso aluno não vivencia uma realidade de língua inglesa, é preciso criar estratégias que levem o aprendizado para além da sala de aula, algo que faça parte do seu dia a dia, preferencialmente, do contrário, todo conteúdo se resumirá ao exato espaço físico e tempo de duração da aula.     

Ao invés de o professor apenas passar a relação dos numerais cardinais e ordinais em inglês na lousa, como se costuma fazer e, no máximo, ensinar a pronúncia, este projeto tem por objetivo fixar a escrita também, algo que para o aluno sempre é mais difícil pois, geralmente, ele se lembra da pronúncia e não da grafia. Por isso, esse trabalho visa memorizar os números cardinais e ordinais em inglês partindo de uma realidade observada e vivenciada pelo aluno naquilo que ele tem mais prazer, os esportes, particularmente a paixão pelo futebol, que deixou de ser um esporte exclusivamente masculino há muito tempo. 

O primeiro passo é pedir para o aluno escrever a escalação de seu time – reservas inclusive - fazendo constar ao lado do nome de cada jogador o número de sua camisa e a posição no campo. Tudo isso em português e, caso o aluno não se lembre de tudo mentalmente, poderá pesquisar na internet.

Como a posição dos jogadores em inglês é um vocabulário difícil de ser encontrado em dicionários, eu mesmo passo a relação do vocabulário necessário na lousa (http://www.linguaestrangeira.pro.br/glossario_futebol.htm) e o aluno vai, então, acrescentar à sua lista os mesmos nomes, agora em inglês, inclusive o número das camisas.

E por falar em time preferido do aluno, ele também deverá pesquisar um breve histórico de seu clube, estádio, etc. Esse texto, em português, ficará sob o título “A brief history of the club”. Na mesma folha deve estar o hino do time (pode acompanhar uma introdução esclarecedora), também em português, sob o título “Hymn of the team”, lyrics by..., music by ... Todo time tem seus símbolos, patrocinador (es) e produto (s) que comercializa. Certamente o aluno saberá e deverá representá-los através de desenho/pintura ou recorte/colagem, cada item em uma folha, estas denominadas “symbols” e “sponsored by...”.

De posse da tabela de classificação dos times (pode ser encontrada no caderno de esportes de todos os jornais), é hora de praticar os números. Do lado esquerdo da relação de times encontra-se a classificação, portanto, em números ordinais e ao lado de cada um o aluno escreve o mesmo número por extenso em inglês, acompanhado do respectivo símbolo (1st, 2nd, 3rd, 4th e assim por diante). Do lado direito há várias colunas (jogos, vitórias, empates, derrotas, etc.), tudo especificado em números cardinais. Como as colunas são estreitas e estão na seqüência uma da outra, lado a lado, é preciso fazer uma montagem. Recortam-se as colunas e cola-se uma a uma no sulfite deixando um espaço de alguns centímetros entre elas para que se possa escrever por extenso, em inglês, o número ali citado.

É hora de treinar habilidades artísticas. O aluno vai desenhar e pintar um campo de futebol completo no sulfite demarcando ali cada um de seus componentes (trave, área, local para o início da partida, cobrança de escanteio, pênalti, etc., e o local referente à posição de cada jogador em campo (zagueiro, lateral, etc.). Aqui, todos esses itens deverão ser escritos em inglês no desenho, pois a relação em português já foi feita acompanhando o nome dos jogadores no início do trabalho.

Caso esse trabalho seja feito totalmente no computador, para essa parte do desenho, pintura e vocabulário, pode ser usado como recurso o “paint”, e o clip art para uma ilustração isolada, para a parte de texto, exercícios, letra dos hinos e vocabulário especifico, no “word” e a tabela dos times no “excell”. Para a apresentação das várias fases no computador, à medida que vai se passando de uma etapa à outra, vai sendo tocado o hino do time já gravado no computador previamente.

O desenho do campo de futebol também pode ser desenvolvido paralelamente pelo professor de educação artística que poderá treinar alguns itens específicos de seu componente, por exemplo:

ângulos em geral, retas, perspectiva, figuras geométricas, uso do esquadro, transferidor, compasso, régua, noções de espaço, margem, clareza, pintura, poderá usar papel, quadriculado, milimetrado, para, a partir da medida oficial, praticar técnicas de redução, e, ainda, reproduzir o campo através de maquete.

Na parte de língua inglesa propriamente dita, há um texto “History of football” (autoria desconhecida), atividade para habilitar o aluno no reconhecimento das palavras transparentes, o que vai lhe facilitar bastante a leitura para, a partir daí, entender a mensagem do texto. Há ainda questões que visam trabalhar a gramática já aprendida.

A música do Skank “É uma partida de futebol” vem bem a calhar, pois é quase um hino também, e pode ser utilizada pelos professores de português para ser analisada como uma poesia, (verso, estrofe, rimas, etc.) figuras de linguagem, classes de palavras, questões para interpretação e análise de texto como foco narrativo, espaço, clímax, ou pedir uma produção de texto, uma Composition: “Me, a footbal player”, porém, com o texto em português. Poderá ainda ensaiar um coral ou um clip com a música, no que poderá ser ajudado pelo professor de educação artística.

Outro material que também veio a calhar é o “Guia do Torcedor” (que passa a ser chamado “Supporter’s guide”), elaborado pela Fundação PROCON de São Paulo em função do Estatuto de Defesa do Torcedor (Lei nº 10.671/03). O folheto é cedido em quantidade pelo Procon mediante solicitação das escolas.

O aluno é instruído a fazer a leitura do guia (que deverá ser anexado ao trabalho) e, em seguida, fazer um breve resumo com o título “a brief summary”, porém, em português, e, por último, emitir a sua opinião sobre o mesmo utilizando-se do título “my opinion”.           

Educação física poderá reforçar noções de espírito de equipe, respeito mútuo, teoria e prática das regras do futebol visando até a organização de um campeonato entre as classes envolvidas no trabalho, o que foi feito na semana de 04 a 08/10, com direito a medalhas e fotos. Na semana anterior foi realizada uma reunião entre o aluno capitão de cada time e eu para sortearmos as salas que jogariam cada dia e as regras do nosso campeonato (o que valeria ou não). Havendo campeonato na escola, pode ser feita uma tabela paralela nos mesmos moldes daquela citada inicialmente, porém, preenchida com a pontuação dos alunos ao longo dos jogos.

Há a proposta de visita aos estádios para assistir ao treinamento dos times (já fizemos contatos). Em 01/10 fomos ao CET do São Paulo Futebol Clube assistir um treino dos jogadores do time profissional para delírio das alunas. Foi uma tarde bastante diferente, nem eu esperava que um dia eu estivesse lá na arquibancada (até peguei um autógrafo do técnico). Dia 22/10 fomos ao Palmeiras e o contentamento dos alunos foi ainda maior pois houve mais liberdade no contato com os jogadores, com direito a autógrafos e fotos,  e em 26/11 p.p. fomos assistir ao treino do  Corinthians. Essa seria a parte prática e de lazer do trabalho.

A parte referente ao guia do torcedor citado acima, principalmente no que tange a leitura e discussão com os alunos, também poderá ficar a cargo do professor de educação física.

Ciências poderá argumentar sobre as doenças relacionadas ao esporte (músculos, ossos, stress, limites do corpo, etc.). Há uma questão atualíssima: o dopping!

Matemática, a partir da análise de várias tabelas do mesmo campeonato (que vai até o fim do ano) em momentos diferentes, poderá trabalhar com gráficos referentes à evolução dos times, razão, proporção, porcentagem, PA, PG, etc.

Cabe lembrar que, mesmo na parte que envolve outros componentes curriculares além da língua inglesa, as palavras chave como o cabeçalho propriamente dito: (date, school, components, class), título do trabalho e títulos internos (group, site, song, lyrics, a brief history of the club, hymn of the team, etc.), sempre são mantidos em inglês e, quanto às atividades que são desenvolvidas em português, poderão ser feitas em inglês se for uma série mais elevada. Em princípio, ele foi pensado para a 7ª série.

Com este trabalho creio que terei matado dois coelhos com um único tiro: atividades em língua inglesa dentro da realidade do aluno e a prática da interdisciplinaridade (o foco dos meus projetos) que faz a diferença (vide Revista Nova Escola, ed. 174).

Para conhecer um pouco mais sobre o nosso trabalho, clique  em:


1) Project Supermarket List X Educação para o consumo:

http://www.educacional.com.br/educadores/relatos/relato009.asp 

Este projeto fez parte de uma reportagem da Revista Crescer, Ed. Globo, exemplar nº 97, na Seção Educação/O papel das Escolas,  da 2ª Mostra de Educação para o Consumo no Currículo, da Fundação PROCON SP, na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, em 09/05/02 e também foi objeto de uma  reportagem em 11/11/02  no canal de tv a cabo STV (TV SESC/SENAC), no programa "Filhos", abordando os  Temas Transversais.  

2) Projeto Valorização da língua inglesa:

http://www.educacional.com.br/educadores/relatos/relato005.asp 

3) Project Cidadania e Inclusão/São Paulo from "A" to "Z":

http://www.educacional.com.br/educadores/relatos/relato001.asp

4) Paradidáticos em inglês na sala de aula:

http://www.prof.com.br/fe/proj/proj.asp?proj=10&titulo=Projetos%20/%20Pesquisas

5) Projetos interdisciplinares em geral

http://www.linguaestrangeira.pro.br/projetosem%20ingles.htm 

 

Ricardo Pires Armada (cel.9152-5446)
rparmada@uol.com.br
Professor Titular de Inglês, Ensino Fundamental e Médio

Ilustrações: Silvana Santos