Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início Cadastre-se! Procurar Área de autores Contato Apresentação(4) Normas de Publicação(1) Dicas e Curiosidades(7) Reflexão(3) Para Sensibilizar(1) Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6) Dúvidas(4) Entrevistas(4) Saber do Fazer(1) Culinária(1) Arte e Ambiente(1) Divulgação de Eventos(4) O que fazer para melhorar o meio ambiente(3) Sugestões bibliográficas(1) Educação(1) Você sabia que...(2) Reportagem(3) Educação e temas emergentes(1) Ações e projetos inspiradores(25) O Eco das Vozes(1) Do Linear ao Complexo(1) A Natureza Inspira(1) Notícias(21)   |  Números  
Artigos
16/12/2013 (Nº 46) TURISMO E INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL NA ILHA DE COTIJUBA
Link permanente: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=1685 
  

 

TURISMO E INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL NA ILHA DE COTIJUBA

 

João Gabriel P.Hüffner

Bacharel em Turismo

 

Leonardo Augusto Lobato Bello

Engenheiro Civil

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo principal discutir a ocorrência de impactos ambientais sob a influência da atividade turística na ilha de Cotijuba em Belém do Pará a partir de indicadores de sustentabilidade. Para o alcance do objetivo central foi utilizada uma abordagem metodológica baseada na análise qualitativa das áreas investigadas, partindo da revisão bibliográfica envolvendo os temas turismo, meio ambiente e sustentabilidade em áreas protegidas, e posterior estudo campo a partir da aplicação in loco do método de listagem de impactos ambientais. Os resultados obtidos apontam para uma forte influência do turismo na reprodução de canários ambientalmente degradantes. Aponta-se como causa a ausência de controle sobre o uso e ocupação do solo local, e a falta do planejamento sustentável na ilha.

 

Palavras-chave; Turismo, Sustentabilidade, impactos ambientais

 

1.INTRODUÇÃO

     Este estudo trata do turismo como atividade que usa e se apropria dos ambientes naturais para transformá-los em espaços de consumo e lazer, isso acontece em muitas localidades sem que haja um planejamento prévio dos possíveis impactos gerados pela atividade, transformando o turismo em um agente predatório e ambientalmente insustentável. Neste contexto, a ilha de Cotijuba, área de proteção ambiental pertencente à Belém, apresenta-se como cenário ideal para análise, pois, em seu território repercutem os produtos de sua reconfiguração territorial, pautada na periferização da capital e alteração de sua base econômica a partir do desenvolvimento turístico alheio ao controle e planejamento da área, repercutindo negativamente no meio ambiente local.

      A presente proposta de pesquisa diferencia-se de trabalhos antes elaborados no que tange ao tipo de análise e sua necessidade de aprofundamento, pois, no atual contexto enxerga-se o turismo como uma ferramenta importante na gestão de áreas naturais e protegidas, o que não condiz com a realidade de Cotijuba. Ressalta-se também a carência de fontes bibliográficas referentes ao objeto de estudo e sua dinâmica econômica, social e ambiental.

     Neste sentido, o presente trabalho tem como objetivo principal discutir a ocorrência de impactos ambientais sob a influência da atividade turística na ilha de Cotijuba em Belém do Pará, assim como a ausência de planejamento para a sustentabilidade e educação ambiental na área. E para o cumprimento deste objetivo foi utilizada uma abordagem metodológica baseada na análise qualitativa da área investigada, fundamentando-se em dois momentos; a revisão bibliográfica envolvendo os temas turismo, meio ambiente e sustentabilidade em áreas protegidas, e o estudo de campo a partir da aplicação do método listagem de impactos ambientais.     

      Os dados obtidos em campo revelam cenários impactantes e condizentes com a realidade do desenvolvimento turístico na ilha, com destaque aos problemas provenientes do Lixo, da ocupação irregular, do saneamento e do desmatamento, que causam danos à paisagem e aos ecossistemas locais, provocando a diminuição de espécies importantes para a fauna. E como causa dos potencias impactos percebe-se a ausência de planejamento e controle do uso e ocupação do solo, carência de ações voltadas à educação ambiental de moradores e visitantes, deixando com que a atividade turística se desenvolva aleatoriamente e à margem de qualquer principio de sustentabilidade.

2.A Ilha de Cotijuba

       De acordo com a Segep – Secretaria Municipal de Coordenação Geral do Planejamento e Gestão (2009) o município de Belém capital do Estado Pará é constituído por uma parte continental em forma de península e também por uma área insular composta por 39 ilhas, dentre elas a ilha de Cotijuba (Figura 1).

 

cotijuba 1995.jpg

Figura 1: Ilhas de Belém incluindo Cotijuba

Fonte: SEGEP (2009)

 

        As ilhas de Belém representam cerca de 2/3 do território municipal com uma população que corresponde a 5% da total do município. A ilha de Cotijuba detém a 3ª posição em tamanho e densidade demográfica entre as mais de 30 ilhas pertencentes ao entorno da capital (GUERRA, 2007).

       Os dados sobre o número de habitantes na ilha de Cotijuba são confusos e escassos, o IBGE em 1991 contabilizou 637 habitantes, número este contestado pela FNS – Fundação Nacional da Saúde, que no mesmo ano contabilizou 1.658 moradores, e no ano de 2007 a AMICIA - Associação dos Moradores da Ilha de Cotijuba e Ilhas Adjacentes divulgou um contingente de 4.000 habitantes. Hoje segundo dados não oficiais provenientes da Agência Administrativa do Outeiro – DAOUT, Cotijuba conta com um número de aproximadamente 9.000 habitantes fixos, sendo que nos períodos de férias escolares e feriados a ilha chega a receber cerca de 20.000 visitantes por fim de semana (BELÉMTUR, 1998).

            Cotijuba faz parte do estuário Amazônico, limita-se ao norte pela baía de Marajó; ao Sul pelo furo do Mamão, que a separa das ilhas de Jutuba e Paquetá; à Leste pela ilha de Tatuoca e a oeste pelo canal de Cotijuba, estando a uma distância de 9 Km do distrito de Icoaraci e a 33 Km do centro de Belém. Seu território se estende por uma área de aproximadamente 60 Km² e uma costa de 15 Km de praias de água doce (MARTINS, 2003).

         A ilha de Cotijuba se encontra sob jurisdição administrativa da prefeitura municipal de Belém, fazendo parte do Distrito Administrativo do Outeiro – DAOUT, e através de lei municipal foi instituída como área de proteção ambiental – APA no ano de 1990. Segundo Porto (2006, p.16) “a Ilha de Cotijuba é considerada Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) - Unidade de Conservação Ambiental de Uso Sustentável.”

         De acordo com Loureiro (2005) apud Porto (2006) ARIE é uma área de pequena extensão, com pouca ocupação humana (o que não é o caso de Cotijuba), com características naturais singulares ou que abriga exemplares raros da biota regional e cujo objetivo é manter os ecossistemas naturais de importância regional ou local, ou seja, Cotijuba a partir do previsto em lei deveria ser preservada tendo sua fauna e flora monitoradas mediante ações do poder público o que não vem a ocorrer.

 

3.O Turismo em Cotijuba

     Os ambientes insulares sempre foram alvos de interesses da população vivente nas cidades como locais propícios ao descanso e ao lazer. Diegues (1997, p.3) enfatiza que; “No Brasil, assim como em outras partes do mundo, as imagens das ilhas tropicais invadiram os meios de comunicação sendo vistas como últimos redutos do mundo selvagem, lugares paradisíacos para novas descobertas, aventuras e lazer tranquilo”. Este imaginário descrito como ambiente calmo e natural é o que impulsiona o turismo e a ocupação desordenada em Cotijuba.

     Cotijuba há décadas serve como local de lazer e recreação para os moradores de Belém e vizinhanças, dados da Companhia de Transportes de Belém – CTBEL (2005) registraram 17 mil visitantes ao mês fora da alta temporada e 50 mil passageiros só no mês de Julho totalizando 240 mil ao ano, lembrando que esses registros referem-se aos passageiros que utilizam o transporte oferecido pela prefeitura de Belém, não sendo computadas as viagens em barcos de terceiros ou particulares, com isso supõe-se que a estimativa real ultrapasse os dados oficiais caracterizando o turismo de massa.

       O grande propulsor do turismo em Cotijuba são suas praias de água doce, com mais de 15 km de costa, Cotijuba tem como destaque as praias do Farol e da Saudade, juntamente com a denominada praia do Vai - Quem- Quer localizada na ponta norte da ilha e distante a um quilometro do trapiche (SILVA, 2003).

       Sabe-se que o pleno desenvolvimento da atividade turística de forma sustentável está interligado a diversas questões, tais como o zoneamento da atividade na área, o ordenamento das ações, além do planejamento das instalações perpassando a infraestrutura organizada como requisito básico e, neste aspecto ainda que haja um fluxo turístico tão intenso, Cotijuba apresenta uma infraestrutura precária que atende deficitariamente tanto aos visitantes quanto aos moradores da ilha.

         Enfatizando a questão, o turismo em Cotijuba apresenta-se potencialmente degradante e poluidor, tendo em vista que se trata de uma área de preservação ambiental, onde sua ocupação e atividades inseridas deveriam estar em consonância com um plano de manejo pré-concebido, além de diversos outros aspectos voltados a sustentabilidade ambiental.

            A condição de local turístico mostra a necessidade do desenvolvimento de pesquisas e trabalhos que visem à conservação da Ilha, pois não existe na prática nenhum programa nesse sentido que tenha como objetivo a preservação e manutenção ambiental de Cotijuba (NASCIMENTO, 2002). Para Mesquita & Silva (2010, p.2), “a intensa e acelerada ocupação humana da ilha de Cotijuba nos últimos anos se apresentou como resultado do crescimento do uso turístico do seu território”, o que tem causado forte pressão ambiental, exercida não somente pelos visitantes, mas também pelos que já residem na ilha que se apropriam do espaço de forma impactante.

 

4. Procedimentos Metodológicos

       A pesquisa realizada caracteriza-se como estudo de caso exploratório devido ao seu forte cunho descritivo da realidade do local em questão, tendo a área urbana da Ilha de Cotijuba como objeto de análise.

      O desenvolvimento deste estudo se deu em fases distintas, quase que simultâneas. A primeira etapa consistiu na revisão da literatura pertinente sobre o tema Turismo e impactos ambientais, junto à análise de documentos oficiais envolvendo leis, relatórios e estudos voltados à ilha de Cotijuba incluindo visitas à instituições públicas, como a Secretaria de Saneamento de Belém. Na etapa de campo a pesquisa se constituiu nos seguintes procedimentos; registro fotográfico, análise de mapas e checagem de impactos por meio de listagem de controle de indicadores, culminando na análise critica dos dados obtidos.

     O método de check-list foi aplicado em duas áreas distintas pré-definidas aqui chamados de trecho 1 e trecho 2. O primeiro compreende um trecho de terra batida na Rua Magalhães Barata, usada para o escoamento e transporte diversos desde o trapiche até a avenida principal Jarbas Passarinho localizadas na área urbana da ilha. O segundo trecho compreende a praia do farol em uma extensão de um quilometro.  A figura 2 ilustra os trechos investigados, onde foi aplicada a metodologia do tipo check-list.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


         

       

       

 

 

Figura 2: Trechos 1 e 2 onde foi aplicada a metodologia check List Fonte: Google Maps (2011)

 

 

       O modelo de listagem (check-List) de impactos ambientais empregado neste estudo se baseia na metodologia elaborada por Mauro do Nascimento (2005) no Estado do Amazonas, com a finalidade de caracterizar o ambiente físico visualmente assim como avaliar e quantificar os impactos ambientais em graus de degradação.

      A aplicação do método possibilitou de forma simples avaliar ou ter um parâmetro sobre a condição ambiental da área a partir dos impactos turísticos vislumbrados de acordo com os indicadores listados no formulário.

      Para operacionalizar o check-List foi realizada uma visita in loco no mês de fevereiro de 2011 onde os trechos escolhidos foram percorridos pelo pesquisador realizando a contagem dos indicadores listados no formulário assim como o registro fotográfico dos impactos identificados.

      E dentro do formulário foram elencados os seguintes indicadores; Lixo, danos à vegetação, saneamento, construções irregulares e erosão do solo, sendo contabilizados a partir da visualização nos trechos percorridos.

       Tais indicadores não foram escolhidos aleatoriamente, pois, partem de um raciocínio lógico de apreensão da paisagem e da constituição de seus elementos a partir dos processos resultantes da interação entre as dinâmicas sociais e o meio ambiente. Neste sentido, percebe-se o lixo como um dos principais indicadores visíveis a olho nu de sustentabilidade de qualquer atividade em determinada área, juntamente com a alteração vegetal e os aspectos relativos ao cumprimento de leis e regras de uso e ocupação do solo. 

 

5.Resultados e Discussões

      A análise que segue foi elaborada com base nos dados obtidos por meio do formulário no estilo check-list, além de registro fotográfico e documental sendo dividida de acordo com os indicadores investigados: lixo, danos à vegetação, erosão, ocupação irregular e saneamento, os quais foram interpretados e descritos com o objetivo de identificar e qualificar a variedade de impactos diretos ou indiretos sobre os ecossistemas bióticos e abióticos.

      Vale ressaltar que a aplicação do check-list como ferramenta de análise da situação ambiental a partir de parâmetros qualitativos permeia-se de aspectos subjetivos inerentes a capacidade investigativa do pesquisador, não contemplando com maior profundidade a magnitude e inter-relações dos impactos com o meio, no entanto com o check-list foi possível visualizar e identificar os principais elementos impactados e a possível causa da degradação.

      O modelo de check-list empregado nesta pesquisa representa uma forma simplificada de conhecimento das condições ambientais locais, não possui a profundidade de um estudo de impacto ambiental propriamente dito, porém, pode claramente refletir aspectos importantes da realidade ambiental do local investigado.

       Em Cotijuba os impactos observados e investigados no check-list possuem relação direta com o turismo, como a ocupação irregular e o desmatamento, no entanto, outros estreitam ainda mais sua relação conforme a intensidade das práticas recreativas e de lazer, como o lixo e a perda de vegetação, pois, estão associados ao turismo que influencia a ocupação e urbanização desordenadas, deixando clara a inserção desta atividade nestes dois processos.

 

 

Tabela 1: Formulário Check-list respondido

                         

ITEM /PERGUNTA

TRECHO

1. ACESSO PRINCIPAL

2. PRAIA

                                                             I. LIXO

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

I.a

Ao percorrer a área encontrou lixo?

X

 

 

X

 

 

I.b

A área possui lixeiras?

 

X

 

 

X

 

I.c

O lixo é coletado com frequência regular?

 

X

 

 

X

 

I.d

O lixo coletado tem sempre o mesmo destino?

X

 

 

X

 

 

I.e

O lixo é selecionado e destinado a reciclagem?

X

X

I.f

Há placas orientando quanto destino correto a ser dado ao lixo?

 

X

 

 

X

 

I.g

Existem áreas de despejo de  resíduos?

X

 

 

 

X

 

I.h

Quando não coletado o lixo é enterrado ou queimado?

X

 

 

X

 

 

                                         II. DANOS À VEGETAÇÃO

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

II.a

A área apresenta desmatamento?

X

 

 

X

 

 

II.b

As margens dos rios estão cobertas de vegetação?

 

X

 

 

 X

II.c

Os visitantes costumam levar mudas ou flores retiradas da área?

 

 

X

 

II.d

Foram observados galhos quebrados ou plantas pisoteadas?

 X

 

 

 

X

II.e

Há placas orientando quanto aos cuidados com a vegetação?

 

X

 

 

X

 

II.f

Existem queimadas de áreas verdes visíveis?

 

X

 

 

X

 

II.g

Existe um controle sobre as áreas desmatadas?

 

X

 

 

X

 

III. EROSÃO

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

III.a

São observados sulcos ou outras formas de erosão na área?

 X

 

 

III.b

Neste trecho é comum encontrar raízes expostas na superfície?

 

X

 

 

X

 

III.c

A vegetação das margens dos cursos d’água foi preservada?

 

X

 

 

X

 

III.d

Camadas de liteira (folhiço, serrapilheira) são mantidas  no solo?

 

 

X

 

 

X

III.e

Na  chuva as águas que escorrem carregam muitos sedimentos?

 

X

 

 

X

 

IV. CONSTRUÇÕES IRREGULARES

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

IV.a

As construções existentes estão harmonizadas com a paisagem?

 

X

 

 X

 

IV.b

Há construções abandonadas?

X

 

 

 

X

 

IV.c

Há regras quanto a implantação de novas construções?

 

X

 

 

X

 

IV.d

Existem construções na faixa de praia ou ás margens de rios?

X

 

 

X

 

 

IV.e

Existem construções que ocupam áreas de risco?

 

 X

VI.f

As construções obedecem padrões  estabelecidos por lei ?

 

X

 

 

X

 

V. SANEAMENTO

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

SIM

NÃO

NÃO SE APLICA

V.a

Existem esgotos a céu aberto na área?

X

 

 

 

X

 

V.b

Existe lançamento de esgotos na faixa de praia /igarapés?

 

 

X

 

V.c

Existem esgotos ou fossas próximos a poços artesianos?

X

 

 

 

X

 

V.d

Existe sistema de tratamento de esgoto?

 

X

 

 

X

 

     Fonte: adaptado de Nascimento (2005)      

    As análises foram divididas por trecho para uma melhor compreensão e síntese dos dados, ficando primeiramente o trecho 1 e seus cinco indicadores e, posteriormente o trecho 2 culminando na indicação do grau subjetivo de sustentabilidade das áreas em conjunto.

 

 Trecho 1 - Acesso principal 

-          LIXO

       A problemática do lixo é uma questão bastante ampla a ser discutida, como foi possível analisar durante as pesquisas in loco. Cotijuba até meados da década de 90 resistia às pressões urbanas da metrópole apresentando uma realidade rural baseada em atividades de subsistência, onde temas como lixo não preocupavam moradores e autoridades, no entanto, essa realidade mudou.

        A ilha se reconfigura territorialmente e socialmente a cada dia que passa sob influência de agentes internos e externos como o turismo, com isso temas tipicamente urbanos emergem dentro de um cenário de degradação ambiental e inoperância político administrativa, tomando proporções e dimensões calamitosas. Nesse sentido, dados obtidos na SESAN - Secretaria Municipal de Saneamento (2011) informam que hoje Cotijuba atinge a marca de 7 (sete) toneladas de resíduos sólidos semanais coletados pela prefeitura de Belém entre resíduos domiciliares, comerciais e outros, e nos períodos de férias escolares e feriados prolongados este número aumenta consideravelmente.

       Durante as investigações diversos problemas relacionados ao lixo foram visualizados dentre eles o mau acondicionamento e despejo irregular (Figura 3), estrutura precária de coleta, queima e enterro de resíduos.

COTIJUBA 076.jpg
COTIJUBA 098.jpg
 


 

 

 

 

 

 

Figura 3: Focos de lixo deixados por visitantes espalhados pelo local

Fonte: Autor (2011)

 

II. DANOS À VEGETAÇÃO

     Foi possível observar que o desmatamento ocorre predominantemente em função da ocupação de terrenos por casas de veraneio, bares e pousadas associados diretamente a atividade turística além do parcelamento irregular do solo em virtude da especulação imobiliária promovida pelo turismo na ilha.

     A retirada ou a alteração da cobertura vegetal afeta diretamente a fauna local, quer pela remoção da sua fonte de alimentação, de seu abrigo, ou do local de nidificação (NASCIMENTO, 2002).

 

III. EROSÃO

      Este é perceptível mais como uma consequência do desmatamento verificado na ilha principalmente nas margens ocupadas, como sugere Suguio (1998) apud Salvador de Oliveira (2009, p.2), que “atribui a aceleração do fenômeno erosivo, principalmente à ação antrópica, através do desmatamento que introduz várias modificações no ciclo hidrológico” de tal forma que é possível analisar o processo erosivo a partir da influência do homem na modificação da paisagem natural.

 

IV. CONSTRUÇÕES IRREGULARES

     Segundo Lana Silva (2003) a cada ano que passa a urbanização avança em Cotijuba sob a forma de novas ocupações, principalmente na parte sul da ilha onde esta localizado o trecho 1, neste trecho de acordo com a autora os terrenos vêm assumindo contornos e formas baseadas nos modelos urbanos (10x30 m) em alguns casos ainda menores o que causa preocupação com aspectos relacionados a pressão ambiental exercida conforme esta situação se acentua.

       E a principal causa do uso inapropriado do solo é o turismo sem controle ou planejamento, o qual permite a invasão de áreas de preservação permanente, além de poluição de mananciais, solo e abertura de trilhas sem o menor critério (PORTO, 2006).

 

V. SANEAMENTO

      O quesito saneamento está diretamente relacionado ao item construções irregulares, e se complementa com o desmatamento que é fomentado pela ocupação turística da ilha, ou seja, é uma cadeia de desenvolvimento impactante do turismo.

      Neste quesito foram visualizadas condições insalubres e prejudiciais à saúde humana como também ao meio ambiente.

      Cotijuba não apresenta tratamento de esgoto e dejetos, possuindo fossas e valas a céu aberto.

 

- Trecho 2 – Praia do Farol

I. LIXO

     A orla da praia do farol em Cotijuba caracteriza-se por ser a mais freqüentada por banhistas e visitantes devido à sua proximidade com o trapiche em que atracam os barcos onde o acesso é feito pela Rua Magalhães Barata, além de fatores estruturais que facilitam a permanência do visitante como a presença de pousadas, bares e restaurantes. Em todo o trecho da praia do farol foram encontrados diversos tipos de resíduos, em sua maioria plásticos (garrafas pet, copos descartáveis e sacos plásticos).

    Os altos fluxos de visitantes aliados à ineficácia da limpeza pública fazem com que o cenário de sujeira se agrave e tome proporções preocupantes dada à importância do ecossistema praial para o meio ambiente e para o turismo.

    Outro aspecto preocupante diz respeito à situação das lixeiras encontradas, as quais se encontram em estado de destruição, sem condições de armazenar o lixo depositado (Figura 4).

 

 

COTIJUBA 124.jpg

 

Figura 4: Lixo espalhado pela área e lixeira danificada

Fonte: Autor (2011)

 

II. DANOS Á VEGETAÇÃO

       A área que abrange o trecho referente à orla da praia do farol há muito já apresenta desmatamento devido à grande concentração de atividades antrópicas como o turismo.    Ainda foram visualizadas grandes áreas desmatadas devido o processo de ocupação urbana desordenada atrelada a interesses voltados ao desenvolvimento de atividades turísticas.

                                                                                                                                       

III. EROSÃO

      Na praia do Farol o tipo de relevo não permite a constatação de fenômenos erosivos de qualquer grandeza, portanto é um item não contabilizado no trecho.

 

IV. CONSTRUÇÕES IRREGULARES

       Em Cotijuba foi verificada a presença de construções instaladas na faixa de praia e em barrancos como em toda a extensão investigada constituídas em sua maioria por comércios voltados à prestação de serviços aos visitantes entre bares, pousadas e restaurantes.

       Essas ocupações segundo o Código Florestal Brasileiro Art. 1 são irregulares, pois, estão mantidas sob uma área de preservação imprópria para a construção como também estão em discordância com as regras do Plano Diretor Urbano Municipal – PDU (2008).

 

V.SANEAMENTO

      Quanto ao último item desta análise referente aos indicadores de saneamento no trecho 2 poucos foram os impactos negativos percebidos in loco sendo que neste tipo de ambiente é comum a poluição oriunda do despejo de esgotos e dejetos, como Cotijuba não apresenta rede de drenagem ou tratamento de esgoto toda a captação desses resíduos é feita por fossas sépticas, porém, o que não descarta a possibilidade de contaminação do solo ou aqüíferos, no entanto, para afirmar tal hipótese pesquisas de cunho quantitativo e com a aplicação de métodos de análise desses elementos seriam necessárias.

 

- ANÁLISE DA QUALIDADE AMBIENTAL CONJUNTA DOS TRECHOS 1 E 2

 

     A metodologia empregada propõe um calculo da média de qualidade ambiental baseada nas respostas obtidas com o check-list, chagando a um grau de qualidade subjetivo e com recomendações a cerca da situação da área.

 

- Cálculo da *Média de qualidade ambiental dos trechos.

 

Tabela 2: Tabela Qualidade ambiental

 

 

Pontuação

Classificação

Diagnóstico

 

0 a 20

Ótimo

Apresenta poucos indicadores de impactos e está bem estruturada para o recebimento de visitantes. Pode ser considerado como uma área modelo.

21 a 40

Bom

A quantidade de impactos é pequena e as necessidades de infraestruturas são baixas. Deve-se tomar cuidado com a manutenção e o monitoramento da área.

 

41 a 60

Regular

Já apresenta alguns impactos significativos e carece de algumas infraestruturas há necessidade de intervenção e regulamentação quanto ao uso da área. A consulta a um especialista é recomendada, mas não obrigatória.

 

61 a 80

Ruim

As condições quanto a danos e infraestruturas são criticas, já se fazem necessário uma intervenção mais drástica na área, principalmente para regulamentação do uso e correção dos danos já observados

 

81 a 100

Péssimo

Área com grande número de impactos e praticamente despreparada para o uso turístico ou recreativo. Neste caso recomenda-se a interdição da área ate que medidas de correção dos danos e a implementação de infraestruturas seja concluída.

 

 

Fonte: adaptado de Nascimento (2005)

 

      A partir das análises dos dois trechos investigados convenciona-se ressaltar alguns aspectos importantes das evidências colhidas em campo. Uma dessas evidências é a constatação que ambos os trechos possuem como principais problemas ambientais o lixo e os danos à vegetação.

     Quanto ao lixo, a coleta irregular, o despejo em locais inapropriados, a falta de lixeiras a queima e o enterro de resíduos em áreas aleatórias configuraram como os fatores principais que o caracterizam como um elemento impactante comum aos dois trechos.

      Em pesquisas anteriores autores como Silva (2001) e Porto (2006) de maneira incipiente já alertavam para os problemas relacionados ao lixo e ao desmatamento envolvidos ao incremento da atividade turística na ilha de Cotijuba. Silva (2001) argumenta que a coleta de lixo pela prefeitura de Belém só veio a ser implantada após a regularização da linha de transporte fluvial em 1999, segundo o autor, com o desenvolvimento desordenado do turismo após 1999, o problema do lixo se agravou em Cotijuba, pois, antes todo o lixo produzido se concentrava próximo às residências na área central ou urbana e não representava tanta ameaça, com o aumento do fluxo de visitantes houve algumas mudanças, pois, outras áreas como as praias passaram a ser depósito de lixo devido ao grande volume produzido.

       Já o desmatamento, este é um problema que acompanha a evolução demográfica e urbana da ilha e agravado com o turismo. Antes suas causas segundo Guerra (2000), eram a agricultura, a pecuária e a extração de madeira e areia, hoje este autor explica que o turismo assumiu um papel de protagonista na ocupação desordenada e alteração da cobertura vegetal principalmente na ponta sul. Silva (2001) postula que o turismo promoveu o surgimento de novos problemas relacionados à vegetação em Cotijuba e fez com que outros fossem acentuados tais como: especulação imobiliária (loteamentos e construção de casas para aluguel ou venda), aumento da população e a necessidade de novas plantações; extração excessiva de madeira e a invasão de áreas de preservação (IVALDO SILVA 2000).

       Em Cotijuba o turismo sem controle ou planejamento propicia o uso inapropriado do solo permitindo a ocupação irregular de áreas protegidas além de poluição de mananciais, solo e abertura de trilhas sem o menor critério (PORTO, 2006).

     Obviamente que os trechos investigados não representam a realidade da totalidade do território insular de Cotijuba, pois, ainda existem áreas bem preservadas na ilha principalmente na ponta norte, porém, este estudo busca relatar os impactos negativos do turismo de forma clara e direta observando o avanço da degradação através do exemplo dos trechos 1 e 2 onde devido a fatores geográficos e socioeconômicos o turismo concentra o seu desenvolvimento.

 

6. Considerações Finais

      Este estudo verificou que Cotijuba como área de proteção ambiental legalmente instituída apresenta um crescimento urbano vertiginoso devido à falta de medidas regulatórias e controle do poder público sobre a ocupação do seu território. Esse crescimento se apresenta danoso ao meio ambiente o que influência na conservação ambiental da área.

       Percebeu-se a contribuição do turismo na aceleração do desenvolvimento urbano de Cotijuba, desenvolvimento este caracterizado pela desordem na ocupação do solo, pela favelização, pela ocupação de áreas impróprias e pelo agravamento dos impactos ambientais como os danos à vegetação e a produção de lixo.

       Tanto o lixo quanto os danos à vegetação são reflexos do crescimento urbano desordenado vivenciado nos últimos anos que recebeu impulso da atividade turística atraindo novos moradores e novas ocupações.

      Ao longo da pesquisa ficou claro a influência do turismo na produção de resíduos sólidos nas áreas investigadas bem como no uso e ocupação do solo de forma impactante e sem ordenamento.

      A metodologia empregada mostrou-se eficiente na análise dos indicadores elencados possibilitando um conhecimento amplo acerca dos principais problemas ambientais de Cotijuba assim como permitiu distinguir o turismo e sua influência na transformação ambiental urbana da ilha.

     Percebeu-se com a aplicação do check-list em campo que o lixo caracteriza-se como o protagonista dos principais problemas ambientais identificados nos dois trechos pesquisados onde se registrou diversos pontos de acúmulo de lixo despejado e não coletado.

      Em relação à avaliação de qualidade ambiental, o quadro com os índices permite afirmar que as condições de danos e infraestruturas são criticas requerendo uma intervenção na área, principalmente para regulamentação do uso e mitigação dos danos já constatados.

     Com o incremento do turismo em Cotijuba uma nova dinâmica ocupacional vem sendo gerada onde a atração de pessoas acarreta na expansão urbana a ritmo de favelização, ocasionando a invasão de áreas verdes, especulação imobiliária e poluição.

       Quanto a sua condição legal de Área de Proteção Ambiental, Cotijuba deveria possuir medidas mitigadoras direcionadas a proteção e preservação de sua fauna e flora regulamentadas através de planos de manejo específicos, no entanto, a realidade não atesta a existência de tais medidas e planos cuja incumbência caberia ao poder público municipal o qual permite de forma omissa que Cotijuba se desenvolva com base na degradação de recursos naturais.

 

REFERÊNCIAS

BARRETO, M. Planejamento organização em turismo. 2. ed. Campinas: Papirus, 1996.

BELÉM, Companhia de transporte do Município de. Pesquisa da linha Fluvial Belém

- Icoarací - Cotijuba – Icoarací – Belém ( 1997 e 1999), Belém. 1999.

 

BELEMTUR, Coordenadoria Municipal De Turismo, Inventário Turístico e Ecológico da Ilha de Cotijuba, 1998.

 

DIEGUES, Antônio Carlos. Ilhas e Sociedades Insulares. NUPAUB- Núcleo de apoio à pesquisa de populações humanas e áreas úmidas brasileiras – USP, 1997.

 

GUERRA, Gutemberg. A. Os Efeitos da Ocupação Urbana no Extrativismo Vegetal da Ilha de Cotijuba. Belém-PA, Unama 2007.

GUERRA, G. A. D; CARVALHO, V. R. V. de. Ruralidade na Capital do Estado do Pará. Permanências e Mudanças na Ilha de Cotijuba. In Conservação e desenvolvimento no estuário e litoral amazônicos, Aragon, Luis E. (org.). BELÉM. . UFPA/NAEA, p.210-211.2003.

IMAZON, Belém Sustentável, Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia.  Belém-Pará. 2007.

LOUREIRO, E. C. Comentários à Legislação Ambiental. Belém: SECTAM, 2005.

MARTINS, Alan Kalil Abdon. A ruralidade da ilha de Cotijuba: Um olhar etnográfico. Revista Lato & Sensu, Belém, v. 4, n. 1, p. 3-5, out, 2003.

MESQUITA, T. O. DA SILVA, C.N. Turismo na Amazônia ribeirinha: um estudo sobre as repercussões sócio-espaciais da atividade turística na ilha de Cotijuba, Belém - Pará. Encontro nacional da Anppas. Florianópolis – 2010.

NASCIMENTO, Rafael. Oficina de sensibilização sobre os problemas ambientais da ilha de Cotijuba. MPEG, Belém-PA, 2002.

 

NASCIMENTO, Mauro Do. Turismo e Recreação nas Praias do Baixo Rio Negro – Uma Avaliação Retrospectiva de Impactos Ambientais. Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação em Biologia Tropical e Recursos naturais, do convênio INPA / UFAM – AM, 2005.

PORTO, L. J. L. S.; ROCHA, M. A. B. Da Trilha do Sol à Ilha do Inferno – Cotijuba: Zoneamento Geoambiental. UEPA, engenharia ambiental, 2006.

RUSCHMANN, D. M. Turismo e planejamento sustentável: a proteção do meio ambiente. Campinas: Papirus, 1997.

SEGEP- Secretaria Municipal de Coordenação Geral do Planejamento e Gestão 2009.

 

SILVA, Ivaldo das Dores. Massificação Do Lazer Em Áreas Naturais Amazônicas E

Suas Repercussões Ambientais: o caso da ilha de Cotijuba em Belém. Programa de

pós Graduação em Meio Ambiente, Universidade federal do Ceará, 2001.

 

SILVA, Lana Claudia Macedo da. Lazer, Turismo e Agricultura entre Populações Tradicionais na Ilha de Cotijuba, Belém, Pará - UFPA 2003.

 

SALVADOR DE OLIVEIRA, v.; Holanda, f. S. R. ; Barreto Junior, e. R. Os efeitos naturais, econômicos e sociais da erosão na margem direita do rio São Francisco na sustentabilidade dos agroecossistemas. Revista agrogeoambiental , v. 1, p. 63- 72, 2009.

 

SUGUIO K. Dicionário de geologia sedimentar. Rio de Janeiro: Ed.Bertrand Brasil,

1998.

Ilustrações: Silvana Santos