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ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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16/12/2013 (Nº 46) CONCEPÇÕES DE ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO SOBRE SANEAMENTO BÁSICO
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CONCEPÇÕES DE ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO SOBRE SANEAMENTO BÁSICO

 

Diego Adaylano Monteiro Rodrigues¹ Raquel Crosara Maria Leite²

¹Licenciado em Ciências Biológicas ²Prof.ª Dr.ª do Departamento de Biologia da Universidade Federal do Ceará (UFC)

Contato: diegoadaylano@gmail.com

 

Resumo

                                            

Os maus hábitos da população associados à precariedade do saneamento básico ainda são problemas frequentes nas cidades brasileiras, sendo estes resultantes da falta de programa educativos, que estimulem a mudança individual e coletiva e que promova o aprendizado a partir do que a comunidade já sabe. Esse trabalho tem como objetivo avaliar o conhecimento prévio de estudantes sobre saneamento básico, com intuito de a posteriori realizar uma intervenção pedagógica que contemple aspectos de sanidade do ambiente e educação ambiental. Foram usados questionários avaliativos com questões abertas e de múltipla escolha para 138 estudantes. Os alunos apresentaram dificuldade em compreender todos os eixos do saneamento básico e não souberam relacionar as deficiências desses eixos com as doenças resultantes. 

 

Palavras-chave: saneamento básico, conhecimento prévio, educação ambiental

 

1. INTRODUÇÃO

 

            No final do século XIX surgiram iniciativas de organização no Brasil que incorporaram uma pedagogia higiênica, tendo como alvo a população de famílias elitistas (OLIVEIRA, 2003). Estas medidas foram estimuladas pelo alto índice de mortalidade infantil visando à mudança de seus hábitos higiênicos, o que impôs, segundo Costa (1984) um novo direcionamento na educação física e moral, intelectual e sexual, inspirada nos preceitos de moralidade sanitária, que por sua vez alterou os hábitos coloniais.

            Atualmente, segundo o Ministério da Saúde (2002), as ações de educação sanitária podem colaborar para a promoção da saúde, devendo atuar sobre as condições políticas, econômicas, sociais, culturais, ambientais e de conduta, para que sejam favoráveis a saúde dos indivíduos e de suas comunidades no pressuposto ético de defesa da vida e do desenvolvimento humano.

            A educação sanitária é estimulada nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio quando faz referência à importância da saúde ambiental e que o educador pode: motivar seus educandos a reinterpretarem sua realidade ambiental, perceber a relação entre doenças parasitárias e infecto-contagiosas com a ausência de saneamento, fazer levantamentos na área onde mora sobre o tratamento de água e coleta de lixo e avaliá-los e por fim comparar sua realidade local com a regional e do mundo (BRASIL, p. 46).

            Nos anos de 1926 cria-se os primeiros cursos de formação de educadores que trabalham com a educação sanitária sendo enfatizadas, principalmente nesses cursos, questões de higienização.  Em 1971 a educação para saúde passa ser obrigatória nas escolas e os aspectos de higienização continuam a ser centrais quando se trata de educação sanitária.(CANDEIAS, 1988; MOHR; SCHALL, 1992).

            Uma consequência desse processo histórico é que até hoje a educação sanitária prende-se a transmitir informações sobre agentes etiológicos, ciclo de zoonoses e sintomatologia de doenças, não relacionando estas doenças com problemas ambientais na realidade onde está inserida os aprendizes, explorando o ambiente e as relações de qualidade de vida praticadas, como sugere Mohr e Schall (1992). Estes autores também apontam que essa é a tendência atual da educação sanitária, o que estabelece relações com a educação ambiental.

            A Lei 9. 795 que rege sobre a Política Nacional de Educação Ambiental  em seu Art. 1º esclarece que a “educação ambiental é o meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade”, mostrando que a educação sanitária se integra a educação ambiental. (BRASIL, 1999, p. 1)

A compreensão do que é o saneamento básico, por sua vez, é importante para estimular os indivíduos a cuidar de sua própria saúde e a reivindicar por direitos, portanto é preciso ter conhecimentos sobre o meio ambiente uma vez que a saúde das pessoas depende do meio onde estão inseridas.

 

2. RETRATO HISTÓRICO DO SANEAMENTO BÁSICO

 

            Por vários séculos, o saneamento foi tratado sobre diversas abordagens. Já no final da Idade Média existia uma relação intuitiva entre saneamento do meio ambiente e doenças; as enfermidades eram assim resultantes das condições de vida e trabalho das populações. Concepção esta que foi relegada aos poucos com a evolução da microbiologia (LIMA, 2001).

            Entende-se por saneamento, segundo Menezes (1984), como sendo “o conjunto de medidas que visam modificar as condições do meio ambiente com a finalidade de prevenir doenças e promover a saúde”. Este autor distingue saneamento básico de saneamento ambiental, pois  considera que o primeiro é uma restrição do conceito de saneamento para designar as ações direcionadas ao controle de patógenos e seus vetores, o segundo teria uma abrangência maior e que se relaciona com aspectos culturais, econômicos e administrativos e medidas de uso e ocupação do solo (MENEZES, 1984).

            Apesar de não estar expresso na Constituição Federal de 1988 como um direito social, o saneamento básico está relacionado aos direitos sociais, como à “moradia adequada”  e à “melhoria de todos os aspectos de higiene”, previstos nos artigos 11.1 e 12.2 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômico, Sociais e Culturais (CUNHA, 2011). No entanto em 2007, a Lei Federal Nº 11.445 de 5 de janeiro, estabelece claramente as diretrizes do saneamento básico e o define em seu Art 3º, relacionando-o ao abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, drenagem e manejo de águas pluviais urbanas (BRASIL, 2007, p.2).

        Em 2000 o PNSB (Plano Nacional de Saneamento Básico) indicou que 116 municípios brasileiros não tinham serviços de abastecimento de água por rede geral, refletindo em cerca de 2% do total de municípios brasileiros (IBGE, 2002). Destaca-se que os municípios sem abastecimentos estão concentrados nas regiões norte e nordeste do país, além disso, os investimentos nessa mesma década foram desproporcionais em relação às outras regiões do país. Essa mesma pesquisa expõe que as alternativas usadas pela população são o uso de chafarizes e fontes, poços particulares e abastecimento por caminhões-pipas e o uso direto de corpos hídricos (IBGE, 2002).

            Em 1989, somente cerca de 43,3% dos municípios apresentavam algum tipo de esgotamento sanitário. Esse tipo de serviço cresceu apenas 10 % e o resultado desse baixo desenvolvimento foi que 66,2 % dos municípios brasileiros não tratam seus efluentes, sendo assim despejados seus esgotos em corpos de água, principalmente rios. A região nordeste, por sua vez, apresenta o maior índice de despejo de esgotos não tratados em lagos e lagoas. (IBGE, 2002).

            Ainda em 2000, 60,3% dos municípios brasileiros utilizavam lixões e 32,2% utilizavam aterros sanitários e 5% não informaram onde despejam seus resíduos, contrastando com os dados de 1989 em que apenas 10,7% dos municípios depositavam seus resíduos de forma adequada (IBGE, 2002). O mesmo relatório indica que o destino de resíduos sólidos no Brasil melhorou e indica como um dos fatores que contribuíram para isso é a conscientização da população brasileira.  No entanto a qualidade desejada para o país não foi atingida, pois segundo o mesmo relatório as políticas públicas pouco têm feito pelas populações mais carentes, havendo demanda de investimentos da administração municipal.

           Em 2008, um novo censo foi realizado e o cenário brasileiro mudou significativamente para alguns parâmetros, especialmente quanto ao abastecimento e manejo de águas fluviais. As estimativas de municípios com esgotamentos sanitários no Brasil continuaram baixas, em cerca de  55,6 %, como pode ser visualizado pela figura 1. (IBGE, 2008).

 

 


            Os dados do IBGE (2008) revelam que as doenças de transmissão feco-oral representam cerca de 80% das internações na maioria do período analisado, e que as regiões norte e nordeste apresentam os maiores número de internações por doenças de transmissão feco-oral e por inseto vetor. Em 2008, o número de casos de dengue aumentou em relação ao período de 2005, o que elevou o índice de internações causadas por doenças transmitidas por inseto vetor. Esse mesmo relatório revela um decréscimo no número de internações hospitalares por doenças relacionadas ao saneamento ambiental.

            Essas mudanças no saneamento presente no Brasil são consequência do investimento político na infraestrutura do país e no estabelecimento da educação ambiental e sanitária como primordiais para a conscientização das populações. Por sua vez, um projeto de educação sanitária nacional deve considerar as particularidades regionais e culturais e um projeto dentro de uma escola  deve partir da própria realidade do aluno e valorizar o conhecimento que este trás, trabalhando com esse conhecimento e partindo dele. (MOHR e SCHALL, 1992).

            Ausubel (1978) afirmou que “se eu tivesse que reduzir toda a psicologia educativa a um só princípio, enunciaria este: averigue-se o que o aluno já sabe e ensine-se consequentemente”. Trata-se portanto de visualizar o educando como protagonistas de sua aprendizagem, onde o professor parte do que o aluno já sabe, do conhecimento e representações construídas por cada indivíduo, o que pode ajudar no desenvolvimento de estratégias metodológicas no campo da educação ambiental que valorize a formação de um aluno critico e participativo. (AUSUBEL, 1978; MENDES & CARDOSO, 2009; KOVALSKI E OBARA, 2007)

            Desse modo, antes de realizar um projeto de educação sanitária e ambiental é necessário conhecer o que os alunos já sabem sobre esta temática e conhecer a sua própria realidade para a partir disto organizar e desenvolver as atividades com o intuito de fazer o estudantes perceberem os problemas de saneamento que os rondam e como podem modificar este quadro. Assim, o objetivo desse trabalho é investigar os conhecimentos prévios de estudantes de uma escola pública de Fortaleza relacionado à temática saneamento básico.

 

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

 

            Este trabalho é parte de um projeto maior e está relacionado ao levantamento do conhecimento dos estudantes sobre o tema saneamento básico e doenças veiculadas pela água, baseando-se assim, em uma abordagem exploratória dos dados, na qual se pretende conhecer a percepção de alunos, sobre a questões de saúde e meio ambiente e o contexto onde está inserido, partindo  do princípio de que a população não é um recipiente vazio ao qual a educação tem a finalidade de preencher, como indicado por Piovesan e Temporinier (1995) quando trata de estudos exploratórios em educação para a saúde,  o que servirá de subsídios para a inserção de um programa educativo.

            Essa pesquisa foi desenvolvida em uma escola da rede pública estadual localizada no Conjunto Ceará, na periferia de Fortaleza. A capital do Ceará no ano de 2008 apresentava uma cobertura do esgotamento sanitário de 50,56% do território. Sendo considerada no mesmo ano a 2ª pior capital do país em saneamento básico, pesquisas recentes apontam também que Fortaleza é a 6ª capital do país em internações referente a problemas de saneamento (ALMEIDA, 2008 ; LAVOR, 2011; MAIA, 2008).

            Mesmo com todo esse problema de infraestrutura e de saúde pública, existem bairros da periferia de Fortaleza que são complemente cobertos pela rede de abastecimento e esgotamento sanitário, tais como o Conjunto Ceará. Este, por sua vez, teve grandes problemas na década de 90, quando a capital passou por um período de escassez de água, o que acabou servindo de estímulo para a reurbanização do bairro, por projetos do governo. (CARNEIRO, 2010).

            Apesar da boa qualidade na distribuição de água e na coleta de esgoto, a população residente do Conjunto Ceará passa por graves problemas sócio-ambientais como mostra o relato do morador do bairro a 32 anos: “A coleta passa toda segunda, quarta e sexta, mas as pessoas não respeitam” referindo-se a grande quantidade de lixo jogado nas calçadas, canteiros na avenida e no canal do bairro.(MENESES, 2011) o que representa riscos de saúde para a própria população, pois tais práticas podem aumentar a proliferação de  vetores de doenças, como vetores da dengue por exemplo.

            Essa doença, por sua vez, aumentou sua incidência desde janeiro de 2010, representando um crescimento de 78% de casos em janeiro em relação ao mesmo período anterior. A Secretaria de Saúde de Fortaleza registrou 236 casos em janeiro de 2011, contra 132, em janeiro de 2010. (SARAIVA, 2011). Por sua vez, a Secretaria de Saúde do Estado também confirmou risco de epidemia de dengue em Fortaleza, com  o retorno do tipo 1 da doença que não circulava no Ceará desde de 1994. Além disso, o mosquito está mais resistente aos inseticidas, com suas larvas agora conseguindo habitar águas sujas e salgadas. (LIMA, 2011).

            Destacamos também que dentre as regionais de Fortaleza, a Secretaria Executiva Regional (SER) com maior incidência da doença é a V, com 124 casos, na qual está inserido o bairro Conjunto Ceará. (LIMA, 2011). Este bairro está classificado no perfil de alto risco por ter ultrapassado o limite de 4% de casas com infestação. Sabe-se que o Conjunto Ceará apresenta índice de 4,16% de incidência do mosquito nas casas, enquanto o valor aceitável é de 1% de larvas nos imóveis. (CASTRO, 2011).

            Além da dengue, Fortaleza apresenta problemas com enchentes, que podem facilitar a disseminação de doenças. Segundo a COGERH (2000) o período chuvoso acontece entre fevereiro e maio, onde se concentra cerca de 65 a 70% da precipitação anual e no período em que as enchentes ocorrem, também aumenta a frequências de doenças como por exemplo Virose (resfriado comum) - 40%, Dermatoses (escabioses e tinhas) - 25%, Verminoses - 20% e Diarreias  15%   o que foi constatado pela equipe do Centro de Saúde Meireles na áreas alagadas. (MENESCAL; FIGUEREDO; FRANCO, 2004).

            Menescal, Figueredo e Franco (2004) sugerem que muitos casos de doenças não chegam a ser contabilizados, seja pela dificuldade de integração dos dados de atendimentos médicos, ou por causa da automedicação que esses enfermos realizam e acabam não procurando os posto de saúde.

          O bairro dessa escola, como anteriormente ressaltado, apresenta diversos problemas de saneamento ambiental, além disso, a escola localiza-se próximo ao canal da Avenida C e próximos a lagoas de estabilização da Companhia de Água e Esgoto do Ceará (CAGECE) o que justifica o desenvolvimento de um projeto de educação sanitária na escola e a investigação apresentada nessa pesquisa.

            A amostragem foi realizada em quatro turmas de 3ª anos do ensino médio do turno da tarde que participaram do projeto de educação sanitária. Trata-se portanto de uma amostra intencional.

            Nos primeiros dias de aula que aconteceram em março de 2011, foram realizadas atividades dinâmicas dentro da disciplina de Biologia e ao final da aula foi aplicado um questionário investigativo sobre o tema saneamento básico. O questionário era composto por itens objetivos e dissertativos (abertos).

            Os itens foram elaborados para que tivessem significado para os avaliados e com uma linguagem acessível para todos, apresentando-se em número reduzido de questões para evitar desmotivação em relação ao questionário, como recomendado por Menéndez et al. (2007). Os alunos foram estimulados a responderem ao questionário, entretanto foi determinado que não seria permitida a comunicação entre eles. As turmas tem aproximadamente 45 alunos e cada aluno recebeu um folha única com questões  de múltipla escolha e questões abertas.

            As questões envolveram a definição de saneamento básico, informações sobre o contexto dos educandos  relativas ao tema, tais como a origem da água que consomem em casa ou ainda, para onde destinam seus resíduos sólidos. Investigamos sobre a relação que o lixo e a falta de tratamento de água tem com disseminação de doenças, enfatizando as doenças causadas por animais e avaliando aspectos mais amplos do que a higienização.

            Categorizamos as respostas quando se tratava de questões abertas, a partir de uma leitura atenta do discurso de cada aluno, sendo estabelecidos temas relacionados a cada categoria, como por exemplo para a definição de saneamento básico em que a categoria “coleta de lixo” não foi citada explicitamente porém o aluno fez referência a esta. Quanto a questões fechadas foi realizado uma análise de frequência (FREITAS; MARTINS, 2009; SABINO et al, 2009).

 

 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

 

            Na aula onde foi realizada essa investigação estavam presentes 138 alunos das quatro turmas de 3ª anos. Os educandos tem idade entre 15 – 18 anos, sendo a maioria dessa amostra (63%) composta por alunas. Os estudantes inicialmente tiveram dificuldades para a elaboração das respostas, pois acreditavam se tratar de uma prova, mesmo sendo explicado que era um diagnóstico do que sabiam sobre o tema. Porém essa situação também ocorreu em outras pesquisas que avaliavam as concepções dos educandos, o que pode ter relação com o modelo pedagógico tradicionalista da educação brasileira e a carência de atividades diferenciadas na sala de aula. (MENDES; CARDOSO, 2009). 

            Quanto às informações sobre saneamento de cada educando, destacamos que, segundo suas respostas, a água consumida em suas residências é distribuída pela Companhia de Água do Estado do Ceará (CAGECE) ou eles consomem água mineral. O lixo doméstico teve resultado parecido, em que 92 % dos avaliados afirmam que o lixo produzido em sua residência é recolhido pela prefeitura, no entanto, há uma pequena parcela que destina seu lixo para terrenos abandonados e corpos hídricos compreendendo, apenas 8% dos avaliados.

            Apesar de ser a minoria, chamamos atenção, para os casos em que fica claro que as famílias dos estudantes tem a oportunidade de destinar seu lixo para a prefeitura recolher, no entanto, ainda destinam seus resíduos domésticos em terrenos baldios. O lixo ou rejeito é assim “colocado pra fora de casa”, pois como explicam Ribeiro e Lima (2000), o lixo é um conjunto de elementos desprezados que assumem um caráter depreciativo associados a sujeira, repugnância, pobreza e dentre outras conotações negativas. Assim, esta comunidade que possui coleta de lixo semanal, continua apresentando esses maus hábitos, por conta de uma visão fragmentada e emocional da cadeia produtiva de lixo.

            Ainda sobre a questão do lixo, perguntamos aos estudantes que haviam respondido que seu lixo era coletado pela prefeitura, qual o destino final do lixo recolhido pelo governo, no entanto, todos os estudantes (N=138) acabaram respondendo essa questão e constatamos que 58% dos estudantes avaliados não sabiam a resposta, 12% dos estudantes acreditavam que o lixo de Fortaleza é direcionado para um lixão e 18 % afirmavam que o lixo vai para um aterro sanitário. O restante dos estudantes (13%) acredita que o lixo vai para um terreno baldio, rampa, dentre outras respostas.

            Esses resultados reafirmam a ideia anteriormente citada de que os estudantes e provavelmente a comunidade onde estão inseridos tem uma visão fragmentada da cadeia produtiva de resíduos e desconhecem seu destino final. Fortaleza diante de tantas dificuldades de saneamento e com a crescente produção de lixo, apresenta mudanças consideráveis quanto a o destino dos resíduos sólidos sendo atualmente o destino desses resíduos o Aterro Sanitário Metropolitano Oeste de Caucaia (ASMOC), que substituiu o uso de Lixões no final da década de 90.  Os lixões representam um modo mais primitivo de destinação de resíduos, por desconsiderar os impactos na saúde da comunidade (SANTOS, 2008).

            Quando questionamos se os animais podem causar doenças que são veiculadas pela água e alimentos, 6% dos estudantes responderam “Não”, 30 % dos estudantes responderam “Talvez”, 64% dos estudantes (88 dos avaliados)  responderam “Sim”. Destes alunos que responderam sim a essa pergunta, 7 alunos citaram como exemplo verminoses, 29 estudantes citaram como exemplo a leptospirose,  20 estudantes, citou a dengue, calazar, gripe e gripe suína como exemplo e 32 não citaram exemplos.

            As respostas a essa pergunta revelam que os educandos têm dificuldades em identificar a verdadeira causa das doenças que citaram, pois atribuem por exemplo ao mosquito Aedes aegypti como sendo a causador da dengue ou aos ratos como sendo a causador da leptospirose, o que do ponto de vista biológico é incoerente e que pode contribuir negativamente no controle de focos dessas doenças (NEVES, 2001).

            Quando questionamos se a falta de tratamento de água está relacionada a disseminação de doenças, 24% dos alunos afirmou que não existe relação, 6% mostra-se em dúvida, respondendo “Talvez” e 70 % dos estudantes (N= 138) responderam “Sim” a esta pergunta, representando 96 alunos dessa amostra. No entanto destes 96 alunos, 33 alunos não  citaram nenhuma doença, enquanto os outros que responderam sim, cerca de 63 estudantes, citam como exemplo a leptospirose, verminoses, cólera, dengue, dentre outras. Destacamos que esta última, a dengue, não tem nenhuma relação direta com a falta de tratamento de água, com exceção das águas de piscinas quando não cloradas adequadamente.

            Em estudos realizados no Rio de Janeiro com 243 indivíduos, a população analisada afirma que as principais doenças transmitidas pela água são verminoses, dengue, leptospirose e hepatite (VILAR et al, 2008), resultados semelhantes aos encontrados em nosso estudo, o que indica que os estudantes analisados tem dificuldades em estabelecer relações significativas entre a causa (ausência de tratamento de água) e doenças resultantes, pois alguns citam a dengue,  assim como outros membros da população analisada no Rio de Janeiro.

            A última pergunta do questionário, perguntava se a ausência de coleta de lixo tem relação com doenças veiculadas pela água ou alimentos e os educandos responderam que sim (50%), mas não souberam identificar muitas doenças que se enquadrasse nesses termos. Partindo do pressuposto que doenças de veiculação hídricas são aquelas em que o bioagente é transportado pela água até atingir o hospedeiro (GRAUN; CASTRO, 1996), apenas 11 estudantes citaram a leptospirose e outros citaram a dengue, calazar ou apenas responderam infecção. Cerca de 36% do alunos responderam que talvez houvesse alguma relação entre o lixo e as doenças veiculadas pela água e alimento, enquanto 14 % afirmaram que não havia nenhuma relação.

            Por fim, quanto à definição de saneamento básico, nenhum dos estudantes conseguiu descrever todas as dimensões a qual o termo faz referência, havendo, no entanto uma preponderância das definições em relacionar saneamento básico com esgotamento sanitário (Figura- 2), seja a captação de efluentes domésticos ou a criação de redes de esgoto, representando 67,07 %  dos alunos, o que condiz com outros estudos que investigaram a concepção de alunos. (MENDES; CARDOSO, 2000).

 


5.CONSIDERAÇÕES FINAIS

 Os educandos compreendem que as doenças relacionadas à falta de saneamento são no geral doenças infecciosas, porém eles não conseguem associar o tipo de poluição com as potenciais doenças causadas. Não significa, no entanto, que eles não saibam relacionar que a poluição das águas e o acumulo de lixo possam trazer doenças, todavia eles não compreendem claramente a relação “causa e efeito”, o que os fazem partir do seu senso comum sobre as doenças, quase semelhante à compreensão medieval de saneamento.

Eles também desconhecem a cadeia de produção de lixo, já que não sabem o destino do lixo produzido em suas residências e ficou claro que mesmo habitando em um bairro com coleta de lixo, alguma das famílias dos entrevistados tem hábitos de jogar seu lixo em locais inapropriados.

            Além disso, destacamos que os educandos não sabem o significado biológico de vetores, agente etiológico, doenças veiculadas pela água e doenças relacionadas a água, sendo necessária a intervenção da escola quanto ao processo de educação sanitária e ambiental , frente aos problemas de saneamento do bairro e o período chuvoso. O que justifica a inserção de um projeto de ensino que promova o aprendizado dos conhecimentos de Biologia através da reinterpretação da realidade pelos alunos.

 

AGRADECIMENTOS

 

Ao Programa Institucional Brasileiro de Iniciação a Docência (PIBID) pelas experiências vividas e inspiração para a realização desse trabalho.

Aos coordenadores Socorro Nogueira, Elite Aguiar e José Maciel, ao diretor  Luciano Nery pelo apoio a essa pesquisa e aos meus alunos.

 

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Ilustrações: Silvana Santos