Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início Cadastre-se! Procurar Área de autores Contato Apresentação(4) Normas de Publicação(1) Dicas e Curiosidades(7) Reflexão(3) Para Sensibilizar(1) Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6) Dúvidas(4) Entrevistas(4) Saber do Fazer(1) Culinária(1) Arte e Ambiente(1) Divulgação de Eventos(4) O que fazer para melhorar o meio ambiente(3) Sugestões bibliográficas(1) Educação(1) Você sabia que...(2) Reportagem(3) Educação e temas emergentes(1) Ações e projetos inspiradores(25) O Eco das Vozes(1) Do Linear ao Complexo(1) A Natureza Inspira(1) Notícias(21)   |  Números  
Entrevistas
10/09/2018 (Nº 42) ENTREVISTA COM SUCENA SHKRADA RESK PARA A 42ª EDIÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM AÇÃO
Link permanente: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=1385 
  

 

Entrevista com Sucena Shkrada Resk para a 42ª Edição da Educação Ambiental em Ação

Por Bere Adams

 

Apresentação – A entrevistada desta edição é Sucena Shkrada Resk, que é jornalista e que merece destaque por sua forte atuação e por focar assuntos relevantes da nossa realidade, principalmente os ligados às questões ambientais, temas fundamentais que precisam ser discutidos constantemente com toda a sociedade. Sucena é formada em Jornalismo, pela PUC-SP, há 20 anos, com especialização lato sensu em Política Internacional (1998) e Meio Ambiente e Sociedade (2009), pela FESPSP. Além da sua forte atuação nas redes sociais e grupos de discussão da Internet, ela mantém o Blog Cidadão do Mundo (http://www.cidadaodomundo.blogse.com.br/), onde publica seus artigos de opinião, incentivando reflexão e criticidade acerca dos temas abordados. Vamos ter o prazer de conhecê-la com mais profundidade a partir desta entrevista.

 

Bere – Sucena, inicio esta entrevista perguntando-lhe quando começou o seu interesse pelas questões ambientais, em sua carreira como jornalista?

 

Sucena – O meu interesse ou sensibilização começou desde o início de minha carreira, há 20 anos. Ao atuar em uma rede de jornais de bairro, em São Paulo, como repórter, via nos problemas e iniciativas cotidianas vivenciadas pelas comunidades com relação ao meio, à gestão pública e iniciativa privada, um laboratório “vivo” que vinha ao encontro de meus questionamentos sobre a dificuldade de melhoria da qualidade de vida com as quais me deparava como profissional e cidadã... Inconscientemente, já tendia a me aproximar de temas sobre justiça socioambiental. Nos anos seguintes, essa identificação cresceu, de forma mais amadurecida, por meio das pautas que defendia e gostava de realizar em diferentes veículos que atuei. Mas de forma mais sistemática, a partir de 2008, quando comecei a escrever de forma mais assídua (como jornalista colaboradora em site e revistas) sobre o tema e me aprofundar nas pesquisas sobre a área socioambiental. Nesse período, também dei início de forma regular aos artigos no meu Blog Cidadãos do Mundo e no ano seguinte fiz a pós lato sensu em Meio Ambiente e Sociedade. Uma necessidade de absorver mais conhecimentos, que mantenho até hoje.

 

Bere – Para você, qual é a importância da informação ambiental para a educação?

 

Sucena –  A informação (ética, no sentido de não tendenciosa/mascarada) socioambiental possibilita a escolha a qualquer ser humano, de como agir de forma individual e coletiva, verificar a responsabilidade de seu papel na engrenagem do espaço local ao planeta. Isso é elementar, pois quando ignoramos, a probabilidade de errar é muito maior. Acredito que é um estímulo à proatividade, mas a execução cabe ao livre arbítrio de cada um. A informação não está dissociada do processo de conhecimento (com dados frios, reflexivos, cognitivos...). Para que o mesmo seja difundido, no entanto, é necessário que haja diferentes meios de comunicação para atingir uma parcela maior de pessoas. Nesse aspecto, defendo que a pluralidade de plataformas seja constante – desde o “cuspe e giz” até as redes sociais. A educação, ou melhor, a facilitação para a autonomia se dá pela educação formal, não-formal e informal. Dessa forma, não pode ser elitizada. Acredito na proposta da educomunicação, que propõe a autonomia das pessoas, o protagonismo de capacidade de expressão num espaço educativo, que utiliza as informações e meios (ferramentas) nesse processo (rádios e jornais comunitários, blogs...)

 

Bere – Em sua trajetória, quais foram, (ou são) as suas maiores dificuldades enfrentadas ao lidar com a informação ambiental?

 

Sucena – Há inúmeros fatores. De forma resumida, tento ter um cuidado constante com as fontes (credibilidade das mesmas), apuração dos fatos, tendo em vista que nada está isento de interesses, além de barreiras impostas por burocracias do sistema ou até falta de informações precisas mesmo. Com o passar do tempo, vejo como profissional de imprensa e de comunicação, que preciso também me policiar para não ser influenciada por “paixões” por causas e acreditar piamente no rótulo de “mocinho e bandido”, pois nenhum dos lados está isento de ter pessoas ou organizações éticas e não-éticas.  Utilizo como princípio básico, os direitos elementares; se os mesmos são ou não respeitados, mesmo assim, é possível me enganar. O que torna a informação socioambiental mais complexa é que está atrelada de forma transversal a tudo. Há várias vertentes: casos positivos (estímulo), denúncias, acompanhamentos de temas permanentes (biodiversidade, mudanças climáticas...), que envolvem o cidadão comum, a gestão pública, movimentos socioambientais, de organizações privadas...Há um leque enorme nesta seara, porque há diferentes atores envolvidos. Esse é o estado da realidade do mundo, que não podemos perder de vista.

 

Bere – Como você compreende o conceito de sociedade sustentável e o que mais dificulta sua construção?

 

Sucena – Uma sociedade sustentável, por princípio, é humanitária, equilibrada no uso de recursos e consumo, e que proporciona qualidade de vida. Portanto, não pode alimentar desigualdades. Sendo assim, ainda não existe, na minha avaliação. A desigualdade se dá por ideologias e comportamentos mecanicistas, em que não há humanização nos processos e acarretam resultados generalistas, que não enxergam os detalhes. Alguns dos recortes principais, em minha opinião, para se enxergar essas disparidades, podem ser encontrados na situação da saúde ambiental e no modelo de produção e consumo. Portanto, para se entender o conceito (que é algo em construção), é um aprendizado constante, diário, que levará ainda muito tempo para ser absorvido pela humanidade e exige comprometimento de cada um de nós. Acredito que as modificações começam por nosso próprio comportamento cotidiano nas nossas casas e por escolhas de práticas que envolvam o coletivo. Por exemplo, algumas pessoas são voluntárias em causas e descobrem o “valor” disso em sua evolução como pessoas. Parece algo banal, mas não é. Eu optei por ingressar em atividades na militância do mídia livrismo e de Agenda 21 da cidade onde moro, entre outros. São exercícios de aprendizado, onde você começa a enxergar o outro e como a sua atitude reflete no todo. Quando se trata da gestão pública, em geral, o olhar também deve ser ampliado. O que se espera é que a base, o elementar seja consistente, para que o restante também siga o mesmo caminho. Como exemplo, uso o saneamento básico. Sem acesso e qualidade, todo o restante se torna frágil ao se falar de sustentabilidade. Mais um ponto desestruturador é a privação à educação de qualidade, porque nos afasta do primordial: o direito consciente de escolha e ação.

 

Bere – Quais mudanças significativas você percebe no jornalismo brasileiro em relação à forma de lidar com as questões ambientais?

 

Sucena – Há um avanço nas últimas décadas, mas ainda é preciso muito mais, por uma simples questão. Vivemos em um modelo de desenvolvimento que é esquizofrênico no sentido do entendimento das prioridades das questões socioambientais e consequentemente de sustentabilidade, que são transversais.  Alguns veículos da grande imprensa, por exemplo, mantêm setoristas principalmente para as pautas (macro e permanentes), há outros especializados que lutam por manter patrocínios e ao mesmo tempo, que não intervenham no conteúdo editorial, com textos mais reflexivos. Há outra vertente, que são as redes de comunicação compartilhada, mídia livristas, que atuam de forma colaborativa (sem remuneração). Também colaboro em algumas. É indiscutível que o jornalismo socioambiental está na agenda de forma implícita ou não, mas requer capacitação contínua de todos nós que trabalhamos no segmento. Existe a Rede Brasileira de Jornalistas Ambientais (RBJA) e a Rede Brasileira de Informação Ambiental (Rebia) - das quais participo -, que são alguns dos fóruns de discussão entre profissionais e interessados nas áreas. Mas no fundo, compreendo o seguinte: o mais importante é que de forma cada vez mais amadurecida, tratemos da temática socioambiental em todas as editorias, pois tudo está interligado. Excesso de fragmentação é dispersivo.

 

Bere – Raramente as matérias e notícias sobre o meio ambiente são positivas. Como você percebe esta situação?

 

Sucena – Essa realidade reflete o nosso modelo de desenvolvimento predatório, certo quadro de insatisfação, que vivemos na sociedade contemporânea, associado a eventos extremos em muitas situações e o caos nos centros urbanos. Por isso, os exemplos positivos acabam sendo submersos nessa avalanche. Ao mesmo tempo, é o termômetro da deficiência das relações tanto no âmbito internacional como no nacional para se efetivar avanços em negociações ou efetivações de compromissos firmados. O pano de fundo é o jogo do poder envolvido nas relações geopolíticas.

 

Bere – Qual é a sua experiência com a Educação Ambiental?

 

Sucena – De forma direta, como docente no módulo de Educação Ambiental em curso técnico em Meio Ambiente, em São Paulo, entre maio de 2009 e agosto de 2011 e na realização de palestras, como fiz em junho deste ano, na instituição, sobre a questão das águas na Rio+20; como também em encontros de educomunicação. Como comunicadora, também compartilho conteúdo sobre educação ambiental em diferentes grupos afins em redes sociais, além de escrever artigos em meu blog.

 

Bere – Há algum momento que se destaca e se tornou inesquecível ou significativo, em sua carreira?

 

Sucena – São vários momentos. Mas o que mais mexe comigo são as experiências com povos tradicionais e eventos de mobilização socioambiental. Destaco nos últimos anos, participações como cidadã e jornalista, em fóruns sociais mundiais em Belém e Porto Alegre, no da Pan-amazônia, em Santarém, PA; na Rio+20, no Rio de Janeiro; viagem com equipe do Projeto Saúde e Alegria a comunidades do Tapajós e à aldeia Aweti, no Xingu, entre tantos outros momentos gratificantes. Como também, entrevistas com personalidades que respeito, como o professor Ignacy Sachs, Boaventura de Sousa Santos,os já falecidos Orlando Villas-Bôas e Aziz Ab`Saber, , entre tantos outros.  

 

Bere – O que mais lhe inspira neste trabalho?

 

Sucena – A minha motivação é conseguir, por meio do trabalho, exercer meu  papel social, no final das contas, ser útil. Não consigo separar uma coisa da outra. É preciso dar sentido ao que a gente faz nessa vida, seja em qualquer profissão, não é?  

 

Bere – Concordo, Sucena! Um trabalho que envolve corpo e alma na busca pelo bem comum, por vezes é difícil, mas é extremamente gratificante e amplia o siginificado de nosso viver. E qual é, para você, a importância das redes sociais para o seu trabalho?

 

Sucena – São ferramentas úteis para multiplicar e obter informações, promover diálogos, conhecer pessoas de interesses afins de outras localidades, aprofundar networkings. Têm um “time” mais rápido do que outras plataformas. Em muitas situações, os chamados processos virais (tanto para o bem, como para o mal), por isso, a checagem é importante em qualquer circunstância. Mas não substituem outros meios, acredito que têm papel agregador. Um cuidado permanente que tento ter é evitar que o seu uso restrinja cada vez mais o corpo a corpo, o contato pessoal, que é imprescindível nas relações humanas e no exercício do jornalismo e da educomunicação.

 

Bere – Como você avalia, resumidamente, a atuação do governo em relação às principais questões ambientais?

 

Sucena – É uma relação complexa, em que há interesses diversos em jogo, devido à linha adotada de desenvolvimento, que ainda tem a métrica do Produto Interno Bruto (PIB).

 

Bere – Para finalizar, deixe uma frase, uma palavra, uma poesia ou uma ideia para compartilhar com os/as leitores/as da revista eletrônica Educação Ambiental em Ação:

 

Sucena – Ter amor por aquilo que se faz é algo que nos fortalece diante das dificuldades na trajetória da vida.

 

Bere – Sucena, agradeço, em nome de toda equipe, pela sua disponibilidade em participar desta edição da Educação Ambiental em Ação. Sua trajetória é um exemplo de exercício de cidadania e fiquei muito feliz por poder compartilhar sua experiência nesta publicação, parabéns, e muito obrigada!

 

 

Para contatos com Sucena Shkrada Resk: sucenaresk@yahoo.com.br

Blog Cidadão do Mundo - http://www.cidadaodomundo.blogse.com.br

Ilustrações: Silvana Santos