Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início Cadastre-se! Procurar Área de autores Contato Apresentação(4) Normas de Publicação(1) Dicas e Curiosidades(7) Reflexão(3) Para Sensibilizar(1) Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6) Dúvidas(4) Entrevistas(4) Saber do Fazer(1) Culinária(1) Arte e Ambiente(1) Divulgação de Eventos(4) O que fazer para melhorar o meio ambiente(3) Sugestões bibliográficas(1) Educação(1) Você sabia que...(2) Reportagem(3) Educação e temas emergentes(1) Ações e projetos inspiradores(25) O Eco das Vozes(1) Do Linear ao Complexo(1) A Natureza Inspira(1) Notícias(21)   |  Números  
Artigos
10/09/2011 (Nº 37) EDUCAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Link permanente: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=1069 
  
Educação Ambiental em Ação 37

EDUCAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E EDUCAÇÃO AMBIENTAL

 

 

Antonia Francivan Vieira Castelo BRANCO1; Zoraia Ùrsula Silva de Alencar LINARD2; Ana Carolina Braga de SOUSA3

 

1 – Graduada em Matemática e mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente, pela Universidade Federal do Ceará (UFC), franvcb@hotmail.com; 2 – Graduada em Biologia e mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente, pela Universidade Federal do Ceará (UFC), zoraiaursula@hotmail.com; 3 – Graduada em História e mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente, pela Universidade Federal do Ceará (UFC), carolbraga30@yahoo.com.br.

 

End.: R. Braz de Francesco, nº 100, apto 404, bl. 13, São Gerado, Fortaleza (CE), CEP: 60.325-010

 

Eixo: Educação Ambiental e Seus Contextos

 

 

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo fazer uma abordagem da educação ambiental e educação para o desenvolvimento sustentável, apontando a interdisciplinaridade como instrumento para a concretização de tais propostas na escola. São apresentadas diretrizes nacionais, como a Política Nacional de Educação Ambiental e os Parâmetros Curriculares Nacionais, e internacionais, como algumas convenções, para uma melhor reflexão sobre a aplicação da temática na sala de aula.

 

 

Palavras-chave: Educação Ambiental. Educação para o Desenvolvimento Sustentável. Interdisciplinaridade.

 

 

1. Introdução

           

Desde o início dos movimentos ambientalistas a educação foi tida como um instrumento indispensável de sensibilização, conscientização, informação e formação das pessoas para a promoção de uma consciência ambiental que venha propiciar mudança de valores, comportamentos e atitudes. Mas foi na primeira grande Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo, no ano de 1972, que se reconheceu oficialmente a importância da Educação Ambiental (EA) em trazer assuntos relacionados ao meio ambiente para a população mundial.

Da Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, em Tbilisi, em 1977 – marco histórico da evolução do tema – foi criado um documento que estabelece os princípios que orientam a EA e destaca seu caráter interdisciplinar, crítico, ético e transformador, abrangendo, assim, os aspectos políticos, sociais, econômicos, científicos, ecológicos, culturais e éticos que integram seu conteúdo.

As Conferências Internacionais sobre Educação Ambiental recomendam que a EA não seja praticada somente nas escolas. Sua promoção deve ser de maneira formal e não-formal e através dos meios de comunicação de massa.

A Resolução da Assembléia Geral das Nações Unidas A/RES/57/24, de 21 de fevereiro de 2003, definiu o período de 2005 a 2014 como a Década de Educação para o Desenvolvimento Sustentável, ressaltando que a educação é fundamental para se alcançar o desenvolvimento sustentável.

O desenvolvimento sustentável visa conciliar crescimento econômico, desenvolvimento humano e uso racional dos recursos naturais para atender as necessidades presentes e futuras.

Assim, objetiva-se com este trabalho apresentar as dimensões da educação ambiental e da educação para o desenvolvimento sustentável, com abordagem interdisciplinar, como instrumentos para uma sociedade sustentável, partindo da escola.

 

 

2. Referencial Teórico

 

De acordo com Freire (2006) “não há educação fora das sociedades humanas e não há homem no vazio”, de forma que, a educação ambiental deve ser questionadora e atuante na busca por um entendimento das relações entre homem, natureza e sociedade.

A educação ambiental é importante, porque no contexto da vivência da sociedade é estudada a interação homem-natureza, em que segundo Capra (2003, p. 21) o ambiente não é composto por seres isolados e sim por uma rede de relações interdependentes entre os elementos – dentre eles o homem, formando a teia da vida. Capra (2003, p. 25) salienta que ensinar o saber ecológico é o papel mais importante da educação no século XXI. Esse saber deve atingir não apenas aos alunos de todos os níveis de ensino, mas também a políticos, empresários e profissionais de todas as áreas.

Na perspectiva de uma educação ambiental permanente, Esteves (1998) observa que a educação ambiental deve se dirigir às pessoas de todas as idades e níveis sociais, e que deve ser garantida pelos respectivos setores de educação formal e informal. No âmbito da educação formal, a educação ambiental deve abranger os diversos níveis de escolaridade, desde o pré-escolar até ao universitário.

 

Segundo Guimarães (1995):

 

A educação ambiental vem sendo definida como eminentemente interdisciplinar orientada para a resolução de problemas sociais. É participativa, comunitária, criativa e valoriza a ação. É uma educação crítica da realidade vivenciada, formadora da cidadania. É transformadora de valores e atitudes através da construção de novos hábitos e conhecimentos, criadora de uma nova ética, sensibilizadora e conscientizadora para as relações integradas ser humano\sociedade\natureza objetivando o equilíbrio local e global, como forma de obtenção da melhoria da qualidade de todos os níveis de vida.

 

De acordo com Nicolescu (1999), “a transdisciplinaridade diz respeito aquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina”, nessa perspectiva, a educação ambiental e a educação para o desenvolvimento sustentável se apresentam como transdisciplinar, envolvendo não unicamente a dimensão escolar, mas também uma educação para a vida.

Segundo UNESCO (2005, p. 65) a educação para o desenvolvimento sustentável visa uma educação de qualidade, incrementada por ensinamento de valores, comportamento e estilo de vida que proporcione uma transformação social positiva e sustentável.

A Educação Ambiental (EA) e a Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) são importantes peças contribuintes para as mudanças em prol de estilos de vida sustentáveis. De acordo com Capra (2003, p. 19), o conceito de desenvolvimento sustentável, apresentado no Relatório Brundtland – Nosso Futuro Comum, foi adaptado da definição de comunidade sustentável, apresentada em 1980, por Lester Brow, em que definia como a capacidade de satisfazer as necessidades presentes sem comprometer as oportunidades futuras. Assim, a sobrevivência das próximas gerações dependerá da alfabetização ecológica da sociedade atual.

 

 

3. Educação para o Desenvolvimento Sustentável

 

Tendo em vista a importância de se propor um modelo de educação voltada a um novo direcionamento do mundo para o século XXI, definiu-se a Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável, para o período de 2005 a 2014, onde tem como áreas prioritárias sociedade, meio ambiente e economia, com base nos aspectos culturais de cada país.

Os fundamentos da educação para o desenvolvimento sustentável partem da problemática da degradação dos recursos naturais e sua conseqüente escassez para as gerações presentes e futuras. Daí surge a necessidade de uma mudança de posicionamento de comportamento da sociedade frente ao modelo de crescimento econômico atual – gerador de exclusão social e poluição ambiental.

Para UNESCO (2005, p. 26), o Fórum sobre Educação Mundial, realizado em 2000, em Senegal, reafirmou os princípios da Declaração Mundial sobre Educação para Todos, realizado em 1990, na Tailândia e compartilha com a Declaração Universal de Direitos Humanos ao reconhecer que a “educação é um direito humano fundamental e fator decisivo para o desenvolvimento sustentável, para a paz e estabilidade, para o crescimento socioeconômico e para a construção de uma Nação”. A Eco 92, já apontava através da Agenda 21, a prioridade de uma educação voltada a reflexões sobre o modelo de desenvolvimento que está comprometendo a sustentabilidade do planeta.

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é definido a partir de indicadores de renda, saúde (longevidade de vida) e educação (taxas de matrícula e de alfabetizados). Porém, no âmbito da educação, este indicador não avalia as deficiências e nível de qualidade no processo de ensino-aprendizagem. Identificada a necessidade de avaliar a educação não apenas de forma quantitativa, mas também de forma qualitativa, em 2000, a comunidade internacional adotou os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, onde aponta como uma das metas o aumento da oferta de educação, corrigindo suas desigualdades de gênero. Também consiste como uma das metas do Milênio a elaboração de estratégias nacionais para o desenvolvimento sustentável.

O crescimento econômico gera desenvolvimento para os ricos e maior desigualdade para os pobres. Segundo Brown apud UNESCO (2005, p. 29), de 1950 a 1997, triplicou o uso de madeira para construção e o consumo de grãos, o combustível fóssil quase quadruplicou e os poluentes do ar e da água multiplicaram-se várias vezes. Enquanto os ricos usufruem da qualidade de vida, os pobres não têm moradia digna, são vítimas da fome ou de desnutrição, vivendo em condições subumanas, pois são excluídos do desenvolvimento.

Se o atual modelo econômico não garante o suprimento do básico à sobrevivência de todos os indivíduos de nossa espécie, há uma urgente necessidade de se refletir sobre a forma de consumo e a tendência desse modelo econômico frente aos limitados recursos naturais.

Assim, a educação é uma ferramenta para reflexão sobre os caminhos para se atingir o desenvolvimento sustentável – com as devidas melhorias da qualidade ambiental e justiça social.

A educação ambiental aborda sobre as relações do homem com o meio ambiente e suas formas de preservá-lo e conservá-lo. Já a educação para o desenvolvimento sustentável contextualiza a educação ambiental no aspecto socioeconômico com base na dimensão cultural. Seu ensino deve acontecer de forma interdisciplinar e não ser tratado de forma isolada em disciplina específica. Sua metodologia deve favorecer análise do modelo econômico atual e do modelo de desenvolvimento sustentável almejado, utilizando-se do pensamento crítico e apontando soluções para os problemas resultantes do modelo econômico.

 

 

4. Educação Ambiental no Brasil

 

No Brasil, a Educação Ambiental ganha importância a partir de meados da década de 1980, época em que se iniciou a produção de alguns trabalhos e artigos sobre o tema, tomando assento no sistema normativo, primeiramente por meio da Lei 6.938/81, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, considerada marco da preocupação ambiental no Brasil. A Educação Ambiental tem por objetivo, conforme Brasil (1981), em seu art. 2º, a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana.

A Constituição Federal Brasileira de 1988, no art. 225, parágrafo 1º, inciso VI, sobre Meio Ambiente institui como competência do Poder Público a necessidade de “promover Educação Ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para preservação do Meio Ambiente”. No entanto, a maior contribuição tem sido dada pelos movimentos da própria sociedade, das organizações não-governamentais, dos movimentos culturais e dos veículos de comunicação.  

Após a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano (Rio 92), uma importante iniciativa do governo brasileira, já prevista desde a Conferência de Estocolmo (1972), foi aprovar, em 1994, a proposta que criou o Programa Nacional de Educação Ambiental (PRONEA), que teve sua ação focada na EA e Gestão Ambiental.

Como concreção do direito fundamental ao meio ambiente, surge a Lei nº 9.795/99, que dispõe sobre a Educação Ambiental e institui a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA). Essa lei considera a EA como um permanente processo formal e informal de educação e que deve estar presente em todos os níveis e modalidades educativas, responsabiliza e envolve todos os setores da sociedade e incorpora oficialmente a EA nos sistemas de ensino. Para Brasil (1999), segundo o art. 1º do mesmo Diploma Legal, Educação Ambiental é “o processo por meio dos quais os indivíduos e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.”

Por ocasião da Rio 92, o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global estabelece a noção de que a EA deve ser pautada sob uma perspectiva holística, enfocando, de forma interdisciplinar, a relação do homem com a natureza e o universo.

A Educação Ambiental, assim como a educação básica, deve começar em casa e extrapolar os muros; gerar conhecimento local, regional e global e envolver toda a comunidade. No entanto, apesar das tentativas e esforços de introduzir a EA nos diferentes níveis escolares, essa idéia não tem alcançado o êxito desejável. A deficiência se apresenta desde as séries iniciais até o nível superior, uma vez que a maioria dos cursos não trabalha a temática, fato que reflete negativamente perante a necessidade de que os futuros profissionais contribuam mais eficazmente para a preservação do meio ambiente.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) prevê a Educação Ambiental como uma diretriz para o currículo da educação formal. Com isso, o Ministério da Educação (MEC) apresentou, nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) para o Ensino Fundamental, dentre outros temas, o meio ambiente, como tema transversal, no currículo escolar.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) estabelecem objetivos (metas de qualidade) ao Ensino Fundamental, no sentido de despertar o aluno para sua participação na sociedade com cidadania e consciência crítica.

Os temas transversais não formam novas áreas, e sim um conjunto de temas ligados às questões sociais que permeiam todas as áreas durante a escolaridade do Ensino Fundamental. Essa abordagem no universo dos temas transversais e de forma interdisciplinar significa um avanço qualitativo da formação dos discentes, que passam a compreender melhor o significado do que estudam.

Conforme o PCN para o Meio Ambiente (1998, p.187), a principal função do trabalho com o tema Meio Ambiente é contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos a decidir e atuar na realidade socioambiental de um modo comprometido com a vida, com o bem-estar de cada um e da sociedade, local e global.

Decorridos vinte anos da Conferência de Tbilisi, aconteceu no Brasil, em 1997, a I Conferência Nacional de Educação, que teve como resultado vários textos editados, dentre eles, o Relatório Levantamento Nacional de Educação Ambiental e a Declaração de Brasília para a Educação Ambiental, que consolida as sugestões de diretrizes políticas para a EA brasileira.

Cumpre acentuar a noção de que as questões ambientais não estão dissociadas das questões econômicas, políticas, sociais e culturais. A exploração dos recursos naturais, com o objetivo de atender as necessidades do sistema capitalista, tem contribuído para o aumento dos problemas ambientais, que envolvem desde a destruição de habitats e a elevação da temperatura do planeta Terra, até ao acesso desigual a recursos e serviços ambientais. Perante esse sistema, a legislação vigente tem deficiência em fazer a gestão da superexploração, degradação e poluição ambiental. Assim sendo, impedem que ocorram mudanças imediatas de atitudes para com o meio ambiente, haja vista que tudo está interligado, isto é, o que é feito à natureza reflete sobre o homem.

A vida sustentável deve ser o novo molde para todos os níveis: individual, coletivo e mundial. Assumir esse novo molde requer uma mudança substancial nas atitudes e práticas de cada indivíduo. Para isso, surge a necessidade de refletir a importância da ética para uma vida sustentável. E isso, é um desafio para a sociedade atual e, em especial, para os professores e educadores ambientais, que são incumbidos dessa tarefa, trazer para o debate a ligação existente entre a degradação do meio ambiente, o modelo de produção capitalista e os problemas sociais, bem como trabalhar as diversidades culturais e ideológicas.

       A Política Nacional de Educação Ambiental e os PCN’s são ferramentas importantes da Educação Ambiental, pois ambos tratam das diretrizes que norteiam essas questões no âmbito educacional no Brasil e dão direcionamentos para o desenvolvimento sustentável. Segundo Bridger e Luloff (1999 apud CAMARGO, 2003, p.91), “as comunidades podem ser consideradas sustentáveis quando alcançam as necessidades econômicas de seus habitantes, consideram a importância do meio ambiente e protegem-no além de promoverem sociedades locais mais humanas”.

Para que o desenvolvimento possa ser considerado sustentável é preciso reconhecer, valorizar e desenvolver as potencialidades (naturais e humanas) locais, regionais e globais, bem como, respeitar as diversidades culturais, étnicas e religiosas de cada povo. A Política Nacional de Educação Ambiental e os PCN’s conduzem a essa perspectiva: abordar questões amplas e ao mesmo tempo atentar para as especificidades locais e regionais.

A educação sozinha não resolve todos os problemas ambientais nem é suficiente para mudar os rumos do planeta. No entanto, em muito contribui para formar cidadãos mais conscientes, críticos, participativos e responsáveis pelo futuro do nosso planeta.

Os governos, setores públicos e privados, as organizações não governamentais e a sociedade civil em geral, devem perceber que a Educação Ambiental e a Educação para o Desenvolvimento Sustentável podem contribuir significativamente para o desenvolvimento econômico, social e humano. No entanto, para uma maior superação dos problemas e um melhor desenvolvimento econômico e humano não basta desenvolver uma consciência ambiental, é preciso ocorrer mudanças no modelo de sociedade atualmente vivido pela maioria dos povos do mundo.

A busca por um desenvolvimento integrado e sustentável vem permeando discussões desde as primeiras percepções de que, as intervenções do homem sobre a natureza podem trazer impactos que levam as condições humanas a limites de seus níveis de sobrevivência.

Diante da crise ambiental que se torna mais evidente a partir da década de 60 do século XX, as sociedades se propõem a refletir sobre a degradação ambiental, a limitação ou esgotamento de seus recursos naturais, e as conseqüências que tem surgido e ainda podem surgir a partir da continuidade desse uso irracional do ambiente que segundo Leff (2001):

 

Deve ser compreendido, nessa perspectiva a partir de um novo conceito que envolve uma visão de desenvolvimento humano, que reintegra os valores e potenciais da natureza, as externalidades sociais, os saberes subjugados e a complexidade do mundo negados pela racionalidade (...) o ambiente emerge como um saber reintegrador da diversidade de novos valores éticos e estéticos e dos potenciais sinérgicos gerados pela articulação de processos ecológicos, tecnológicos e culturais. O saber ambiental ocupa seu lugar no vazio deixado pelo progresso da racionalidade cientifica, como sintoma de sua falta de conhecimento e como sinal de um processo interminável de produção teórica e de ações práticas orientadas por uma utopia: A construção de um mundo sustentável, democrático, igualitário e diverso.

 

Na construção desse mundo de maneira real, sustentável e continuada, a educação ambiental e educação para o desenvolvimento sustentável podem ser compreendidas metodologicamente como forma de alcançar tais propósitos, percebendo o homem enquanto agente transformador, compreendendo criticamente o ambiente ao qual faz parte (extrapolando os aspectos físico-biológicos), as relações que se estabelecem entre os diversos elementos e grupos que o constituem, e como se posicionar diante das discussões e decisões políticas, sociais, econômicas e ambientais.

Estes modelos de educação surgem a partir da definição de novos paradigmas de sustentabilidade, que propõe a construção de valores éticos, de igualdade e de qualidade de vida para todos, que além do atendimento das necessidades básicas de alimentação, saúde, moradia e educação, compreendem o respeito à diversidade cultural, a participação coletiva nas decisões políticas e o acesso ao desenvolvimento econômico que garanta bem-estar e desenvolvimento sustentável de forma global e igualitária, tornando-se imprescindível para o desenvolvimento de novas posturas e novas práticas do homem para com o meio ambiente.

A educação ambiental deve também ser trabalhada unificando a aprendizagem teórica e a prática educativa, compreendendo a complexidade das relações entre o ser humano e a natureza como partes de um ambiente integrado e complementar que se modifica, transforma e se autoregula, mas que, a partir da intervenção humana pode sofrer impactos irreversíveis, chegando até a destruição e esgotamento dos recursos naturais e a perda irrecuperável da biodiversidade.

A educação ambiental deve ser analisada levando em consideração a ação do homem como sujeito social, responsável pelos seus atos. A construção desse processo deve ser iniciada desde a infância, pois, como afirma Figueiredo (2006):

 

No ensino da educação ambiental infantil, é necessário ter, como um pressuposto inicial, a criança como um sujeito epistêmico, que se constitui permanentemente nas relações que estabelece com o mundo, com o outro e consigo mesmo. Sujeito capaz de práxis transformadora, de extrair sentido de suas ações e, consequentemente, produzir teorias a cerca delas. Encontra na relação com o mundo por meio da práxis sua continua transformação em “ser mais”. Dessa maneira, carrega o dom de ser capaz, de transformar, de revolucionar.

 

 

 

5. Interdisciplinaridade

 

A fundamentação do processo de ensino-aprendizagem que é proposto se estabelece na leitura de mundo que visa à transformação socioambiental, a partir de uma abordagem e prática educativa libertadora que leva em consideração a autonomia, as relações, as problematizações e a fusão de linguagens e conhecimentos através de uma dimensão transdisciplinar e interdisciplinar.

Na interdisciplinaridade, a questão ambiental está inserida na disciplina do currículo e vice-versa. A interdisciplinaridade surge a partir do diálogo entre várias disciplinas sobre um tema central. As problemáticas ambientais contemporâneas devem ser estudadas de forma interdisciplinar, pois uma disciplina específica não consegue explicar fenômenos em sua totalidade sem recorrer às demais áreas do conhecimento. A conexão entre estas áreas, na exploração de temáticas ligadas ao meio ambiente possibilita ao aluno compreender o objeto de estudo de forma globalizada, e não fragmentada. Quando a metodologia de ensino se limita à forma disciplinar, não tem arcabouço para tratar de temáticas de forma mais complexa. O trabalho interdisciplinar traz para discussão de forma contextualizada com a vivência do aluno, fazendo uma relação entre os elementos da vida do estudante e do conhecimento.

Sobre a abordagem da temática ambiental nas diversas disciplinas, Coimbra (2000, p. 53) enfatiza que a interdisciplinaridade não se limita a ser um método de ensino, pois é uma mola propulsora na reformulação do saber.

A instituição escolar tem um papel relevante na transformação social. E trabalhar de forma interdisciplinar não é tarefa fácil. É preciso existir maiores investimentos na formação dos docentes que venham proporcionar mudanças nas práticas pedagógicas, e que estas possam contribuir para atingir de forma satisfatória os objetivos propostos pelos instrumentos norteadores da educação.                        

A multiplicidade de saberes deve ser contemplada no estudo e construção de uma educação ambiental voltada para a constituição de um desenvolvimento sustentável. As diversas formas de aprendizagem, de linguagens, de conceitos (como por exemplo: convivência, manejo, preservação, direitos, deveres e custos sociais), de contextos históricos, políticos e sociais, devem ser levados em consideração na elaboração dessa prática educativa, valorizando experiências e saberes, individuais e coletivos, e fundindo todos esses conhecimentos de forma a possibilitar conscientização e continuidade de uma educação que gere qualidade de vida e desenvolvimento social igualitário, compreendendo o homem enquanto ser complexo em uma ordem biológica e enquanto sujeito que tem necessidades a serem atendidas e que precisa fazer escolhas, posto que, os bens e os recursos são escassos, e a partir dessas escolhas, como atender suas necessidades percebendo o direito do outro e das gerações que surgirão no futuro.

Para Morin (2000), na construção da transdisciplinaridade é necessário ter embasamento em um pensamento complexo organizador que leva em consideração o que ele define como os sete saberes: o entendimento da possibilidade do erro, do conhecimento pertinente, o ensino da condição humana, da identidade da terra, do enfrentamento das incertezas, do ensino da compreensão e o desenvolvimento da ética do gênero humano.

Quanto a educação ambiental aplicada na dimensão escolar, Figueiredo (2006) afirma que:

 

A escola assumiu ares de independência em sua relação com o meio ambiente que a acolhe. A sala de aula tornou-se um espaço de restrição da liberdade e de controle dos movimentos naturais (...), é necessário que a educação retome os elos e consolide pontes com o entorno das escolas. É importante que o movimento de aprendizagem escolar possa incorporar a vida dinâmica e própria dos educandos como referência fundamental.

 

  O autor propõe também tratar das problemáticas da comunidade e envolver educandos e educadores, grupo gestor e funcionários, enfim, todos os elementos que constituem o ambiente escolar nessa proposta de construção de uma educação ambiental questionadora, atuante, participativa e integradora que desenvolva ações para um mundo mais igualitário e sustentável.

 

 

6. Considerações finais

 

Conclui-se que a interdisciplinaridade é um instrumento para dar eficácia à aplicação da educação ambiental, juntamente com a educação para o desenvolvimento sustentável, sendo que ambas são base para a sustentabilidade. O que se pode esperar de uma sociedade que incorpora os princípios da educação ambiental e da educação para o desenvolvimento sustentável é de comunidades que usufruem de uma concreta aplicação destes fundamentos, despertando em conservação nos recursos naturais agregada às potencialidades econômicas sustentáveis. A educação com sua disseminação de valores, mudança de atitude e com base em princípios éticos é um instrumento para enfrentar o desafio a um caminho para uma sociedade sustentável.

 

 

Referências bibliográficas

 

BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em 12 out. 2008.

 

BRASIL. Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a Educação Ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em: 11 out. 2008.

 

CAMARGO, Ana Luíza de Brasil. Desenvolvimento sustentável: dimensões e desafios. Campinas-SP: Papirus, 2003.

 

CAPRA, Fritjof. Alfabetização ecológica: o desafio para a educação do século 21. In: TRIGUEIRO, André (coord.). Meio ambiente no século 21: 21 especialistas falam da questão ambiental nas suas áreas de conhecimento. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.

 

COIMBRA, José de Ávida Aguiar. Considerações sobre a Interdisciplinaridade. In: PHILIPPI, Jr. Arlindo. Interdisciplinaridade em Ciências Ambientais. São Paulo: Signus, 2000.

 

DIAS, Genebaldo. Freire. Educação Ambiental: princípios e práticas. 5ª ed. São Paulo: Global, 1998.

 

ESTEVES, Lídia Máximo. Da teoria a prática: Educação ambiental com as crianças ou O fio da história. Porto (Portugal): Porto, 1998.

 

FIGUEIREDO, João Batista. A educação ambiental dialógica na infância. In: MATOS, Kelma (org.). Cultura de Paz, Educação Ambiental e Movimentos Sociais: Ações com sensibilidade. Fortaleza: UFC, 2006 (Coleção diálogos intempestivos).

 

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006.

 

GUIMARÃES, Mauro. A dimensão ambiental na educação. Campinas, SP: Papirus, 1995.

 

LEFF, Henrique. Saber Ambiental: Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Tradução de Lúcia Matilde Endlich Orth. Petrópolis-RJ: Vozes, 2001.

 

MORAES, Alexandre de. Constituição da República Federativa do Brasil. 27ª ed. São Paulo: Atlas, 2006.

 

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, UNESCO, 2000.

 

NICOLESCU, Barasab. O manifesto da transdisciplinaridade. Tradução Lucia Pereira de Sousa. Editora Triom, 1999.

 

Parâmetros Curriculares Nacionais em Ação - 1ª a 4ª séries. Disponível em:
<http://www.mec.gov.br/sef/estrut2/pcn/pcn1a4.asp>. Acesso em: 1º jul. 2009.


Parâmetros Curriculares Nacionais em Ação - 5ª a 8ª séries. Disponível em:
<http://www.mec.gov.br/sef/estrut2/pcn/pcn5a8.asp>. Acesso em: 1 jul. 2009.

 

UNESCO. Década das Nações Unidas da Educação para o Desenvolvimento Sustentável, 2005-2014: documento final do plano internacional de implementação. Brasília: UNESCO, OREALC, 2005.

 

Ilustrações: Silvana Santos