Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2011 (Nº 37) TEATRO DE FANTOCHES COMO FERRAMENTA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO PROJETO DE ASSENTAMENTO DE REFORMA AGRÁRIA JOSÉ EMÍDIO DOS SANTOS, CAPELA,SE
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TEATRO DE FANTOCHES: EDUYCAÇÃO AMBIENTAL DE FORMA EFICAZ

 

TEATRO DE FANTOCHES COMO FERRAMENTA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO PROJETO DE ASSENTAMENTO DE REFORMA AGRÁRIA JOSÉ EMÍDIO DOS SANTOS, CAPELA,SE.[i]

 

Ane Marcela das Chagas Mendonça

Ivana Silva Sobral*

Karla Fernanda Barbosa Barreto

 

INSTITUTO BIOTERRA

Avenida Enos Sadok de Sá, n° 216, Bairro Suiça, Aracaju, Sergipe.          

* Autora para correspondência

ivanasobral@yahoo.com.br

 

 

RESUMO

 

Este trabalho objetivou sensibilizar as crianças do assentamento José Emídio dos Santos, situado no município de Capela e incluí-las socialmente nas discussões da relação homem- sociedade-natureza. Para isto, foi realizada uma peça teatral, cujo tema tratou da importância da mobilização das crianças para a proteção da natureza e conquista de seus direitos como cidadãos. Após a apresentação da peça teatral, o tema foi discutido com as crianças e solicitou-se que elaborassem desenhos sobre suas percepções da relação homem-sociedade-natureza. Por meio de pesquisa qualitativa verificou-se que o teatro de fantoches é uma ferramenta de educação ambiental capaz de transmitir conhecimento de maneira lúdica, incluindo socialmente as crianças no processo de construção do conhecimento e da sociedade.

Palavras-chave: atividade lúdica, educação informal, percepção ambiental.

 

 

 

ABSTRACT

 

 

This study aimed to make children aware of the settlement Emidio José dos Santos, located in the town of Capela, and include them in the discussions of social relationship between man, society and nature. The method used was the presentation of a play that discussed the importance of mobilizing children to the protection of nature and the achievement of their rights as citizens. After the presentation of the play, the issue was discussed with the children and they were asked to draw their perceptions of the relationship between man, society and nature. Through qualitative research, it was discovered that the puppet theater is an effective tool for environmental education that imparts knowledge in a playful way, includingchildren in the social process of construction of knowledge and society.

Key-words recreational activity, informal education, environmental perception

 

INTRODUÇÃO

           

            O teatro de fantoches está presente desde a mais remota antiguidade acreditando-se que ele seja tão antigo quanto o teatro convencional. Na Grécia e na Roma o teatro torna-se popular, sendo posteriormente uma técnica adotada pela maioria dos países europeus. No Ocidente os bonecos assumem uma ligação ao homem em sua realidade racional. Na América, os fantoches foram trazidos pelos colonizadores, apesar dos nativos já fazerem bonecos articulados.

Em tempos de globalização, onde o consumismo extremo valoriza o acúmulo de bens e onde, segundo Guimarães (1995), “o ser humano totalmente desintegrado do todo, não percebe mais as relações de equilíbrio da natureza”, existe a necessidade de práticas educativas que incluam as crianças como parte integrante do meio ambiente e da sociedade, de forma a possibilitar uma relação harmoniosa entre a tríade homem - sociedade- natureza.

            Fazer as crianças perceberem que são parte integrante da natureza e da sociedade, possibilita uma relação mais harmoniosa com a Natureza e a formação de atores sociais conscientes de seus direitos e deveres como cidadãos

A educação ambiental deve apresentar uma perspectiva holística, enfocando a relação entre o ser humano, a natureza e o universo de forma interdisciplinar (GUARIM, 2002). Para isto, muitas técnicas lúdicas são utilizadas como métodos para desenvolver a Educação Ambiental, tais jogos, oficinas, aulas de campo e peças teatrais.

O teatro de fantoches é capaz de transmitir conhecimento de forma persuasiva, além de possibilitar que as crianças entendem e discutam sobre o lugar aonde vivem de forma lúdica. Para Galvão (apud GUERRA s/d).

 

As crianças parecem receber bem melhor e armazenar com maior facilidade as imagens, quando são apresentadas através de algo que as encante emocionalmente como é o caso do teatro de boneco.

 

Considerando que todo o processo de ensino e aprendizagem envolve diretamente o ato da comunicação, e, sendo a comunicação “... um processo de compartilhar experiências até que se tornem um bem comum...” (JOHN DEWEY apud MENDONÇA, 1974), o teatro de fantoches tem significância para a Educação Ambiental. Através dele haverá a todo instante o processo de recepção e transmissão da informação. Unindo essa característica a ele inerente com a sensibilidade infantil de aprender e repassar, as crianças deixarão de ocupar posição de meros expectadores e assumirão um papel de agentes informantes das questões ambientais e sociais.

Em detrimento da necessidade de se discutir as relações natureza-sociedade, foi desenvolvido o Projeto “Bioterra apresenta: Teatro de Fantoches, que será utilizado como meio de aprendizagem de temas ambientais e sociais para as crianças do assentamento José Emídio dos Santos, situado em Capela, SE.

            O objetivo maior deste projeto foi sensibilizar as crianças do assentamento José Emídio dos Santos e incluí-las socialmente nas discussões da relação homem- natureza.

 

 

 

EDUCAÇÃO AMBIENTAL

 

Nos anos de 1970 há uma ênfase nos debates acerca do meio ambiente e desenvolvimento. Durante essa época há consolidação do capitalismo internacional e, em contrapartida torna-se de conhecimento público a finitude dos impactos globais produzidos pela produção capitalista (JACOBI, 2005). Nesse sentido, a ciência já não conseguia dar respostas aos novos problemas que surgiam, necessitando de discussões mais complexas e interdisciplinares (MEDINA, s.d.). De acordo com Jacobi (2003), inicia-se em nível global um processo para criar condições que formem uma nova consciência sobre o valor da natureza e para reorientar a produção de conhecimentos baseados em métodos interdisciplinares.

No entanto, ao decorrer dos anos o objetivo principal da Educação Ambiental foi desfocado, acreditando-se segundo Guimarães (2004) que transmitindo o conhecimento correto ao indivíduo e sobrepondo a teoria à prática fosse capaz de transformar seu comportamento e consequentemente, a sociedade. Desta forma, a Educação Ambiental no contexto atual tende à reflexão e à crítica, deixando para trás a visão do mundo que fragmenta a realidade, simplificando-a e reduzindo-a, produzindo uma prática pedagógica objetivada no indivíduo e na transformação de seu comportamento (GUIMARÃES, 2004). De acordo com Carvalho (2001), o novo conceito de uma Educação Ambiental passa por um novo horizonte epistemológico em que o ambiental é pensado como um sistema complexo de relações e interações socioambientais, historicamente configurado e dinamicamente movido pelas tensões e conflitos sociais. É de fundamental importância que se estabeleçam processos educativos que favoreçam a realização do movimento de constante construção do nosso ser na dinâmica da vida, superando as relações sociais vigentes e dominadoras e fazendo surgir uma ética a qual se possa chamar de ecológica (LOUREIRO, 2004).

            Desta maneira, não se pode iniciar um processo de Educação Ambiental sem levar em conta o contexto sócio-cultural em que a comunidade foco de estudo encontra-se inserida. Assim, de acordo com Jacobi (2003), não se pode ignorar as dimensões culturais, relações de poder existentes e as limitações ecológicas, sob pena de se estabelecer um padrão de desenvolvimento sustentável.      

Principiar esse processo educativo e transformador ainda na infância faz com que a criança internalize a importância do cuidado pelo meio ambiente. As atividades relacionadas à Educação Ambiental permitem um melhor engajamento ambiente-criança, promovendo criatividade, participação e iniciativa, além de uma boa interação social (ELALI, 2003).

Técnicas que se utilizam de atividades lúdicas, onde segundo Luckesi o ser humano vivencia uma experiência plena, que não admite divisões, contribuem no processo de assimilação de temas ligados ao meio ambiente e possivelmente, fortalecendo a via de construção para uma nova relação sociedade-ambiente (GONZALEZ et al., 2007).

 

 

METODOLOGIA

 

            A metodologia utilizada foi a pesquisa-ação, por meio da qual, se deve criar uma consciência de mudança da realidade em que os atores sociais estão inseridos, de forma a reorganizar conceitos e coletivizar soluções. Para isto, o teatro de fantoches foi a ferramenta utilizada.

 Os personagens criados para a peça teatral representavam o homem do campo tal como ele vive no ambiente em que foi apresentada a peça. Para que as atenções das crianças fossem apreendidas, durante o teatro de fantoches, utilizaram-se fundo musical, comentários engraçados e narrador.

            Posteriormente a apresentação, estimulou-se uma discussão e a elaboração de desenhos para verificar a percepção das crianças perante as questões ambientais e sociais.

 

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

            O “Projeto Bioterra apresenta: teatro de fantoches”, através da temática homem-sociedade-natureza, trabalhou a educação ambiental sensibilizando as crianças do assentamento José Emídio dos Santos (Figura 1). A peça teatral utilizou como cenário fictício um ambiental rural, cujos integrantes foram o homem, a floresta, os animais, a monocultura de cana-de-açúcar, a horta orgânica para mobilizar os atores sociais em prol da sadia relação homem-sociedade-natureza.

 

 

Figura 1: Personagens do Teatro de Fantoches.

 

 

A história que contém caracteres relacionados à conservação ambiental, a qualidade de vida da comunidade e mobilização dos atores sociais, era composta por seis personagens e se passou na cidade fictícia de Pirariroca. Durante a peça, Zé, um típico homem do campo, com o desejo de enriquecer, planeja realizar a derrubada de uma mata para a introdução de uma monocultura de cana-de açúcar, fazendo uso de produtos agroquímicos. Em contrapartida, a professora da escola do povoado estimula seus alunos a montar uma horta orgânica na qual não haverá a necessidade de derrubadas, nem de utilização de agrotóxicos. A mobilização das crianças impede a implementação da monocultura de cana-de-açucar e as crianças começam a produzir alimentos saudáveis para a comunidade.

            Posteriormente à exibição da peça foi iniciada uma discussão, com questionamentos e espaços para expressão, buscando poder aferir o nível de entendimento dos expectadores (Figura 2). De acordo com as crianças, a apresentação mostrou-se bastante persuasiva, de fácil entendimento e divertida, porém foi perceptível uma relativa dificuldade por parte das crianças em expressar conceitos e opiniões em relação ao meio ambiente. As crianças no geral, não possuem a percepção que integram e interagem diretamente com a natureza. Elas entendem que as ações praticadas pelos “vilões” da história são prejudiciais à natureza e consequentemente às nossas vidas, porém não conseguem reconhecer no círculo de pessoas que as cercam, possíveis ações que reproduzam o que a peça ilustra.

 

 

 

Figura 2: Momento de discussão com os expectadores

 

Utilizou-se também do método de desenhos para a demonstração de forma concreta do que cada criança conseguiu entender a realidade socioambiental pelas quais estão inseridas. As ilustrações mostravam plantas e animais sem a presença do ser humano, ou num espaço distante dos elementos da natureza. Não houve desenhos que demonstrassem o entendimento da interação que elas mesmas possuem em seu dia-a-dia com o meio ambiente.

Neste sentido o Teatro de Fantoches possui uma característica bastante importante já que apresenta o papel de alertar, sinalizar para a questão ambiental, mostrar às crianças o papel fundamental que elas possuem na preservação do ambiente, sendo de extrema importância dar continuidade ao projeto, levando outras peças que possam convencer e se mostrar satisfatórias no sentido da aprendizagem.

Figura 3: Momento de expressão através do desenho

 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As crianças envolvidas na atividade apresentaram certa dificuldade em estabelecer conexões claras entre a degradação ambiental e o papel que o homem possui nesse acontecimento, necessitando da intervenção da equipe no auxílio da construção de conceitos relativos à conservação da natureza.

O teatro de Fantoches mostrou-se uma ferramenta de educação ambiental eficaz pelo seu potencial em educar, divertindo. Por meio dele, a aprendizagem aconteceu de maneira dinâmica e lúdica. A analogia dos personagens criados com a realidade das crianças foi de extrema importância para que o poder persuasivo do fantoche fosse maximizado.

           

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARVALHO, I. C. M. Qual Educação Ambiental? Elementos para um debate sobre educação ambiental e extensão rural. Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável, v. 2, n. 2, p. 43-51, 2001

ELALI, G. A. O ambiente da escola- o ambiente na escola: uma discussão sobre a relação escola-natureza em educação infantil. Estudos de Psicologia, v.8, n.2, p. 309-319, 2003. GONZALEZ, L. T. V.; TONOZI-REIS, M. F. C.; DINIZ, R. E. S. Educação Ambiental na comunidade: uma proposta de pesquisa-ação. Revista Eletrônica do Mestrado em Educação ambiental, v. 18, p. 379-398, 2007.

GUARIM. V. L. M. S. Barranco Alto: Uma experiência em educação ambiental. Mato Grosso. Editora da Universidade Federal de Mato Grosso. 2002

GUERRA. R. A. T.; GUSMÃO. C. R. C.; SIBRÃO. E. R. Teatro de fantoches: uma estratégia em educação ambiental. Disponível em: < http://www.dse.ufpb.br/ea/Masters/Artigo_4.pdf >. Acesso em 12 de Agosto de 2009.

GUIMARÃES. M. A dimensão ambiental na educação. São Paulo. Editora Papirus. 1995

GUIMARÃES, M. Educação Ambiental Crítica. In: _______. Identidades da Educação Ambiental Brasileira. Brasília: Edições MMA, 2004, p. 25- 34.

JACOBI, P. R. Educação Ambiental, Cidadania e Sustentabilidade. Cadernos de Pesquisa, n. 118, p.189-205, 2003.

JACOBI, P. R. Educação Ambiental: o desafio da construção de um pensamento crítico, complexo e reflexivo. Educação e Pesquisa, v. 31, n. 2, p. 233- 250, 2005.

LOUREIRO, C. F. B. Educação Ambiental Transformadora. In: _______. Identidades da Educação Ambiental Brasileira. Brasília: Edições MMA, 2004, p. 65- 84.

LUCKESI, C. C. Ludicidade e atividades lúdicas: uma abordagem a partir da experiência interna. Disponível em: . Acesso em 24 de Maio de 2011.

MEDINA, N. M. Breve histórico da Educação Ambiental. Disponível em: < http://www.cursoecologia.ufba.br/.../Educacao_Ambiental>. Acesso em 24 de Maio de 2011.

MENDONÇA. H. M. N. Os meios audiovisuais e a aprendizagem. Rio de Janeiro. Editora J. Olympio. 1974.

 

 



[i] Trabalho executado pelo Instituto Bioterra – Organização para a Conservação da Biodiversidade e Meio Ambiente, através dos convênios INCRA/BIOTERRA n° 10000/2008. Este convênio faz parte do programa do MDA que tem por objetivo implantar projetos de manejo, recuperação, conservação e monitoramento do uso de Recursos Naturais, visando à recuperação ambiental de áreas protegidas por regramento jurídico e à promoção da gestão ambiental e do manejo florestal em projetos de assentamentos da reforma agrária. 

 

Ilustrações: Silvana Santos