História da Sustentabilidade - Leonardo Boff
Publicado dia: 28/11/2007 s 21:00
Fonte: Jornal do Meio Ambiente - 28/11/07
A categoria sustentabilidade é central para a cosmovisão ecológica e,
possivelmente, constitui um dos fundamentos do novo paradigma civilizatório
que procura harmonizar ser humano, desenvolvimento e Terra entendida como
Gaia. Comumente a sustentabilidade vem acoplada ao desenvolvimento.
Oficialmente o conceito desenvolvimento sustentável foi usado pela primeira
vez na Assembléia Geral das Nações Unidas em 1979. Foi assumido pelos
governos e pelos organismos multilaterais a partir de 1987 quando, depois de
quase mil dias de reuniões de especialistas convocados pela ONU sob a
coordenação da primeira ministra da Noruega Gro Brundland se publicou o
documento Nosso Futuro Comum. É lá que aparece a definição tornada clássica:"sustentá
vel é o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem
comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias
necessidades"
.
Na verdade, o conceito possui uma pré-história de quase três séculos.
Ele surgiu da percepção da escassez. As potencias coloniais e industriais
européias desflorestaram vastamente seus territórios para alimentar com
lenha a incipiente produção industrial e a construção de seus navios com
os quais transportavam suas mercadorias e submetiam militarmente grande
parte dos povos da Terra. Então surgiu a questão: como administrar a
escassez? Carl von Carlowitz respondeu em 1713 com um tratado que vinha com
o título latino de Sylvicultura Oeconomica. Ai ele usou a expressão
nachhaltendes wirtschaften que traduzido significa: administração sustentável.
Os ingleses traduziram por sustainable yield que quer dizer produção
sustentável.
De imediato surgiu a questão, válida até os dias de hoje: como produzir
sustentavelmente? Apresentavam-
se para o autor quatro estratégias. A primeira era política: cabe ao poder
público e não às empresas e aos consumidores regular a produção e o
consumo e assim garantir a sustentabilidade em função do bem comum. A
segunda era a colonial: para resolver a carência de sustentabilidade
nacional impunha-se buscar os recursos faltantes fora, conquistando e
colonizando outros paises e povos. A terceira era a liberal: o mercado
aberto e o livre comércio vão regular a demanda e o consumo, resultando
então a sustentabilidade que será melhor assegurada se for apoiada por
unidades de produção nos paises onde há abundância de recursos necessários
para a produção. A quarta era técnica: para superar a escassez e garantir
a sustentabilidade buscar-se-á a inovação tecnológica ou a substituição
dos recurso escassos: em vez de madeira usar carvão e mais tarde, em vez de
carvão, o petróleo.
Hoje com a distância temporal podemos dizer: se houvesse triunfado a estratégia
política em razão do bem comum, a história econômica e social do
Ocidente e do mundo teria seguido o caminho da sustentabilidade. Haveria
seguramente mais eqüidade (os custos e os benefícios seriam mais
igualmente distribuidos)
, viver-se-ia melhor com menos e havera mais preservação dos
ecossistemas.
Mas não foi este o caminho escolhido. Foi o do colonialismo, do
imperialismo, do globalismo ecômico-financeiro e da economia política
de mercado que gerou a grande transformação (Polanyi) com a
mercantilizaçã
o de todas as coisas e o submetimento da política e da ética à economia.
A crise ecológica atual deriva deste percurso que, mantido, poderá ameaçar
o futuro da vida humana. Agora é tempo de revisões e de buscas de
alternativas paradigmáticas.
Leonardo Boff - Teólogo