PERCEPÇÃO AMBIENTAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES SOBRE UMA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL NO SEMIÁRIDO PARAIBANO

Cíntia Cleub Neves Batista¹ Gil Dutra Furtado²

¹Zootecnista; Mestranda em Desenvolvimento de Meio Ambiente - PRODEMA/UFPB – Universidade Federal da Paraíba, cintiacleub@hotmail.com

²Engenheiro Agrônomo; Doutor em Psicobiologia; Professor das Faculdades de Enfermagem e de Medicina Nova Esperança – FACENE/FAMENE; Professor Colaborador do PRODEMA/UFPB; pesquisador do LABEA/UFPB, gdfurtado@gmail.com



Resumo

Com a crise ambiental que vem se instaurando no planeta, o desenvolvimento de estratégias que possam mitigar esses impactos tem sido de suma importância para preservação do meio ambiente, e a criação de áreas protegidas surge como um importante aliado para esta causa, essas áreas são divididas por categorias de acordo com a necessidade do espaço, as áreas de proteção ambiental (APA) é uma delas, estas são caracterizadas pela presença de comunidades em interior, objetivando a promoção do uso sustentável do espaço. Com isso, o presente trabalho objetivou estudar a percepção ambiental de alunos de duas escolas públicas localizadas no entorno da Área de Proteção das Onças, localizada no município de São João do Tigre na Paraíba – Brasil. Deste modo, foram aplicados questionários semiestruturados em duas turmas de alunos de duas escolas de ensino público, uma contendo alunos do ensino médio e outra com alunos do ensino fundamental, os resultados obtidos são considerados positivos, uma vez que a maioria dos participantes demonstraram ter conhecimento da existência da APA das Onças, bem como sobre a fauna local, destacando espécies que de acordo com a literatura ocorrem no Bioma Caatinga. Assim, esta pesquisa visa ter despertado uma ampliação do interesse dos moradores locais na preservação do meio ambiente, bem como motivar os professores a praticar mais amplamente a educação ambiental voltada a realidade local.

Palavras chave: meio ambiente, caatinga, unidades de conservação



Introdução

O bioma Caatinga está presente em praticamente toda a região nordeste do Brasil, uma das suas característicasprincipais é a perda das folhas durante a estação seca, tornando a paisagem branca e clara, fator este, que resultou na sua denominação, uma vez que em Tupi “caa”significa branca e “tinga” significa mata, portanto, mata ou floresta branca (Prado, 2003).

Outra característica peculiar da Caatinga é seu clima, que geralmente é semiárido (LEAL et al., 2005), proporcionando assim uma paisagem característica euma vasta biodiversidade.

Embora os estudos relacionados a fauna e flora da caatinga ainda sejam escassos, pesquisas indicam um número elevado de espécies encontradas neste bioma, LEALet al. 2003apontam a ocorrência de 923 espécies de planta, sendo 1/3 dessas espécies endêmicas, além disso, este mesmo autor relata a presença de 143 espécies de mamíferos, 510 espécies de aves, 116 de repteis, 51 de anfíbios e 240 de peixes. Tais dados confirmam a ocorrência de uma ampla biodiversidade no bioma caatinga, demonstrando ainda a importância da realização de estudos aprofundados neste tema, uma vez que, esses dados ainda são insuficientes quando comparados a estudos realizados no demais biomas que ocorrem no Brasil (LEAL et al., 2005).

Diante disto, a criação de áreas protegidas surge como uma perspectiva preservacionista e científica, uma vez que, através destas, espera – se proporcionar uma maior visibilidade para a preservação ambiental em especial para o bioma caatinga.

De acordo com o Cadastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC, 2017), atualmente a Caatinga possui 149 UC’s federais e estaduais, de proteção integral e de uso sustentável, totalizando 6.505.775 ha de áreas protegidas, equivalendo a aproximadamente 7,7% do bioma.

As áreas de proteção ambiental fazem parte da categoria de uso sustentável, sendo considerada a categoria de manejo que sofre mais modificação das condições naturais, uma vez que grande parte dessas áreas são compostas por propriedades privadas, merecendo atenção especial, devido ao fato de sofrerem maior pressão antrópica (ESTEVES & SOUZA, 2014).

Nesse contexto, a área de proteção ambiental das Onças localizada no município de São João do Tigre na Paraíba, foi criada com o intuito de garantir a preservação do seu bioma caatinga, dos recursos hídricos e de espécies da fauna, como a Onça Parda (Puma concolor) e o Veado Campeiro (Ozotocerusbezoarticus) (BRASIL, 2002).

Com isso, o presente estudo objetivou estudar a percepção ambiental de alunos de duas escolas públicas localizadas no entorno da Área de Proteção das Onças, em São João do Tigre na Paraíba – Brasil.

Procedimentos Metodológicos

Área de estudo

A presente pesquisa foi realizada em duas escolas localizadas no entornoda Área de Proteção Ambiental (APA) das Onças, no município de São João do Tigre, que encontra – se a cerca 393 km de João Pessoa, capital do Estado da Paraíba, Nordeste brasileiro.

A área de proteção Ambiental das Onças foi instituída em 2002 através do decreto estadual 22.880/2002, constituindo uma Unidade de Conservação de Uso Sustentável, de jurisdição estadual, gerenciada pela Superintendência de Administração do Meio Ambiente (SUDEMA), possui uma área de 36,000 hectares, sendo a maior área de proteção ambiental do estado da Paraíba.

Atualmente o município de São João do Tigre possui uma população estimada em 4.427 habitantes (IBGE, 2016), dentre estas, cerca de 400 famílias vivem na zona rural.







METODOLOGIA

Coleta de dados

Os primeiros contatos com a comunidade local tiveram início em fevereiro de 2017, com visitas a área de estudo e contato com alguns moradores locais, incluindo o condutor local, que serviu como facilitador para o acesso a APA e aos moradores da região.

A abordagem metodológica aplicada no presente trabalho foi a pesquisa qualitativa através da técnica amostral não probabilística por conveniência (GIL, 2008), uma vez que, foram previamente estabelecidos critérios para escolha das escolas e das turmas avaliadas.

Por sua vez, foram selecionadas uma turma de cada escola, sendo preferencialmente uma contendo alunos residentes na APA das Onças e outra com alunos que residiam na cidade.

As escolas selecionadas foram, a Escola de Campo Água Azul e a Escola Estadual de Ensino Médio Mario Oliveira Chaves, nestas, foram aplicados questionários semiestruturados, abordando questões relativas ao meio ambiente e a Área de Proteção Ambiental das Onças.

Estudo e caracterização da percepção ambiental

De acordo com Vieira (2005) apud Santos (2006), a pesquisa participativa é uma ferramenta de grande utilidade, pois promove o envolvimento comunitário, reconhecendo, o valor e a legitimidade dos diferentes tipos de conhecimentos, particularmente o conhecimento considerado “popular” e “local”.

A presente pesquisa foi autorizada pelocomitê de ética da Universidade Federal da Paraíba (CAAE Nº 67125917.0.0000.5188).

Os questionários foram aplicados diretamente aos alunos e os mesmos levaram para casa, para que seu responsável legal assinasse o TCLE autorizando a participação do menor na pesquisa, o que veio a limitar o número de participantes, uma vez que alguns pais se recusaram a assinar o termo, inviabilizando a participação da criança na pesquisa.



RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram entrevistados 22 alunos de duas escolas públicas local, sendo uma de ensino médio (N=9) e outra de ensino fundamental (N=13).

No total de entrevistados, 29,5% eram do sexo feminino e 20,5% do sexo masculino, com idades variando entre 13 e 21 anos. Destes, 42,9% faziam o segundo ano do ensino médio e 57,1% o nono ano do ensino fundamental, sendo, os alunos do ensino médio residentes da APA das Onças e os do ensino fundamental, residentes da cidade.

O questionário era composto por oito questões, destas, seis questões eram fechadas, com a opção sim ou não, e duasquestões dissertativas, as quais foram elaboradas de maneira simples em linguagem acessível de maneira que não constrangesse o participante nem o eliminasse da pesquisa.

Ao serem questionados sobre a área de proteção ambiental das onças, 90,9 % dos participantes afirmaram saber o que significava, e apenas 9,1% respondeu negativamente. Resultado encontrado na escola de alunos que residem na cidade, contudo merece atenção, uma vez que a referida escola é uma escola de campo e já possui a disciplina de educação ambiental em seu currículo escolar, contudo, tal resultado pode ser considerado positivo, uma vez que, MARCZWSKI (2006), em sua pesquisa com 117 alunos participantes, 102 optaram por não responder à questão sobre unidades de conservação e apenas 15 responderam corretamente.

Do total de participantes 54,5% afirmaram que moram dentro da APA das Onças, 40,9% afirmaram que não e 4,5% não souberam responder. Nas demais questões sobre saber o que é meio ambiente, preservação da APA e importância dos animais, todos (100%) responderam positivamente.

Durante a aplicação do questionário, pôde-se perceber também que alguns alunos não sabiam ao certo se moravam dentro ou fora da APA, uma vez que a área representa cerca de 50% do município, abrangendo grande parte da extensão rural do município, mas não toda, o que possivelmente venha a confundir a população, tornando necessário um trabalho maior de divulgação dessa área e da sua real importância.

Apesar de não existir registro oficial da ocorrência da ocorrência da Onças Parda na área, os relatos sobre a espécie são comuns entre os habitantes da região, em função disto foi incluída uma questão especifica sobre o assunto, onde os participantes foram questionados sobre saber ou não da ocorrência da Onça Parda (Puma concolor) na APA,assim, 95,5% afirmaram que sim, já ouviram falar da presença da espécie no local e apenas 4,5%. NUNES (2011) encontrou resultados semelhantes aos da presente pesquisa, onde, a espécie foi citada em localidades inéditas (Cajazeiras, Mataraca, Maturéia, São João do Cariri e São José dos Cordeiros na Paraíba e São Caitano e Serra Talhada em Pernambuco), demonstrando assim a necessidade de mais estudos direcionados a esta espécie, uma vez que, seus registros existem apenas por relatos de moradores das regiões pesquisadas.

Na questão aberta, as respostas foram analisadas individualmente e destacadas as de maior relevância (Tabela 1), onde, perguntou-se: “Você acha os animais importantes? Porque?” No entanto, a maioria(N=13) dos participantes optaram por não responder à questão destacada.





Diante dos resultados encontrados para esta questão pode-se perceber que apesar da diferença de idades e de série, as respostas apresentadas pelos participantes foram semelhantes, demonstrando uma certa tendência a não se considerar como parte integrante do meio ambiente, corroborando com os resultados encontrados por TELES & SILVA (2012) em um trabalho realizado com crianças de escolas de ensino fundamental I e II e por MARCZWSKI (2006), onde 46,14% dos participantes demonstraram uma forte tendência a associar o meio ambiente apenas aos recursos naturais e 34,87% apenas à elementos da natureza, resultados que demonstram ainda mais a importância de uma educação ambiental efetiva nas escolas, auxiliando nas estratégias de preservação ambiental, uma vez que a educação de base é de suma importância na promoção da preocupação ambiental e consequentemente na proteção deste.

Com relação aos animais que ocorrem na região, as respostas foram variadas, contudo, as espécies mais citadas foram basicamente as mesmas nas duas escolas a Onça Parda, Tatu e Cobra, como demonstrado nos gráficos 1 e 2.







Apesar dos estudos direcionados a fauna nessa região serem consideravelmente escassos, os animais mencionados pelos alunos são comumente citados na literatura como espécies encontradas no bioma caatinga (SILVA et al. 2004).

Esse conhecimento pode estar atrelado à prática da caça realizada pelos adultos, que apesar da existência de uma área de proteção ambiental no local, tal atividade ainda persiste como tradição, tanto por parte dos moradores locais como das regiões circunvizinhas que se deslocam até a área para praticar a caça predatória.

Nesse contexto, a partir de informações acerca dos mamíferos, foram estabelecidas áreas prioritárias para conservação selecionadas a partir da sua riqueza de espécies, assim como, áreas que possuemrelevante interesse ecológico, porem com dados de fauna insuficientes.

As áreas foram divididas de acordo com sua região, estando o município de São João Tigre inserido na área “Centro de Pernambuco” pertencendo ao mesmo grupo os municípios: Águas Belas (PE), Alagoinha(PE),Arcoverde(PE), Buíque(PE), Caetés(PE), Custódia(PE), Iati(PE),Ibimirim(PE), Paranatama(PE), Pesqueira(PE), Pedra(PE),Saloá(PE), São Sebastiãodo Umbuzeiro(PB), Sertânia(PE) e Tupanatinga(PE)(SILVA et al. 2004), destacando assim, a necessidade da realização de pesquisas cientificas de levantamento faunístico, com o intuito de efetivar um trabalho de preservação da fauna e auxiliar a compreender as mudanças e ocorrem no bioma Caatinga.



CONSIDERAÇÕES FINAIS


Diante dos resultados encontrados, sugere – se que ambas as turmas pesquisadas, tem conhecimento da área de proteção ambiental das onças, apesar de demonstrarem não compreender a real função daquela área.

Além disso, pode – se perceber de modo não generalista, que a maioria dos participantes apresentam uma certa tendência a não se considerar como parte integrante do meio ambiente, chamando atenção para a necessidade um trabalho de educação ambiental mais específico com relação a este tema.

Sobre a percepção em relação a fauna, constatou – se também que a maioria cita como presente no local a espécie símbolo da APA, a Onça Parda (Puma concolor), como também demonstra um certo conhecimento em relação aos demais animais comumente encontrados no bioma Caatinga, possivelmente pela convivência com os adultos ou até mesmo por ter avistado alguma das espécies citadas durante o deslocamento pela APA.

Assim, esta pesquisa visa ter despertado uma ampliação do interesse dos moradores locais na preservação do meio ambiente, bem como motivar os professores a praticar mais amplamente a educação ambiental na realidade local.

Agradecimentos

Agradecemos ao apoio fornecido pelo Laboratório de Ecologia Aquática (LABEA), Departamento de Sistemática e Ecologia, Centro de Ciências Exatas e da Natureza, Universidade Federal da Paraíba. Agradecemos ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA)/ UFPB pelo apoio institucional. Agradecemos pela bolsa de mestrado fornecida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).





REFERÊNCIAS


BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza: Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000; Brasília: MMA, 2011. 76 p.

BRASIL. Decreto Estadual n.º 22.880, de 25 de março de 2002 . Decreto de criação da Área de Proteção Ambiental das Onças, João Pessoa - PB

CNUC, 2017. Cadastro Nacional de Unidades de Conservação. Disponível em: <http://sistemas.mma.gov.br/cnuc>. Acesso em: 15/09/2017

CUNHA, Antônio Henrique Martins Carneiro da. APA das Onças: Gestão do Território e desafios para Conservação de Ecossistemas. João Pessoa: UFPB, 2011. Monografia (Graduação) – Centro de Ciências Exatas e da Natureza, Universidade Federal da Paraíba, 2012.

ESTEVES, Aline Oliveira; SOUZA, Marcelo Pereira. Avaliação Ambiental Estratégica e as Áreas de Proteção Ambiental. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 19, p. 77-86, 2014.

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