Ecopontos para pilhas e baterias na cidade de São Bernardo do Campo/SP

 

Fernanda Cristina Romero, Graduanda em Ciências Ambientais - SP. Instituição: Universidade Federal de São Paulo. Endereço: Av. Conceição, 329 - Centro, Diadema - SP, 09920-000. E-mail: romero_fcr@yahoo.com.br.

 

Luciana Aparecida Farias, Professora da Universidade Federal de São Paulo. Endereço: Av. Conceição, 329 - Centro, Diadema - SP, 09920-000. E-mail:  lufarias2@yahoo.com.br

 

Resumo

 

Pilhas e baterias são classificadas como resíduos perigosos e, depois de utilizadas, a maioria é ainda jogada em lixos comuns contaminando solo, ar e água. Nesse sentido, o objetivo do presente trabalho é apresentar os resultados de uma pesquisa cuja proposta foi avaliar a eficácia dos ecopontos disponibilizados pela prefeitura do município de São Bernardo do Campo, no estado de São Paulo. O presente estudo teve caráter qualitativo exploratório, sendo que os dados qualitativos, resultantes das entrevistas e aplicações de questionários semiestruturados, foram organizados de forma descritiva com o objetivo de permitir a análise comparativa das atuais condições de trabalho e eficiência dos ecopontos. O principal problema encontrado foi a falta de diálogo entre população, poder público e iniciativa privada, o que compromete a implementação de programas e ferramentas eficientes e eficazes relacionados ao manejo de pilhas e baterias.

 

Palavras Chaves: resíduo sólido urbano, pilhas e baterias, ecopontos.

Ecopoints for batteries in the city of São Bernardo do Campo / SP

 

Abstract

 

Batteries are classified as hazardous waste and highly toxic compounds of metals, after use most are still thrown into ordinary bins and goes to landfills contaminating soil, air and water. In this sense, the objective of this paper is to present the results of a study which purpose was to evaluate the effectiveness of eco-points made available by the city of São Bernardo do Campo, in the state of São Paulo. The present study was exploratory qualitative and qualitative data resulting from interviews and applications of semi-structured questionnaires were organized descriptively in order to permit a comparative analysis of current working conditions and efficiency of eco-points. The main problem was the lack of dialogue between people, government and the private sector, which undermines the implementation of programs and efficient and effective tools related to the management of batteries.

 

Keywords: municipal solid waste, batteries; ecopoints.

 

Introdução

 

O entendimento do que é resíduo foi sofrendo diversas modificações ao longo do tempo de acordo com as necessidades ambientais vigentes. Atualmente, a designação para resíduo considera seu valor econômico agregado e sua possibilidade de reaproveitamento (Demajorovic, 1996 e Demajorovic 1995). Considerando a evolução desse conceito do que antes era considerado “lixo” para o atual termo “resíduo sólido”, com valor agregado, temos no cenário nacional propostas de ações efetivas, ainda que demoradas no que tange ao gerenciamento dos mesmos. Em dois de agosto de 2010 a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) foi promulgada após vinte anos no Senado, onde ocorreram debates entre diversas instâncias sociais e políticas, desde o governo até entidades civis. A PNRS reúne o conjunto de diretrizes e ações a serem adotadas com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento adequado dos RSU no país (Brasil, 2010). A responsabilidade compartilhada e a logística reversa (Brasil, 2010) aparecem como importantes objetos norteadores da nova Lei. Dessa forma, a sociedade como um todo se torna responsável pela redução e reutilização dos resíduos, ou seja, arcam com a responsabilidade pós-consumo. Entretanto, alguns processos de mudança ainda são necessários (Abramovay et al. 2013). Falta estabelecer efetivamente no país, segundo os autores, esse princípio do poluidor-pagador. Só ele será capaz de desarmar uma cadeia de irresponsabilidade cujas consequências sociais e ambientais são indesejáveis, haja vista o crescimento urbano.

Em 1970, 56% dos brasileiros moravam em áreas urbanas. Hoje são 80%. O volume de RSU domiciliares gerados em cidades da região Sul e Sudeste do país, por exemplo, pode chegar a 1,3 kg/hab./dia, considerando todos os resíduos manipulados pelos serviços de limpeza urbana, isto é, domiciliares, comerciais, de limpeza de logradouros, de serviços de saúde e entulhos (Monteiro, 2008). Segundo a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE), 41,6% dos municípios brasileiros ainda destinam de maneira inadequada (em lixões ou aterros controlados) os RSU gerados em seus territórios e no ano de 2014 foram coletados no Brasil 195.233  toneladas por dia de RSU (ABRELPE, 2014). Portanto, a disposição final dos RSU tornou-se um grave problema, tanto em decorrência do volume gerado, quanto às soluções empregadas pelas administrações públicas ao longo de décadas, que se preocupavam exclusivamente em afastar o lixo coletado das áreas urbanas, depositando-o em locais inapropriados, tais como: encostas florestadas, manguezais, várzeas de rios, baías e vales (Giannetti et al. 2006).

Dentro desse contexto, a preocupação com o desenvolvimento sustentável conduz à busca por sistemas de produção de ciclo fechado (Zenin e Mônaco, 2008), nos quais os inevitáveis resíduos passam a serem matérias-primas de novos produtos. O interesse pelo tema reciclagem e pela coleta seletiva cresce, tanto na academia e indústria, quanto na sociedade em geral. Nesse processo, a coleta seletiva desempenha um papel fundamental na gestão ambientalmente sustentável dos resíduos, pois articula a etapa de descarte à incorporação deste no mercado da reciclagem quando possível ou ao descarte ambientalmente correto quando necessário, evitando que as sobras de muitas atividades humanas sejam destinadas a aterros sanitários e lixões (Santos et al. 2012).

Outro problema proveniente dos RSU incorretamente descartados são as substâncias tóxicas presentes que, além serem um caso de saúde pública, agridem o meio. Um exemplo típico e comumente descartado no lixo comum são as pilhas e baterias que, ao serem descartadas de forma indevida, passam a se desintegrar e liberar no meio ambiente substâncias e elementos perigosos. Conforme discutem Santos et al. (2012), as pilhas podem ser classificadas de várias maneiras, como: “formato, tamanho, se aberta ou não, removível ou fixa, finalidade, eletricidade, sua aplicação e uso e se é primária ou secundária. O grau de periculosidade também vai depender da composição. Existem várias opções e as quantidades dos metais na composição de pilhas e baterias estão sendo reduzidas em atendimento às atuais resoluções que impõe regras mais restritivas em relação à composição das mesmas. Segundo Kemerich et al. (2012), no Brasil, até a década de 1990, não se considerava a questão da contaminação ambiental por pilhas e baterias usadas. Todavia, a partir de 1999, com a Resolução 257 o país passou a ter legislação específica sobre o tema, haja vista que este tipo de RSU, como por exemplo, as pilhas do tipo zincocarbono (comuns) que possuem ainda alguns elementos usados para evitar a corrosão, como Hg, Pb, Cd, e In, além de Zn, grafite e MnO2 (dióxido de manganês) que pode se transformar em MnO(OH) (manganita) formada pelo óxido de manganês hidratado e uma hidroxila, o qual altera o pH do solo deixando-o mais alcalino. Entretanto, em 2008 a Resolução 257 foi revogada, entrando em vigor a Resolução 401, que define a destinação ambientalmente adequada das pilhas e baterias usadas e restringe os tipos passíveis de terem como disposição final os aterros sanitários licenciados e incineradores, mesmo que essas não excedam a quantidade permitida de metais tóxicos13. De acordo com a norma NBR 10.004, as pilhas e baterias apresentam características de corrosividade, reatividade e toxicidade, classificando-as como resíduos perigosos (classe I), apesar de nem todos os tipos de pilhas e baterias apresentarem o mesmo grau de periculosidade à saúde e ao meio ambiente, pois o mercado dispõe de alternativas menos agressivas.

De acordo com a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (ABINEE), oPrograma de Logística Reversa de Pilhas e Baterias Portáteis”, iniciado no mês de novembro de 2010, em atendimento à Resolução CONAMA 401/2008, coletou 900 toneladas de pilhas e baterias, por meio de mais de 1.100 postos de recebimento espalhados em todo o Brasil (GM&CLog- Logística e Transporte)[1]. O programa prevê o recebimento, em todo território nacional, desse tipo de RSU, entregues pelo consumidor ao comércio, e seu encaminhamento, por meio de transportadora certificada, a uma empresa que faz a reciclagem e destinação final ambientalmente adequada desse material. Na região metropolitana da Grande São Paulo, as pilhas e baterias de uso doméstico, coletadas nos postos de recolhimento, estão sendo encaminhadas à empresa Suzaquim Indústria Química e os custos desta destinação final também são arcados pelos fabricantes e importadores (ABINEE, 2013).

Por outro lado, podemos afirmar que a logística reversa no campo das pilhas e baterias ainda é escassa, pois grande parte da população não conhece a periculosidade de seus componentes ao meio ambiente e à saúde humana, descartando pilhas e baterias juntamente ao lixo domiciliar, quando o procedimento correto seria retorná-las ao comerciante, importador, revendedor ou ao próprio fabricante de modo a corroborar com a articulação de um fluxo reverso desses materiais. Juntamente a essa questão, existem os altos custos de acondicionamento, triagem, transporte, remanufatura e eventual reciclagem de pilhas e baterias que tornam a logística reversa desse rol de resíduos economicamente inviáveis. O Brasil dispõe de poucas tecnologias para reciclar completamente as pilhas e baterias – na maioria das vezes, esses materiais são remanufaturados no país, ou seja, têm seus componentes substituídos por outros novos de modo a oferecer maior sobrevida ao produto (tem-se como exemplo o caso da troca de células de lítio nas baterias íons-lítio pós-uso) ou ainda, têm alguns de seus componentes (geralmente os mais simples) extraídos e reaproveitados em outros ciclos produtivos.

Para que essa situação comece a se reverter e o processo de logística reversa não somente de pilhas e baterias, mas também de diversos tipos de resíduos comece a aumentar, é necessário implementar a formação de um mercado consumidor para tecnologias limpas e processos produtivos com maior eco eficiência. Todavia, no caso específico de pilhas e baterias, as tentativas de articulação dessa logística por entidades privadas envolvendo a participação do consumidor, ainda que normalmente bem intencionada, nem sempre atinge os objetivos desejados, pelos motivos mais diversos, como por exemplo, o marketing verde, dificuldades de estabelecimento de acordo entre iniciativas público-privada, as dimensões do país, entre outros. Iniciativas públicas vêm surgindo no âmbito governamental, considerando-se a necessidade preconizada pela PNRS de as municipalidades apresentarem seus Planos de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos para terem acesso a recursos da União para investimentos nos serviços de limpeza pública. Conforme exemplo de um estudo realizado em Goiânia (Aquino e Leite, 2007), houve a investigação do gerenciamento do descarte de pilhas e baterias no estado, o qual mostrou que a iniciativa pública, no caso a Companhia de Urbanização de Goiânia- COMURG disponibiliza um compartimento junto aos seus Pontos de Entrega Voluntária (PEVs) para descarte de pilhas e baterias. Porém, sem um contrato com alguma empresa que realize a reciclagem, os materiais permanecem nos pontos de entrega voluntária, o que levou ao seguinte questionamento: Seria esse também o caso dos ecopontos do município de São Bernardo do Campo?

São Bernardo do Campo é uma cidade de grande porte com população estimada em 2015 de aproximadamente 816 mil habitantes (IBGE, 2015), localizada no Estado de São Paulo, a Secretaria de Serviços Urbanos disponibilizou uma relação de ecopontos do município no site da prefeitura, os quais visam proporcionar destinação final ambientalmente adequada e alternativa ao aterro sanitário da cidade. Entretanto, acreditou-se que os mesmos também recebiam pilhas e baterias, além daqueles ecopontos fornecidos pela iniciativa privada, haja vista que as pilhas e baterias são citadas no Plano Municipal de Resíduos Sólidos do município, ainda que sem grande destaque (São Bernardo do Campo, 2010), o qual faz menção a este tipo de resíduo citando a Lei Municipal n° 4911, de 28 de setembro de 2000. Há, portanto, um incentivo para coleta seletiva de pilhas e baterias pós-uso existentes na cidade. Mesmo esta preconizando que fica expressamente proibido despejar no lixo comum, pilhas e baterias de aparelhos celulares e que tais objetos devem ser embalados e entregues aos estabelecimentos comerciais que comercializem esses produtos, nem sempre isso ocorre.

Por outro lado, também há indícios de que os ecopontos da cidade não sejam eficientes e sua situação difere de seu ideal de concepção; principalmente devido à infraestrutura precária e/ou inexistente. No cenário observado, por exemplo, para pilhas e baterias, quando procurado um dos ecopontos listado na relação anteriormente citada para o descarte desse tipo de material recolhido na Universidade Federal de São Paulo, Campus Diadema, o mesmo não existia e outros foram de difícil localização, bem como em nenhum momento foi dada a orientação se aqueles ecopontos recebiam ou não aquele material. Esta coleta faz parte de um ecoponto implantado na universidade por meio do projeto de extensão Consumo Sustentável do grupo Quimicando com a Ciência, cujo alguns membros residem na cidade, o que levou a escolha do município de São Bernardo do Campo para o descarte do material recolhido.

Tal constatação levantou alguns questionamentos, os quais procurou-se responder ao longo do desenvolvimento do trabalho: quais dos ecopontos listados existem de fato e quais as suas condições de funcionamento? Esses ecopontos recebem pilhas e baterias? Caso recebam, pode-se afirmar que estas são em quantidade significante? É realizado estudo prévio das tipologias de pilhas e baterias de modo a verificar se realmente podem ser dispostas em aterros sanitários licenciados, conforme preconiza a Resolução 401 do CONAMA? Quais os desafios de gestão ambiental de pilhas e baterias e de implementação da PNRS nesse município, relativos a esses produtos, que precisam ser superados para que a logística reversa seja eficiente? Diante do exposto, é evidente que o problema é relativamente complexo e segundo hipóteses iniciais poderia envolver ainda algumas dificuldades extras, como por exemplo: 1) dificuldade de se viabilizar a logística reversa como preconizada na PNRS em função das pilhas e baterias consumidas serem, em sua maioria, originárias da China; 2) dificuldade de integração das iniciativas de reciclagem existentes, tanto públicas quanto privadas, e 3) carência de programas ambientais devidamente estruturados e apoiados pelo poder público e/ou iniciativa privada para garantir o recolhimento de pilhas e baterias. Tais questões levaram ao objetivo do presente estudo, o de refletir e investigar, por meio de uma revisão bibliográfica e de uma pesquisa de campo, a eficiência dos ecopontos para coleta de pilhas e baterias de uma forma geral no país, bem como os ecopontos disponibilizados pela prefeitura do município de São Bernardo do Campo, no estado de São Paulo. Pretendeu-se avaliar, sobretudo, se os ecopontos listados pela prefeitura do município realmente existiam e funcionavam, se a população os procurava para o descarte de material e para onde o mesmo era levado após ser recolhido.

Para se atingir esse objetivo, entendeu-se que era importante mapear e analisar a iniciativa pública municipal referente à reciclagem de pilhas e baterias pós-uso em São Bernardo do Campo, levantar informações acerca de como se dá o gerenciamento desses resíduos sólidos em nível local - incluindo identificação de destino para desmonte, remanufatura e reciclagem - bem como caracterizar os principais desafios de gestão pública de pilhas e baterias e de implementação da PNRS em nível municipal, no que tange a esses resíduos, tendo em vista responder às questões de pesquisa que nortearam o desenvolvimento do presente estudo.

 

Percurso metodológico

 

Desenvolvimento geral do trabalho

 

Para a realização do objetivo proposto, a metodologia utilizada contemplou quatro etapas propostas, com foco na caracterização dos desafios a serem superados em relação à iniciativa pública de gestão de pilhas e baterias, existentes em São Bernardo do Campo e, também, em relação à implementação da PNRS no que tange a esses produtos em nível municipal, sendo essas etapas: 1) levantamento bibliográfico e documental e elaboração de diário de campo - feitos a partir da busca em plataformas de dados como o ISI, Web of Knowledge, o SciFinder e a plataforma Scielo, bem como junto ao banco de teses e dissertações da CAPES, utilizando descritores adequados; 2) visitas e análise dos ecopontos (iniciativa pública) disponibilizados em São Bernardo do Campo - visitação e análise da iniciativa pública (100 ecopontos) para coleta seletiva em relação ao gerenciamento específico de pilhas e baterias realizada ao longo do ano de 2014. Um importante instrumento utilizado para nortear o planejamento das visitas foi a relação dos ecopontos do município, disponibilizada no site da prefeitura, a qual fornecia o endereço dos principais pontos de entrega voluntária de resíduos sólidos. Nessa visita foram realizadas entrevistas presenciais semi-estruturadas com o responsável pelos ecopontos (quando encontrado), com o objetivo de identificar quais deles realmente existem e se recebiam ou não pilhas e baterias; 3) entrevista com o gerente do departamento de sustentabilidade da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (ABINEE) com o objetivo de se obter informações sobre o manejo de pilhas e baterias no cenário nacional; 4) entrevista com o diretor da limpeza urbana do Município de São Bernardo do Campo e 5) visita e análise da iniciativa privada para a coleta seletiva de pilhas e baterias com o objetivo de se compreender o manejo dos RSU de forma geral no município, particularmente o manejo das pilhas e baterias.

O presente estudo teve caráter qualitativo exploratório conforme preconiza Gil (2008), sendo que os dados qualitativos, resultantes das entrevistas e aplicações de questionários semiestruturados, foram organizados de forma descritiva com o objetivo de permitir a análise comparativa das atuais condições de trabalho e eficácia dos ecopontos. É importante salientar que a abordagem qualitativa adotada na pesquisa teve como característica a não utilização de instrumental estatístico como base para o processo de análise de um problema (Richardson, 1999).

No que diz respeito ao papel relacionado aos ecopontos do município com relação à coleta seletiva de pilhas e baterias, foi realizada uma análise crítica parcial abrangendo aspectos sobre: (i) existência e funcionamento dos ecopontos; (ii) o recebimento ou não de pilhas e baterias. Esta análise fez uso tanto dos dados levantados com a pesquisa de campo, como da revisão bibliográfica sobre o tema, sempre buscando respostas às hipóteses e o alcance dos objetivos do trabalho.

Com relação aos pontos dispostos pelo município como iniciativa privada, situados em bancos, supermercados, farmácias, entre outros, ainda que não previsto inicialmente no estudo, constatou-se ao longo de seu desenvolvimento a necessidade de se fazer um levantamento prospectivo com relação aos mesmos. Nesse sentido, foram realizadas três visitas a estes estabelecimentos com o objetivo de se obter um panorama inicial desses locais, com posterior análise abrangendo aspectos sobre: (i) local em que o ecoponto está situado; (ii) empresa que recolhe as pilhas e baterias; (iii) periodicidade de coleta dos materiais.

Finalmente, todos os dados obtidos nas visitas dos ecopontos privados e públicos foram analisados a partir das entrevistas feitas com o gerente do setor de Sustentabilidade da ABINEE e com o diretor de Limpeza Urbana do município de São Bernardo do Campo, buscando compreender o ciclo de vida com relação às pilhas e baterias no município estudado e quais são as principais dificuldades relacionadas a coleta seletiva desses materiais e dos resíduos sólidos de forma geral. Para análise e comparação das informações, foi utilizado o método de triangulação dos dados que, segundo Duarte (2009), permite integrar diferentes perspectivas em torno do objeto de estudo.

 

Resultados e discussões

 

A fase inicial do desenvolvimento do projeto consistiu no levantamento bibliográfico feito por meio de busca e leitura de artigos referentes ao tema, com destaque para o estudo aprofundado da Política Nacional dos Resíduos Sólidos. Essa etapa ocorreu de Janeiro a Junho de 2014. Na sequência, foi iniciado o que se denominou como sendo a segunda fase, na qual foram feitas visitas aos ecopontos com a elaboração de um diário de campo com as principais ocorrências diárias, conforme relato a seguir.

            A primeira constatação feita no início das visitas aos ecopontos foi que os mesmos eram divididos em dois tipos, conforme a finalidade a que se destina, sendo eles: os Pontos de Entrega Voluntária (PEVs)- que se constituem de contentores dispostas pelo município e recebem materiais de simples reciclagem, como papel, vidro, plástico e alumínio; e os pontos de entrega de resíduos da construção civil (RCC)- que também recebem os resíduos aceitos pelos PEVs. Porém, tal distinção não estava clara na lista disponibilizada pela prefeitura. Todos os PEVs receberam códigos identificadores “EP n”.

 

Visita e análise dos ecopontos (iniciativa pública) disponibilizados em São Bernardo do Campo

 

As visitas aos ecopontos começaram em Março de 2014, após liberação da pesquisa pelo Comitê de Ética da universidade e foram concluídas em meados de setembro do mesmo ano, com 100 pontos visitados, sendo que será dado destaque a alguns.

Conforme citado anteriormente, pelo fato de não estar claro na lista disponibilizada pela prefeitura a distinção entre os tipos de ecopontos, a primeira visita foi ao ecoponto de RCC EP 01 Reciclável, do bairro Batistine. O entrevistado do local era funcionário da empresa SBC Valorização de Resíduos, oriunda de uma parceria Público-Privada. Segundo informações, o local não recebe materiais de natureza eletrônica, o que inclui pilhas e baterias. Entretanto, essa informação não é de conhecimento geral e muitos munícipes usuários do serviço de reciclagem, buscam o local para descartar estes materiais, porém, os funcionários são instruídos a não receberem, característica essa entendida pelo entrevistado como sendo um ponto falho dessa prestação de serviço. Porém, informou também que quando a quantidade de pilhas e baterias não é grande, os funcionários recolhem e as entregam para catadores. O mesmo alegou que, uma vez que esses materiais são maléficos para o meio ambiente, a prefeitura deveria disponibilizar locais para descarte dos mesmos, o que não ocorre. Ele desconhecia a disponibilização de ecopontos da iniciativa privada. Além disso, ao ser questionado sobre conscientização quanto ao trabalho por ele desenvolvido, informou que não houve esse processo quando de sua contratação por parte da prefeitura e que apenas desenvolve sua função. Outro ponto importante constatado durante a entrevista foi sobre o processo de divulgação do local para a comunidade no entorno do ecoponto. O entrevistado relatou que a prefeitura enviou agentes ambientais porta-a-porta para conversarem com os moradores do bairro a fim de informar sobre a existência e importância do local. Entretanto, uma vez que as pessoas passaram também a buscar o ecoponto para descartarem material eletrônico e até mesmo resíduo orgânico, o funcionário disse entender essa característica como falha, conforme citado acima e que outros trabalhos de conscientização deveriam ser feitos.

Dentro desse contexto, diversos autores destacam os impactos socioambientais vinculados aos RSU e a importância do descarte ambientalmente correto dos mesmos, sendo que os ecopontos constituem uma importante estratégia para a reciclagem desses materiais (Jacobi, 2011 e Savi, 2005). Entretanto, na visita acima relatada, foi possível constatar que, embora o funcionário desempenhe uma função de suma importância, o mesmo não tinha dimensão da questão e desenvolve seu trabalho “mecanicamente”, que não foi previamente instruído. Ainda assim, o entrevistado demonstrou sensibilidade quanto à questão ambiental, que disse entender que de alguma forma, os resíduos afetam o meio ambiente. Ao ser questionado quanto às pilhas e baterias, disse não compreender o fato de a prefeitura não aceitar esse tipo de material, uma vez que os ecopontos deveriam tratar de todos os tipos de resíduos sólidos e posteriormente, dar a eles os respectivos tratamentos para reciclagem ou encaminhá-los para locais licenciados. O que nos evidencia a importância de pensar políticas públicas que incluam todos os atores dessa questão, para que os mesmos entendam o processo da coleta e reciclagem de RSU do seu município, e, no caso desses funcionários dos ecopontos, instruir as pessoas a levarem esses materiais para os pontos de coleta da iniciativa privada.

Na sequência, visitou-se um condomínio EP 10A, localizado no Bairro Baeta Neves, onde o entrevistado foi o síndico e também morador do local. O ecoponto em questão tratava- se de contentores que recebiam os resíduos recicláveis gerados pelos próprios moradores, exceto pilhas e baterias. Entretanto, entendendo a necessidade da reciclagem desses materiais, o síndico, por iniciativa própria, colocou um ponto de entrega de pilhas e baterias no condomínio, as quais são posteriormente levadas para um local, de iniciativa privada, que segundo ele, as direcionava para locais adequados e licenciados.

Na mesma rua do condomínio, havia outro ecoponto (EP 10B) listado, localizado em uma praça pública. O síndico também fora questionado sobre a existência desse ecoponto e informou que os contentores não existiam mais e que haviam sido queimadas por catadores por se sentirem revoltados com a presença dos ecopontos, pois isso significaria ausência do material para ser reciclado, o qual servia como fonte de renda para os mesmos.  No local, foi constatado que de fato não existia mais, porém, a comunidade ainda o procura para descarte de materiais e, na sua ausência, descarta os resíduos no chão. Uma munícipe moradora da região foi abordada a fim de se obter maiores informações sobre o ocorrido e a mesma alegou que não foram os catadores que queimaram os contentores, e sim moradores de rua (Figuras 1a e 1b).

 

Figura 1a (esquerda) e 1b (direita) - Disposição irregular de resíduos na ausência de ecoponto em praça pública localizada no bairro Baeta Neves, São Bernardo do Campo.

O ecoponto seguinte, EP 09, também se situava no bairro Baeta Neves, em condomínio particular, onde a entrevistada foi uma funcionária da limpeza do local. A mesma relatou que recolhe os resíduos dos condôminos e os deposita nos contentores localizadas. A entrevistada informou que algumas vezes separava o “lixo” corretamente para a reciclagem, uma vez que alguns moradores não o fazem. Além disso, disse notar que pilhas e baterias, que também não são aceitas pelos contentores da prefeitura, são descartadas no lixo comum. Consciente da importância do descarte correto, a funcionária retira as pilhas e baterias do lixo e as separa para encaminhá-las a locais que as aceite, também de iniciativa privada, no caso, uma drogaria.

Nesse contexto, Provazy et al.(2012) discutem o aumento do consumo de materiais eletroeletrônicos, o qual está diretamente ligado ao aumento de sua produção em virtude do maior número de consumidores e também ao excesso.  Todavia, como parte do ciclo de vida de qualquer produto, após o uso, essas pilhas e baterias tornam-se obsoletas e são descartadas, processo esse que requer análise do impacto causado ao meio ambiente, haja vista que parte de seus constituintes é tóxico e, quando em contato com o solo e o lençol freático, podem causar sérios danos. Entretanto, esses materiais ainda são comumente descartados no lixo doméstico, o que também constatamos no presente estudo. Essa constatação nos fez refletir sobre duas questões importantes. A primeira delas é a importância de o município realizar um trabalho efetivo de educação ambiental com a população com relação ao descarte e coleta desses materiais. a segunda diz respeito à observação na presente pesquisa, de que não houve, necessariamente, uma relação entre o nível de instrução do entrevistado e seu maior esclarecimento sobre o tema estudado. Uma constatação diferente do que se é esperado, que os moradores do condomínio são pessoas de classe média, aos quais normalmente se associa atitudes mais conscientes devido ao nível de instrução maior, conforme reflexão feita por Nery et al. (2012). Ainda que não tenha sido objeto de investigação, consideramos essa informação importante para ser destacada.

O ecoponto seguinte tratava-se de uma escola e aqui cabe destacar que as escolas públicas de São Bernardo do Campo são os principais locais possuidores de contentores e escolhidos como pontos de entrega voluntária.  O local em questão localiza-se no Bairro Demarchi, (EP 03A) onde os contentores estão situadas na área interna e externa, tendo assim, dois ecopontos no mesmo local. A funcionária entrevistada, no caso, a coordenadora da escola, informou que o ponto da área interna é para uso apenas de funcionários e alunos, o da área externa é para uso da comunidade em geral. Além disso, embora não sejam aceitas pilhas e baterias, a coordenadora se mostrou bastante consciente sobre a questão ambiental e disse entender a necessidade do descarte ambientalmente correto desse tipo de material.

O ponto de entrega voluntária localizado no bairro Alvarenga (EP 14A), que também é uma escola, possui contentores na área interna, mas também para uso da comunidade, além dos funcionários e alunos. Uma funcionária da segurança alegou que o local não é muito procurado, pois, a reciclagem é fonte de renda dos moradores, portanto, eles não os descartam para poderem vendê-los e ganharem com isso.

Dessa forma, foi possível observar que alguns dos ecopontos localizados no interior das escolas são para uso interno. Entretanto, em alguns bairros, não outra opção nas proximidades para os moradores, o que aparece, portanto, como uma inconsistência com a proposta de reciclagem do município, que todos deveriam ter acesso para descarte de seus resíduos. Além disso, em época de férias escolares as escolas estão fechadas, portanto, não é possível a entrada da comunidade para descarte dos materiais nos contentores dos ecopontos, o que também aparece como um problema, que os resíduos são gerados o ano todo e devem ser descartados corretamente durante esse período. Já em uma escola municipal de iniciação profissional (EMIP), constatou-se também que o local recebe pilhas e baterias, porém, por iniciativa própria.

Nessa altura do trabalho havia sido constatado que não iniciativa pública oficial para coleta de pilhas e baterias, mesmo a população procurando os ecopontos para isso. A não existência do oferecimento dessa coleta por parte do município foi esclarecida após as entrevistas com a ABINEE e com a secretaria de limpeza urbana, conforme discutiremos a seguir.

 

Entrevista com o gerente do setor de Sustentabilidade da ABINEE

 

Foi realizada uma entrevista com o gerente do setor de sustentabilidade da ABINEE em outubro de 2014. A entrevista durou aproximadamente quarenta minutos e a partir dos questionamentos foi possível fazer uma relação com os dados oriundos das visitas e pesquisa bibliográfica. O foco da entrevista foi: panorama da situação dos RSU no Brasil, em especial as pilhas e baterias, a logística reversa, as principais dificuldades no manejo desses materiais, bem como o estabelecimento de parceria com a iniciativa privada por parte da prefeitura e sua eficácia no recolhimento desse material. Nesse contexto, dentro de todas as características observadas ao longo das visitas, dando destaque ao não recebimento de pilhas e baterias por parte da iniciativa pública, apenas pela iniciativa privada, foi possível fazer uma reflexão, a qual se pôde aprofundar durante a entrevista com a ABINEE, conforme citado anteriormente.

            De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, Seção II, Artigo 33 e parágrafo 7º (Brasil, 2010):

Art. 33. “São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de:

[...] II- pilhas e baterias[...]

§ 7º Se o titular do serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, por acordo setorial ou termo de compromisso firmado com o setor empresarial, encarregar-se de atividades de responsabilidade dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes nos sistemas de logística reversa dos produtos e embalagens a que se refere este artigo, as ações do poder público serão devidamente remuneradas, na forma previamente acordada entre as partes”.

 

O trecho citado é bastante importante, pois uma das principais características da PNRS é a responsabilidade compartilhada, ou seja, os três atores com maior responsabilidade pós-consumo são os consumidores (por entregarem os produtos após a sua vida útil), os comerciantes (os quais devem recebê-los dos consumidores) e os fabricantes ou importadores (os quais devem dar destinação aos produtos recebidos do comércio). Todavia, apesar da lei ser clara, discussão de quem deve “pagar a conta”, pois o processo demanda transporte do material coletado e que por sua vez gera ônus, o qual dá início à uma discussão entre comércio e indústria. E caso o município aceitasse recolher esse material, o mesmo teria que receber por isso, ou seja, mais uma despesa e mais uma discussão acerca do responsável pelo pagamento, além do fato que em muitos casos a cobrança é abusiva, conforme informado pelo representante da ABINEE. Tentando resolver esse problema, a mesma criou um programa para receber pilhas e baterias em parceria com a iniciativa privada, como por exemplo, farmácias e supermercados, para que esses locais se tornassem pontos oficiais de recebimento desse material. Posteriormente, a empresa GM&CLog faz a logística de transporte e a Suzaquim Indústrias Químicas, recolhe os materiais e a destinação correta.

Outro ponto discutido na entrevista foi a questão das pilhas que entram no país ainda sem supervisão, como por exemplo, algumas vindas da China. Uma vez que não há controle, quem é então responsabilizado pelo gerenciamento desses materiais? Isso se constitui, portanto como outro problema enfrentado no manejo desse tipo de resíduo sólido e que segundo o entrevistado ainda não tem resolução no país.

 

Entrevista com o diretor de limpeza urbana do município de São Bernardo do Campo

 

Em Janeiro de 2015 foi estabelecido contato com a secretaria de limpeza urbana do município de São Bernardo do Campo e, no mesmo mês, uma entrevista com o diretor do setor foi realizada. A entrevista durou aproximadamente cinquenta minutos, visando esclarecer informações sobre o manejo dos RSU no município, com foco nas pilhas e baterias, e as dificuldades encontradas no gerenciamento desses materiais.

Ao confrontar as informações obtidas nas duas entrevistas, foi possível perceber um conflito de ideias e interesses entre a iniciativa privada, representada aqui pela ABINEE e a iniciativa pública. Embora o município não disponha de locais oficiais para recebimento de pilhas e baterias, o diretor disse que a parceria público-privada seria algo benéfico que esse material é muitas vezes recebido de forma indevida pelo ecoponto da prefeitura, ocorrendo, neste caso, o descarte irregular. Isso seria evitado e menos danos e prejuízos ambientais ocorreriam, como por exemplo, a contaminação do solo e gastos públicos com funcionários para recolherem os produtos das vias, rios e demais locais de descarte impróprio. Entretanto, apesar desse interesse demonstrado pelo representante do município no estabelecimento dessa parceria público-privada para recolhimento de pilhas e baterias, o mesmo não relatou nenhuma negociação em andamento nessa direção.

Ao ser questionado sobre a remoção de alguns ecopontos (contentores), conforme observado durante as visitas, alegou que isso ocorre devido a reclamações de moradores do entorno, seja pela localização em frente a estabelecimentos seja por uso indevido por parte de alguns moradores. O diretor também ressaltou que a retirada dos contentores não ocorre sem que a população seja informada. Todavia isso pode se tornar um problema, pois alguns bairros não possuem outros espaços possíveis para servirem como alternativa. Sendo assim, ações envolvendo educação ambiental são realizadas, a fim de conscientizar as pessoas sobre a importância dos ecopontos nos locais. Entretanto, uma vez constatados locais sem os contentores recorrentemente, mas com resíduos depositados pelos moradores, um problema pôde ser caracterizado, que o trabalho de conscientização se mostra falho.

Portanto, além da coleta seletiva implantada na cidade, com uso de diferentes instrumentos como, por exemplo, a moto que coleta lixo em locais onde os caminhões não entram, buscamos salientar junto ao diretor a importância da educação ambiental, ferramenta essa que traz reflexão sobre consumo e geração de RSU e que pode ser trabalhada em uma parceria entre a prefeitura e as universidades. Um exemplo desse tipo de parceria ocorreu entre São Bernardo do Campo e outros municípios com a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e o Instituto GEA- Ética e Meio Ambiente, com um projeto chamado ECO-ELETRO (Segurança + Renda)[2] iniciado em 2011. A primeira fase do projeto visou instrumentalizar os catadores de cooperativas de reciclagem quanto à coleta segura e o tratamento e processamento adequado de materiais eletrônicos. Sendo assim, uma vez estabelecido esse contato entre academia e sociedade, os alunos das universidades poderão alertar as pessoas sobre os riscos e possíveis mudanças nos padrões de consumo.

Outro ponto bastante relevante discutido com o diretor, também observado nas pesquisas bibliográficas, foi a construção do incinerador no município de São Bernardo do Campo. Entendeu-se que era necessário abordar essa questão, pois pilhas e baterias ainda são descartadas em lixos comuns. Dessa forma, o entrevistado foi indagado sobre os impactos, tanto ambientais quanto sociais, bem como a eficiência energética da usina. O diretor informou que o processo de construção de uma usina de incineração será capaz de gerar energia elétrica para abastecimento da iluminação pública e de domicílios de uma cidade de 200.00 habitantes, está em andamento e disse entendê-la como um avanço para o município, que São Bernardo do Campo é visto como uma referência no que tange as práticas sustentáveis. Após o fechamento do antigo lixão do bairro Alvarenga, que atualmente passa por descontaminação e alocará o incinerador e um parque[3], os catadores que trabalhavam foram realocados para uma casa de processamento de resíduos, com sistema de cooperativismo, que tem capacidade de processar vinte e cinco toneladas por dia, com futuros planos de uma nova casa que processará cem toneladas por dia. A renda desses trabalhadores, segundo o diretor, passou de R$ 400,00 por mês para aproximadamente R$ 1.200,00, com condições de trabalho salubres. Segundo dados fornecidos, cerca de 20% do material reciclável são rejeitos, ou seja, não tem valor de mercado. Uma vez dispondo do incinerador, esse material poderá então ser reaproveitado para gerar energia. Ainda segundo previsão feita pela prefeitura, 70% do material que vai entrar na usina é orgânico, o qual proverá liga junto ao material seco. Dessa forma, antes dos produtos irem para o incinerador, haverá uma triagem em uma central automatizada, processo no qual seriam removidas pilhas e baterias e 8% de material seco será recuperado e, conforme esperado, será gerado dezessete megawatt por hora.

Entretanto, apesar dessa previsão otimista, segundo alguns autores a incineração não pode ser vista como a solução completa para o problema da geração de RSU. Conforme discute Jacobi et al. (2011), embora seja gerada energia, incinerar o lixo não conscientiza as pessoas quanto a necessidade de mudança nos padrões de consumo. O que seria consonante com o que também prevê o Art. da Política Nacional de Resíduos Sólidos: (i) não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos; (ii) estímulo à adoção de padrões sustentáveis de produção e consumo de bens e serviços (Brasil, 2010).

Finalmente, ainda no caso das pilhas e baterias, a incineração é, portanto algo que requer muito estudo no que se refere ao produto residual desse processo. Os gases que podem ser liberados após a queima são potencialmente danosos, daí a necessidade de triagem criteriosa para que resíduos especiais como pilhas e baterias não entrem no incinerador.

 

Visita e análise dos ecopontos (iniciativa privada) para coleta de pilhas e baterias disponibilizada em São Bernardo do Campo

 

Foram feitas três visitas a ecopontos privados, os quais possuem locais para que os clientes levem suas pilhas, baterias e até mesmo celulares após sua vida útil. Um questionário foi utilizado para anotar as características importantes, entretanto, os pontos não possuem um responsável para ceder informações. A primeira visita foi a um banco onde existiam contentores para descarte de pilhas, baterias e aparelhos eletrônicos portáteis, as quais eram denominadas “Papa Pilhas”[4]. Porém, como o início do programa “ABINEE RECEBE PILHAS”, o banco decidiu descontinuar o programa.

os dois outros ecopontos situavam-se um em um supermercado e outro em um Shopping Center. No primeiro caso, uma funcionária informou que é o próprio estabelecimento que realiza a recolha dos materiais, e que não sabia maiores detalhes do destino dessas pilhas e baterias recolhidas. o ponto seguinte não possuía alguém para dar informações e, assim, apenas foi constatada sua existência. Dessa forma, não foi possível obter dados mais específicos sobre os ecopontos da iniciativa privada, haja vista que nos locais visitados não havia alguém responsável.

 

Considerações finais

 

A PNRS trouxe consigo muitos avanços para o país de forma geral no que se refere ao manejo e gerenciamento de resíduos, entretanto, bem como pontuado ao longo do estudo, alguns pontos ainda não foram totalmente atendidos.

Como é sabido, a reciclagem e a logística reversa são importantes ferramentas para minimizar os impactos causados pela geração de resíduos. Dentro desse contexto, as pilhas e baterias constituem um tipo de resíduo que, embora a legislação exija que esses materiais sejam descartados corretamente e que recebam os devidos tratamentos, a população ainda não se mostra completamente consciente dos problemas ambientais associados a esses materiais quando os descarta junto ao lixo doméstico. Também foi constatado a partir desse estudo em São Bernardo do Campo, que o diálogo entre os diferentes atores, envolvendo consumidores, comércio e indústria, bem como setores públicos é ainda bastante falho. Uma alternativa para minimizar esse problema seria reforçar projetos de Educação Ambiental para a população. Todavia, no caso de São Bernardo do Campo, embora conste no plano municipal a existências desses projetos, não foi possível constatar a eficácia dos mesmos, já que o descarte irregular de produtos e a procura de ecopontos para destinação de materiais que o mesmo não aceita, ainda é recorrente. Portanto, os ecopontos, de maneira geral, existem, porém, o diálogo da prefeitura com a sociedade quanto à existência ou eventuais mudanças desses pontos se mostrou problemático e, o não recebimento de pilhas e baterias por parte da prefeitura, apenas da iniciativa privada, aparece como um problema, já que algumas pessoas procuram os pontos de entrega voluntária para descarte do material, assim como citado anteriormente.

Outro ponto importante a ser destacado é o embate entre setor privado e setor público, haja vista que a lei, em certo ponto, torna o processo de reciclagem bastante complexo, como no caso de a prefeitura ter que receber caso seus serviços sejam usados por parte dos setores privados, conforme relatado durante a entrevista da ABINEE. No caso das pilhas e baterias isso constitui um empecilho, já que os ecopontos são vistos como locais onde as pessoas podem descartar corretamente todos os seus resíduos, o que não é verdade. Por mais que esteja previsto em lei, o ônus resultante do uso desse serviço público ainda é controverso, o que se agrava quando outra variável também é incluída, a questão referente ao transporte desse material coletado. Quem deve pagar pelo transporte dos materiais advindos dos ecopontos? O comerciante, o fabricante ou todos?

Dessa forma, uma reflexão feita ao longo do estudo foi que uma solução possível seria uma adequação da lei para que assim o problema fosse resolvido. Entretanto, a mesma deveria ser feita a partir de uma reunião entre os diferentes atores envolvidos, incluindo instâncias públicas e privadas, com representantes da sociedade civil, junto ao Ministério Público, de forma a pensar em alternativas que possibilitem uma logística reversa eficiente e que atenda a todos.

Por fim, uma sugestão para projetos futuros seria a avaliação da eficácia dos ecopontos privados oferecidos no município, uma vez que, na análise preliminar feita no presente estudo, pudemos constatar que ainda que os mesmos existam fisicamente, não necessariamente atingem sua finalidade proposta.

 

Referências bibliográficas

 

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[1] Disponível em: http://www.gmcons.com.br/gmclog/admin/VisualizarPostosMapaCliente.aspx

[2] Disponível em: http://www.institutogea.org.br/projetos/projeto-eco-eletro-seguranca-renda-2/

[3] Disponível em: http://www.dgabc.com.br/Noticia/470392/antigo-lixao-sera-recuperado-13-anos-apos-fechamento

[4]                      Informação disponível em: http://sustentabilidade.santander.com.br/pt/Praticas-de-Gestao/Paginas/Papa-Pilhas.aspx, acessada em Novembro de 2015.