Projeto PST/Navegar UFRGS: Dez Anos de Experiências

WORKSHOP DE CONSCIENTIZAÇÃO NÃO DEIXE RASTRO: EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM ATIVIDADES AO AR LIVRE

 

Rodrigo Cavasini

Graduação em Educação Física; especialização em Metodologias do Ensino de Educação Ambiental e em Educação Ambiental; mestrado e doutorado em Ciências do Movimento Humano/UFRGS. Professor da PUCRS. Email: rcavasini@yahoo.com.br

 

Rafael Falcão Breyer

Graduação em Educação Física; aluno de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Movimento Humano/UFRGS. Email: rfbreyer@gmail.com

 

RESUMO

O Workshop de Conscientização Não Deixe Rastro é uma proposta de Educação Ambiental focada em práticas de mínimo impacto ambiental para atividades ao ar livre. Este trabalho relata a experiência da realização de Workshops de Conscientização Não Deixe Rastro em cursos de Educação Física de duas universidades localizadas no município de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Durante os doze semestres de realização das atividades educacionais, as avaliações apontaram para os seguintes resultados: desenvolvimento de competências ambientalmente relevantes; ampliação da percepção de relevância e do interesse acadêmico e profissional pelas áreas da Educação Ambiental e das atividades ao ar livre; valorização dos espaços ao ar livre; e a transferência de atitudes e comportamentos.

 

Palavras-chave: Educação ao Ar Livre; Práticas de Mínimo Impacto; Educação Experiencial

 

ABSTRACT

The Leave no Trace Awareness Workshop is an approach of Environmental Education focused on practices of minimum environmental impact for outdoor activities. This paper reports the experience of Leave no Trace Awareness Workshops carried out in Physical Education courses of two universities located in the city of Porto Alegre, Rio Grande do Sul. During the twelve semesters of educational activities, the evaluations pointed to the following results: development of environmental competencies; increasing the perception of relevance and the interest for the areas of Environmental Education and outdoor activities; valuing the outdoor spaces; and the transfer of attitudes and behaviors.

 

Keywords: Outdoor Education; Practices of Minimal Impact; Experiential Learning

 

Introdução

 

Durante as últimas décadas as atividades ao ar livre têm se expandido e o número de praticantes e interessados por essas atividades se tornaram expressivos. É facilmente percebida a presença de indivíduos praticando trekking, ciclismo, slackline, canoagem, surfe e demais atividades ao ar livre em locais próximos ou não de centros urbanos, em que figuram parques, praias, lagos, mares, morros e rios. Essa situação ocorre em vários países e pode ser conferida em materiais produzidos nos últimos anos: no Brasil o Ministério do Esporte lançou em 2015 o Diagnóstico do Esporte (MINISTÉRIO DO ESPORTE, 2015); na Nova Zelândia a instituição Sport New Zealand publicou em 2015 o relatório Sport and Active Recreation in the Lives of New Zealand Adults 2013/14 Active: New Zealand Survey Results (SPORT NEW ZEALAND, 2015); nos Estados Unidos a instituição The Outdoor Foundation produziu dezenas de pesquisas desde o início dos anos 2000 (THE OUTDOOR FOUNDATION, 2016).

Diversas motivações e potencialidades figuram entre as razões da expansão das atividades ao ar livre e do número de praticantes e interessados. Em relação às motivações o trabalho de Manning (2011) aponta para as seguintes: aprendizagem em várias áreas do conhecimento; ganho de autoimagem; ampliação do reconhecimento social; desfrutar do contato com a natureza; encontrar e conviver com outros indivíduos que partilham valores; oportunidades para ensinar e liderar outros indivíduos; união familiar; introspecção; autonomia que pode ser exemplificada pela manutenção do controle em situações inusitadas.

As potencialidades ou resultados positivos que podem ser obtidos pela prática de atividades ao ar livre perfazem quatro grupos, os quais são apresentados de maneira simplificada no Quadro 1:

 

Potencialidades das Atividades ao Ar Livre

Quadro 1: Elaborado pelos autores com base em Manning (2011).

 

A prática das atividades ao ar livre, que são características da sociedade contemporânea, pode gerar impactos ambientais, em especial, quando desconsiderados aspectos éticos. Nesse sentido Marion (2014), Tilton (2003), Macgiviney (2003) e Harmon (1997) enfatizam que os impactos ambientais produzidos pela realização de atividades ao ar livre podem ser evitados ou minimizados, por meio da utilização de práticas de mínimo impacto ambiental, como os Princípios de Não Deixe Rastro.

Os Princípios de Não Deixe Rastro são o foco de atividades de Educação Ambiental ao ar livre que objetivam minimizar ou evitar impactos ambientais gerados por atividades ao ar livre, como o trekking, o mountain bike, a canoagem, o slackline, o geocaching, a observação da natureza e os jogos de sensibilização (CAVASINI; BREYER, 2015a, 2015b).

Este trabalho relata as experiências de Workshops de Conscientização Não Deixe Rastro nos cursos de Educação Física da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O texto está organizado em três partes: primeiramente são tratados aspectos relacionados à Educação Ambiental ao ar livre e aos Princípios de Não Deixe Rastro; a segunda parte se volta para as experiências de Educação Ambiental focadas em Workshops de Conscientização Não Deixe Rastro realizadas nas duas universidades; e finalmente são apresentadas algumas considerações e perspectivas.

 

Os Princípios de Não Deixe Rastro

O número de interessados e de praticantes de atividades ao ar livre são expressivos e estão em expansão em inúmeros espaços. Em paralelo a benefícios relacionados às potencialidades das atividades ao ar livre, resultados negativos podem ser ocasionados aos praticantes, à sociedade e ao meio ambiente. Isso pode ser exemplificado por situações percebidas em locais de prática de trekking e de mountain bike, como o surgimento de trilhas em paralelo às previamente estabelecidas e a presença de resíduos deixados em locais inapropriados. Entretanto cabe salientar que os impactos ambientais gerados pela prática de atividades ao ar livre vão além da multiplicação de trilhas ou questões relacionadas aos resíduos, também podendo afetar vegetação, recursos hídricos, vida silvestre (LNT, 2016; MOORE; DRIVER, 2005, LEUNG; MARION, 2000), seres humanos (LNT, 2016; MOORE; DRIVER, 2005), qualidade do ar (MOORE; DRIVER, 2005) e objetos e locais de valor histórico e cultural (LNT, 2016).

À medida que os impactos ambientais causados pela prática de atividades ao ar livre foram se ampliando, esforços estruturados começaram a ser promovidos por instituições públicas e privadas na América do Norte. No final da década de 1960 o U.S. Forest Service (Serviço Florestal dos Estados Unidos) começou a empregar medidas regulatórias e a desenvolver programas educacionais com o intuito de minimizar os impactos gerados pela prática de atividades ao ar livre (MARION, 2014).

Na década de 1970 ampliou-se a percepção de que as propostas unicamente regulatórias para a minimização de impactos ambientais gerados pelas atividades ao ar livre eram pouco efetivas, devido a vários aspectos: regulamentos tendem a antagonizar o público, em vez de conquistar o seu apoio; a maioria dos impactos é gerada pela falta de competências sobre práticas de mínimo impacto ambiental e não por atos intencionais; a fiscalização do cumprimento dos regulamentos em áreas ao ar livre é difícil, devido às dimensões dos locais utilizados. Dessa forma os programas educacionais começaram a ser mais utilizados, com o intuito de promover a conscientização sobre os impactos causados pelas atividades ao ar livre e de estimular a busca pelo desenvolvimento de competências de mínimo impacto. Assim indo ao encontro do defendido por um ex-diretor do U.S. Forest Service ao afirmar em 1985 que a gestão de áreas ao ar livre deveria ser centrada 90% em educação e apenas 10% em iniciativas regulatórias (MARION, 2014; VAGIAS, 2009; MARION; REID, 2001).

Foi em meados da década de 1980 que o U.S. Forest Service desenvolveu um programa de Educação Ambiental intitulado No-Trace (Sem Traços). Esse programa enfatizava a relevância de aspectos éticos e de abordagens sustentáveis para a promoção de atividades ao ar livre (LNT, 2016). No início da década de 1990, o U.S. Forest Service em conjunto com a National Outdoor Leadership School (Escola Nacional de Liderança ao Ar Livre) e outras instituições iniciaram o desenvolvimento de uma proposta de Educação Ambiental ao ar livre com base científica e voltada para o desenvolvimento de práticas de mínimo impacto ambiental para atividades ao ar livre. Em 1993 foi criada uma organização independente, sem fins lucrativos e chamada Leave No Trace Inc. (Não Deixe Rastro), a qual atualmente é intitulada de The Leave no Trace Center for Outdoor Ethics (LNT, 2016; MARION; REID, 2001).

O The Leave no Trace Center for Outdoor Ethics (Centro de Ética em Atividades ao Ar Livre Não Deixe Rastro) busca promover e inspirar a sociedade por meio de atividades ao ar livre. Possui a missão de conservar as áreas ao ar livre através da educação e inspirar as pessoas a apreciá-las de forma responsável. Anualmente milhões de pessoas participam de atividades de Educação Ambiental ao ar livre centradas nos Princípios de Não Deixe Rastro, as quais buscam contribuir para o desenvolvimento de competências e orientar os praticantes de atividades ao ar livre (LNT, 2016).

Os Princípios de Não Deixe Rastro são fundamentados em estudos realizados pela instituição proponente em conjunto com outros produzidos por pesquisadores das áreas das Dimensões Humanas de Recursos Naturais e da Ecologia da Recreação. Nesse sentido a área de estudo das Dimensões Humanas dos Recursos Naturais busca a interpretação de atitudes e comportamentos dos seres humanos em relação a percepções e a interações com os ecossistemas (LNT, 2016). Já a área da Ecologia da Recreação foca na investigação de impactos ambientais que podem ser gerados por atividades ao ar livre, desde a década de 1940 (MARION, 2006).

O trabalho de Vagias (2009) destaca que os Princípios de Não Deixe Rastro integram as propostas de Educação Ambiental mais utilizadas para a minimização de impactos ambientais gerados por atividades ao ar livre. Esses princípios são desenvolvidos em face de diversas demandas e podem ser organizados nos quatro blocos que seguem:

·           De acordo com questões específicas de determinadas atividades ao ar livre, como os princípios relacionados à pesca, geocaching, canionismo, escalada em rocha e mountain bike;

·           De acordo com demandas específicas de determinado período do ano, em que se destacam os princípios para o período de inverno;

·           De acordo com características específicas de determinada população, em que podem ser citados os princípios para crianças e adolescentes;

·           De acordo com demandas específicas dos ambientes de prática das atividades ao ar livre, em que podem ser destacados: Internacionais que possuem caráter generalista; América do Norte que são voltados para essa região do continente americano; Locais de Relevante Herança Cultural, como sítios arqueológicos; e Frontcountry que são os locais de acesso facilitado e com grande visitação (LNT, 2016).  

Os Princípios de Não Deixe Rastro foram elaborados para atender as demandas que existiam em ambientes ao ar livre distantes de áreas urbanas. Com o passar dos anos, foi percebida a necessidade de focar em ambientes de mais fácil acesso, próximos às cidades e com grande número de praticantes de atividades ao ar livre (MARION; REID, 2001; MARION, 2014). Os Princípios voltados para locais de fácil acesso se relacionam com espaços de parques, praças, florestas, trilhas em áreas urbanas, áreas estruturadas para acampamento, piquenique e grandes eventos, ou seja, se voltam para os espaços em que mais de 80% das atividades ao ar livre são realizadas (MARION, 2014).

Diversos trabalhos discutem os Princípios de Não Deixe Rastro, como os seguintes: Cavasini (2016), Cavasini e Breyer (2015a; 2015b), Maryon (2014), Cavasini, Petersen e Petkowicz (2013), Hutson (2012), Tilton (2003), McGivney (2003), Hampton e Cole (2003), Harvey (1999) e Harmon (1997). Os princípios para locais de fácil acesso podem ser descritos da seguinte maneira:

-Conhecer antes de ir: valorização do planejamento de qualquer atividade ao ar livre. Sugere-se fortemente a promoção de um amplo levantamento de informações (ex.: livros, artigos, internet, outros professores, órgãos públicos, etc.), em relação aos espaços que serão empregados para o desenvolvimento das atividades (ex.: condições locais, restrições e proibições, dias e horários de funcionamento, previsão meteorológica, etc.), às características da atividade (ex.: jogos, esportes, piqueniques, passeios etc.) e ao grupo envolvido (ex.: competências da equipe de trabalho, faixa etária dos alunos, número de participantes e de professores, etc.). Também enfatiza a necessidade de considerar os equipamentos que serão empregados em cada atividade, os quais devem atender aos objetivos estabelecidos.

-Permanecer nas trilhas e acampar em locais permitidos: a importância da utilização de locais adequados e previamente determinados ou estabelecidos para a realização de atividades ao ar livre. Esse princípio possui grande relação com passeios orientados, trilhas ecológicas, piqueniques, atividades de observação da natureza, jogos, esportes, acampamentos, entre outros.

-Tratar dos resíduos produzidos e recolher os dejetos de animais de estimação: organizar as atividades de modo a empregar, sempre que possível, os sanitários existentes. Trazer de volta e encaminhar adequadamente tudo que for levado à natureza durante a prática de atividades ao ar livre, como cascas de frutas, embalagens de comida, latas e garrafas. Recolher os dejetos dos animais de estimação, salientando a responsabilidade de todos em relação aos resíduos produzidos.  

-Deixar os locais como foram encontrados: não alterar os locais empregados para as atividades, prevenindo danos permanentes à vegetação, ao solo e aos objetos de valor histórico e/ou cultural, dessa forma, também permitindo a satisfação e o senso de descoberta de outros indivíduos.

-Ser cuidadoso com as fogueiras: somente acender fogueiras nos locais em que for permitido. Utilizar somente as áreas já destinadas para fogueiras, mantendo o fogo reduzido, de modo a reduzir impactos ao solo e reduzir outros riscos. Antes de abandonar o local, queimar toda a madeira até que vire cinza, certificando-se de que o fogo esteja apagado e as cinzas não estejam quentes. Preferir utilizar fogareiros para cozinhar ao invés de fogueiras, pois os fogareiros facilitam o processo de cozimento de alimentos, geram impactos inferiores se comparados às fogueiras e reduzem a exposição a riscos.

-Permitir que os animais silvestres se mantenham silvestres: relevância de promover as atividades ao ar livre de modo que professores, estagiários, alunos e demais participantes não alimentem e se mantenham distantes de animais silvestres. Salienta-se que esse princípio se relaciona diretamente com a gestão de riscos das atividades ao ar livre.

-Compartilhar as trilhas e cuidar dos animais de estimação: considerar e respeitar outros indivíduos presentes nos mesmos locais e horários empregados para a realização das atividades propostas, pois as pessoas possuem diferentes formas de apreciar as atividades ao ar livre e barulhos desnecessários ou algazarras podem não ser bem aceitos nessas ocasiões. Caso seja permitida a presença de animais de estimação nos locais de prática de atividades ao ar livre, eles devem ser mantidos sob controle e seus dejetos devem ser recolhidos.

            Desde 2004 o The Leave no Trace Center for Outdoor Ethics desenvolve um sistema de treinamento educacional abrangente composto por três níveis, os quais englobam cursos de caráter prático e/ou teórico. O primeiro nível, intitulado Educador Máster Não Deixe Rastro, foi projetado para os indivíduos já envolvidos com atividades ao ar livre e, em especial, atividades de Educação Ambiental focadas nos Princípios de Não Deixe Rastro. Essa proposta já formou mais de seis mil educadores. O segundo nível é o Curso Trainer Não Deixe Rastro, que é uma versão abreviada do curso Educador Máster, no qual os participantes recebem treinamento introdutório sobre os Princípios de Não Deixe Rastro e da área da ética em atividades ao ar livre, tendo a participação de mais de 32 mil educadores. O terceiro nível de formação se volta para o Workshop de Conscientização Não Deixe Rastro, que é a proposta mais realizada e já contabiliza a participação de milhões de indivíduos. Essa proposta é voltada para a população em geral e busca o desenvolvimento de competências básicas para minimizar impactos ambientais em atividades ao ar livre, ao mesmo tempo em que aproxima os indivíduos da área da ética em atividades ao ar livre (LNT, 2016).  

 

As Experiências de Educação Ambiental em Atividades ao Ar Livre

O Workshop de Conscientização Não Deixe Rastro é desenvolvido na disciplina Esporte na Natureza no curso de Educação Física da PUCRS, desde 2011. Essa disciplina possui carga horária de 32 horas/aula, estruturadas em encontros de duas, quatro e seis horas/aula. Já no curso de Educação Física da UFRGS as experiências foram realizadas na disciplina Tópicos Especiais em Esporte 3 - Atividades Esportivas e Educacionais na Natureza, oferecida entre 2013 e 2014. Essa disciplina possui carga horária de 64 horas/aula, organizadas em encontros de dois, quatro e oito horas/aula.

Ambas as disciplinas possuem caráter teórico-prático e objetivam desenvolver conhecimento relacionado aos esportes e atividades ao ar livre, à Educação Ambiental ao ar livre, à gestão de riscos, à ética em atividades ao ar livre, bem como atividades experienciais. Cabe salientar que as atividades experienciais se relacionam com a aprendizagem e educação experienciais. A aprendizagem experiencial é uma forma de aprendizado autêntica, em primeira mão, baseada nos sentidos (BEHRENDT; FRANKLIN, 2014) e que compreende: “o processo de aprendizagem oriundo diretamente de experiências vivenciadas pelos alunos” (ITIN, 1999). Já a educação experiencial pode ser conceituada como uma metodologia em que educadores, premeditadamente, levam os alunos a experiências e a reflexões com o intuito de desenvolver conhecimento, habilidades, valores e capacidades relevantes para a atuação e contribuição em suas comunidades (ASSOCIATION FOR EXPERIENTIAL EDUCATION, 2016; 1994).

           O grupo de participantes foi formado por professores universitários, alunos e convidados. Os docentes que atuaram nas disciplinas são graduados em Educação Física, especialistas em Educação Ambiental, alunos do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Movimento Humano da UFRGS e possuem expertise nas áreas de esportes e atividades ao ar livre, Educação Ambiental, gestão riscos e educação ao ar livre. Os alunos eram oriundos de cursos de graduação e pós-graduação em Educação Física, Pedagogia, Nutrição, Geografia, Administração de Empresas, Engenharias, Biologia, Química, entre outros. Também integraram o grupo, professores convidados que colaboram com seus expertises em áreas de interesse das disciplinas. Durante os doze semestres de realização dos Workshops de Conscientização Não Deixe Rastro, o quantitativo de participantes superou 800 indivíduos.

           Os Workshops foram realizados durante saídas de campo com duração de seis horas/aula, que ocorreram em áreas das unidades de conservação Parque Natural Morro do Osso e Reserva da Vida Silvestre Morro Santana. Essas unidades de conservação estão situadas na cadeia de morros graníticos de Porto Alegre/RS e são espaços diferenciados para a promoção de atividades de Educação Ambiental ao ar livre, em face de diversos fatores, como os seguintes: existência de áreas para a realização de atividades ao ar livre, como trekking, mountain bike, Educação Ambiental, piquenique e observação da natureza; interesse e envolvimento históricos da população para a conservação e valorização dessas áreas; existência de locais de considerável beleza cênica e natural; observação facilitada de impactos ambientais, inclusive causados por praticantes de atividades ao ar livre; conveniência e relevância para a problematização e emprego dos Princípios de Não Deixe Rastro. A Figura 1 ressalta aspectos complementares dos locais visitados.

 

 

 

Locais de realização do Workshop de Conscientização Não Deixe Rastro

Figura 1: Elaborada pelos autores.

A Figura 2 apresenta aspectos descritivos do Workshop de Conscientização Não Deixe Rastro que foram organizadas em três momentos: anteriormente, durante e posteriormente às saídas de campo.

 

Aspectos do Workshop de Conscientização Não Deixe Rastro

Figura 2: Elaborada pelos autores.

 

O processo avaliativo do Workshop de Conscientização Não Deixe Rastro ocorreu de duas maneiras: promoção de discussões dos temas tratados nos semestres; e por meio de material avaliativo específico.

 As discussões foram realizadas em apresentações de seminários em sala de aula e em momentos de relevância educacional, durante as atividades experienciais e saídas de campo. Desse modo foram ampliadas as oportunidades para o desenvolvimento de aspectos relacionados à ética em atividades ao ar livre, aos Princípios de Não Deixe Rastro e à Educação Ambiental, ao mesmo tempo em que foi almejada uma melhor compreensão dos resultados produzidos e, principalmente, dos processos educacionais realizados.

O material avaliativo específico do Workshop de Conscientização Não Deixe Rastro tinha o formato de um folder com informações simplificadas sobre os Princípios, além de campos destinados à realização de anotações. Ele foi disponibilizado de maneira impressa e digital nos Workshops, permitindo que os participantes realizassem suas anotações durante as atividades experienciais e em momentos posteriores. A Figura 3 apresenta uma versão simplificada desse material avaliativo.

 

Versão simplificada do material de avaliação

Figura 3: Elaborada pelos autores.

 

As informações levantadas através do processo avaliativo dos Workshops de Conscientização Não Deixe Rastro foram organizadas em cinco aspectos: desenvolvimento de competências; ampliação da percepção de relevância e do interesse acadêmico; promoção de intervenções pedagógicas de Educação Ambiental; valorização de espaços ao ar livre; e a transferência de atitudes e comportamentos.

O primeiro aspecto levantado foi o desenvolvimento de competências relevantes para a manutenção e melhoria da qualidade do meio ambiente. Os Princípios de Não Deixe Rastro foram amplamente utilizados nas saídas de campo, em especial, os que tratam do planejamento das atividades, da utilização dos espaços adequados para as práticas, da responsabilização sobre resíduos produzidos, da manutenção da qualidade dos locais visitados e da consideração aos demais indivíduos.

O segundo aspecto foi a ampliação da percepção de relevância e do interesse acadêmico e profissional pelas áreas da Educação Ambiental e das atividades ao ar livre. Isso pode ser exemplificado pelo envolvimento dos participantes em iniciativas relacionadas ao trekking, à Educação Ambiental, ao mountain bike, à canoagem e ao kitesurfe, bem como pela produção e apresentação de trabalhos científicos em eventos. Nesse sentido o trabalho produzido por Cavasini, Fonseca e Guerra (2015), que tratou de um Workshop de Conscientização Não Deixe Rastro, recebeu premiação de destaque em apresentação realizada por Roberto Ely Fonseca durante evento relacionado ao tema Meio Ambiente.

O terceiro aspecto foi a promoção de intervenções pedagógicas de Educação Ambiental ao ar livre focadas nos Princípios de Não Deixe Rastro pelos estudantes. Relatos apontaram para a realização de propostas educacionais em centros de atividades físicas, em instituições formais de ensino, em projetos esportivos educacionais, em atividades de turismo realizadas na natureza e em centros de atividades ao ar livre.

O quarto aspecto foi a valorização dos espaços ao ar livre utilizados para o desenvolvimento das atividades educacionais e experienciais, como as áreas visitadas nas unidades de conservação do Parque Natural Morro do Osso e da Reserva da Vida Silvestre Morro Santana. Esse aspecto já havia sido tratado em trabalho anterior de Cavasini e Breyer (2015a) e demonstrou continuar presente.

            O quinto aspecto foi a transferência de atitudes e comportamentos desenvolvidos nas atividades ao ar livre para o cotidiano dos participantes. De acordo com Hutson (2012) as atividades de Educação Ambiental focadas em Princípios de Não Deixe Rastro tornam possível a transferência de atitudes e comportamentos desenvolvidos nas atividades ao ar livre para o cotidiano dos indivíduos. Isso pode ser exemplificado pela importância de encaminhar adequadamente os resíduos produzidos durante as atividades ao ar livre e o maior envolvimento em questões relacionadas aos resíduos e desperdícios de recursos em seus lares e comunidades, bem como, a maior consideração dos demais praticantes de atividades ao ar livre e o desenvolvimento de sensibilidade em face de questões humanitárias.

 

Outras Considerações e Perspectivas

            As atividades ao ar livre podem ser caracterizadas pelo grande interesse da população, o aumento do quantitativo de praticantes e a presença de potencialidades, contudo, a prática dessas atividades pode gerar impactos ambientais, em especial, quando desconsideradas questões éticas. As propostas de Educação Ambiental ao ar livre centradas nos Princípios de Não Deixe Rastro podem contribuir para a minimização desses impactos, inclusive, quando consideradas anteriormente às estratégias meramente regulatórias ou punitivas.

            Durante os doze semestres de realização dos Workshops de Conscientização Não Deixe Rastro, as avaliações apontaram para os seguintes aspectos: desenvolvimento de competências; ampliação do interesse pelas áreas de Educação Ambiental e das atividades ao ar livre; emprego dos Princípios de Não Deixe Rastro; promoção de atividades de Educação Ambiental ao ar livre.

            Quanto a perspectivas dessas iniciativas de Educação Ambiental, dois aspectos emergiram nos últimos semestres de realização dos Workshops de Conscientização Não Deixe Rastro: o primeiro foi a contribuição para a discussão de propostas limitadoras de quantitativos de indivíduos em áreas naturais; e o segundo foi a necessidade de ampliação de atividades educacionais focadas nos Princípios de Não Deixe Rastro.

            Os Princípios de Não Deixe Rastro também podem contribuir para a reavaliação e, em certos casos, a manutenção ou ampliação de capacidades de carga de áreas empregadas para a realização de atividades ao ar livre, devido às alterações de atitudes dos praticantes e a consequente minimização de impactos ambientais gerados (MARION; REID, 2001).  Esse aspecto tem sido levantado por profissionais que tratam de aspectos relacionados à gestão de espaços naturais e também tem contribuído para o desenvolvimento dos Workshops de Conscientização Não Deixe Rastro, entretanto, salienta-se que essa discussão precisa ser aprofundada.

            Por fim um aspecto que surgiu durante a realização das atividades de Educação Ambiental foi a necessidade da ampliação do número de Workshops propostos e a realização de cursos especializados. Nesse sentido Workshops de Conscientização Não Deixe Rastro e Cursos Trainer Não Deixe Rastro já ocorreram em diversas ocasiões e fazem parte de iniciativas focadas em atividades ao ar livre que estão planejadas para os próximos semestres.

 

Referências

ASSOCIATION FOR EXPERIENTIAL EDUCATION. Disponível em: http://www.aee.org/about/whatIsEE, acesso em 2 de janeiro de 2016.

______. AEE Definition of Experiential Education. Boulder, EUA: Association for Experiential Education, 1994.

BEHRENDT, M.; FRANKLIN, T. A review of research on school field trips and their value in education. International Journal of Environmental & Science Education, vol. 9, 2014.

CAVASINI, R.; PETERSEN, R. D. S.; PETKOWICZ, F. Projeto PST/Navegar: Aspectos Técnicos e Pedagógicos. Maringá: EDUEM, 2013.

CAVASINI, R.; BREYER, R. F. Educação Ambiental ao Ar Livre: Experiências em Unidades de Conservação. Educação Ambiental em Ação, v. 53, 2015a.

______. Educação Ambiental ao Ar Livre. In: Guerra, T. Educação Ambiental: contribuição para a gestão socioambiental na Bacia Hidrográfica do Rio Gravataí. Rio de Janeiro: MC&G Editorial, 2015b.

CAVASINI, R.; FONSECA, R. E.; GUERRA, T. Práticas de Mínimo Impacto Ambiental em Esportes ao Ar Livre. In: GUERRA, T. (Org.) Conhecer para gerenciar: ambiente e sociedade. Porto Alegre: Centro de Ecologia/UFRGS, 2015.

CAVASINI, R. Intervenções Pedagógicas de Educação Ambiental no Programa Segundo Tempo. Tese (Doutorado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Programa de Pós-Graduação em Ciências do Movimento Humano. Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança, 2016.

HAMPTON, B.; COLE, D. Soft Paths: How to Enjoy the Wilderness Without Harming It. Mechanicsburg, EUA: Stackpole Books, 2003.

HARMON, W. Leave no Trace: Minimum Impact Outdoor Recreation. Helena, EUA: Falcon, 1997.

HARVEY, M. The National Outdoor Leadership Scholl’s Wilderness Guide. Nova Iorque, EUA:  Ed. Fireside, 1999.

HUTSON, G. The Seeds of Leave No Trace Grow Well Beyond Backcountry Boundaries. In: MARTIN, Bruce; WAGSTAFF, Mark. Controversial issues in adventure programming. Champaign, Estados Unidos: Human Kinetics, 2012.

ITIN, C. M. Reasserting the Philosophy of Experiential Education as a Vehicle for Change in the 21st Century. The Journal of Experiential Education, n. 22, 1999.

LEUNG, Y.; MARION, J. L. Recreation Impacts and Management in Wilderness: A State-of-Knowledge Review. USDA Forest Service Proceedings, vol. 5, 2000.

MANNING, R. E. Studies in Outdoor Recreation: Search and Research for Satisfaction. Corvallis, EUA: Oregon State University Press, 2011. 

MARION, J., L.; REID, S. Development of the United States Leave No Trace Programme: A historical perspective. In: USHER, M.B. Enjoyment and Understanding of the Natural Heritage. Edinburgh, Escócia: The Stationery Office Ltd., 2001.

MARION, J. L. Recreation Ecology Research in the Americas. In: SIEGRIST, D. et al. Exploring the Nature of Management. Proceedings of the Third International Conference on Monitoring and Management of Visitor Flows in Recreational and Protected Areas. Suíça: University of Applied Sciences Rapperswil, 2006.

_______. Leave no Trace in the Outdoors. Mechanicsburg, EUA: Stackpole Books, 2014.

MCGIVNEY, A. Leave No Trace A Guide To The New Wilderness Etiquette. Seattle, EUA: Mountaineers Books, 2003.

MINISTÉRIO DO ESPORTE. Diagnostico Nacional do Esporte: Diesporte. Brasília: Ministério do Esporte, 2015.

MOORE, L; DRIVER, B. L. Introduction to Outdoor Recreation: Providing and Managing Natural Resource Based Opportunities. State College, EUA: Venture Publishing, 2005.

SPORT NEW ZEALAND. Sport and Active Recreation in the Lives of New Zealand Adults 2013/14 Active: New Zealand Survey Results. Wellington, Nova Zelândia: Sport New Zealand, 2015.

THE LEAVE NO TRACE CENTER FOR OUTDOOR ETHICS (LNT). Disponível em: www.lnt.org, acesso em 12 de março de 2016.

THE OUTDOOR FOUNDATION. Disponível em: http://www.outdoorfoundation.org/, acesso em 12 de março de 2016.

TILTON, B. The Leave no Trace Master Educator Handbook. Boulder, USA: The Leave No Trace Center for Outdoor Ethics, 2003.

VAGIAS, W. An Examination of the Leave No Trace Visitor Education Program in Two US National Park Service Units. Tese (Doutorado). Graduate School of Clemson University, 2009.