DEIXA SUBIR!

Tasso Azevedo 

 

Em um domingo ensolarado no início de janeiro acordei cedo para levar minha filha a um piquenique numa praça em São Paulo para comemorar o aniversário de sete anos de sua melhor amiga. Na Praça do Jardim das Perdizes, inaugurada meses antes, os pais da aniversariante colocaram uma pequena mesa embaixo de uma árvore com comes e bebes e penduraram alguns balões nos galhos ao redor.

Tudo ia perfeitamente bem até que um veiculo da Guarda Municipal entra na Praça, estaciona ao lado da árvore e dois guardas descem e solicitam o documento de autorização do "evento". Diante da perplexidade dos adultos e a curiosidade das crianças anunciam que a festa deveria ser encerrada imediatamente: - Além do mais senhores, é proibido pendurar qualquer objeto ou subir nas árvores nos parques e praças da cidade! Emendou o guarda.

Apesar de toda cena ser absurda, o que me chamou mais atenção foi a proibição de subir em árvores e aproveitei para entender a razão da arbitrariedade. Logo escutei: - É para segurança dos seus filhos e para preservar as árvores, assim eles aprendem não correr perigo e cuidar da natureza.

Mas será que tem esta proibição mesmo. Pois é, está lá em um decreto municipal de 1989 que é proibido subir ou escrever em arvores e correr no gramado(!!). Deve ser só em SP – cidade mais carrancuda – pensei eu, mas não, em Belo Horizonte, uma  portaria de 2013 veda “subir em árvores ou nelas amarrar redes”.

Em um Jardim Botânico até vale o argumento de proteção dos espécimes muitas vezes únicos, mas em geral que mal pode ter uma criança subir numa árvore? É a criança que sobre em árvore, brinca com formiga, corre atrás de passarinho, coleciona flores e folhas que vai lutar para proteger a fauna e flora quando crescer. Esta ligação motora e emotiva é fundamental para conectar-nos com a natureza.

Famílias que escolhem levar para as praças e parques a confraternização e brincadeira da garotada em vez de se enfurnar num shopping tem que ser aplaudidos e incentivados e não constrangidos.

Uma ótima iniciativa em curso, por enquanto no Rio e São Paulo, é o programa Criança e Natureza do Instituto Alana que disponibiliza uma séria de ferramentas e dicas para incentivar as famílias, escolas e as cidade a proporcionar o convício da criança com a Natureza. Que o programa contamine os gestores municipais e quem sabe logo, logo, tenha uma plaquinha nas árvores dizendo “vem brincar comigo”.

Ah, na festinha do Jardim das Perdizes enquanto os adultos e guardas discutiam as crianças voltaram a brincar correndo curiosos atrás de um punhado de gafanhotos que passou por lá (xi... será que pode?).

 

Publicado em O Globo em 22.02.2017