Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início Cadastre-se! Procurar Área de autores Contato Apresentação(4) Normas de Publicação(1) Dicas e Curiosidades(7) Reflexão(3) Para Sensibilizar(1) Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6) Dúvidas(4) Entrevistas(4) Saber do Fazer(1) Culinária(1) Arte e Ambiente(1) Divulgação de Eventos(4) O que fazer para melhorar o meio ambiente(3) Sugestões bibliográficas(1) Educação(1) Você sabia que...(2) Reportagem(3) Educação e temas emergentes(1) Ações e projetos inspiradores(25) O Eco das Vozes(1) Do Linear ao Complexo(1) A Natureza Inspira(1) Notícias(21)   |  Números  
Artigos
03/09/2010 (Nº 33) A CRISE DO MEIO AMBIENTE ENTRE AS VÁRIAS AGENDAS CONTEMPORÂNEAS
Link permanente: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=893 
  
Educação Ambiental 33

A CRISE DO MEIO AMBIENTE ENTRE AS VÁRIAS AGENDAS CONTEMPORÂNEAS

 

Boaz Antonio de Vasconcelos Lopes

Emial: lopes40-@bol.com.br

RESUMO:

 

Neste artigo, iremos evidenciar as principais agendas para a gestão dos recursos naturais sem deixar de desvendar as contradições interna a todo o processo de desenvolvimento sócio-ambiental. Optamos por uma dissertação em que são identificadas as seguintes categorias de análise: visão, procedimento, instrumento, agentes principais e espaço. Então, com esse encaminhamento são caracterizadas as seguintes agendas da gestão ambiental: a tese de Pigou, a tese de Coase, a tese da gestão Integrada dos recursos naturais e da crítica radical ao modelo de produção e consumo vigente.

 

Palavras-chave:

Ambientalismo; gestão ambiental; agendas ambientais; recursos naturais.

 

1. Introdução

 

A partir do efeito midiático da Eco 92, a crise do meio ambiente passou a ser uma percepção muito mais presente na vida de todos. Todavia, as soluções para os problemas ambientais não são consensuais, ao contrário, elas dependem da visão de mundo e de interesse de cada um dos atores sociais. Existem opiniões divergentes sobre suas causas e os seus efeitos e quais são as respostas mais adequadas para a gestão de seus recursos.

O atual modelo capitalista de produção e consumo tem uma tendência "natural" de expandir sua centralidade econômica. Sua lógica é transformar os valores de uso, aqueles que satisfazem as necessidades humanas, em valores de troca, aqueles que satisfazem as necessidades do mercado, cada vez mais globalizado.

É clássico o conhecimento de que o modelo de crescimento dominante, desde a Revolução Industrial, tem gerado uma massa cada vez maior de excluídos sociais. Agora, o modelo tem degradado, às vezes de forma irreversível, o meio ambiente. Estamos diante de um novo tipo de crise, nunca vista, a sócio-ambiental.

Inicialmente, podemos aceitar a definição de meio ambiente como sendo o produto da interação entre os homens e a natureza de forma equilibrada. Essa noção, perpassa, também, a interação entre os próprios homens, em espaços e tempos concretos e com dimensões históricas e culturais específicas que expressam também o significado político e econômico das mudanças que se pretende induzir ou sustar. Esta visão está dentro de um escopo de estudo chamado desenvolvimento sustentável.

O Relatório Brundtland, um dos documentos mais importante sobre o assunto (Bruseke, 2003), traz uma das definições mais conhecidas, a qual afirma que o desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades das gerações presentes sem comprometer a possibilidade das gerações futuras atenderem suas próprias necessidades. Neste sentido, é indispensável pensarmos um desenvolvimento em que é considerada a correlação entre, pelo menos, as seguintes dimensões: sociais, ambientais e econômicas. Assim, uma pergunta se faz necessária: há compatibilidade entre o atual sistema de produção/consumo de riquezas e uma saída sustentável para o desenvolvimento?

Mediante a análise de algumas obras, neste artigo, iremos evidenciar as principais agendas para a gestão dos recursos naturais sem deixar de desvendar as contradições interna que envolve todo o processo do desenvolvimento sustentável em prática.

Optamos, também, por uma dissertação em que são identificadas as seguintes categorias de análise: visão, procedimento, instrumento, agentes principais e espaço.

 

Problemática:

O que está em jogo nessa problemática é que tipo de desenvolvimento queremos e como ele se articula com a gestão dos recursos naturais?

 

2. Solução econômica para a crise ambiental

 

Durante muito tempo, desde a Revolução Industrial, os insumos naturais têm sido usados de forma infinita. A partir do momento em que o fornecimento deste insumo, fundamental para o processo da reprodução do modelo econômico, começou a ficar crítico, o paradigma dominante buscou, no controle econômico deste, uma solução para o problema.

Na perspectiva da crise da escassez de recursos naturais, o controle econômico do consumo das fontes naturais tem se constituído como uma solução duplamente útil.  Porque, ao mesmo tempo em que se diminui o consumo destes recursos, dirigindo-os para lógica da indústria, conserva-se o paradigma vigente, uma vez que o modelo tem fundamento, também, na ordem da economia de mercado.

O campo da economia que o paradigma dominante aplica à teoria econômica, a questões ligadas ao manejo e à preservação do meio ambiente é chamado de Economia Ambiental ou Economia do Meio Ambiente. Essa é uma das razões que, nos últimos anos do século XX, justificam um claro crescimento da preocupação e do interesse das empresas com os assuntos relacionados ao meio ambiente. Entre as razões apresentadas para esse crescente interesse corporativo pelo meio ambiente, podemos citar:

a) Sobrevivência corporativa a longo prazo: está relacionada à necessidade de tecnologias que possibilitem a geração de recursos básicos para a manutenção de alguns importantes setores da economia, como, por exemplo, energia e celulose.

b) Oportunidades de mercado: um exemplo de mercado gerado a partir de ações de preservação do meio ambiente é a venda de quotas de absorção de CO2.

c) Mercado financeiro: devido a novas regulamentações e a um agressivo clima de litígio, um atestado de saúde ambiental está tornando-se cada vez mais vital para assegurar investimentos e financiamentos a novos projetos nos mais diversos setores produtivos.

d) Responsabilidade criminal e legal: as novas leis de proteção ao meio ambiente têm sido responsáveis pela adequação tecnológica de várias empresas, sob pena de inviabilizar a implantação ou a ampliação das mesmas.

e) Informação globalizada: a globalização traz consigo a distribuição praticamente uniforme da informação, o que está derrubando as práticas indiscriminadas dos recursos naturais.

A seguir trataremos de conceitos fundamentais para a economia do meio ambiente como premissas e importantes instrumentos de análise, constituindo-se em conceitos-chave para o desenvolvimento de nosso estudo, são eles:

 

  • Critério de Pareto: é o critério utilizado para julgar se a alocação do recurso é ou não o mais eficiente, é indicado para estabelecer um ponto ótimo para a sociedade nas negociações entre governo e mercado para a preservação do meio ambiente.
  • Externalidade: a compreensão desse conceito demonstra a idéia de como o mercado faz uso dos recursos naturais, muitas vezes não atribuindo o devido valor a esses bens por usufruir deles gratuitamente.
  • Internalidade: alternativa econômica para a compensação pelos níveis de poluição provocados pelo uso dos recursos naturais no processo de produção das indústrias. Mediante inclusão dos custos ambientais no cálculo de custo da produção.
  • Taxa pigouviana: constitui-se no estabelecimento de uma taxa sobre a emissão de poluentes. É uma política de cunho econômico de controle dos níveis de poluição feito pelo poder público.
  • Teorema de Coase: faz um contraponto às taxas pigouvianas, propondo o controle da poluição pelo mercado por meio de quota para poluir fornecido para as indústrias.  Esta teoria usa o conceito de equilíbrio competitivo mediante o critério de Pareto.

 

3. Fundamentos da tese de Pigou

 

 A taxa pigouviana, assim chamada em homenagem ao economista inglês Arthur Cecil Pigou, quem primeiro sugeriu essa taxa, conceitualmente, trata de um imposto sobre unidade de poluição emitida que deve ser igual ao custo marginal social dessa poluição no nível ótima da emissão.

            A alternativa proposta por Pigou, para o controle da escassez dos recursos naturais, seria a aplicação de uma taxa que igualaria o montante total do custo marginal imposto à sociedade. Dessa forma, o fabricante passaria a assumir o total dos custos de sua produção pelo pagamento de uma taxa pré-fixada pelo Estado.

            Analisemos um exemplo proposto por Costa (2002), o caso de dois poluidores: um deles pode reduzir sua poluição a um custo relativamente pequeno, enquanto o outro tem de arcar com pesadas reduções em seus lucros para cada unidade produzida a menos. Nesse caso, seria mais coerente impor uma redução maior àquele poluidor que pode fazê-lo a baixo custo. Esse objetivo seria automaticamente alcançado com o mecanismo da taxa pigouviana.

            A taxa pigouviana alcança seu objetivo de reduzir os níveis de poluição, minimizando o custo dessa redução para a sociedade. Outro ponto apresentado a favor da taxa pigouviana é o estímulo gerado para que as firmas busquem desenvolver tecnologias menos poluidoras. Isso ocorre porque, com a taxa pigouviana, a emissão de poluição passa a ter um custo e, evidentemente, toda firma busca possuir tecnologias que reduzam seus custos.

            De acordo com a proposta metodológica sugerida na introdução de nosso artigo, podemos sintetizar a tese de Pigou pelas seguintes configurações:

 

  • Visão: solução política e quantitativa para a crise do meio ambiente;
  • Procedimento: gestão gerenciada pelo Estado;
  • Instrumento: econômico.
  • Agentes principais: Estado e os agentes econômicos;  
  • Espaço: jurídico.

 

4. Fundamentos da tese de Coase

 

            A abordagem econômico-liberal aposta nas forças de autoregulação do mercado, e parte do pressuposto de que pressão de concorrência, crescimento econômico e prosperidade levariam automaticamente ao uso racional dos recursos naturais, ao progresso tecnológico e a novas necessidades de consumo compatíveis com as exigências do meio ambiente.

            Por essa visão, o mercado é o melhor mecanismo para garantir a satisfação dos desejos individuais, inclusive dos desejos ambientais na medida em que os consumidores manifestassem sua consciência ecológica nas decisões de compra, o mercado verde responderia a esta demanda com a oferta crescente de produtos e serviços ecológicos

            Para Ronald Coase, desde que os direitos de emissão de externalidades sejam adequadamente definidos e que não haja custos de transação entre as partes, a livre negociação entre as mesmas deve levar ao nível ótimo de emissão destas externalidades.

Costa (2002), para demonstrar a tese de Coase, descreve o seguinte exemplo: uma empresa de celulose que se instalou em uma sociedade cuja base econômica são cooperativas agropastoris. Na localidade onde as duas indústrias estão instaladas há um importante rio que em um primeiro momento atendia a irrigação da lavoura e o consumo da criação de gado da cooperativa e da região.

A nova indústria foi implantada e em pouco tempo foram sentidos danos, principalmente em relação à água. Os níveis de poluentes emitidos na água geraram a necessidade, por parte das cooperativas, de tratarem a água antes de consumi-la para sua produção, uma vez que, o consumo direto gerou doenças no rebanho e perdas nas plantações.

            Nessa situação, ocorre que quanto mais resíduos lançar no rio a empresa de celulose, que utiliza grande quantidade de água em seu processo produtivo, maior será o custo das cooperativas da região com instalações de tratamento para a água, o que resulta em um lucro menor.

            A sociedade local encontra-se em um dilema: as cooperativas da região gostariam que a empresa de celulose reduzisse a emissão de poluentes, o que reduziria seus custos e aumentaria seus lucros. Por outro lado, a indústria de celulose não tem interesse em reduzir a poluição que gera, pois isso só seria possível de duas formas: ou reduzindo a produção, ou desenvolvendo tecnologias de tratamento para água antes de lançá-la ao rio. Qualquer uma dessas opções geraria uma redução no seu lucro.

            Coase (1960) sugeriu que a indústria poluente seja levada a emitir o nível ótimo de poluição desde que fosse determinado a ela o direito de poluir o quanto quisesse, ou seja, até o limite em que o outro agente tem o direito a usar a água limpa.

            Aqui entramos em uma questão que traz uma função essencial do Estado: a definição e a preservação dos direitos de propriedade para poluir. Ou seja, se não houver uma determinação legal proibindo que qualquer indústria polua a água sem prévia autorização, a cooperativa autorizará a produção até o nível em que será compensada por seus lucros.

            Aplicando-se à realidade, quando uma indústria pretende implantar uma nova sede ou ampliar sua planta, ela deverá pedir autorização à sociedade, que aceitará ou não conforme seus critérios. Teoricamente, o representante da sociedade é o Estado, que através dos órgãos especializados aprova ou não a implantação ou a ampliação de determinada indústria.

            Para Coase (1960) o controle feito pelo Estado pode ser utilizado como uma grande arma política, favorecendo ou prejudicando um ou outro grupo de poder. E uma maneira de evitar o protecionismo a alguns grupos em detrimento de outros seria estipular o nível máximo de poluição aceito pela sociedade em determinada região e, a partir daí, o mercado fixar quotas de poluição para as indústrias de uma localidade.

Nesse caso o Estado define a propriedade para poluir e permite que haja um livre mercado de quotas de poluição, garantindo à sociedade que seu limite de aceitação de poluição não será ultrapassado, já que as próprias indústrias envolvidas auxiliarão os órgãos públicos.

De acordo com a proposta metodológica sugerida na introdução de nosso artigo, podemos sintetizar a tese de Coase pelas seguintes configurações:

 

  • Visão: solução econômica e quantitativa para a crise do meio ambiente;
  • Procedimento: gestão gerenciada pelo mercado;
  • Instrumento: econômico. 
  • Agentes principais: indústria;
  • Espaço: mercado de troca.

 

5. Gestão Integrada dos recursos naturais

 

            Para Frey (2001), a teoria moderna afirma que o Estado contemporâneo perde progressivamente sua capacidade de condução hierárquica unilateral à medida que as redes de negociação entre os diferentes atores dentro de cada sociedade, como também entre os diferentes Estados, diversificam-se.

            A lógica funcional que está na base do sistema político-administrativo prevalecente nas democracias representativas do mundo ocidental pressupõe que aqueles que exercem funções públicas deveriam, a princípio, estar em condições de transformar as concepções politicamente defendidas também em planos de ação pertinentes e, por conseguinte, em correspondentes resultados políticos.

            Mas, à medida que aumenta a complexidade e a diferenciação funcional da sociedade moderna, declina a capacidade de condução e de governabilidade por parte do sistema político-administrativo. Particularmente os problemas ambientais mostram de forma mais nítida, que a política deveria conseguir muito e acaba conseguindo pouco, perante a incapacidade de controle dos resultados do sistema político e da esfera do Estado.

 Diante das limitações desse Estado, a gestão integrada reivindica a transferência de maiores responsabilidades para os sistemas de negociação da sociedade civil e o aumento das possibilidades de informação, de influência e de controle exercidas pela sociedade baseando-se nas teorias da democracia participativa.

As teorias da democracia participativa e da democracia deliberativa, como também o comunitarismo, evidenciam a crescente desilusão com o potencial transformador do Estado. Por outro lado, tentam uma alternativa ao livre mercado como modelo único de tomada de decisão sobre os rumos de desenvolvimento das sociedades e da gestão do meio ambiente em crise. Esta nova visão deposita na própria sociedade civil, a possibilidade de ser o ator principal rumo ao desenvolvimento sustentável da sociedade.

Em oposição às abordagens ecocêntricas, cujo foco de atenção é a natureza e sua proteção, a abordagem política de participação democrática parte do pressuposto de que o homem e a sociedade devem estar no centro da atenção e de reflexão. Portanto, essa abordagem pode ser considerada como uma visão sócio-dicursiva da gestão do meio ambiente e de seus recursos naturais.

            A democracia liberal privilegia os interesses econômicos particulares de pessoas ou grupos sociais afetados, em detrimento dos interesses ecológicos de caráter geral e difuso. Contudo, a abordagem política de participação democrática parte da necessidade de uma ampla participação para determinar os objetivos das políticas ambientais, tomando como princípio a idéia de que todas as dimensões da relação homem-natureza são fundamentais e importantes.  

Outro ponto crítico é que uma democracia discursiva não trata de uma abordagem elaborada explicitamente a partir de uma preocupação com a questão ambiental, porém, a proposta apresentada é possuidora de características que podem ser úteis para se pensar uma concepção do desenvolvimento sustentável e possíveis soluções para a crise ecológica mediante a radicalização dos mecanismos democráticos, quando buscam o consenso na construção da escala de prioridade da gestão do meio ambiente.  

Daí a gestão integrada – sociedade, instituições, costumes e cultura - como estratégia de desenvolvimento, onde os recursos naturais possam ser vistos como fonte de bem-estar e de conservação para manutenção de um meio ambiente equilibrado e saudável e à disposição das futuras gerações.

De acordo com a proposta metodológica sugerida na introdução de nosso artigo, podemos sintetizar a tese da gestão integrada pelas seguintes configurações:

 

  • Visão: solução integrada das dimensões da gestão dos recursos naturais;
  • Procedimento: criação de ambiente democrático de decisão;
  • Instrumento: participação social;
  • Agentes principais: todos;
  • Espaço: discursivo-consensual.

 

6. Visão pela crítica radical do modelo de produção e consumo

 

Para Hora (2007), a estrutura econômica é responsável pela crise ambiental em que vivemos. Vemos fatores sócio-ambientais como as alterações do equilíbrio natural causadas por fenômenos como: aquecimento global, as ilhas de calor, escassez de recursos hídricos, assim como a constante miserabilidade que grande parte da população do globo enfrenta,

O que existe é a consolidação de um sistema produtivo capitalista que orienta uma necessidade vital de manter o atual padrão de consumo. E por outro lado, uma tentativa de recorrer à teoria de Malthus, para defender a tese de que é o crescimento populacional, em particular os pobres, os responsáveis pelos problemas ambientais e sociais.

            O processo de urbanização e a atual situação de crise sócio-ambiental são vivenciados pela globalização e pelo modelo de desenvolvimento econômico que imputa, aos países do mundo, uma divisão geopolítica de um norte rico e um sul cada vez mais pobre. É isso que se faz refletir sobre o tipo e o conceito de desenvolvimento e progresso desejado.

            Não é possível mais não pensar em meio ambiente, quando o mundo já vive problemas de escassez de água, mas também, não é possível pensá-lo, sem alimentar os milhões de famintos que se encontram em continentes inteiros. Mas também, já não é possível dar sustentabilidade aos padrões de consumo dos países desenvolvidos.

            Primeiramente, de quê Desenvolvimento Sustentável (DS) falamos? Se considerarmos a definição da ONU, expressa no Relatório Brundtland, temos que: “desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem suas próprias necessidades”. (BRUSEKE, 2003, p. 29)

            Aparentemente é coeso, o discurso do desenvolvimento sustentável, da garantia do “nosso futuro comum”, no entanto, apresenta-se como uma demanda genérica da sociedade – como elemento homogêneo e único. Desconsiderando, justamente, as singularidades e necessidades dos povos do mundo. Não contestando nem apontando para uma necessidade histórica de superação do atual modelo de crescimento.

            A questão ambiental ou do DS pode orientar matrizes de desenvolvimento diferenciadas e antagônicas, destacando-se de um lado àquelas que suprimem a idéia da disputa de classe, que serve de suporte ao próprio modelo capitalista. E por outro, aponta para a superação do modelo de desenvolvimento atual, para a construção de novas relações societárias.

Quando a ascensão do ecologismo dilacera o positivismo com suas denúncias contra degradação ambiental, denota-se não apenas uma preocupação ético-estética do ponto de vista da vida, mas uma alteração na essência do entendimento da relação homem-natureza. Neste instante torna-se mais que latente a indagação: de qual natureza falamos? E ainda: como o meio ambiente torna-se uma questão ambiental?  

A questão ambiental tem sido um fator de reprodução do sistema na proporção em que gera resíduos para garantir a exploração do trabalho e a construção da mais valia como princípio inato de sua sobrevivência. Nele, num momento, a natureza precisa ser privatizada e no outro precisa ser conservada, para ser explorada. Assim, longe de ser um debate fora de seu seio, é justamente a (re)inserção da visão de mundo que inclui o homem como elemento da natureza que aponta a forma de sua  reprodução.

É preciso ter nítido que a proteção da fauna, flora e da mitigação dos impactos ambientais com a proposta de sistemas de conservação e preservação do meio ambiente esteja consorciadas à proteção de todos os homens sem a exclusão.

Mudar hábitos de consumo, repensar os processos produtivos, urbanizar sem causar impactos, gerar formas alternativas de produção energética, distribuir renda. Enfim, criar e estabelecer outros princípios e valores perpassa a transformação do atual modelo dominante de produção e consumo.

            Os críticos dessa visão afirmam que não podemos nos deixar enganar por aqueles que insistem em humanizar o capital. Porque, o grande desafio é como humanizar a diferença, a pobreza e a degradação ao mesmo tempo.

            A pobreza, a exclusão social e o desemprego devem ser tratados como problemas planetários. Porque, tanto quanto a chuva ácida, o efeito estufa, a depleção da camada de ozônio e o entulho espacial, assim como a maioria dos projetos de gestão dos recursos naturais, estão no cerne das mesmas concepções de desenvolvimento, e fora da lógica atual do crescimento econômico global.  

De acordo com a proposta metodológica sugerida na introdução de nosso artigo, podemos sintetizar a tese da visão pela critica radical do modelo de produção e consumo pelas seguintes configurações:

 

  • Visão: postura crítica radical diante do modelo econômico de produção e consumo;
  • Procedimento: desenvolvimento de uma consciência política ambiental;
  • Instrumento: a política econômica ambiental;
  • Agentes principais: os excluídos do modelo econômico dominante;
  • Espaço: sociológico.

 

7. Considerações finais

            A crise ambiente não é disciplinar. Não podemos olhar para um único ponto, nem tão pouco, temos a nossa disposição um objeto bem definido. Então, o que temos é um objeto complexo que possibilita várias formas de se olhar.   

            Lidar com um objeto com esse nível de mobilidade, requer que sejam mostradas todas as contradições possíveis; que caminhemos por várias dimensões, sem nos perdemos e sem sermos consumidos por alguma delas. Não basta tentarmos mostrar conteúdos, até porque eles não existem de forma cristalina. Temos que avançar no mérito do método e da diversidade, para não sermos apenas reprodutores.

            Por estarmos diante de uma ciência interdisciplinar, procedemos selecionando entre algumas agendas sobre a gestão de recursos naturais aquelas que possuem as características mais distintas. De posse destas agendas, por uma leitura crítica, fomos “enquadrando”, em nossa proposta de sistema de categorias, os fundamentos de cada uma dessas agendas.   

            Assim procedemos, porque pelos motivos já expostos, não foi suficiente identificar apenas os instrumentos de gestão. Bem mais ainda porque, seja nas ações científicas ou nas práticas de cotidiano, os instrumentos guardam, no seu escopo, fundamentos que se estendem além de sua utilidade.  

            O que guia a prática de uso de um instrumento, nos exercícios da vida científica ou na sociedade, são as visões de mundo que ficam resguardadas. Essas ações são feitas mediante procedimentos que beneficiam algum ou vários agentes, nos limites de um espaço de ações e disputas. Onde não cabe a neutralidade de posições.

             Pela leitura dessas agendas, sobre a gestão dos recursos naturais, é possível identificar que em um extremo temos um paradigma que é dominante, que tenta se apresentar enquanto um mero instrumento, sem muitas pretensões. Este é mais bem definido, atuante, mais voltado para resultados e sem muitos questionamentos. No nosso caso, baseado na tese de Coase.    

            Do outro lado, temos um paradigma totalmente oposto que, mesmo com toda uma tradição discursiva, apresenta-se, ainda, sem uma vertente instrumental consistente. Pois, é natural que um paradigma periférico desenvolva mais seu escopo teórico que instrumental. Esta descrição de visão sobre a gestão dos recursos naturais foi apresentada pelo modelo de crítica radical do modelo de produção e consumo. 

            Assim como, também, temos o “paradigma” que, algumas vezes, está dentro do escopo da visão dominante da gestão dos recursos naturais, e outra, defende as teses do paradigma periférico. Este, geralmente, se apresenta mais bem definido, instrumentalmente, em relação ao segundo. Para esta descrição, no nosso caso, enquadra-se o conceito de desenvolvimento sustentável.

 

8. Bibliografia

 

BELLEN, M. van Hans. Indicadores de sustentabilidade. Rio de Janeiro: FGV, 2005.

BOFF, Leonardo. 1995. Ecologia: Grito da Terra, Grito dos Pobres. Editora Ática. São Paulo, 1995

BRUSEKE, Franz Josef. Problema do desenvolvimento sustentápavel. In: CAVALCANTE, Clóvis (ORG.) Desenvolvimento e natureza: estudos para uma sociedade sustentável. São Paulo: Cortez, 2003.  

COASE, R. The problem of social cost. Journal of Law and Economics, 1960, disponível em: < www.sfu.ca/~allen/CoaseJLE1960.pdf > acessado em: 26 jun. 2007.

COSTA, Simone S. T. Economia do meio ambiente produção versus poluição. Dissertação (Mestrado) – Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2002.

FREY, Klaus. A dimensão político-democrática nas teorias de desenvolvimento sustentável e suas implicações para a gestão local, Ambiente & Sociedade , Ano IV - No 9 , 2o Semestre de 2001.

HORA, Karla Emmanuela Ribeiro. O processo de urbanização e papel da educação ambiental no limiar do século, Disponível: em < http:// www.abrali.com/ 016meio_ambiente/016meio_ambiente_o_processo_de_urbanizacao_e_o_papel_da_educacao_ambiental_no_limiar_do_seculo_xxi.html> acessado em: 26 de junho 2007.

MARTINS, Paulo Roberto. O Desafio da Sustentabilidade. São Paulo: Editora Fundação Perseu, 2001.

Ilustrações: Silvana Santos