Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início Cadastre-se! Procurar Área de autores Contato Apresentação(4) Normas de Publicação(1) Dicas e Curiosidades(7) Reflexão(3) Para Sensibilizar(1) Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6) Dúvidas(4) Entrevistas(4) Saber do Fazer(1) Culinária(1) Arte e Ambiente(1) Divulgação de Eventos(4) O que fazer para melhorar o meio ambiente(3) Sugestões bibliográficas(1) Educação(1) Você sabia que...(2) Reportagem(3) Educação e temas emergentes(1) Ações e projetos inspiradores(25) O Eco das Vozes(1) Do Linear ao Complexo(1) A Natureza Inspira(1) Notícias(21)   |  Números  
Artigos
03/09/2010 (Nº 33) Gestão de Resíduos de Saúde nos ateliês de tatuagem em Aracaju
Link permanente: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=889 
  
Educação Ambiental 33

Gestão de Resíduos de Saúde nos ateliês de tatuagem em Aracaju

 

 

Paulo Eduardo Silva Martins¹

José Guimarães de Carvalho Neto²

 

 

¹ Pós-graduando Universidade Estadual Paulista Júlio de  Mesquita Filho (UNESP)

 ² Pós-graduando Universidade Federal de Campina Grande (UFCG)

 

paulo_xx_martins@hotmail.com

 

Av. Francisco Borges de Godoy Macota, 371 – Bairro Nova Aparecida, Jaboticabal – SP , CEP 14883-390

              

 

 

 

RESUMO

 

Os resíduos de serviços de saúde constituem em um grave problema principalmente devido aos perigos potenciais de contaminação química e biológica. Neste estudo aborda-se o gerenciamento dos resíduos de serviços de saúde nos ateliês de tatuagem em Aracaju – SE. Através deste estudo, pretendeu-se observar e explorar as condições de funcionamento da gestão destes resíduos nos ateliês. O instrumento de coleta de dados foi através de um questionário aplicado a um representante do estabelecimento, perante visita técnica ao ateliê. Verificamos que os profissionais entrevistados possuem boa percepção em relação aos riscos relacionados aos RSS e que o destinam de maneira correta através de carro coletor especial. Entretanto, ficou evidenciado que os profissionais têm pouco conhecimento sobre a composição dos seus resíduos e que o modelo de Gestão Avançada de RSS deve ser rapidamente implantado para que se possam evitar os agravantes relacionados aos resíduos, tanto em termos ambientais quanto em saúde pública.

 

 

PALAVRAS CHAVE: Disposição Final; Piercing; Resíduos do Serviço de Saúde; Tatuagem.

INTRODUÇÃO

 

A problemática envolvendo os resíduos sólidos urbanos preocupa cada vez mais a opinião pública e as lideranças políticas, tanto em escala federal, quanto nas escalas estaduais e municipais.

Segundo Takayanagui (2003), cada vez mais a administração pública têm se voltado para discutir e criar caminhos através das legislações, que permitam orientar os responsáveis em como destinar corretamente os diversos tipos de resíduos, com especial atenção para os resíduos do serviço de saúde.

            No Brasil, o modelo de gerenciamento para os Resíduos de Serviços de Saúde (RSS) pode ser verificado nas normas e legislações pertinentes ao tema, em que os geradores, responsáveis pelo gerenciamento interno dos resíduos, têm que se adequar aos modelos de gerenciamento descritos na legislação (MARANGONI, 2006: 114p.).

            Órgãos como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária e o Conselho Nacional do Meio Ambiente têm assumido o papel de orientar, definir regras e regular a conduta dos diferentes agentes, no que se refere à geração e ao manejo dos RSS, com o objetivo de preservar a saúde e o meio ambiente, garantindo a sua sustentabilidade. Um marco deste esforço foi a publicação da Resolução CONAMA 05/93, que definiu a obrigatoriedade dos serviços de saúde elaborarem o Plano de Gerenciamento de seus resíduos. Este esforço se reflete atualmente com as publicações da RDC ANVISA nº 306/04 e CONAMA nº 358/05 (Ministério da Saúde, 2006: 182pp.).

            Os RSS por suas características de geração e, portanto, pela sua heterogeneidade na composição, apresentam riscos ao homem e ao meio ambiente. Segundo Silva (2004, 107p.), a relação entre os RSS e infecção hospitalar remete às normas de Biossegurança, pois a manipulação dos resíduos perfuro-cortantes com materiais biológicos pode causar acidentes levando à contaminação dos profissionais envolvidos no processo, bem como da população, caso os RSS estejam mal acondicionados e tenham um destino final inadequado.

            De acordo com Rutala e Mayhall (1992, 11p.), o destino final dos resíduos de serviço de saúde representou um dos grandes problemas de saúde pública nos Estados Unidos, principalmente entre 1987 e 1988 quando houve o surgimento de resíduos de serviços de saúde em praias no Estado de Nova Iorque, estes poderiam ser uma das fontes de transmissão que causavam epidemia do vírus HIV.

            Mendes (2005, 110p.) afirma que a disposição inadequada dos RSS pode causar danos importantes ao meio ambiente em relação à possibilidade de contaminação de lençóis freáticos e à população pela proliferação de doenças através da transmissão por vetores.

            Scheider et al. (2001, 319p.) complementam afirmando que o abandono dos RSS no meio ambiente, favorece também a incorporação de agentes contaminantes na cadeia trófica e suas conseqüências à saúde humana, além de que deve-se levar em consideração que o aumento na geração de resíduos, implica em um consumo paralelo de matérias-primas, as quais encontram-se em quantidades limitadas na natureza.

            No Brasil, a quantidade de RSS gerados tem aumentado nos últimos anos, devido à incorporação de tecnologias de países desenvolvidos, o aumento do poder aquisitivo da população e à expansão urbana (MENDES, 2005, 110p.).

            A abordagem da Resolução 306/04 da ANVISA com relação à saúde ocupacional e a capacitação de recursos humanos, mostra um dos aspectos de responsabilidade do gerador de resíduos e sua importância para a efetivação de um gerenciamento adequado.

            Joffre et al. (1993, 6p.) apresentam estudo comparativo entre duas formas de gestão: Gestão Tradicional ou Clássica e a Gestão Avançada de RSS, onde enquadram o Brasil na forma de Gestão Clássica, conforme a Tabela 1.

 

Tabela 1: Gestão de resíduos de serviços de saúde.

Tipo

Descrição Básica

Kg/leito/dia

Países

Gestão Clássica

ou

Tradicional

 

A totalidade dos RSS é considerada especial, seja como infectante e/ou como especial

1,5 – 2,0

 

 

 

1,2 – 3,8

Reino Unido, França e Bélgica

 

 

Brasil

 

Gestão Avançada

Somente uma pequena percentagem dos RSS é considerada infectante e/ou especial

 

 

0,005 – 0,4

 

 

 

Alemanha, Holanda, Canadá, Áustria, Suécia

 

 

 

 

Fonte: Joffre et al. (1993, 6p.).

 

A gestão avançada considera os princípios da segregação eficiente, com uma pequena porcentagem de resíduos sendo tratada e disposta como infectante o que gera economia nos processos de tratamento e induz à políticas de educação ambiental. Esta gestão visa promover a correta disposição final dos resíduos contaminados, de modo a evitar agravos à comunidade e ao meio ambiente (HADDAD, 2006: 137p.).

Para Garcia & Zanetti-Ramos (2004, 9p.) a segregação é o ponto fundamental de toda a discussão sobre a periculosidade ou não dos resíduos de serviços de saúde, pois a introdução de um resíduo contaminado em uma massa de resíduos fará com que todos que tiveram contato com estes resíduos sejam tratados como potencialmente infectantes ou contaminantes, exigindo procedimentos e cuidados especiais nas demais etapas do manejo, proporcionando um maior risco e aumento de custos no restante do processo.

            Por isso, a gestão avançada trabalha com a premissa da segregação mais eficiente. Esta gestão tem a proposta de promover a correta disposição final dos resíduos contaminados; enquanto a gestão clássica, que considera a maioria dos resíduos de serviços de saúde como infectante ou especial, se transforma em um grande problema da disposição dos RSS devido à contaminação de toda a parcela a ser destinada.

            Em função deste panorama, este trabalho, através de visitas técnicas seguidas de aplicações de questionários, teve o objetivo de explorar e observar as condições de funcionamento da prática e aplicação de tatuagens em Aracaju-SE e a sua relação com a gestão dos RSS. Os resultados desta avaliação poderão auxiliar a elaboração de um planejamento suportado por um programa de treinamento e sensibilização.

 

 

 

 

 

MATERIAIS E MÉTODOS

 

            O estudo incidiu sobre o universo dos ateliês de tatuagem que possuem estabelecimento comercial na cidade de Aracaju, Estado de Sergipe, no ano de 2008 em um total de 8 ateliês.

Para a realização deste trabalho recorremos ao uso de um questionário (Anexo 1) como instrumento de coletas de dados nas visitas realizadas aos ateliês. Este questionário foi acompanhado de um ofício informando o objetivo do estudo proposto. O questionário foi preenchido por um representante de cada ateliê avaliado.

 Pretendia-se com o questionário:

a)    Avaliar o conhecimento dos profissionais em relação aos riscos sobre o manejo e a disposição final de RSS;

b)    Analisar a gestão dos RSS no ateliê;

c)    Estimar a quantidade de RSS produzidos semanalmente no estabelecimento;

d)    Avaliar a coleta dos RSS gerados;

e)    Avaliar o conhecimento dos tatuadores em relação aos resíduos gerados.

 

RESULTADOS

 

            Foi percebido que o tempo de trabalho “profissional” (há de se dizer que um tatuador é dito profissional quando o exercício da profissão é feito em estabelecimento comercial formal) varia entre 3 a 22 anos para tatuadores, e entre 1 ano a 6 anos para piercers (aqueles habilitados em aplicar as jóias, piercing).

            A grande maioria dos entrevistados, 7, acondiciona todos os resíduos provenientes do trabalho de acordo com o exigido pela legislação (utilizando os recipientes aconselhados pela NBR 13853). É válido ressaltar que em 1 dos estabelecimentos é mantido um ambiente para armazenamento interno com as devidas precauções. Contudo, apenas um deles alegou fornecer os resíduos provenientes das aplicações de piercings para reuso, com o intuito de prover objetos de arte através da manipulação das agulhas, após processo de esterilização.

Sendo assim, este mesmo profissional alegou não haver coleta externa de seus resíduos, igualmente a outro estabelecimento que depositava seus resíduos normalmente no caminhão tradicional da companhia de lixo urbano. Nos demais, havia o serviço especial e privado de coleta destinada a resíduos do serviço de saúde da empresa de coleta de lixo, em que era realizada com diferentes freqüências, a depender da geração do estabelecimento.

Observou-se que em média é gerado cerca de 15 quilos de materiais por semana nos ateliês.

            Pode-se ressaltar ainda que os mesmos 6 estabelecimentos que destinam os RSS gerados em veículo de coleta especial são devidamente vistoriados pela Vigilância Sanitária.

            Apenas os estabelecimentos que não destinam os RSS em veículo especial de coleta não são vistoriados pela Vigilância Sanitária.

            Por fim, as respostas referentes à pergunta que tratava do entendimento em relação aos resíduos de saúde mostraram que os entrevistados limitam-se a classificar os RSS como sendo todos os resíduos gerados em suas atividades, praticando o modelo de Gestão Clássica definida por Joffre et al. (1993, 6p.).

 

CONCLUSÕES

 

            A maioria dos profissionais entrevistados possuem boa percepção em relação aos riscos relacionados aos RSS. Este fato pode ser facilmente confirmado com o fato de 7 entrevistados acondicionarem de maneira correta seus resíduos. Entretanto, ficou evidenciado que os profissionais têm pouco conhecimento sobre a composição dos seus resíduos, quando afirmado que todos os resíduos gerados em suas atividades são classificados como RSS.

            Outro resultado que chama atenção é que a maioria dos entrevistados destina os RSS de maneira correta, em carro coletor especial, e passam freqüentemente por vistorias da Vigilância Sanitária.

            Como recomendação, algumas ações já podem ser iniciadas, como o exercício da capacitação profissional em relação à Gestão Avançada, que deve ser rapidamente implantada nos estabelecimentos para que se possam evitar os agravantes relacionados aos resíduos, tanto em termos ambientais quanto em saúde pública. A segregação eficiente com a implantação da Gestão Avançada reduziria a quantidade gerada de RSS, promoveria sua correta disposição final e permitiria que se evitasse a contaminação dos resíduos comuns, possibilitando sua recuperação e reciclagem.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

           

ANVISA – AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Resolução no 306 de 2004. Regulamento técnico para o gerenciamento de resíduos de serviço de saúde. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 10 dez. 2004.

 

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13853: coletores para resíduos de serviços de saúde: perfurantes e cortantes: Especificação. Rio de Janeiro, 1997.

 

CONAMA - CONSELHO NACIONAL DE MEIO AMBIENTE. Resolução nº 5 de 1993. Gerenciamento de resíduos sólidos, oriundos de serviços de saúde. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 05 ago. 1993.

 

CONAMA - CONSELHO NACIONAL DE MEIO AMBIENTE. Resolução nº 358 de 2005. Tratamento e a destinação final dos resíduos de serviços de saúde. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 04 mai. 2005.

 

GARCIA, L. P. ; ZANETTI-RAMOS, B. G. Gerenciamento dos resíduos de serviços de saúde: uma questão de biossegurança. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro. v.3, n. 20, p.744-752. 2004.

 

HADDAD, C. M. C. Resíduos de serviços de saúde de um hospital de médio porte do município de Araraquara: subsídios para elaboração de um plano de gerenciamento, 2006. 137p. Dissertação de Mestrado, UNIARA, Araraquara, 2006.

 

JOFFRE, A.F. ; DIE, I. M. ; MARUET, J. U.Gestion avanzada de residuos biosanitários. Revista todo Hospital. v.6, n. 97, p.13-18. 1993.

 

MARANGONI, M. C. Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde: Estudo de caso no Hemocentro da UNICAMP, 2006. 114p. Dissertação de Mestrado, UNICAMP, Campinas, 2006.

 

MENDES, A. A. A percepção ambiental dos resíduos de serviços de saúde – RSS da equipe de enfermagem de um hospital filantrópico de Araraquara – SP, 2005. 110p. Dissertação de Mestrado, UNIARA, Araraquara, 2005.

 

Ministério da Saúde (2006). Manual de gerenciamento dos resíduos de serviços de saúde. Ed. Anvisa, Brasília, DF. 182pp.

 

RUTALA, W; MAYHALL, G. Medical Waste: SHE position paper. Infect Control Hospital Epidemiology. 1992. p. 38-48

 

SCHEIDER, V. E.; REGO, R.C.E.; CALDART, V.; ORLANDIM, S.M. Manual de gerenciamento de resíduos sólidos de serviço de saúde. São Paulo: Balieiro, 2001. 319p.

 

SILVA, M. F. I. S. Resíduos de Serviços de Saúde: Gerenciamento no Centro Cirúrgico, Central de Material e Centro de Recuperação Anestesica de um Hospital do Interior Paulista. 2004. 107p. Tese (Doutorado em Enfermagem) – Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2004.

 

TAKAYANAGUI, A. M. M. Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde. In: Saneamento, Saúde e Ambiente. São Paulo: EDUSP, 2003.

Ilustrações: Silvana Santos