Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início
Cadastre-se!
Procurar
Área de autores
Contato
Apresentação(4)
Normas de Publicação(1)
Dicas e Curiosidades(7)
Reflexão(3)
Para Sensibilizar(1)
Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6)
Dúvidas(4)
Entrevistas(4)
Saber do Fazer(1)
Culinária(1)
Arte e Ambiente(1)
Divulgação de Eventos(4)
O que fazer para melhorar o meio ambiente(3)
Sugestões bibliográficas(1)
Educação(1)
Você sabia que...(2)
Reportagem(3)
Educação e temas emergentes(1)
Ações e projetos inspiradores(25)
O Eco das Vozes(1)
Do Linear ao Complexo(1)
A Natureza Inspira(1)
Notícias(21)
| Números
|
Artigos
A Agroecologia e Educação Ambiental como metodologia pedagógica para
alunos do ensino básico e fundamental: Caso da Escola Municipal Professora
Eunice Carneiro - Montes Claros, MG Rômulo
Fredson Duarte, Mestrando em Ciências Agrárias/Agroecologia pelo Instituto de
Ciências Agrárias da Universidade Federal de Minas Gerais – ICA/UFMG. agroromulo@yahoo.com.br
. Humberto
Pereira da Silva, Mestrando em Agronomia/Fitotecnia pela Universidade Federal de
Lavras – UFLA. humbertofu@yahoo.com.br
Resumo:
O processo de implantação de atividades em escolas municipais, desempenhado na
forma de ensinamento participativo, vem como um novo método de inserir diversos
alunos do ensino básico e fundamental no contexto da aplicação agroecológica
de produção, oficinas de caráter interdisciplinar além da percepção
ambiental. O presente trabalho teve como objetivo desenvolver atividades ligadas
à agroecologia, educação ambiental e outras práticas agrícolas de ensino de
forma que haja integração e envolvimento dos alunos e parte da sociedade a
partir de maneira simples, claras e objetivas de ensinamentos. Introdução A cidade de Montes
Claros está localizada no Norte de Minas Gerais, no Polígono das Secas,
historicamente conhecida pelos graves problemas sociais e econômicos. Apesar
disso, a região consegue se destacar por apresentar intensas riquezas artísticas,
culturais, biodidiversidade ambiental além de territórios e populações
tradicionais. A cidade contava em 2007 com uma população estimada de 352.384
habitantes e área da unidade territorial de 3.583 km² (IBGE, 2008). No âmbito educacional,
novas formas de ensino pedagógico estão surgindo, principalmente aquelas que
possuem um papel além da ocupação da sala de aula como meio de aprendizado
escolar. Assim, o processo de implantação de atividades em escolas municipais,
desempenhado na forma de ensinamento participativo, vem como um novo método de
inserção de alunos do ensino básico e fundamental da rede pública de ensino
no contexto da aplicação agroecológica de produção através da construção
de hortas escolares, oficinas de caráter interdisciplinar além de estudos que
envolvam o meio ambiente.
Segundo CAPORAL e COSTABEBER (2002: p.14): “A agroecologia tem
sido reafirmada como uma ciência ou disciplina científica, ou seja, um campo
de conhecimento de caráter multidisciplinar que apresenta uma série de princípios,
conceitos e metodologias que nos permitam estudar, analisar, dirigir, desenhar e
avaliar agroecossistemas – unidades fundamentais para o estudo e planejamento
das intervenções humanas em prol do desenvolvimento rural sustentável”. Estes
mesmos autores ainda complementam: “Em essência, o
Enfoque Agroecológico corresponde à aplicação de conceitos e princípios da
Ecologia, da Agronomia, da Sociologia, da Antropologia, da ciência da Comunicação,
da Economia Ecológica e de tantas outras áreas do conhecimento, no redesenho e
no manejo de agroecossistemas que queremos que sejam mais sustentáveis através
do tempo”. Sendo assim, dentro do
conceito da agroecologia, a sua aplicação torna-se de fundamental importância
tanto no contexto social e cultural quanto no político, econômico e ambiental.
Daí surge a necessidade dessa abordagem como ferramenta para a integração e
inserção de alunos de escolas públicas na formação intelectual além de
fomento para a inclusão social. “A descrição dos
conhecimentos e sentimentos da população em relação ao ambiente em que vive
pode representar uma ferramenta estratégica para monitorar e fomentar mudanças
de atitudes nos grupos socioculturais onde estão os professores do entorno,
alunos e familiares, proprietários de terra, pesquisadores e administração,
considerando o pressuposto de que a sensibilização, por meio do conhecimento
do sistema ambiental, é condição básica para o envolvimento efetivo dos
mesmos" (BEZERRA et al., 2007: p.148) O projeto
“Comunidades Educadoras”, o qual faz parte dessa iniciativa, visa promover
novos processos de aprendizagem ampliando a relação das crianças e jovens com
seu entorno através de percursos formativos instituídos no contexto da
comunidade na qual vivem e, do estabelecimento de parcerias com diversas
instituições e agentes sociais locais. Os conceitos norteadores dessa ação
se referem ao escopo teórico que sistematiza estudos sobre “Educação
Comunitária”, ou seja, processos educativos empreendidos a partir da vinculação
da comunidade de aprendizes com sua realidade próxima visando ações
interventivas e guiadas por valores éticos e estéticos. Esse trabalho tem uma
promoção em parceria da Prefeitura Municipal de Montes Claros, através da
Secretaria Municipal de Educação, Esporte e Lazer e do Instituto de Ciências
Agrárias da Universidade Federal de Minas Gerais – ICA/UFMG, campus Montes
Claros. Dessa forma, convém
salientar que, a idéia de permitir às pessoas (crianças, jovens e adultos)
livre acesso às informações inerentes à educação poderá possibilitar a
esses possíveis atores na contribuição para a melhoria da qualidade de vida e
o desenvolvimento socioambiental. Nesse mesmo sentido,
convém destacar o caráter multifuncional da educação ambiental conforme
JACOBI (2003: p.197) salienta: Quando nos referimos à
educação ambiental, situamo-nos em contexto mais amplo, o da educação para a
cidadania, configurando-a como elemento determinante para a consolidação de
sujeitos cidadãos. O desafio do fortalecimento da cidadania para a população
como um todo, e não para um grupo restrito, concretiza-se pela possibilidade de
cada pessoa ser portadora de direitos e deveres, e de se converter, portanto, em
ator co-responsável na defesa da qualidade de vida.
Dentro dessa abordagem sugerem-se maneiras ou formas que seria
determinante para a inclusão e transformação social, ou seja: O principal eixo de
atuação da educação ambiental deve buscar, acima de tudo, a solidariedade, a
igualdade e o respeito à diferença através de formas democráticas de atuação
baseadas em práticas interativas e dialógicas. Isto se consubstancia no
objetivo de criar novas atitudes e comportamentos diante do consumo na nossa
sociedade e de estimular a mudança de valores individuais e coletivos (JACOBI,
1997). Metodologia O trabalho foi
implantado e desenvolvido com alunos das séries iniciais da Escola Municipal
Professora Eunice Carneiro em Montes Claros – MG, no período de fevereiro a
junho de 2008. A escola, localizada na Rua “D”, nº 300, Bairro Conjunto José
Correa Machado, conta hoje com cerca de 590 alunos matriculados no ensino
regular com faixa etária entre 06 e 14 anos de idade. Do total de alunos da
escola, estão inscritos/as no projeto “Comunidades Educadoras” 47 alunos no
turno matutino e 90 alunos no vespertino. As atividades foram realizadas no período
matutino, atendendo aos alunos que estudavam no período vespertino e no período
vespertino para aqueles do turno matutino. Para isso eram realizadas aulas teóricas
em conjunto com oficinas práticas quatro vezes por semana com as seguintes
abordagens: horta escolar, educação ambiental, produção de mudas medicinais
e ornamentais, práticas conservasionistas de solo e água, entre outras
atividades. Resultados e Discussão As experiências desenvolvidas Todos os trabalhos
implantados na escola surgiram em função de uma demanda levantada no início
do projeto pelos próprios alunos, onde os mesmos poderiam utilizar a sua
criatividade para expandir o conteúdo das atividades realizadas. Daí surge a
função principal das atividades realizadas que é de buscar a formação tanto
dos educadores (quem educa) quanto dos educandos (quem é educado), e isso
procurou ser feito de maneira espontânea pelos alunos a medida do transcorrer
dos fatos (visitas, passeios,
oficinas, etc.). Implantação da horta “A olericultura é o
ramo da horticultura que trata dos cultivos das plantas olericolas, também
chamadas hortaliças. Elas são conhecidas popularmente como verduras e
legumes” (IRALA & FERNANDES, 2001). Na escola uma horta tem
grandes vantagens para todo corpo escolar, como: diminui gastos com a alimentação,
permite a colaboração dos alunos, enriquecendo o conhecimento deles, estimula
o interesse dos alunos pelos temas desenvolvidos com a horta, além de fornecer
vitaminas e sais minerais importantes à saúde dos alunos (JARDZWSKI, 2005). Na implantação das
atividades para a construção da horta na escola procurou-se estabelecer um
planejamento de forma a levantar os materiais a serem utilizados. Assim, de
imediato surgiu a dificuldade para a aquisição do adubo orgânico (esterco)
que seria utilizado, já que a escola não possuía tal insumo. A partir daí,
em uma incursão feita com os alunos para conhecer o bairro onde fica a escola,
deparamos com uma situação interessante. Os carroceiros que ali residiam, após
o uso de seus animais costumavam deixá-los em áreas externas às suas casas,
de preferência em locais onde existiam área verde ou gramado. Dessa maneira tínhamos
acesso ao esterco desses animais, onde fazíamos coletas freqüentes, obtendo um
bom material para o plantio das hortaliças. No local destinado ao
trabalho de campo, ou seja, na horta da escola, após explanação de todo o
conhecimento técnico acerca do assunto (como cultivar hortaliças em uma horta
escolar) pelo professor de Agronomia da UFMG, os alunos foram envolvidos a
construírem sementeiras de culturas como alface, coentro e cebola, entre
outras, diretamente no canteiro. Durante a fase de crescimento e produção das
hortaliças, como exemplo a cebolinha-verde, as crianças puderam acompanhar
todas as práticas culturais que norteiam o ciclo dessa cultura, inclusive a
produção de outros adubos a partir da compostagem. Para a produção do
composto orgânico através da compostagem, os alunos utilizaram restos
vegetais, oriundos da área onde estava prevista para a montagem de um jardim,
mais o esterco coletado durante as incursões realizadas pelo bairro já
mencionado anteriormente.
“Caminhada do saber” A “caminhada do
saber” surgiu a partir do momento em que foi observado que os alunos tinham
maior aproveitamento e participação daquelas aulas que eram ministradas fora
do ambiente escolar. Dessa forma, além da Agronomia a caminhada permitiu que
houvesse um envolvimento interdisciplinar com diversas áreas do conhecimento
como Artes, Pedagogia, Educação Física, Língua estrangeira e entre outros
reforçados pela presença dos professores estagiários dessas áreas. O trajeto
do passeio começou pela escola, passando pelas ruas do bairro e terminou
novamente na escola. Durante o percurso os alunos puderam observar algumas questões
que merecem reflexões como: presença de áreas com lixo próximas a um córrego
localizado no bairro; área inclinada com ausência de vegetação e em processo
de degradação e erosão; presença de uma diversidade de plantas em alguns
quintais dos moradores do bairro; áreas de lazer; o andamento da construção
de uma avenida a qual traria melhoria da estrutura do bairro,etc.. Como tentativa de
conscientização dos participantes dessa caminhada e como forma de
aprendizagem, foi realizado intervenções discursivas com os alunos onde era
levantadas principalmente abordagens dentro da temática de meio ambiente e bem
estar social e possível alternativas para conservação do solo como a manutenção
da vegetação e construção de curvas de nível, levando em consideração os
problemas identificados. Utilizou-se da percepção ambiental como instrumento
de avaliação da degradação ambiental em que se encontrava um determinado
local ou região. Assim, GUIMARÃES (2000) relata que: A percepção ambiental
então pode ser trabalhada por meio da educação e se apresenta aos segmentos
populares da sociedade pela vivência imediata e intensa dessa população sobre
os diversos problemas ambientais que se vinculam intimamente com a produção da
miséria por esse modelo de sociedade. “Utilizar argumentos
baseados em fatos científicos ou não, a tentativa de sensibilização do aluno
quanto à importância da preservação dos ambientes naturais é um ponto comum
e importante em todo projeto” (GRANDISOLI, 2008: p.18). Criação de peixes ornamentais A idéia de implantação
de um pequeno tanque para a criação de peixes ornamentais surgiu após a
visita dos alunos a um morador do bairro, próximo a escola, onde nessa residência
possui algumas caixas de amianto utilizadas para a atividade de piscicultura. Além
disso, nos momentos de coleta do esterco, próximo ao córrego localizado também
no bairro, os alunos às vezes utilizavam do próprio recipiente (balde), que
seria usado para a coleta do adubo, como forma para adquirir pequenas espécies
de peixes que tinham naquele rio. A partir desses momentos e através de
curiosidades, idéias e especulações e interesses por parte dos alunos,
fizeram com que esse trabalho se tornasse realidade. A construção do tanque na
escola foi feito de maneira participativa. Utilizou-se material reciclável para
o seu revestimento, ou seja, aqueles materiais que eram encontrados na própria
comunidade como, por exemplo, pedaços de cerâmica. Já o cimento foi
conseguido através de doações feitas pelos próprios moradores do bairro e
pais dos alunos. O jardim escolar Com o objetivo de
inserir e enriquecer o jardim da escola os alunos foram movidos a produção e
aquisição de mudas ornamentais que fossem utilizadas para esse fim. Ao ter
conhecimento dessa idéia, os próprios pais dos alunos se propuseram em doarem
mudas de plantas para o jardim. Assim foi feito, através de incursões pelo
bairro visitaram-se diversas casas para o recolhimento desses materiais. Outras atividades desenvolvidas Além das atividades já
citadas, os alunos do projeto participaram e desenvolveram outras atividades
como: educação ambiental, o esgoto urbano e seus impactos ambientais, práticas
de conservação do solo, estudo de morfologia vegetal, etc. Dessa forma, incursões
no bairro ou no entorno da comunidade eram feitas a fim de auxiliar na abordagem
dos temas citados. Assim, garantiria que o próprio aluno construísse a sua
percepção crítica diante das demonstrações práticas. Conclusões Durante e após a
realização do projeto “Comunidades Educadoras” pode-se perceber o alcance
do objetivo proposto, ou seja, foram desenvolvidas várias atividades ligadas a
Agroecologia – práticas agrícolas, educação ambiental entre outras, onde
houve integração e envolvimento dos alunos e a sociedade no entorno do bairro.
Grande parte dos
conhecimentos gerados a partir do desenvolvimento das atividades, principalmente
àquelas que envolvem a construção da horta na escola, puderam ser absorvidos
e multiplicados com enfoque prático para a melhoria da qualidade de vida da
comunidade. Da mesma forma, os momentos propiciados aos alunos, configuraram-se
claramente em uma contextualização das questões ambientais, houve construção
de conhecimentos e idéias contextualizadas, e não questões fragmentadas,
isoladas ou meramente no campo psicológico comportamental das crianças. Apesar das dificuldades
para a realização das atividades pudemos observar a presteza das pessoas em
ajudar as outras da mesma localidade, ou seja, as do mesmo bairro. Isso os
permite inferir que, partindo do pressuposto das crianças e jovens serem vistos
como possíveis transformadores do meio social é possível fazer algo a alguma
comunidade independentemente da participação do poder público ou não.
Necessita-se ter um bom planejamento, muita boa vontade e ainda buscar mais
parcerias para o desenvolvimento das atividades. Agradecimentos Aos alunos,
professores, funcionários da Escola Municipal Professora Eunice Carneiro e a
comunidade do entorno que contribuíram com o processo de aprendizagem dessa
experiência. Referências BEZERRA,
T. M. de O.; FELICIANO, A. L. P.; ALVES, A. G. C. Percepção ambiental de
alunos e professores do entorno da Estação Ecológica de Caetés – Região
Metropolitana do Recife – PE. Biotemas,
v. 21, n. 1, p. 147-160, mar. 2008. CAPORAL,
F. R.; COSTABEBER, J. A. Agroecologia. Enfoque científico e estratégico. Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável, Porto Alegre, v.
3, n. 2, p. 13-16, abr./junh. 2002. GRANDISOLI,
E. A. C. Educação Ambiental Urbana (EAUrb) – uma alternativa de ensino nos
grandes centros urbanos. Educação
Ambiental em Ação. 2008. n.23, Ano VI, março/maio. 2008. On line. Disponível
em: <
http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=551&class=02>. Acesso em: 08
de agosto 2008. GUIMARÃES,
Mauro. Educação Ambiental: No consenso um embate?. Campinas, SP: Papírus, 2000. (Coleção
Papírus Educação). IBGE
- INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Contagem
da População 2007 e Estimativas da População 2007. Publicada no Diário
Oficial da União de 05/10/2007. On line. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/contagem2007/defaulttab.shtm.
Acesso em: 07 abril de 2008. IRALA, C H; FERNANDES, P M. Manual
Para Escolas – Hortas. p. 21 Universidade de Brasília - Departamento de
Nutrição. Brasília, 2001. JACOBI,
P. Educação Ambiental, Cidadania e Sustentabilidade. Cadernos
de Pesquisa, São Paulo, n. 118, p. 189-205, março/ 2003. JACOBI,
P. “Meio Ambiente urbano e sustentabilidade: alguns elementos para a reflexão”.
In: CAVALCANTI, C. (org.) Meio Ambiente,
Desenvolvimento Sustentável e Políticas Públicas. São Paulo: Cortez
Editora, 1997. JARDZWSKI,
K. Projeto Horta. 2005. On line. Disponível em:
http://www.portaleducacao.com.br/ensinando/principal/conteudo.asp?id=1357.
Acesso em: 25 de setembro de 2008. |