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ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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28/05/2009 (Nº 28) O cartão-postal como instrumento didático na Educação Geoambiental
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O CARTÃO-POSTAL COMO INSTRUMENTO DIDÁTICO NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Seção: trabalhos enviados

O CARTÃO-POSTAL COMO INSTRUMENTO DIDÁTICO NA EDUCAÇÃO GEOAMBIENTAL

 

Saulo Rondinelli Xavier da Silva

Graduado em Geografia (UESC), Mestrando em Cultura e Turismo (UESC)

Especialista em Educação Geoambiental (FacSul) e Educação a Distância (FTC)

Professor de Geografia da Rede Estadual de Educação – SEC-BA.

E-mail: geoilheus@hotmail.com

Home-page: http://geoilheus.tripod.com

 

 

 

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

 

O presente estudo se desenvolve a partir do trabalho monográfico intitulado “O cartão-postal: uma teoria de interpretação do espaço” (SILVA, 2003), que teve o objetivo de analisar as potencialidades do cartão-postal como forma de representação do espaço e sua possível utilização como recurso didático no processo ensino/aprendizagem da Geografia. Neste trabalho realizado com alunos do ensino fundamental em Ilhéus, constatou-se que a maioria deles consegue descrever e ainda acrescentar informações sobre os elementos que constituem a imagem fotográfica. Assim, a mensagem contida na imagem registrada e veiculada no tempo e no espaço, através do cartão-postal, é complementada com conhecimentos anteriores construídos através dos diálogos com os grupos sociais, ou pelas informações veiculadas pela mídia, pelos romances ou por outros documentos disponibilizados em livrarias, bibliotecas, museus.

Esta proposta do estudo se justifica na medida em que entendemos o cartão-postal como uma imagem material que ilustra, educa e resgata algum momento do passado, pois ele possui diversas informações que o potencializam como um recurso didático, podendo, assim, auxiliar no desenvolvimento de diversas atividades tais que educativas, culturais, pois o cartão-postal pode propiciar ao sujeito o desenvolvimento do seu raciocínio lógico, da sua autonomia, da sua criatividade, da sua capacidade de investigação e do seu espírito crítico.

Nessa perspectiva, uma revisão bibliográfica tem demonstrado que o cartão-postal tem sido um objeto utilizado no turismo, apenas, como um meio de propagação de uma imagem material de uma dada realidade sócio-espacial. Assim, considerando o valor documental dos cartões-postais e suas limitações, quando esta imagem é produzida com o objetivo de representar o objeto ausente: a cidade, pensamos que é preciso ultrapassar a visão captada pelas lentes dos fotógrafos profissionais que têm uma intenção de mostrar o lado positivo da cidade e explorar as potencialidades do cartão-postal como instrumento de educação patrimonial, cultural e ambiental.

            Contudo, Vasquez (2002) afirma que o cartão-postal tem revelado, nos últimos anos, sua capacidade em meio ao apanhado de informações que fornece, tanto para qualificar os estudos de determinadas situações urbanas quanto para dar precisão a uma inegável situação sócio-cultural. Desta maneira, o autor considera o cartão-postal como a primeira e mais democrática forma de comunicação que envolve um processo industrial de produção da informação.

            Para apoiar esta afirmação, Bédard (2003) conclui que as pessoas têm necessidade de ter elementos de identificação, ou seja, de geossímbolos autênticos para “ser”, logo ele cita, por exemplo, que se pedirmos a um estrangeiro que ele identifique o que tem de mais francês na França, talvez ele vá responder que sem dúvida a Torre Eiffel, entre outros. Contudo para o francês, ele vai se referir à outros traços da imagem do seu meio cotidiano, ou do seu imaginário coletivo e portanto, aqueles símbolos das paisagens locais ou regionais.

Assim, a imagem fotográfica do cartão-postal retrata as impressões, primeiramente, de quem a produz, no caso o fotógrafo. Em outro momento o receptor injetará impressões na imagem através de seu discurso, que é movido por uma atmosfera contemplativa. Essas impressões são herdadas pelas gerações sucessoras num processo de transmissão cultural. Segundo Vasquez (2002), o cartão-postal serve como um suporte para a imortalização da memória cultural, e também pode ser entendido como um elemento do processo de mundialização – por ser um veículo de mensagens que as propaga, através da imagem, por todas as latitudes, colaborando também para o dinamismo da indústria gráfica que logo transformou o produto num objeto de coleção.

 

 

2. O USO DE IMAGENS NA EDUCAÇÃO

 

            Percebemos que as imagens visam fixar o que é transmitido verbalmente, até mesmo os livros didáticos exemplificam com gravuras, fotografias, charges, ou usam destes para sugerir a produção de um texto, por exemplo.

            Sabemos que a imagem tem a capacidade de fixar seu conteúdo mais facilmente do que qualquer outra forma. Numa aula de Geografia o assunto é melhor assimilado quando o recurso didático estimula a percepção e interpretação do aluno, principalmente quando manifestado no lugar em que vive, a cidade por exemplo.

            Nessa perspectiva, o cartão-postal é um recurso didático ideal para o estudo de fenômenos geográficos partindo de uma análise local. O estudo do lugar estimula a atenção e o interesse, e quando associado a utilização de imagens, desperta a compreensão e o senso crítico do aluno.

            Da paisagem retratada num cartão-postal podemos obter informações para o estudo do espaço “natural”, como a perspectiva ambiental, a vegetação, o relevo, a hidrografia, ou mesmo um aspecto que “diz” qual é o clima ou como está o tempo naquele local; e para o estudo do espaço geográfico, a perspectiva urbana, social e a relação homem/natureza.

            Através dessa análise, o receptor realiza inferências sobre a constituição do espaço geográfico, compreendendo os fatores de organização e constituição do espaço nos aspectos socioeconômicos, topológicos e socioespaciais. Assim, o aluno pode entender melhor e com a sua criatividade criar seus próprios conceitos para definir fenômenos, elementos e agentes que atuam no espaço geográfico.

            Muitas vezes se associarmos a imagem com o seu complemento, geralmente uma legenda contida em seu verso, podemos entender completamente, ou quase, um acontecimento ou uma caracterização do espaço. Como o exemplo das Figuras 1 e 2, ambos cartões-postais mostram um fato (através da imagem fotográfica), bem como informam o ocorrido numa mensagem verbal denominada legenda. A Figura 2 trata-se de um cartão-postal que serviu de veículo para a difusão de um assunto, registrando um evento de caráter efêmero com a ótica jornalística.

 

Figura 1 - Vista parcial da praia da Avenida Soares Lopes numa época que o mar chegava a atingir a murada de proteção. Ilhéus (BA), início do século XX.

 

Figura 2 - Ressaca na Avenida Beira-Mar, Rio de Janeiro (RJ). f. Bippus, 1913

 

Também no estudo oceanográfico podemos visualizar a ocorrência de fenômenos naturais como regressão e transgressão marinhas e até mesmo analisar sua intensidade quando somados à intervenção antrópica no espaço, principalmente devido a criação de “sistemas de engenharia” (SANTOS & SILVEIRA, 2001), nesse caso, a construção do Porto Internacional do Malhado como principal fator de influência na transformação da paisagem (Figuras 3 e 4).

 

Figura 3 - Praia de Copacabana, bastante freqüentada pela população ilheense no início do século XX.

 

 

Figura 4 - Avenida Soares Lopes e praia, Ilhéus, década de 1990.

 

Além disso, a possibilidade de visualizar ambientes geográficos como realmente são, como ilhas, tômbolos, baías, e também outros não precisamente oceanográficos como tipos de vegetação e relevo, organização urbana, atividade econômica e outros aspectos, podem auxiliar e potencializar na Educação Geoambiental.

 

 

 

 

 

 

 

 

3. PERSPECTIVA METODOLÓGICA

 

Partindo desta proposição, a experimentação didático-pedagógica utilizando como recurso os cartões-postais no ensino Geoambiental, poderá revelar as transformações do espaço em um determinado período. Nesta perspectiva, este recurso poderá ser um catalisador para a análise dos aspectos socioespaciais, além de servir como fonte de informações sobre o lugar retratado.

Sugere-se uma aplicação didática com cartões-postais antigos e atuais de algum aspecto da cidade de Ilhéus (praças públicas, jardins e espaços abertos, por exemplo) em alguma série do ensino, no caso da pesquisa monográfica, essa experiência foi testada no ensino fundamental, mas segundo sondagem preliminar com outros professores através de questionários, entendemos que o cartão-postal poderia ser utilizado desde as séries iniciais e até mesmo no ensino médio.

Os cartões-postais deverão formar pares, sendo um mesmo aspecto demonstrado em momentos diferentes. Por exemplo, um cartão-postal antigo e um atual de uma mesma praça. Esses cartões deverão ser distribuídos na classe já dividida em grupos, após um tempo determinado, o professor irá solicitar que cada equipe construa um texto abordando acerca das informações contidas nos cartões, como os aspectos sócio-espaciais, a época de seu registro fotográfico, e conceitos de elementos retratados. Após concluída esta etapa, realizar uma discussão intergrupal visando facilitar a apreensão de conhecimentos pelo aluno, possibilitando-o perceber o lugar e as relações entre elementos humanos e naturais na produção da paisagem geográfica.

A partir daí, reorganizar a classe em grupos para que os mesmos comparem a cidade de Ilhéus demonstrada nos postais do século passado em relação aos atuais. Então, ao final do trabalho, solicitar que os alunos identifiquem as alterações, bem como seus agentes, com uma abordagem crítica onde o aluno deverá realizar:

 

1.   Identificação do lugar e período histórico da imagem;

2.   Interpretação geográfica das imagens através da:

2.1.            Caracterização do espaço através da análise dos aspectos topológicos, sócio-espaciais e culturais;

2.2.            Descrição dos aspectos naturais que configuram as imagens dos cartões na época de seu registro;

2.3.            Descrição e crítica dos elementos técnico-econômicos que compõem as imagens no período histórico;

2.4.            Análise dos acréscimos da técnica, ciência e informação no lugar;

2.5.            Inferências acerca das relações afetivas entre o habitante e o lugar onde vive.

 

Por último, o professor abordará os pontos não elucidados pelos alunos e fará comentários sobre os principais aspectos observados pelos mesmos, avaliando o índice de aprendizagem, logo, a eficácia desse recurso didático na Educação Geoambiental.

 

 

 

 

 

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

 

BÉDARD, Mário. Le paysage comme caractéristique identitaire. L’UQAM. Universidade do Quebec em Montreal. 17 nov. 2003, p.5.

 

SILVA, S. R. X. O cartão-postal: uma teoria de interpretação do espaço. 2003. 53f. Monografia (Graduação em Geografia) – Universidade Estadual de Santa Cruz, Ilhéus, 2003.

 

SANTOS, Milton & SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro: Record, 2001. 470p.

 

VASQUEZ, Pedro Karp. Postaes do Brasil:1893-1930. São Paulo: Metalivros, 2002. 240p.

Ilustrações: Silvana Santos