Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/03/2009 (Nº 27) Educação Ambiental: A responsabilidade individual para uma sociedade sustentável
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educação ambiental em Ação

Educação Ambiental: A responsabilidade individual pARA UMA SOCIEDADE SUSTENTÁVEL

 

 

Márcio Balbino Cavalcante

 

 

Especialista em Ciências Ambientais pelas Faculdades Integradas de Patos – FIP, Geógrafo pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. Professor-visitante do Instituto de Educação de Cajazeiras – ISEC. Av. Celso Lisboa,1198, centro, Passa e Fica – RN. CEP: 59.218-000. cavalcantegeo@bol.com.br

 

 

RESUMO

 

O presente artigo aponta a necessidade de se promover a Educação Ambiental como primeiro passo a ser dado, quando se deseja mobilizar pessoas para ações relacionadas à ética e a cidadania ambiental. Para isto, faz-se necessário promover um conhecimento capaz de educar e formar cidadãos conscientes de suas responsabilidades individuais, em relação a preservação e conservação do ambiente global. Desse forma, uma atividade de Educação Ambiental deve se constituir  um processo contínuo, no qual os indivíduos e comunidades envolvidas tomem consciência da possibilidade de um colapso ecológico e adquiram conhecimentos, valores, habilidades, experiências e determinação que os tornem aptos a agir, individualmente e coletivamente, tendo como princípio básico o respeito a todas as espécies de vida.

 

 

 

1.   Introdução

 

 

Desde o surgimento da espécie humana na Terra, as formas de modificação e apropriação em relação a natureza se intensificaram e ocasionaram diversos impactos ambientais. O advento do hábito sedentário levou o homem a desenvolver novas habilidades tecnológicas necessárias a edificações de casas, manejo do solo, uso do fogo, produção de tecidos e vestuários; ferramentas de trabalho; o transporte; a roda; a tração animal; o aproveitamento de energia; dentre outras.

Contudo, as sociedades primitivas sempre mantiveram uma relação mais próxima com a natureza procurando conviver em equilíbrio com os elementos naturais, Elisabet Sahtouris na obra A dança da Terra (1997) destaca o exemplo de povos indígenas das mais diversas regiões do planeta, como sociedades que convivem de maneira mais equilibrada com a natureza, adotando um estilo vida baseando em uma ordem muito antiga, as leis da naturais.     

Nessa mesma direção Almeida (2000), apresenta estudos acerca da relação de convivência sustentável homem-natureza e da utilização do conhecimento da tradição como base epistemológica fundamental para a sobrevivência das populações diante de ambientes inóspitos. Estudo realizado por Almeida, na Lagoa do Piató no município de Assú, Rio Grande do Norte, permite compreender como os agricultores-pescadores tomam por base elementos naturais, como flora, fauna e fenômenos físicos, para fazer a leitura do tempo e desenvolver técnicas de uma melhor convivência com as estiagens durante os períodos de seca. Surge então uma importante questão: com a devastação do ecossistema local, o que os habitantes da região farão para preservar esses saberes milenares que são a base de sustentação da vida?

Como sabemos, em aproximadamente duzentos anos de industrialização do planeta, a produtividade de bens materiais e seu consumo se deu de forma bastante acelerada, ocorrendo uma considerável degradação do meio ambiente, comprometendo a qualidade de vida da população. Nesse sentido, a crise ecológica que destrói o planeta Terra, põe em risco a sobrevivência da diversidade dos sistemas vivos, incluindo aí o próprio homem. A maioria dos problemas ambientais do planeta provém de um certo estilo de cultura adotado pela sociedade.

Este estilo desconsidera a interdependência existente na natureza, como ilustra a afirmação de Guatarri na obra As três ecologias (1997, p.07), “o Planeta Terra vive um período de intensas transformações técnico-científicos, em contrapartida das quais engendram-se fenômenos de desequilíbrios ecológicos, que se não forem remediados no limite, ameaçam a implantação da vida em sua superfície. Paralelamente a tais perturbações, os modos de vida humanos individuais e coletivos evoluem no sentido de uma progressiva deterioração.”

Na obra Terra-Pátria, (2001), Edgar Morin propõe a reformulação do pensamento para a compreensão da crise planetária que se instalou na Terra. Nesse contexto observa que as civilizações dispersas do planeta estão vivendo um momento de necessidade de interdependência em todos os aspectos e é preciso, então, que se consolide a fraternidade que surge com a conscientização da importância dessas inter-relações entre a comunidade humana e o cosmo. Fala ainda da era planetária em que vivemos e a sua agonia, do cartão de identidade terrena, dos objetivos terrestres e da responsabilidade do ser humano na transformação da Terra-Pátria que deve iniciar-se pela transformação do pensamento.

            Assim, apontamos a necessidade de se promover a Educação Ambiental como primeiro passo a ser dado, quando se deseja mobilizar pessoas para ações relacionadas à ética e a cidadania ambiental. Para isto, faz-se necessário promover um conhecimento capaz de educar e formar cidadãos conscientes de suas responsabilidades individuais, em relação a preservação e conservação do ambiente global, e assim promover o que Morin denomina de “cidadania terrestre”.

            A situação vigente requer um trabalho de Educação Ambiental, que faça uso de estratégias dinâmicas e se ampare numa visão transdisciplinar, para assim proporcionar conhecimentos, habilidades e criticidade aos indivíduos, sensibilizando-os para a importância da natureza como meio à perpetuação da vida.

            Tem razão também Morin (2000a), quando afirma que uma lógica da complementaridade nos faz pensar para além das excludências e distinções. Essa lógica supõe o intercâmbio entre diferentes áreas de conhecimentos, sobretudo quando se trata do meio ambiente, tema que por si próprio demanda vários enfoques e disciplinas.

            Desse modo, os cuidados com o planeta deve ser uma preocupação de profissionais de todas as esferas, em especial de educadores, no sentido de (re)educar ambientalmente os cidadãos terrestres.     

 

2.  A eclosão de uma consciência ecológica

 

            Todos sabemos que há muito tempo encontramos alterações ambientais e movimentos que defendem a preservação da natureza e a melhoria da qualidade de vida. Assim, os movimentos ambientalistas têm contribuído para o surgimento e desenvolvimento da Educação Ambiental.

            A obra da jornalista Ranchel Carson (1962), intitulada “Primavera Silenciosa” fermentou ainda mais as discussões acerca da questão ambiental no mundo inteiro. Nela Carson aborda a perda da qualidade de vida em várias partes do planeta, causada, sobretudo pela crescente queda da qualidade ambiental, produzida pela ganância dos lucros a qualquer custo, por meio da exploração predatória.

            Encontros mundiais foram realizados para discutir os problemas ambientais do planeta e apontaram para o desenvolvimento da Educação Ambiental como estratégia de preservação. Destacamos alguns dos mais importantes fóruns.

            Em 1972, a Educação Ambiental se destacou como principal resultado da Conferência da Organização das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, na Suécia. “A Conferência gerou a declaração sobre o meio ambiente que reconheceu o desenvolvimento da Educação Ambiental como elemento crítico para o combate à crise ambiental no mundo”. (Zeppone, 1999, p.17).

            No ano de 1975, foi realizou-se em Belgrado o Encontro Internacional de Educação Ambiental, onde foram discutidos os princípios e orientações para o Programa Internacional de Educação Ambiental UNESCO/UPUMA. Nesse mesmo momento ocorreu também a formulação da Carta de Belgrado, que alertou o mundo quanto às conseqüências do crescimento econômico e tecnológico sem limites. “A Educação Ambiental é citada como um dos elementos mais críticos para que se possa combater com mais rapidez a degradação da biosfera“ (Leff, 1999, p.113).

            As recomendações desses encontros e de outros que se realizaram também em âmbitos regionais documentadas, serviram de subsídio para a Conferência Internacional sobre Educação Ambiental em 1977, que realizou-se em Tbilisi na Geórgia (ex-URSS).

            De acordo com esta Conferência a Educação Ambiental deve se fundamentar em dois princípios básicos: o primeiro consagra-a como uma nova ética que orienta os valores e comportamentos para os objetivos de sustentabilidade ecológica e a eqüidade social;  o segundo apresenta uma nova concepção do mundo como sistemas complexos, a reconstituirão do conhecimento e o diálogo de saberes. Neste sentido, podemos considerar a transdisciplinaridade como um princípio importante para o desenvolvimento da Educação Ambiental.

            No ano de 1992 realizou-se no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, a Conferência Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento - Rio 92, que culminou na articulação de tratados, acordos e convenções para a sustentabilidade da vida na Terra. Como resultado apresentou-se um plano de ação para o presente século, visando o equilíbrio e o respeito a vida – Batizada  Agenda 21 - se configura numa carta de compromissos assumidos em relação ao ambiente, constituindo-se como estratégia de sobrevivência a todos os seres vivos. (Barbiere, 1998).

            A nível sub-regionais foi realizado em 1979, na Costa Rica, o Seminário de Educação Ambiental para a América Latina. Em 1998, realizou-se em Buenos Aires o Seminário Taller Latino Americano de Educação Ambiental. Todos promovendo recomendações e contribuindo importantemente para o desenvolvimento, a sistematização e a divulgação dos conhecimentos relacionados com a Educação Ambiental.

Na Conferência de Tbilisi a Educação Ambiental foi definida como uma dimensão que deveria ser dada ao conteúdo e à prática educacional, buscando a resolução dos problemas ambientais, via enfoques interdiciplinares e de uma ativa e responsável participação de cada indivíduo e da coletividade como um todo.

            No Brasil pode-se verificar uma diversidade de opiniões quanto a definição de Educação Ambiental. Conforme Dias (1994) de um lado, o meio ambiente é apenas um tema neutro de estudo, de outro, estão incluídos o elemento humano e os fatores que interferem em suas relações com o ambiente. Tal análise envolve fatores políticos, sociais, econômicos e culturais. Desta forma podemos ressaltar que a Educação Ambiental está deixando de ser concebida com ênfase em apenas um dos seus aspectos, que é o ecológico, e levando-se em  consideração também os outros aspectos: econômico, social, ético, político, científico, tecnológico e cultural.

            A este respeito Dantas (2001) nos diz que “estamos todos, ricos e miseráveis, no mesmo barco, ou melhor, na mesma nave. Se ela despencar vamos todos ao abismo. E já está na hora de entendermos que não podemos estimular a manutenção de diferenças sociais e sim de sermos responsáveis, de sermos éticos com a vida de todos os seres vivos”.

            A concepção de natureza como objeto de apropriação, para obtenção de lucros,  vinculada principalmente a partir dos séculos XVII e XVIII, assim como a compreensão do homem como elemento independente dos sistemas naturais, necessitam serem repensadas. 

Morin (2001) aponta para necessidade de um pensamento ecológico que leve em considerando a ligação vital de todos os sistemas vivos, ao seu ambiente. Essas questões, entretanto, necessitam de atenção especial por parte dos órgãos nacionais e internacionais responsáveis pela conservação da natureza, bem como, da população em geral, uma vez que para se alcançar sucesso na realização de qualquer trabalho de nível conscietizatório, é preciso a participação ativa da população.

Desse forma, uma atividade de Educação Ambiental deve se constituir  um processo contínuo, no qual os indivíduos e comunidades envolvidas tomem consciência da possibilidade de um colapso ecológico e adquiram conhecimentos, valores, habilidades, experiências e determinação que os tornem aptos a agir, individualmente e coletivamente, tendo como princípio básico o respeito a todas as espécies de vida.

De acordo com Silva; Martim (2001) a Educação Ambiental é um instrumento poderoso de que a sociedade dispõe no momento para resgatar valores capazes de induzir crianças e jovens a perceberem a natureza como um bem comum, a ser compartilhado com base no sentimento de solidariedade e responsabilidade.

O desafio de superar a crise ecológica a nível global deve ser, sem dúvida, uma preocupação de todas as esferas do poder público e de a humanidade como um todo, nessa direção, em temos constitucionais, na década de 1980 (cf. Wainer, 1991) a Educação Ambiental passou a ser um dos instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, em 1988, que no seu artigo 225, diz que:

 “Todos têm direito ao meio ambiente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

No mesmo documento se destaca como função do poder público “promover a Educação Ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente”.

            No âmbito escolar a Educação Ambiental vem sendo instrumento de preocupação das novas tendências curriculares. A esse respeito o MEC dentro dos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), propõe temáticas transversais que abrem espaço para se abordar o meio ambiente em todas as disciplinas do Ensino Fundamental.

            Contudo, ao mesmo tempo que estes documentos apontam a importância, a transversalidade e a natureza transdisciplinar do tema, deixam também, o espaço para questionamentos, como: até que ponto os professores das diversas disciplinas articulam os conteúdos curriculares aos conteúdos ambientais? Qual será a preparação e quais os recursos que esses docentes dispõem para abordar esses conteúdos?   

            Nesse sentido conclui-se que o desenvolvimento de um trabalho da Educação Ambiental formal ou informal pode ser considerado prioritário no atual momento da história da humanidade. Essa retomada de consciência deve acontecer com o apoio de profissionais das diversas áreas de conhecimento, uma vez que deve-se considerar a inter-relação existente nos diversos elementos da natureza, assim como a conexão entre os saberes.      

 

 

Referências Bibliográficas

 

 

ALMEIDA, Maria da Conceição. Técnicas de previsão climática no Nordeste do Brasil: uma "ciência neolítica" no século XX. In: CONGRESSO LUSO-BRASILEIRO DE HISTÓRIA DA CIÊNCIA E DA TÉCNICA, 1. Aveiro-Portugal. 2000. Universidade de Aveiro, 2000. p. 179-180.

BARBIERE, José Carlos. Desenvolvimento e meio ambiente - as estratégias de mudanças da agenda 21. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1998.

BRASIL. Secretária de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos - temas transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998.

CARSON, Raquel. Primavera silenciosa. Rio de Janeiro: Melhoramentos, 1962.

DANTAS, Mário. Novos desafios ambientais. Tribuna do Norte, Natal, 21 abr. 2001.

DIAS, Genebaldo Freire. Educação ambiental: princípios e práticas. 4 ed. São Paulo: Gaia, 1994.

GUATTARI, Felix. As três ecologias. 6. ed. Campinas-SP: Papirus, 1997.

LEFF, Enrique. Educação ambiental e desenvolvimento sustentável. In: REIGOTA, M. (org.) Verde cotidiano: o meio ambiente em discussão. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.

MORIN, Edgar. Complexidade e transdisciplinaridade: a reforma da universidade e do ensino fundamental. Natal: EDUFRN, 2000.

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à Educação do futuro. Tradução: Catarina Eleonora F. da Silva; Jeanne Sawaya. 2.ed. São Paulo: Cortez, 2000a.

MORIN, Edgar; KERN, Anne Brigitte. Terra-Pátria. 2.ed. Lisboa: Instituto Piaget, 2001.

SAHTOURIS, Elisabet. A dança da Terra -  sistemas vivos em evolução: uma nova visão da biologia. Tradução: Ruy Jungmann. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1998.

SILVA, Márcia Regina da. MARTIM, Maria do Socorro Costa. Educação Ambiental e formação docente. In: CONGRESSO NORDESTINO DE ECOLOGIA, 8. Natal, 2001. Anais... Natal: SNE, 2001.

WAINER, Ann. Helen. Legislação ambiental brasileira: subsídios para a história do direito ambiental. Rio de Janeiro: Forense, 1991.

ZEPPONE, Rosimeire Maria Orlando. Educação ambiental: teorias e práticas escolares. Araraquara: XM, 1999.

 

 

Ilustrações: Silvana Santos