Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Conhecimento
da flora paraibana: um olhar dos estudantes de ciências biológicas Milton Costa Lima Neto MSc.
em Botânica, docente, Universidade Federal da Paraíba, Centro de Ciências
Aplicadas e Educação, Departamento de Engenharia e Meio Ambiente, Campus IV
– Litoral Norte. Rua: Mangueira, s/n, Centro. CEP: 58.297-000, Rio Tinto –
PB. Fone: 83 3291 1528 Email: miltoncostalima@hotmail.com Mateus Bezerra Lima Graduando
em Psicologia, Universidade Federal da Paraíba, Centro de Ciências Humanas,
Letras e Artes, Departamento de Psicologia, Campus I. Cidade Universitária, CEP - 58059-900.
João Pessoa – PB. Email: mateus_bezerra@yahoo.com.br Resumo: Avaliou-se a
percepção dos estudantes do curso de graduação em ciências biológicas da
Universidade Federal da Paraíba, futuros professores e multiplicadores do
conhecimento junto à formação do ensino fundamental e médio, quanto ao
conhecimento da flora do estado da Paraíba. Como instrumento de coleta de
dados foi utilizado um questionário semi-estruturado com quatro questões
subjetivas. O questionário foi aplicado a 30 alunos do primeiro período e 30
alunos do oitavo período, totalizando 60 alunos escolhidos aleatoriamente.
Tanto os alunos do primeiro período quanto do oitavo período fizeram mais
referências à corrente antropocêntrica, sugerindo uma visão utilitarista
da flora na maioria dos casos. O reconhecimento da importância da vegetação
natural nativa para a manutenção da diversidade e do equilíbrio do ambiente
não foi muito explorado pelos alunos em seus questionários. Os resultados
encontrados contribuirão para que os educadores considerem os saberes
acumulados por seus alunos e desenvolvam ações educativas ambientalmente
comprometidas com a formação de indivíduos responsáveis pela criação e
manutenção da qualidade de vida, agindo como agentes multiplicadores da
cidadania e educação ambiental. Palavras-chave: flora, percepção, educação ambiental. Introdução Vivemos
ainda em um mundo “verde”, apesar de ultrapassarmos os seis bilhões de
habitantes e ainda continuarmos a crescer.
A ação antrópica já é bastante marcante nos dias atuais, onde se
torna impossível entender o funcionamento dos mais diversos ecossistemas sem
considerar a presença e interferência do homem no meio. O
desenvolvimento industrial, hoje praticado de acordo com o sistema empregado
pelos competitivos mercados, em formas ambientalmente descontroladas, é o
principal vilão na preservação e conservação de nossa biodiversidade
ainda pouco conhecida. A intensidade com que a degradação do meio natural
tem atingido os seres humanos introduz a discussão sobre a necessidade de um
novo modelo de desenvolvimento. A escassez de recursos básicos à sobrevivência,
a poluição e a miséria indicam a urgência de mudanças (BRASIL, 2003). Para
que se consiga mudar os atuais métodos empregados no modelo de
desenvolvimento produtivo-econômico é necessário o conhecimento de nossa
biodiversidade, bem como de métodos sustentáveis de exploração. O Brasil,
pelo fato de abrigar a maior cobertura de florestas tropicais do mundo, aliado
a sua extensão territorial, diversidade geográfica e climática, possui uma
imensa diversidade biológica, fazendo dele o principal país detentor da
megadiversidade do planeta, possuindo entre 15% a 20% das 1,5 milhões de espécies
já descritas (BRASIL, 2002). Especificamente de flora, o Brasil possui cerca
de 20% a 22% do total do número de espécies (MOTTA,1998). Essa riqueza em
potencial já representa para o país, em forma de uso direto, 45% do PIB
(agroindústria, florestais e pescado), 31% das exportações, 30% da matriz
energética, além de constituir um campo aberto para os avanços da
biotecnologia (MOTTA, 1998). A
crise ambiental é a crise do nosso tempo. O risco ecológico questiona o
conhecimento do mundo. Esta crise apresenta-se como um limite no real, que
ressignifica e reorienta o curso da história; limite do crescimento econômico
e populacional; limite dos desequilíbrios ecológicos e das capacidades de
sustentação da vida; limite da pobreza e da desigualdade social (LEFF,
2001). A
educação é peça fundamental para buscar entender e resolver os problemas
ambientais. Corroborando esta idéia, a UNESCO (Órgão das Nações Unidas
para a Educação) ergueu quatro pilares para orientar a educação e o papel
da escola para este século, são eles: 1º - aprender a conhecer, isto é,
adquirir os instrumentos da compreensão; 2º - aprender a fazer, isto é,
pode agir sobre o meio envolvente; 3º - aprender a viver juntos, isto é,
cooperar com outros em todas as atividades humanas e 4º - aprender a ser, via
essencial que integra às três precedentes (DELORS, 1999). A
temática de educação, mais especificamente dos problemas do sistema
educacional brasileiro é evidente, levando em consideração tanto as discussões
do meio acadêmico especializado quando da mídia em geral (SEBER, 1997).
Evidencia-se facilmente um desagrado absoluto e uma insatisfação
generalizada principalmente em relação aos modelos de formação de
professores praticados em nosso país atualmente (AZANHA, 2004). França
e Gonçalves (2006) salientam o papel fundamental da educação como forma de
mudança social, atuando como um degrau que os indivíduos podem se utilizar
para galgar posições sociais mais favoráveis, mudando tanto sua história
pessoal como da sociedade como um todo. Tais autores afirmam porém, que em países
tais como o Brasil, onde se observa níveis alarmantes de estratificação
social e econômica, a educação não tem se mostrado como ferramenta
contributiva para a ruptura do ciclo vicioso do desequilíbrio econômico e
social. Logo,
como podemos esperar que a população brasileira tenha algum tipo de preocupação
preservacionista em relação ao seu meio? Como os estudantes percebem o meio
à sua volta? De acordo com Faggionato (2002), cada indivíduo percebe, reage
e responde diferentemente frente às ações sobre o meio. As respostas ou
manifestações são, portanto, resultado das percepções, dos processos
cognitivos, julgamentos e expectativas de cada indivíduo. Embora nem todas as
manifestações psicológicas sejam evidentes, são constantes, e afetam nossa
conduta, algumas vezes, inconscientemente. Desta
forma, estudos da percepção que os indivíduos têm acerca de seu meio são
de fundamental importância para que se possa compreender melhor as inter-relações
existentes entre o homem e o ambiente, suas perspectivas, expectativas,
satisfações, julgamentos e condutas (GUERRA, 2004). É
por intermédio das diferentes concepções de mundo e das relações
cotidianas com os meios natural e construído que poderão ser estabelecidas
as diretrizes mínimas para a solução dos problemas ambientais que preocupam
a todos. Afinal, o exercício do diálogo entre diferentes culturas e
representações sobre um mesmo tema é extremamente necessário no atual
contexto mundial (REIGOTA, 2001). Kluckhohn
(apud HUTCHISON 2000, p.32) defende a existência de três orientações
contrastantes que, ao longo da história, formam a base para a relação do
ser humano com o mundo natural: o ser humano como subjugado à natureza; o ser
humano como dominador da natureza e o ser humano como uma parte implícita da
natureza. Na primeira, o mundo natural é considerado onipotente, incapaz de
ser manejado e imprevisível, na segunda, os seres humanos são considerados
mestres e superiores ao mundo natura e, na terceira, a vida das pessoas – não
apenas em nível biológico, mas também em nível cultural e psicológico
interliga-se com o funcionamento do ambiente natural. A
principal função de se trabalhar na escola o tema Meio Ambiente, de acordo
com os Temas Transversais, (BRASIL, 1992) é a de contribuir para a formação
de cidadãos conscientes, aptos a decidir e atuar na realidade socioambiental
de um modo comprometido com a vida, com o bem-estar de cada um e da sociedade,
local e global. Para que isso ocorra, é necessário informar, trabalhar com
atitudes e formação de valores, com o ensino e a aprendizagem, e
principalmente trabalhar com os professores, para que estes possam repassar
tudo isso a seus alunos de maneira correta e da melhor forma possível. Toda
a importância que o projeto educacional de uma nação tem no desenvolvimento
da mesma pode ser expressa por Meireles (2001) quando afirma que a escola é o
que diz o que as pessoas são e serão. Ela é o índice da formação dos
povos, por ela se tem a medida das suas inquietudes, dos seus projetos, das
suas conquistas e dos seus ideais. Portanto,
conhecer a representação dos alunos sobre as questões relativas ao meio
ambiente pode auxiliar o professor a entender como eles as estão captando,
interpretando e agindo sobre elas em sua realidade próxima, já que essas
representações são fundamentais na formação de opiniões e no
estabelecimento de atitudes individuais e coletivas. No entanto, como são dinâmicas,
é importante identificá-las, para que sejam trabalhadas tanto com os alunos
quanto nas relações escola-comunidade (MARTINHO, TALAMONI, 2007). Embasado
nessas considerações, este trabalho se propõe a averiguar a percepção dos
estudantes de ciências biológicas da Universidade Federal da Paraíba,
futuros professores e multiplicadores do conhecimento junto à formação do
ensino fundamental e médio, quanto ao conhecimento da flora do estado da Paraíba. Material
e métodos Utilizamos
como instrumento de coleta de dados, um questionário semi-estruturado com
quatro questões subjetivas, aplicados a alunos do curso de graduação em ciências
biológicas da UFPB, sendo 30 alunos do primeiro período e 30 alunos do
oitavo período, totalizando 60 alunos escolhidos aleatoriamente. O
questionário foi composto com as seguintes questões: 1
– A palavra planta lembra... 2 – Cite dez plantas que você conhece e que ocorrem
na Paraíba. 3 – Onde você costuma ver essas plantas? Por
se tratarem de questões subjetivas, através das quais o aluno pode dar mais
de uma resposta à mesma questão, todos os dados foram tabulados e agrupados
em categorias de acordo com o relacionamento das respostas, e analisadas à
luz da tipologia das concepções de meio ambiente proposta por SAUVÉ (1997)
e dos enfoques de DIEGUES (2001). Resultados e discussão Foram
escolhidos alunos do primeiro e do oitavo período do curso, com o propósito
de avaliar o alunado no decorrer da graduação, sua evolução conceitual e o
conhecimento da flora local dos futuros professores de Biologia do Ensino Médio
e Fundamental. Os alunos de primeiro período ainda não haviam sido
apresentados a todo o conteúdo das disciplinas botânicas, e a nenhum das
disciplinas de ecologia. Já os alunos do oitavo período, haviam completado
as disciplinas de conteúdo botânico e se encontram em pleno aprendizado nas
disciplinas de ecologia. Essa diferença de conteúdo foi importante para
interpretação dos resultados obtidos. Os
dados referentes à primeira questão encontram-se na Tabela 1. Tabela 1 – Porcentagem de respostas entre os
alunos do primeiro e oitavo período agrupadas em categorias de conteúdo
Como
referência à natureza os alunos citaram respostas como: “Vida, beleza nas flores e aroma dos frutos”. Quanto à produção
de energia respostas como: “Ser vivo fotossintetizante que contribui para
a estabilidade da biosfera do planeta”.
Alunos citaram referência quanto
a alimentos: “Nos dá alimentos como frutos e folhas”. Preservação:
“Devem ser preservadas para a manutenção da vida no planeta”.
Ornamentação e paisagismo: “Servem para criar lindos jardins e nos dá
sombra” e quanto à categoria abrigo: “Serve de local para produção
de ninhos de pássaros e insetos”. Os alunos do primeiro período citaram referências
que foram agrupadas em quatro categorias principais, já os alunos do oitavo
período fizeram referências a mais duas categorias (Tabela 1). Mesmo tendo
um conhecimento acadêmico maior quanto às disciplinas de botânica e
ecologia, 5% dos alunos do oitavo período não responderam à questão,
contrapondo com apenas 2% dos alunos do primeiro período. Alguns
autores abordam dois grandes enfoques ou correntes na análise da relação
homem-natureza. A primeira corrente é a Biocêntrica ou Ecocêntrica, onde se
pretende ver o mundo natural em sua totalidade, na qual o homem está inserido
como qualquer ser vivo. Além disso, o mundo natural tem um valor em si mesmo,
independente da utilidade que possa ter para os humanos. Numa outra corrente,
chamada de Antropocêntrica, se entende que o homem tem direitos de controle e
posse sobre a natureza, sobretudo por meio da ciência moderna e da tecnologia
(DIEGUES, 2001). Tanto
os alunos do primeiro período quanto do oitavo período fizeram mais referências
à corrente antropocêntrica, sugerindo uma visão utilitarista da flora na
maioria dos casos. O não reconhecimento da importância da vegetação
natural nativa para a manutenção da diversidade e do equilíbrio do ambiente
não foi muito explorada pelos alunos em seus questionários. Quanto à segunda questão: Cite
dez plantas que você conhece e que ocorrem na Paraíba, os alunos do primeiro
período citaram 55 plantas entre endêmicas, exóticas, frutíferas,
ornamentais e herbáceas. Em primeiro lugar, empatadas com 9,23%, estão o Ipê,
espécie de Mata Atlântica, e ainda muito comum no centro urbano de João
Pessoa, e a Mangueira, árvore frutífera exótica, porém abundante na região
urbana da capital. Com 5,28% foi
citado o Pau-Brasil, também uma espécie de Mata Atlântica, e muito
conhecida devido a fatores históricos de conhecimento geral. Do bioma de
Caatinga, foi citado o umbuzeiro e o xique-xique, com 0,77%, entre outras.
Aparecem ainda respostas bem genéricas como “árvores em geral” com
3,08%, e ainda citações de plantas completamente exóticas no nosso estado,
como araucárias e coníferas. Os alunos do oitavo período citaram 72 plantas
diferentes. Empatadas em primeiro lugar, com 4,76%, estão a Aroeira, o Ipê e
o Juazeiro. Todas três são espécies facilmente encontradas na Paraíba e são
todas nativas. A diversidade de espécies citadas pelos alunos do 8º
período foi bem maior entre plantas nativas, do que a citada pelos alunos do
1º período. Espécies exóticas foram menos citadas e plantas nativas do
interior do estado, do bioma de Caatinga foram mais lembradas, o que demonstra
um conhecimento mais amplo da flora nativa do estado da Paraíba pelos alunos
do oitavo período. Plantas exóticas foram citadas, porém com menor freqüência.
Dos alunos do oitavo período do curso de ciências
biológicas da UFPB, 35,7% citaram 10 plantas diferentes, contrastando com
20,8% para os alunos do primeiro período, o que mais uma vez corrobora para o
maior conhecimento da flora paraibana com o passar do curso. Porém 14,3% não
citaram nenhuma planta, o que ficou bem próximo da percentagem dos alunos do
primeiro período, 12,5% (Tabela 02). Tabela 02 – Número de plantas citadas, pelos alunos do primeiro e
oitavo período do curso de Ciências biológicas da UFPB
Quanto
à pergunta de número 3, “Onde você viu essas plantas?”, 28% dos alunos
do primeiro período disseram ter visto essas plantas na zona urbana da
capital, 20% não souberam responder, 20% responderam que viram em vários
lugares, 12% responderam que viram no próprio campus da universidade, 12% no
interior do estado e 8% viram em fotos ou gravuras. Já os alunos do oitavo
período, 48% disseram ter visto essas plantas citadas, no próprio campus da
universidade, o que demonstra a importância da reserva de Mata Atlântica que
ainda é encontrada dentro e no entorno do campus I da UFPB, bem como das
atividades práticas de campo realizadas durante o curso de graduação. Uma
proporção de 17% disseram ter visto essas espécies no interior do estado,
12% na paisagem urbana, 10% não souberam responder e 3% disseram conhecer
essas plantas de fotos ou gravuras. Conclusões Para
que possamos acomodar o sistema de desenvolvimento aos cuidados necessários
para a sobrevivência não só humana, como das assembléias faunísticas e
florísticas de todo o mundo, é de fundamental importância a formação de
educadores com novos conceitos e idéias, para formar cidadãos, preocupados e
conscientes da necessidade de preservação e conservação dos nossos
recursos naturais. É primordial tomar atitudes quanto à educação
ambiental, pois uma educação ambiental para a sustentabilidade eqüitativa
é um processo de aprendizagem permanente, baseado no respeito a todas as
formas de vida. Tal educação afirma valores e ações que contribuem para a
transformação humana e social e para a preservação ecológica
BRASIL(1992). Devem
ser tomadas providências nas demais esferas sociais, para a mobilização
necessária à implantação mais dinâmica e intrusiva da educação
ambiental nos mais diversos ciclos da educação, seja ele fundamental, médio
ou superior. Infelizmente
os sistemas educacionais, com fortes vícios das tendências pedagógicas
liberais tradicionais, não têm bem compreendido ou bem aceito a Educação
Ambiental, o que dificulta a consolidação desta prática multifacetada e
interdisciplinar ADAMS (2003). Acredita-se
que os resultados encontrados contribuirão para que os educadores considerem
os saberes acumulados por seus alunos e desenvolvam ações educativas
ambientalmente comprometidas com a formação de indivíduos responsáveis
pela criação e manutenção da qualidade de vida, agindo como agentes
multiplicadores da cidadania e educação ambiental. Referências ADAMS, B. G. Tendências pedagógicas
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o diálogo com a criança e o desenvolvimento do raciocínio. São Paulo:
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