Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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14/03/2008 (Nº 23) EDUCAÇÃO AMBIENTAL: PRÁXIS EDUCATIVA TRANSFORMADORA
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Revista Educação ambiental em Ação 23

EDUCAÇÃO AMBIENTAL: PRÁXIS EDUCATIVA TRANSFORMADORA

 

Nilton Manoel Lacerda Adão (niltonadao@hotmail.com)

Geógrafo (FURG-RS); Especialista em Sociologia Política e Cultura (PUC-RJ);  Planejamento e Educação Ambiental (UCAM-RJ); e História do Brasil (UFF-RJ).

Professor do Ensino Técnico e Superior (SENAI) em Joinville, SC.

 

RESUMO

 

O posicionamento crítico se faz necessário ao pensar em uma reestruturação social. As premissas que sugerem mudanças podem ser forjadas em um processo educativo transformador. Partindo-se desta evidência, torna-se visível a importância da Educação Ambiental na busca de um planeta ecologicamente equilibrado e com equidade social. Com base nesses fundamentos, este trabalho foi construído com o intuito de promover uma discussão equilibrada das possibilidades de um novo paradigma de sociedade forjado em uma Educação que se intitule “Ambiental”.    

 

Palavras-chave: Educação Ambiental, democracia, posicionamento crítico, transformação.

 

 

INTRODUÇÃO

 

Educar é transformar o coração e o espírito. Mais do que nunca na história da humanidade a necessidade de transformação se faz necessária. A proeminência desta realidade pode ser estruturada, de forma interdisciplinar e holística, nos pressupostos da Educação Ambiental (EA). Quebrar os axiomas, dogmas e ortodoxias se faz necessário para a desconstrução do “homem e natureza objetos”. Assim, para desconstruir o processo de dominações existentes,  faz-se pertinente uma reformulação social com uma visão menos econômica e mais ecológica. Partindo desta realidade, este ensaio teórico  procura promover a EA como uma práxis educativa parte de um processo dialógico de promoção de uma sociedade sustentável.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO 

          

Diante de uma economia globalizada os avanços técnicos e científicos  dinamizam a compreensão humana da  complexa  interdependência existente entre espaço e tempo. Como aborda Harvey (1992, p. 219) “ [... ]o espaço parece encolher numa aldeia global de telecomunicações e numa espaçonave terra de interdependência ecológicas e econômicas”. O acesso instantâneo à uma grande quantidade de informações estimula a formação de novas possibilidades de produção e acesso ao conhecimento. Paralelamente, de forma desmedida, valoriza-se sociedade de consumo. Há um entrelaçamento complexo entre as boas e más possibilidades de vivencias possíveis na Terra. No entanto, já é de conhecimento de todos que o planeta dá sinais de insustentabilidade. Obviamente este fato traz dúvida quanto ao futuro da humanidade. Hobsbawn (2006, p. 562) é categórico ao afirmar que “se a humanidade quer ter um futuro reconhecível, não pode ser pelo prolongamento do passado ou do presente. Se tentarmos construir um terceiro milênio nessa base, vamos fracassar.” Faz-se necessário encontrar uma práxis educativa que visione uma nova compreensão de mundo. Um conhecimento estruturado e direcionado na busca da sustentabilidade pode promover mudanças comportamentais visionando uma relação harmoniosa entre sociedade e natureza.   TEIXEIRA ( 2000, p. 102) define o homem como “o animal que se educa, adaptando-se sem cessar, alargando, dia a dia, a sua compreensão, tornando-se, enfim, um instrumento permanente de progresso e mudança da própria natureza.” Neste sentido, a priori, qualquer mudança é possível através da educação. A riqueza de conhecimentos gerada pelo homem na sua curta passagem, no planeta, fundamenta a esperança da continuidade da espécie. Para tanto, há a necessidade de uma ruptura com o modelo atual de sociedade.

            Na perspectiva de encontrar um novo paradigma, a Educação Ambiental pode apresentar-se como uma pedagogia crítica e democrática. Compreende-se por crítica a busca da verdade em uma dialética axiológica desprendendo-se das pré-noções e pré-conceitos que geram os axiomas existentes. Na conjetura crítica a única verdade permanente é a busca incansável da realidade desprovida das camuflagens apresentadas pelos interesses dominantes. Não havendo a criticidade não há mudanças a contento e as alienações persistem. Para FREIRE (2003, p. 103) “quanto menos criticidade em nós, tanto mais ingenuamente tratamos os problemas e discutimos superficialmente os assuntos.” O posicionamento crítico não só gera o aprofundamento em relação aos assuntos pertinentes, como também, proporciona a compreensão de que o diálogo deve ser intenso, permanente e, principalmente, democrático.

 A democracia permite uma discussão que agrega além dos conhecimentos eruditos o conhecimento empírico. Para Perrenoud (2001, p. 151) “seria absurdo considerar todos os saberes eruditos como declarativos ou fundamentais, ou todos os saberes do senso comum como aplicados, procedimentais ou pragmáticos.” Partindo-se, desta possibilidade, haveria uma concepção de mundo que transcenderia os muros acadêmicos e promoveria uma práxis de compreensão da realidade passível a todos. Assim, todo indivíduo valeria-se destes conhecimentos e reconheceria a sua importância como “sujeito” e o seu papel como inquilino do planeta Terra. Uma dialética crítica fomentaria a responsabilidade para com o “outro”, construindo noções de valores a partir de um constante processo de retificação e (ou) ratificação de atitudes.

Manacorda (1996, p. 7) aponta a necessidade de uma “nova coordenação do saber, de uma nova articulação entre o conhecer e fazer, que transforma a vida do homem e exige homens novos.”  O primeiro passo seria reconhecer-se a necessidade de mudança. Os meios são possíveis de serem encontrados na própria natureza, Lutzenberger (1985, p.102) defendia a tese de que há modelos de convivências nos sistemas naturais intactos que podem ser relevantes para a condição humana. Segundo ele, nestes sistemas “não existem estruturas de poder central, hegemonias, dominação. O que existe é constelação de equilíbrios.” Dependendo do aprofundamento das discussões, vários seriam os meios possíveis de se construir um processo educativo em prol de uma finalidade maior: uma sociedade mais harmônica reconhecendo-se como parte de um sistema maior chamado Terra. Para Fazenda (1995, p. 51) “toda prática verdadeira está intimamente correlacionada ao fim que o homem tem em vista e a seu engajamento no processo produtivo.” Vale mencionar, que a humanidade construiu seu desenvolvimento histórico através de uma relação de domínio com a natureza. A partir das transformações dos recursos naturais, por meio do trabalho, seres humanos construíram o mundo histórico. Saviani (1997) define que a essência da realidade humana é o trabalho, através dele que o homem age transformando a natureza de acordo com as suas necessidades. Nestas bases, construiu-se os processos civilizatórios que forjaram a sociedade atual. É perceptível na atualidade, a necessidade de um rompimento com esta compreensão do mundo que preponderou durante toda a história da humanidade.  Diante desta realidade as conquistas do passado devem ser reavaliadas e uma nova relação com a natureza deve ser buscada. Porém, isto só é possível quando a compreensão de mundo, que cada indivíduo possui, sobressair-se em relação aos interesses individuais ampliando os horizontes atitudinais para a objetivação de uma humanidade que utilize as conquistas científicas para o progresso social e para o bem estar dos aspectos naturais, na qual o ser humano está incluso.

Wilson (2002, p.175) acredita na possibilidade de se “procurar uma base comum na qual o progresso econômico e a conservação possam ser tratados como uma única meta.” Torna-se claro que a idéia de progresso também deve ser redefinida apontando como meta a redução da poluição, uso com melhor aproveitamento das matérias primas reduzindo desperdícios e aumentando a produtividade. Ao encontro deve-se promover uma “reengenharia” que propicie também o surgimento de novos empregos, um grande desafio para o atual mundo globalizado. No que se refere ao campo político as conquistas sociais são o grande desafio para os países em desenvolvimento na conjuntura neoliberal. Faz-se necessário um planeta  que propiciem a todos o acesso à novas tecnologias fundamentando-se em necessidades e não apenas “em consumir pelo simples ato de consumir”. Contrariando o fato que epistemologicamente consumir é sinônimo de exaurir e destruir,  a prática do consumo deve estar arcada nos interesses coletivos que, diante desta premissa, torna-se consciente e regulado.

Com base em ações coerentes e harmônicas com a natureza a EA emerge com o seu papel transformador. Uma sociedade nova necessita de indivíduos conscientes. Lovelock (2006, p. 142) é coerente ao afirmar que precisamos de uma população “que se mobilize de forma espontânea e promova, generosamente, uma retirada ordeira e sustentável para um mundo onde tentemos viver em harmonia com Gaia.” Cabe a EA promover o diálogo que impulsione esta mobilização. Para Silveira (1998, p.230) o diálogo é “um movimento de dentro para fora, e vice-versa” abrangendo os níveis objetivos e subjetivos “que passam a regular e coordenar o comportamento em sociedade.” O interesse dessa busca é uma sociedade mais justa e democrática em um mundo ecologicamente equilibrado. Com esta consciência todos podem contribuir neste diálogo. Reigota (1997, p.62) é muito coerente ao afirmar que a EA como educação política pode estar “empenhada na formação do cidadão nacional, continental e planetário, baseando-se no diálogo de culturas e conhecimento entre povos, gerações e gêneros.” Vale-se nestes argumentos, o fato que o conhecimento mais do que transmitido é produzido. Não se aprende do outro, mas com o outro. Eis um dos fundamentos de uma pedagogia crítica e democrática e por fim transformadora. 

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

           

            Este breve ensaio teórico buscou dentro de um pensamento crítico construir, de forma dialógica, novas perspectivas sociológicas visando uma sociedade democrática adequada à necessidades individuais e coletivas da humanidade norteando-se no imperativo da construção de uma nova consciência ambiental. É fato a necessidade de um constante processo de transformação de mundo. Este argumento apresenta-se com melhor clareza diante dos desgastes socioeconômicos e ambientais transcendentes na contemporaneidade. O antagonismo existente entre o avanço técnico-científico e a falta de acesso de parte da população mundial deve ser analisado de forma crítica orientando-se em novas possibilidades, fundamentando-se não nos fetiches consumistas, mas na construção de uma sociedade sadia (física e mentalmente) e também, consciente da necessidade de se preservar e conservar o meio ambiente. Diante destas questões, fica claro que a discussão apresentada é pertinente e necessária quando uma nova consciência é a meta. E também há veracidade na afirmação de que todos, de alguma forma, podemos e devemos mudar visando o equilíbrio com a natureza e uma nova justiça sócio-ambiental.

              

 

BIBLIOGRAFIA

 

FAZENDA, Ivani Catarina A. Interdisciplinaridade: um projeto em parceria. 3 ed.São Paulo: Edições Loyola, 1995.

 

FREIRE, Paulo. Educação como prática de liberdade. 27 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.

 

HARVEY, David. Condição Pós-Moderna. 5 ed. São Paulo: Loyola, 1992.

 

HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos. 2 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

 

LOVELOCK, James. A vingança de Gaia. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2006.

 

LUTZEMBERG, José. Ecologia: do jardim ao poder. 10 ed. Porto Alegre: L&PM, 1985.

 

MANACORDA, Mario Alighiero. Marx e a pedagogia moderna. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1996.

 

PERRENOUD, Philippe. Ensinar: agir na urgência, decidir na incerteza. 2 ed. Porto Alegre: Artimed, 2001.

 

SILVEIRA, Diva Lopes da. Educação Ambiental e conceitos caóticos. In: PEDRINI, Alexandre de Gusmão (Org.). Educação Ambiental: reflexões e práticas contemporâneas. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1998.

 

REIGOTA, Marcos. Meio ambiente e representação social. 2 ed. São Paulo: Cortez, 1997.

 

TEIXEIRA, Anísio. Pequena introdução à filosofia da educação. 6 ed. Rio de Janeiro: D&PA, 2000.

 

WILSON, Edward. O futuro da vida. Rio de Janeiro: Campus, 2002.

Ilustrações: Silvana Santos