Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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30/05/2022 (Nº 79) EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UMA METODOLOGIA COM PRINCÍPIO, MEIO E FIM
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EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UMA METODOLOGIA COM PRINCÍPIO, MEIO E FIM



Andréa Pupo, educadora ambiental do IPÊ, dando seu recado no projeto Semeando Água, no Sistema Cantareira (SP) – Foto: Ilana Bar/IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas

Por Suzana Padua

Mestra em educação ambiental e doutora em desenvolvimento sustentável. Co-fundadora e presidente do IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas e da Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade (Escas) educacaoambiental@faunanews.com.br

Um dos desafios de fazer um programa de educação ambiental é por onde começar e como prever as etapas que serão necessárias. A metodologia que compartilho hoje é conhecida por PPP, Planejamento, Processo e Produto, e foi concebida por Jacobson (1991) e modificada, e muito utilizada, por mim em diferentes contextos (Padua, 1994; 2004 e Padua et al. 2003). Seu objetivo é avaliar continuamente o que está sendo posto em prática de modo a facilitar a implantação de um projeto com economia de tempo, recursos e energia.



Modelo de avaliação contínua na elaboração de projetos de educação ambiental


A fase de Planejamento consiste na elaboração de levantamentos que fornecem o perfil socioeconômico e cultural da população com a qual se vai trabalhar e aspectos gerais do contexto. Essas informações são essenciais para que sejam traçados não só os objetivos, mas como chegar a eles, com base nos recursos regionais e as necessidades mais prementes a serem enfocadas. A definição do público é, portanto, fundamental, pois a linguagem do programa precisa estar compatível com as mensagens a serem passadas, buscando maior eficácia daquilo que está sendo oferecido. É no planejamento que a estrutura do projeto é idealizada, um dever de casa que necessita de cuidados por demandar levantamentos de informações que serão cruciais no decorrer de sua implantação. Sendo assim, o(a) educador(a) ambiental será recompensado por se debruçar nessa fase antes de iniciar qualquer passo adicional.

Na fase de Processo são implantadas as estratégias, sempre acompanhadas de avaliações para que possam ser modificadas e melhoradas com base no que se averiguou. Durante toda essa etapa, busca-se o apoio e a participação dos diversos segmentos das comunidades locais, aspecto que pode soar desnecessário, porque demanda tempo e dedicação, mas traz maior garantia de continuidade.

A etapa Produto inclui avaliações mais específicas quanto à eficácia do programa como um todo, à disseminação dos resultados e à busca de apoio para a continuidade. Os resultados devem sempre ser apresentados às comunidades participantes para que haja uma retroalimentação do processo de envolvimento, além da exposição nos mesmos em outros cenários.

Alguns aspectos que se observa em programas sem alguns cuidados incluem:

Linguagem, mensagem e meios inadequados ao público com que se pretende trabalhar podem ser um entrave ao sucesso do programa. Por exemplo, se o público a ser alcançado tem dificuldade de leitura e interpretação, ou ainda se não for escolarizado, é necessário utilizar formas de comunicação como ilustrações ou filmes. Caso o acesso à internet seja fraco ou inexistente, como prever ações digitais? Caso o local seja frequentado por pessoas com alto poder aquisitivo, como em ilhas aonde só se chega de barco próprio, quem sabe utilizar poesias e informações que inspirem e despertem interesse? Uma vez que tudo deve ser testado antes de ser produzido em definitivo, aquilo que for percebido na testagem poderá ser modificado e melhorado antes da confecção final.

A coluna do meio, Processo, é a mais gostosa. É nela que o(a) educador(a) coloca a mão na massa – é o fazer! Essa é, em geral, a razão pela qual se quer trabalhar. Por isso, é comum que se aja sem que se tenha feito os levantamentos da primeira coluna, ou seja, do Planejamento. É aí em que mais se verificam equívocos que poderiam ter sido evitados, como promover coleta seletiva sem que a prefeitura local conte com esse serviço e com locais adequados para se depositar os resíduos diferenciados. Outro exemplo comum é na elaboração de materiais impressos, ou mesmo placas interpretativas, sem as devidas testagens e ajustes anteriores. Muitas vezes, os resultados podem não trazer os efeitos imaginados, inclusive com uso de linguagem inadequada. Sem testagem, pode-se só descobrir esse tipo de falha depois que se gastou recursos naturais como papel na impressão ou madeira para as placas.

Os resultados das avaliações podem não ser tão positivos quanto se esperava, o que leva o(a) educador(a) ambiental a querer escondê-los e a não os publicar. Esses resultados são preciosos, pois podem ajudar outros a evitarem os mesmos procedimentos que levaram ao “não sucesso”. Todos os resultados obtidos por uma avaliação bem conduzida devem ser divulgados já que, acima de tudo, sempre servirão para apontar onde se precisa melhorar, ajustar ou continuar a persistir.

Quanto mais participativo for um programa de educação ambiental, maior a chance de se ter adeptos e apoiadores à sua continuidade. A ideia é despertar o interesse e o envolvimento das pessoas, principalmente aquelas que moram na localidade onde o programa é implementado, de modo a se obter apoio à sua continuidade. Outros públicos devem também ser envolvidos para se ter maiores chances de apoio, como os próprios doadores. Para isso, alguns aspectos devem ser observados como:

Sempre compartilhar a missão, ou objetivos dos programas oferecidos, seja para salvar uma espécie da extinção, melhor proteger matas nativas, restaurar áreas degradadas, entre outros. Ao expor objetivos que transcendem interesses individuais, há mais chance de envolvimento e interesse em participar.

Expor o porquê de algumas estratégias serem priorizadas em lugar de outras, pois muitas vezes as razões levam as pessoas a apoiar as decisões tomadas. Por exemplo, o programa pode incluir uma peça de teatro sobre um tema identificado como importante no contexto, como desmatamento, doenças causadas por poluições ou os males do lixo mal direcionado, por haver um grupo amador de jovens atores na região que se dispõe a levar a ideia adiante. Outro exemplo é visitar uma área natural com um guia previamente capacitado a passar informações de maneira estimulante e, assim, despertar interesses que valorizam um parque ou uma praça local. Trazer orgulho ao que é local pode fazer diferença.

Divulgar os resultados de cada etapa ou do programa como um todo deve ser feito de diversas maneiras como em congressos e encontros temáticos, mas também nos jornais ou rádios regionais. Todos os públicos são importantes! Os científicos, por levar a educação ambiental a um patamar de reconhecimento no campo da pesquisa, e os veículos locais, por compartilhar conhecimentos com quem pode se envolver na resolução de problemas socioambientais ou a buscar formas de evitá-los. Hoje ainda se conta com as mídias sociais, que podem e devem ser utilizadas por conta da facilidade e abrangência de acesso.

Os dados obtidos ajudam também a se conquistar apoio a novos projetos ou a continuidade dos que foram avaliados com dados confiáveis. Para tal, pode-se utilizar desenhos experimentais com grupo de tratamento e grupo controle, ou se assumir abordagens mais qualitativas. O importante é adotar procedimentos estruturados que dão ao programa a credibilidade que inspira confiança. Isso aumenta as chances, inclusive, de os doadores se sentirem com mais segurança de investir em quem avalia, pois pode melhorar aquilo que oferece.

O Planejamento/Processo/Produto – PPP não é o único modelo, pois existem muitos que têm sido utilizados por outros educadores. No entanto, como esse foi o que eu e muitas pessoas que conheço utilizaram com resultados favoráveis, achei que merecia ser compartilhado.

A concepção do PPP leva em conta princípio, meio e fim, mesmo que o “fim” signifique recomeços, o que é comum, uma vez que se percebam novas frentes que podem ser valiosas e necessárias a se trabalhar. A estrutura permite que muitas etapas sejam construídas ou ajustadas na medida em que são implementadas. A importância dessa abordagem está na previsão de estratégias que possam ser buriladas para que se chegue aos objetivos desejados, mesmo quando as ideias precisem ser adaptadas às dinâmicas ou às necessidades do contexto. A ideia é evitar que sejam tomadas medidas soltas ou sem propósito. Com isso todos ganham ou todos têm mais chance de êxito, inclusive a conservação da natureza que se quer proteger.

Referências


– JACOBSON, S., 1991. Evaluation model for developing, implementing, and assessing conservation education programmes: examples from Belize and Costa Rica. Environmental Management. 15(2): 143-150.

PADUA, S. M., Educação ambiental como processo de gestão socioambiental: integração entre conservação e uso sustentável dos recursos naturais no Pontal do Paranapanema, São Paulo. Tese de doutorado defendida no Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília, 2004.

PADUA, S. M., TABANEZ, Marlene Francisca, SOUZA, Maria das Graças de. 2003. A abordagem participativa na educação para a conservação da natureza In Métodos de Estudos em Biologia da Conservação & Manejo da Vida Silvestre, edited by Laury Cullen Jr.; Rudy Rudran; Claudio Valladares-Padua, 557-591. Curitiba: Editora da Universidade Federal do Paraná.

PADUA, S. M., 1994. Conservation awareness through an environmental education programme in the Atlantic Forest of Brazil. In Environmental Conservation, v.21, 145-151.

Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es).

Fonte: https://bitlybr.com/MrxV





Ilustrações: Silvana Santos