Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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05/09/2006 (Nº 18) EDUCAÇÃO AMBIENTAL E AGROECOLOGIA: PERSPECTIVAS PARA UMA NOVA EXTENSÃO RURAL
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Educação Ambiental e Agroecologia

Artigo:

EDUCAÇÃO AMBIENTAL E AGROECOLOGIA: PERSPECTIVAS PARA UMA NOVA EXTENSÃO RURAL

 

LUZZARDI, Roberta do Espírito Santo[1].

 

 

Palavras-chave: educação ambiental; extensão rural; agroecologia.

 

INTRODUÇÃO

 

A extensão rural no Brasil nasceu sob o comando do capital, com forte influência norte-americana e visava superar o atraso na agricultura. Para tanto, havia a necessidade de “educar” o povo rural, para que ele passasse a adquirir equipamentos e insumos industrializados necessários à modernização de sua atividade agropecuária, com isso ele passaria do atraso para a “modernidade”. O modelo serviria para que o homem/mulher rural entrasse na dinâmica da sociedade de mercado, produzindo mais, com melhor qualidade e maior rendimento. A extensão era um empreendimento que visava persuadir os (as) produtores (as), para que esses (as) adotassem as novas tecnologias. Seus conhecimentos empíricos não interessavam, bem como suas reais necessidades não eram levadas em conta. A extensão assumiu um caráter tutorial e paternalista.

A extensão rural deveria, ser um trabalho que, na sua essência, objetivasse formar junto com os coletivos que reúne conhecimentos e práticas técnico/sociais visando à melhoria da qualidade de vida e o bem estar da população rural. No entanto, na prática, o que acontece não é bem isso, na maior parte da história da extensão os técnicos apoderam-se do conhecimento técnico/científico e acabam anulando todo e qualquer conhecimento que o agricultor e a agricultora acumularam no decorrer de sua trajetória histórica de trabalho.

Entretanto o técnico ou extensionista interfere na cultura e nos conhecimentos locais mediante práticas pedagógicas tradicionais (educação bancária), nas quais o educador é considerado sujeito e o educando objeto, ou seja, o educador detém o conhecimento e ensina (transmite), e o educando, por ser visto como aquele que nada sabe, deve aprender tudo, sem nada contribuir para o processo. Ocorre com isso, o que Freire (2001) denomina “invasão cultural”. Segundo este mesmo autor, “na visão bancária” da educação o “saber” é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber.

 

REFERENCIAL TEÓRICO

Sabendo que a extensão rural é um processo educacional não formal, pois a mesma acontece no interior de grupos e movimentos sociais vinculados a sociedade rural, é importante lembrar autores como Morin (2001), o qual afirma que o processo da educação se desenvolve em três grandes eixos: “educação formal, aquela que acontece nas salas de aula; educação não formal, a que corresponde ao processo desenvolvido pelos movimentos sociais; e educação informal, processo que se desenvolve basicamente no interior das famílias”. Sendo assim, esta será mais uma das muitas análises embasadas na lógica deste processo, assim como da prática extensionista desenvolvidas pelas empresas de extensão rural.

Como ensina Iturra (1993 apud CAPORAL & COSTABEBER, 2000) o saber dos agricultores e agricultoras se desenvolve na sua heterogênea ligação ao grupo doméstico e ao grupo de trabalho e, portanto, a “conduta reprodutiva rural”. É o resultado de uma acumulação de conhecimentos - uma epistemologia - sobre o sistema de trabalho que não vem de livros e textos, mas sim da relação entre as pessoas, seu ambiente e as interações resultantes destas relações. Nesta perspectiva, a busca de sustentabilidade na agricultura e no desenvolvimento rural implica reconhecer a existência deste saber - construído mediante uma lógica indutiva - que vai sendo estabelecido na história dos grupos sociais na medida em que se vê fazer, se escuta para poder dizer, explicar e devolver este conhecimento. Sendo, pois, a agricultura uma atividade humana, ela é uma construção social que, além de ser ambientalmente determinada, está subordinada a determinados condicionantes socioculturais, entre os quais se destaca o conhecimento ou o saber local.

Deste modo, a ação extensionista orientada à agricultura sustentável deverá ser desviada de sua histórica concepção difusionista (baseada no “ensino”) para dar lugar a uma prática social baseada na “aprendizagem”, isto é, na construção de saberes adequados para impulsionar estilos de agricultura e de manejo dos recursos naturais capazes de estabelecer patamares crescentes de sustentabilidade.

Nesse contexto, a Agricultura Sustentável e a Educação Ambiental - entendida como campos de conhecimentos e de investigação - oferecem ferramentas importantes para subsidiar a intervenção da Nova Extensão Rural em suas estratégias de promoção do desenvolvimento rural sustentável.

Segundo Caporal & Costabeber (2000), a missão de qualquer estilo de Extensão Rural que se pretenda novo está destinada a nos ajudar no direcionamento de ações e atividades que promovam novos estilos de desenvolvimento e de agricultura que respeitem não só a condição especifica de cada agroecossistema, mas também a preservação da biodiversidade e da diversidade cultural.

Nesta perspectiva, a participação popular emerge como um direito e passa a exigir uma nova prática extensionista, uma verdadeira práxis social, que só é possível quando adotamos uma postura democrática e quando realizamos nossa tarefa com base em metodologias e princípios pedagógicos libertadores.

O enfoque a ser adotado pela Nova Extensão Rural também exigirá dos (as) extensionistas a capacidade de compreender os aspectos relacionados à vida dos indivíduos e suas relações sociais, assim como os aspectos da história dos diferentes atores individuais e coletivos com os quais atuamos. Somente assim poderemos nos aproximar das verdadeiras necessidades, valores e aspirações que orientam sua busca permanente por melhores condições de vida e bem-estar social. Como apoiá-los na construção do desenvolvimento rural sustentável sem conhecer as necessidades, os valores e as motivações que sustentam e dão sentido às suas decisões?

 

CONCLUSÃO

A educação ambiental proposta para a nova extensão rural deverá levar os seres ao reconhecimento do seu meio, portanto maior respeito, à assunção como produtores de um alimento nobre e à autonomia, ou seja, a construção coletiva do seu mundo, num espaço eminentemente ético.

Certamente, a Extensão Rural juntamente com o ideário da Educação Ambiental poderá vir a ser um dos instrumentos para a construção deste novo paradigma, capaz de abrir espaços para a construção/reconstrução da cidadania da maioria do povo rural.

 

REFERÊNCIAS

 

CAPORAL, F. R.; COSTABEBER, J. A. Agroecologia e Extensão Rural: Contribuições para a Promoção do Desenvolvimento Rural Sustentável. Brasília-DF: MDA/SAF/DATER-IICA, 2004. 165p.

 

CAPORAL, F.R.; COSTABEBER, J.A. Análise multidimensional da sustentabilidade: uma proposta metodológica a partir da Agroecologia. Rev. Agroecol. e Desenv. Rur. Sustent., Porto Alegre, v. 3, n 3, p.70-85, jul./set. 2002.

 

CAPORAL, F. R.; COSTABEBER, J. A. Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável: perspectivas para uma Nova Extensão Rural. Agroecol. e Desenv. Rur. Sustent., Porto Alegre, v.1, n1, jan./mar.2000.

 

FREIRE, P. Extensão ou comunicação? 7° ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001. 93p.

 

GLIESSMAN, S.R. Agroecologia: processos ecológicos em agricultura sustentável. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2000. 654p.

 

GUATTARI, F. As três ecologias. Trad. Maria C. F. Bittencourt. Campinas, SP: Papirus, 7º edição. 1998. 56p.

 

LOUREIRO, C. Trajetória e fundamentos da educação ambiental. São Paulo: Cortez, 2004. 150p.

 

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 3. ed. São Paulo: Cortez; Brasília, 2001. 118p.

 

NORGAARD, R.B. A base epistemológica da Agroecologia. In: ALTIERI, M. A. (Ed.). Agroecologia: as bases científicas da agricultura alternativa. Rio de Janeiro: PTA/FASE, 1989. p.42-48.


 

[1] Engenheira Agrônoma; mestranda em Agronomia (Produção Vegetal) – Universidade Federal de Pelotas.

Ilustrações: Silvana Santos