Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Entrevistas
26/05/2005 (Nº 13) Entrevista com Nadia Cozzi
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Entrevista com Nadia Cozzi sobre Alimentação Consciente (13a. edição da revista eletrônica EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM AÇÃO)

Por Berenice Gehlen Adams

Apresentação: Esta edição comemorativa de três anos da revista eletrônica Educação Ambiental em Ação tem a honra de apresentar a publicitária e pesquisadora Nadia  Cozzi, uma paulista engajada há 10 anos nas questões da alimentação consciente. Nadia é formada em Publicidade e Propaganda e é Pesquisadora do Tema Agricultura Pura. Também é Coordenadora do Núcleo Alimentação Consciente da  ONG Caminho Kyusei Kannon - Desenvolvimento Humano (www.ckk.org.br). Vamos conhecer um pouco mais da sua rica experiência, que muito contribuirá para incentivar posturas alimentares sadias e conscientes, necessárias para a saúde humana, porém, abafadas pela forma de vida atriblada dos dias atuais.

- Nadia, conte-nos como surgiu o seu interesse pela alimentação saudável.


Foi uma série de coincidências, se é que elas existem. Na minha época de Publicitária atendi contas de agrotóxicos em todas as agências em que trabalhei. Depois passei para a área de eventos numa empresa de cozinhas industriais. Tive meu próprio restaurante e assim conheci todos os lados do alimento, do envenenamento por agroquímicos ao envenenamento pelo sentimento na compra e preparo dos pratos, onde tudo o que importa é o lucro financeiro. Há 10 anos tive contato com o conceito Agricultura Pura desenvolvido na década de 30 por Meishu Sama, um mestre japonês. Fiquei encantada com o respeito ao solo, a valorização do trabalho do agricultor e o cuidado com a saúde das pessoas e do meio ambiente, e a partir daí passei a me dedicar inteiramente ao assunto. Peguei o conceito e o desenvolvi em relação a todos os setores da alimentação dos hortifruti até os industrializados, oferecendo alternativas de uma alimentação mais pura, mesmo que não se tenha acesso ao orgânico.

- Como você avalia os atuais hábitos alimentares das pessoas, de uma forma geral?


Sofríveis, parece que as pessoas esqueceram que a verdadeira função do alimento é a de gerar vida, nosso bem maior. Em nome da economia, da praticidade, da rapidez, perdeu-se o sabor, a beleza, o perfume, a crocância natural e o enorme prazer de preparar com suas próprias mãos uma refeição para a família. Nossos 5 sentidos foram colocados de lado, a energia gerada pelo alimento empobreceu. Quem perdeu com isso? A Vida.

- Quais são as conseqüências mais sérias provocadas pelos maus hábitos alimentares?


Infelizmente as consequências não são sentidas na hora, o efeito da química do alimento é cumulativo, e aliando-se  a outros fatores, pouco a pouco vamos ficando doentes, física, mental e emocionalmente. Assim surgem diversos tipos de câncer, artroses, reumatismos, doenças nos nervos, síndromes, depressão, hiper atividade. O corpo se abate, a mente anuvia, vamos ficando cada vez mais apáticos, nossa vontade cada vez mais influenciada negativamente.

- As crianças são extremamente influenciadas pela mídia. Para você, qual o papel dos veículos de comunicação em promover hábitos alimentares saudáveis?


A indústria alimentícia gera grandes rendas publicitárias, os veículos de comunicação até tratam do assunto da química no alimento, mas de maneira superficial, infelizmente. Fala-se das vantagens da soja, dos tomates , dos morangos,  por exemplo, mas não se alerta que  se forem convencionais, perdem parte de seus nutrientes, além da grande quantidade de agrotóxicos que neles são colocados, ou do uso das sementes transgênicas.

- Muitas pessoas dizem que têm pouco tempo para prepararem alimentos mais naturais e argumentam que esses produtos são mais caros. O que você acha deste posicionamento e o que é possível sugerir para elas?


Aqui temos dois pontos a ressaltar. E ambos vão gerar polêmicas com certeza.
O primeiro (fator tempo) refere-se a um posicionamento herdado de uma revolução feminista, que, como toda boa revolução parte para os extremos para se chegar ao equilíbrio. Nossa geração aprendeu que deveríamos refutar tudo o que lembrasse a "servidão" da mulher. Assim deixamos de lado máquinas de costura, agulhas de tricot e crochê, panelas, etc. Essas aptidões passaram a ser encaradas como coisas menores, tinha-se orgulho até em dizer " nem sei onde fica a cozinha da minha casa", não é assim? A mulher saiu para a batalha, para se igualar e até superar o homem. Conseguiu, mas é feliz?
Comparando à Natureza, a essência da mulher é a Terra, aquela que gera, que dá vida, que sonha. A essência do homem é a do Agricultor, que cuida da Terra, que provê, que luta para realizar o sonho. Um completa o outro.


Preparar uma refeição para a família está longe de ser um papel menor, é um arte, um encantamento. Ao calor do fogo misturam-se ingredientes e desejos, sonha-se o futuro dos filhos, projeta-se a relação com o marido, fortalecem-se os elos de uma verdadeira família. Querem um exemplo de quanto isso é forte?    Quem não tem na lembrança o sabor de um prato especial da infância, que a avó, a tia ou a mãe faziam e que hoje ninguém consegue imitar? A receita era diferente? Não, o ingrediente especial era o sentimento colocado. Longe de mim querer levantar a bandeira da mulher submissa, eu também trabalho fora, eu também me realizo, deve sim haver um equilíbrio. A arte da culinária está sendo redescoberta até como terapia, não é necessário despender horas para se preparar um alimento, eu mesma tenho uma apostila com 90 receitas feitas no liquidificador, tudo rápido, saboroso e melhor feitas com alimentos orgânicos, fruto de minha própria experiência como dona de casa e profissional.  Só uma coisinha mais para ressaltar: os homens já descobriram os encantos de se preparar um jantarzinho à luz de velas, cuidado meninas (risos).


Quanto ao segundo ponto, o preço, tenho algumas considerações. Em primeiro lugar a demanda ainda é pequena o que acarreta perdas, etc... etc. Em segundo lugar o alimento orgânico tem mais nutrientes, no caso das carnes tem menor perda de água, não causam doenças, não poluem o meio ambiente, não destroem a fauna e a flora, tem por traz um grande projeto de responsabilidade social, não utilizam mão de obra infantil, valorizam as pequenas propriedades diminuindo o êxodo rural, consequentemente os problemas sociais das grandes cidades. Por tudo isso já valeria a pena investir nos alimentos orgânicos. Mas, o que quero ressaltar é o que se valoriza realmente na sociedade atual. Acha-se caro um pé de alface custar R$ 1,70, mas compra-se pelo mesmo preço um pacote de salgadinho, um refrigerante, um pastel de feira. Será que nossos valores não estão de ponta cabeça? Sem falar naquelas pessoas que reclamam do preço dos orgânicos, mas vestem jeans que custam R$ 300,00, sapatos e acessórios de grife, e usam shampoos e cremes caríssimos.

- Você acha que a Educação Ambiental pode colaborar para o desenvolvimento de hábitos alimentares conscientes?


Acho, desde que os educadores ambientais se conscientizem de seu papel, de nada adianta falar de ecologia, de meio ambiente, da poluição das águas e em nossas atitudes diárias, como por exemplo, na hora das refeições patrocinar empresas de agrotóxicos, de conservantes de alimentos, de pesquisas transgênicas e assim por diante. As mudanças devem acontecer primeiro em nossas casas , em nossas atitudes, senão ficam inconsistentes e sujeitas à meras discussões egóicas. 

- Normalmente as escolas mantêm cantinas ou bares onde vendem guloseimas dos mais variados tipos. O que você pensa sobre isso?


Aqui em São Paulo já existe uma grande preocupação por parte das escolas na troca dos salgadinhos, frituras, biscoitos recheados e refrigerantes por frutas, sucos, lanches mais naturais, inclusive com a contratação de nutricionistas para orientar o pessoal da cantina. Mas esbarram com a falta de apoio dos pais, muitas vezes as crianças trazem de casa o que a escola não oferece mais,

- O que você considera inaceitável ou mais prejudicial nos hábitos alimentares atuais?


A grande quantidade de alimentos industrializados presentes à nossa mesa. Ninguém se preocupa em ler os ingredientes constantes nas embalagens e ver a quantidade de produtos químicos que se ingere diariamente. Que bem pode fazer à saúde um leite que dura 6 meses dentro de uma caixa, alimentos recheados de agrotóxicos, carnes inchadas com promotores de crescimento, um complexo de substâncias químicas e cremosas intitulado margarina que se passa generosamente em pães que à custa de conservantes duram mais de 30 dias numa prateleira de supermercado.E assim por diante, basta raciocinar um pouquinho.

- Muitas pessoas falam sobre os prejuízos de se utilizar o microondas. Mesmo assim, há uma generalização cada vez maior pelo uso deste equipamento nas cozinhas. Qual é o seu posicionamento em relação a utilização deste equipamento para o preparo dos alimentos?


De novo é uma questão de raciocínio. Um freezer por exemplo, já perceberam que fazemos comida nova para colocar no freezer e comemos a velha para que não se estrague?
O microondas para mim é como os transgênicos, alguns dizem que faz mal, outros não. Como diria minha avozinha, onde há fumaça há fogo.Todos sabemos que devemos cuidar da manutenção do aparelho para que não haja vazamento das microondas que podem afetar a nossa saúde. Mas não são elas que agem sobre o alimento e promovem o aquecimento?


Mas eu só esquento água ou o jantar das crianças e do marido (coitadinhos!). Não cozinho nele.Mais uma vez incoerente, em primeiro lugar estou gastando energia elétrica o que já é uma atitude antiecológica, em segundo lugar quanto tempo leva uma água para ferver, será que vale a pena arriscar minha saúde e da minha família em função do ganho de alguns minutos?


Sabem porque normalmente colocamos um bolo no forno pré-aquecido? Para que ele encontre um ambiente caloroso como a barriga de uma mãe que gera seu filho, que gera vida. Será que existe então diferença entre aquecer a refeição das crianças e do marido no forno convencional, onde tudo se aquece no tempo certo mantendo as características e o sabor, e no forno de microondas, tudo em nome da pressa, da rapidez? Porque se corre tanto, onde queremos chegar?


Ah... voltando aos transgênicos, se são tão bons porque não colocar nos rótulos dos alimentos, assim poderíamos escolher não é mesmo?

- Deixe seu recado para os/as leitores/as da revista Educação Ambiental em Ação: um conselho, uma frase ou uma dica:


A Vida é nosso bem mais precioso, cuidem dela por favor. Repensem atitudes e valores, a felicidade é simples e mora dentro de nós. Resgatem o sabor da Vida.


Nadia, nós, Editores(as) e Colaboradores(as) da revista eletrônica Educação Ambiental em Ação agradecemos imensamente pela gentileza de conceder-nos esta entrevist@. Muito Obrigada!

Informações adicionais:

Email para contato com Nadia Cozzi: nacozzi@hotmail.com

A ONG Caminho Kyusei Kannon - Desenvolvimento Humano (www.ckk.org.br) promove cursos, palestras em empresas, escolas, e onde são solicitados, além dee seminários sobre Alimentação Consciente, e dispõe de apostilas sobre a nova postura ecológica, que são:


Bio Culinária - Alimentação Consciente - receitas de liquidificador
Bio Conservação de Alimentos - conservando de maneira natural
Industrializado feito em Casa - tirando os aditivos da mesa
Bio Cosmética - o alimento como produto de beleza
Bio Limpeza - limpando a casa sem poluir o planeta
Nadia Cozzi
(11) 9158.4451

Ilustrações: Silvana Santos