Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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15/12/2015 (Nº 54) ENSINO POR VIVÊNCIAS: A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA PERCEPÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
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ENSINO POR VIVÊNCIAS: A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA PERCEPÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Diego Max Fernandes da Silva

Estudante de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal de Campina Grande

Luiz Sodré Neto

Professor do curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Campina Grande

Maria Franco Trindade Medeiros

Professora do curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Campina Grande

 

RESUMO

            A globalização tem determinado o perfil social em todos os níveis e consequentemente é aumentada a necessidade de escolarização e formação dos cidadãos. Os estudantes que ultrapassam a idade para a educação regular ingressam na modalidade de educação voltada para os jovens e adultos (EJA), que também deve contemplar os problemas ambientais relacionados à sociedade. Nesse contexto, os estudantes com mais idade e que geralmente têm uma interferência maior no meio em que vivem, em relação às crianças, precisam estar cientes da sua contribuição para a Educação Ambiental na escola e fora dela. Buscou-se, portanto, discutir questões ambientais pontuais com estudantes da EJA, assim como apresentar uma das possíveis maneiras de se trabalhar o tema a partir da vivência de estudantes, que pode ser aplicada em todos os níveis de ensino, além de ser extensível aos familiares e à comunidade escolar.

Palavras-chave: Ensino, Sociedade, Ambiente.

 

INTRODUÇÃO

            Vivemos em uma época na qual a sociedade exige um constante processo de mudança e os indivíduos têm o dever de permanentemente adquirir novos conhecimentos, como maneira de adaptação a um modelo globalizado. Este cenário, por sua vez, valoriza cada dia mais o cidadão escolarizado. Quem não concluiu os seus estudos no período adequado retorna ao contexto escolar inserido na Educação de Jovens e Adultos (EJA) que, de acordo com (CURY, 2004), é um direito de todos aqueles que não tiveram acesso à escola ou mesmo aqueles que não completaram os estudos em idade regular. Tal modalidade de ensino é uma alternativa para as pessoas que desejam dar continuidade ao seu desenvolvimento intelectual e profissional.

Nas sinopses estatísticas da educação básica de 2014, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), aponta para um total de 2.233.053 matriculados na EJA (INEP, 2014). É válido considerar também que o total de alunos que conclui o curso não chega a esse valor numérico. Daí a preocupação em se buscar estratégias de ensino que tenham em vista diminuir a evasão desses educandos.

            As questões ligadas ao meio ambiente têm tomado uma grande proporção, pois a sociedade vive um período de problemas ambientais que são visíveis, perigosos, mas que nem sempre são percebidos e discutidos. Nesse sentido, torna-se importante adaptar metodologias educacionais ao perfil dos educandos da EJA, inserindo nessa modalidade de ensino questões voltadas para a Educação Ambiental (EA) como proposta para o resgate de valores éticos, sociais e humanistas, que venha a ser um instrumento que reforce e incentive a inserção das discussões ambientais no âmbito da educação formal e ao mesmo tempo popular (SILVA, COSTA E ALMEIDA, 2012). 

A Educação Ambiental, de forma geral, aparece como um programa que estuda as relações econômicas e sociais, a melhoria da qualidade de vida e as possíveis consequências do uso indevido do ambiente (KRASILCHIK, 1988).  As alternativas podem auxiliar no entendimento da busca pela maneira de viver mais coerente com os ideais de uma sociedade sustentável e democrática, fazendo com que sejam repensadas as tradicionais fórmulas e que sejam destacadas ações concretas para transformar a casa, a rua, o bairro, as comunidades em geral. Parte de um princípio de respeito à diversidade natural (FREITAS, 2009).

            A Lei 9.795/99 estabelece que a Educação Ambiental deva estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, respeitando em suas diretrizes nacionais. O princípio citado no artigo 4º, inciso VII da Lei 9.795/99, valoriza a abordagem articulada das questões ambientais locais, regionais e nacionais, e o artigo 8º, incisos IV e V incentivam a busca de alternativas curriculares e metodológicas na capacitação da área ambiental e as iniciativas e experiências locais e regionais, incluindo a produção de material educativo (BRASIL, 1999).

            Nessa linha de pensamento, temos nas palavras de Freire (1996):

“Por que não aproveitar a experiência que têm os alunos de viver em áreas descuidadas pelo poder público para discutir, por exemplo, a poluição dos riachos e córregos e os baixos níveis de bem-estar da população, os lixões e os riscos que oferecem a saúde das gentes?” (FREIRE, 1996. p.33).

Na EJA, mais do que nas séries regulares, a alternativa supracitada tem um grande potencial pelo fato de lidar com pessoas mais vividas e consequentemente mais experientes em relação aos problemas ambientais cotidianos. E é evidente, em toda a sociedade, que uma das melhores formas de conscientização do cidadão, quanto à preservação do meio ambiente, é sensibilizá-lo quanto aos hábitos e costumes que o ajudarão a cuidar e preservar o mesmo (ALVES, 2014). Nesse contexto, o presente artigo objetivou evidenciar a importância de vincular os conteúdos trabalhados na EJA à realidade dos educandos, como também destacam Curvello e Latini (2007), para que eles sintam a necessidade de aprender e reconheçam que eles são os próprios atores sociais das mudanças.

ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS

            A proposta de trabalho foi desenvolvida durante a disciplina de Estágio Supervisionado II do Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, do Centro de Educação e Saúde, da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), para uma Escola Municipal de Cuité/PB, com alunos do 4º e 5º anos da EJA.

Inicialmente foi lançada nas turmas-alvo uma discussão sobre o tema “Preservação do Meio Ambiente”, com perguntas e respostas comentadas, buscando-se analisar as ideias prévias dos estudantes quanto à geração e o descarte dos resíduos. A discussão girou em torno de uma questão sobre o conceito de lixo e de outra sobre o que o descarte inadequado de resíduos poderia provocar.

Em seguida foram apresentadas imagens da atual situação em que se encontra a lagoa que fica localiza no centro do referido Município. Neste momento eles puderam observar os tipos de resíduos de atividades humanas encontrados nas margens do corpo d’água e refletir sobre a interferência da população naquele ambiente.

  Após a exposição das diferentes percepções e da troca de experiências e conhecimentos, foram ministradas aulas e palestras sobre Educação Ambiental durante o período de uma semana. Nos encontros foi possível contemplar assuntos específicos das disciplinas de Ciências e Geografia, destacando-se também as contribuições do ensino de ciências para a formação cidadã, participativa, crítica e ativa na sociedade atual, como apresentado por Gomes, Barbosa e Aguiar (2014), além das abordagens baseadas nos princípios de interdisciplinaridade.

PERCEPÇÕES E PERSPECTIVAS

            De acordo com as respostas obtidas no primeiro questionamento, a maioria dos alunos não percebeu o lixo como algo que possa ser reaproveitado. Embora o termo “lixo” se aplique aos resíduos sólidos em geral, como os resíduos orgânicos provenientes da manipulação de alimentos, da manutenção e limpeza de áreas verdes (poda), embalagens de vidro, plástico, metal, papel ou até mesmo entulhos provenientes de obras e demolições (FURIAM e GÜNTHER, 2006). Muito do que se considera lixo pode ser reutilizado ou reciclado, desde que os materiais sejam adequadamente tratados (FREITAS et al, 2015).

            O funcionamento do sistema capitalista atual tende a apagar na prática a distinção entre consumo exagerado e destruição (ZANETI, 2009), objetivando uma produção em grande velocidade, de imensas quantidades de mercadorias, ocasionando um descarte prematuro dos bens consumidos. O que somado a uma sociedade com poucas estratégias de minimização de danos ao meio ambiente, se torna um fator preocupante á saúde pública. Ainda Segundo (CERETTA et al, 2013), a geração de lixo cresce, conforme aumenta o consumo e quanto mais compras de mercadorias são efetuadas, consequentemente mais lixo é gerado.

             Em relação ao questionamento dos problemas ocasionados em virtude do descarte incorreto do lixo, verificou-se que os alunos relacionaram o despejo inadequado apenas aos danos causados á saúde do ser humano. Nesse aspecto, o homem pode ser atingido de diversas formas pelos efeitos indesejáveis do lixo, que constitui um ambiente favorável à atração e ao desenvolvimento de diversos animais e microrganismos veiculadores de doenças (FERREIRA et al, 2001).

Poucos estudantes estabeleceram vínculos entre o descarte desses resíduos e os efeitos negativos provocados ao ambiente. Que vem sofrendo com a incorreta disposição desses materiais, que além de provocar a poluição do solo, colabora para a poluição das águas, do ar e ocasiona uma contínua degradação ambiental. Sendo o homem, parte integrante da natureza e, portanto, sofre com toda intervenção indevida sobre ela (SIQUEIRA, 2009).

            As respostas obtidas nesse debate não foram tabuladas, pois se tratou apenas de um levantamento do conhecimento prévio dos alunos sobre o tema. A exposição desses tópicos, assim como suas respectivas respostas, foi útil para fomentar a discussão sobre a questão ambiental.

            A execução dessa proposta permitiu observar que os alunos participantes apresentavam conhecimentos prévios a respeito da preservação, mas não possuíam hábitos de descarte correto de materiais constantemente utilizados em seu cotidiano. Após a execução das atividades, notou-se por parte dos educandos, a preocupação com o despejo incorreto do lixo em locais indevidos, e a preservação do Ambiente que constitui a comunidade. Todos puderam compartilhar de seus conhecimentos e refletir sobre a importância de se valorizar os recursos naturais de sua região. Com a troca de diálogos, foi possível reconstruir de forma significativa e proveitosa os seus conceitos e atitudes a certa da preservação ambiental.

            Um dos pontos positivos deste trabalho foi a participação dos alunos. Foram solicitadas duas turmas para participar do projeto, totalizando 30 alunos, que dentro das possibilidades de cada um estiveram presentes ativamente em todas as atividades. Percebeu-se que a EJA é um ambiente aberto para o conhecimento e que práticas de ensino que incluem em sala de aula temas do contexto social em que os alunos vivem têm uma grande aceitação por despertar curiosidade e valorizar atitudes individuais.

            Este trabalho apresentou uma das possíveis maneiras de se trabalhar EA, a partir da vivência de estudantes, que pode ser aplicada em todos os níveis de ensino, além de ser extensível aos familiares e à comunidade escolar. Sendo assim, deve-se continuar incentivando os hábitos sensíveis, conscientes e multiplicadores acerca das questões ambientais no processo educativo (SILVA et al, 2014). 

            Além disso, foi possível a percepção de que trabalhar com um tema bastante transformador no contexto escolar como a Educação Ambiental gera discussões importantíssimas em sala de aula. Foi de grande valia, não apenas pela troca de saberes que foi proporcionado, como também pela conscientização para a preservação do Meio Ambiente, e a demonstração de como a busca por práticas dinâmicas de ensino podem influenciar na formação crítica e intelectual dos alunos.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Decreto 4.281, de 25.06.2002. Regulamenta a Lei no 9.795, de 27 de abril de 1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, e dá outras providências. DOU 26.06.2002.

CERETTA, G. F, SILVA, F. K, ROCHA, A. C. Gestão Ambiental e a problemática dos resíduos sólidos domésticos na área rural do município de São João – PR. GESTÃO AMBIENTAL, ADMpg Gestão Estratégica, Ponta Grossa, v. 6, n. 1, p.17-25, 2013

CURVELLO, T.; LATINI, R. Ensino de Ciências e Ambiente na Educação de Jovens e Adultos. Revista Educação Ambiental em Ação v. 22, 2007.

CURY, C. R. J. Por uma nova educação de jovens e adultos.TV Escola, Salto para o Futuro. Educação de Jovens e Adultos: continuar... e aprender por toda a vida. Net, v. 20, 2008.

DA SILVA, L. O.; COSTA, A. P. L.; ARAÚJO-DE-ALMEIDA, E. Educação Ambiental: o despertar de uma proposta crítica para a formação do sujeito ecológico. HOLOS, v. 1, p. 110-123, 2012.

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FREITAS, A. C. S.; SANTOS, J. E. O.; BARRETO, L. V. Educação ambiental no ensino de jovens e adultos. Centro Científico Conhecer-ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Goiânia, v. 5, n. 8, 2009.

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FURIAM, S. M.; GÜNTHER, W. R. Avaliação da educação ambiental no gerenciamento dos resíduos sólidos no campus da Universidade Estadual de Feira de Santana. Revista Sitientibus, n. 35, p. 7-27, 2006.

GOMES, S.; BARBOSA, I.; AGUIAR, J. Quando a Escola e o Bairro Dialogam: o Ensino de Ciências e a Ecopedagogia. Revista Educação Ambiental em Ação, v. 50, 2014.

INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio TeixeiraSinopses Educação Básica”, disponível em: http://portal.inep.gov.br/basica-censo-escolar-sinopse-sinopse. Acesso em 18 de Julho de 2015.

KRASILCHIK, M. Ensino de ciências e a formação do cidadão. aberto, Brasília v. 7, p. 55-60, 1988.

MAGALHÃES D. N. Elementos para o diagnóstico e gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos do município de Dores de Campos – MG. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Análise Ambiental) – Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2008.

SILVA, E.; RÊGO, V.; FERREIRA, L.; ABREU, B. Percepção Ambiental dos Educandos e das Educandas de Ensino Fundamental ii da E. E. E. F M. Senador Ruy Carneiro, Mamanguape – PB, Sobre Gerenciamento de Resíduos Sólidos. Revista Educação Ambiental em Ação v. 49, 2014.

SIQUEIRA, M. M.; MORAES, M. S. Saúde coletiva, resíduos sólidos urbanos e os catadores de lixo. Ciência & Saúde Coletiva, v. 14, n. 6, p. 2115-2122, 2009.

ZANETI, I. C. B. B.; SÁ, L. M. ALMEIDA, V. G. Insustentabilidade e produção de resíduos: a face oculta do sistema do capital. Sociedade e Estado, v. 24, n. 1, p. 173-192, 2009.

 

Ilustrações: Silvana Santos