Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2018 (Nº 53) REFLEXÕES SOBRE EDUCAÇÃO E AS PRÁTICAS EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL
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REFLEXÕES SOBRE EDUCAÇÃO E AS PRÁTICAS EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL

 

 

Flávio Roberto Chaddad [

frchaddad@gmail.com

 Mestre em Educação [Área de Concentração: Ensino Superior] pela PUC-Campinas em 27/10/2004.

 

Vive-se uma intensa degradação ambiental, todos concordam. A partir deste cenário, muitos acadêmicos, professores e alunos, afirmam serem as práticas educativas ambientais formas de conscientizar os seres humanos sobre os limites de sua ação no planeta Terra. Mas, serão mesmo importantes estas práticas ambientais? Em um artigo que escrevi para esta revista, em 2014, O Desafio do Desenvolvimento Sustentável, enfatizei que só através da superação do modo de produção capitalista é que a questão ambiental seria resolvida. Assim, pontuo que as práticas educativas ambientais, que não questionam o modo de produção vigente, deixam de realmente terem um sentido revolucionário e de promoverem mudanças importantes no cenário mundial. Isto porque o capitalismo vive do consumo e este é o principal fator para a utilização crescente de recursos naturais e a consequente destruição ambiental.

Mas, mais uma vez, vê-se que estas práticas que, na maioria das vezes, ocorrem no espaço escolar, apenas visam um adestramento do ser humano ao sistema produtivo em voga. São práticas que procuram solucionar problemas pontuais de violência, de consumo de drogas, de gastos de energia, de redução dos resíduos, etc. Ou seja, apenas e somente buscam adaptar o ser humano ao espaço social capitalista – em uma atitude revisionista – que, quando conseguem, apenas conferem ao cidadão a sua emancipação política. A emancipação humana é outra coisa. O pior é que os próprios idealizadores destes processos educativos ambientais, que, muitas vezes, se utilizam das pesquisas participantes e do método crítico dialético, afirmam serem processos reflexivos, onde os seres humanos através de temas geradores atingem um nível de consciência de uma forma tal que se emancipam.

Portanto, eles não se atentam que podem estar, através destas posturas idealistas, trabalhando em prol a autorrealização e organização do sistema. E qual seria a base para uma prática ambiental que se faz realmente emancipatória? Em primeiro lugar a educação ambiental é apenas parte da educação. Neste sentido, para que o ser humano e natureza sejam valorizados seria necessária uma educação que realize plenamente sua especificidade, ou seja, o ato de ensinar. Infelizmente em nosso país, principalmente, após a conferência de Jomtien na Tailândia, houve a adoção de pedagogias que se revestem de um caráter antipedagógico, que desvalorizam o ato de ensinar, o ato de transmitir o que há de mais evoluído no conhecimento através da lógica dialética. Portanto, esta especificidade foi esquecida.

A educação, então, se caracterizou por adotar um grupo pedagogias que alguns pesquisadores denominam como pedagogias do aprender a aprender. Uma destas pedagogias é o construtivismo, que se faz hegemônica pelos defensores do sistema liberal. O construtivismo é uma pedagogia que não admiti o ato de ensinar. Pelo contrário, ocorre uma nítida desvalorização do professor. Ele apenas prepara situações de aprendizagem para os alunos interagirem com o objeto, que de acordo com a sua maturação cognitiva dá um sentido próprio ao objeto. Aqui não importa a verdade, ou como querem os marxistas, um sentido de verdade, uma apropriação crítica da verdade. Pelo contrário, a verdade é relativa e depende de como o sujeito se relaciona com o objeto e das necessidades de cada educando – neste sentido, é que também surge o pragmatismo do que se denomina como à aprendizagem significativa.

Se o educando se relaciona conforme o seu interesse e de acordo com a sua percepção com e do objeto, construindo a sua verdade particular, a educação e a educação ambiental de uma prática que valoriza a cultura humana se torna subjetivista. Neste sentido, a grande luta do ser humano, que se faz contra o sistema capitalista e de suas formas de apropriação da riqueza, é diluída - é deixada de lado em detrimento das pequenas narrativas ou das narrativas moleculares que é característica da pós-modernidade. É necessário ressaltar que a ideologia pós-moderna não deixa de ter suas raízes fincadas na antiguidade, mais precisamente em um grupo de filósofos que valorizavam não o conhecimento e a verdade, mas sim o pragmatismo e a retórica: os sofistas. Estes defendiam que o homem é a medida de todas as coisas: das coisas que são e das coisas que não são. O mais puro relativismo!

Se o construtivismo é uma pedagogia utilizada e dirigida pelas elites para desestabilizar qualquer sistema educacional, através do impedimento da formação de um espírito humanístico e crítico ao sistema capitalista, existem também pedagogias que tem um viés popular e que procuram valorizar os oprimidos através de sua própria cultura e não de um referencial humanístico. Estas pedagogias, portanto, não enfatizam a cultura humana no que há de mais desenvolvido e, também podem, segundo vários autores, serem consideradas como antipedagogias. Um exemplo é a pedagogia de Paulo Freire. Freire em sua Pedagogia do Oprimido afirma que nós - educadores e educandos - aprendemos juntos. Ele não admite que alguém ensine a alguém, neste caso o professor ao aluno. Outra questão que se torna importante salientar é que é difícil pensar que na educação básica este pensamento pode ter aplicação [[1]]. Pelo contrário, hoje em dia, se mesmo professores não conseguem se libertar das alienações impostas pelo sistema imagine, então, os alunos. Os alunos trazem de casa formas ideológicas de pensar a realidade, permeadas pelo cotidiano. E o saber cotidiano não deve ser encarado como um conhecimento que eleve - que faça os educandos sair do imediato.  A educação, portanto, deve superar o cotidiano e não cultivá-lo. Desta forma, para Freire, o ato de ensinar, que deve ser emanado do professor, passa a reeditar a relação entre o opressor e o oprimido, que ele condena em sua pedagogia. Assim, o que se pode dizer é que esta pedagogia constitui-se em uma antipedagogia, pois impede e desvaloriza a especificidade da educação que é o ato de ensinar, o ato de transmitir os conteúdos do que há de mais desenvolvido na cultura humana pelo professor.

Assim, este é um pequeno perfil da educação brasileira que valoriza, sobretudo, formas de pensar a educação que carregam grandes contradições com a emancipação humana. Estas pedagogias, em sua vertente hegemônica liberal ou em sua vertente popular, não libertam o ser humano, não formam sujeitos aptos a lutarem por um mundo livre do sistema capitalista. Pelo contrário. Estas pedagogias fazem com que a capacidade crítica dos sujeitos seja reduzida e, consequentemente, perpetue o sistema liberal e suas formas de apropriação da riqueza, cujo saldo é a expropriação e exploração do homem e da natureza. Se for pretendida uma luta efetiva contra este sistema e suas formas de alienação, torna-se necessário uma educação que realmente valorize o professor e o ato de ensinar. O ato de transmitir o que há de mais desenvolvido na cultura humana. Mas, este conhecimento não será uma transmissão de uma verdade imparcial. Exemplos de uma ciência abominável não nos faltam, como é o caso da engenharia da morte elaborada pelos nazistas na Alemanha [[2]] e a explosão das bombas atômicas no Japão. Este conhecimento será efetivado pela sua apropriação crítica, através da lógica dialética. Para tanto, não se poderá deixar de lado o conhecimento disciplinar, que é produzido através da lógica formal e que se faz e se torna a base do conhecimento interdisciplinar, tão necessário a educação ambiental.

Só assim vejo que se dará um salto de qualidade na educação e nas relações entre o homem e homem e entre o homem e a natureza. Neste sentido, a partir deste esboço torna-se necessário pensar:

 

·         Na educação ambiental como modalidade da educação;

 

·         Procurar questionar as pedagogias dominantes ou hegemônicas que o sistema liberal utiliza-se para a desestabilização das instituições educacionais, principalmente, dos países subdesenvolvidos como o Brasil, tornando-os cada vez mais dependentes;

 

·         Procurar a olhar a transmissão do conhecimento do que há de mais desenvolvido na cultura humana, contextualizado através da lógica dialética, como uma pedagogia progressista que propõe a valorização do ato educativo e do professor;

 

·         Procurar questionar as práticas ambientais que se realizam através das metodologias participativas: será que realmente elas contribuem para emancipação humana ou apenas implicam em posturas revisionistas do próprio capital?

 



[[1]] Para meu ponto de vista, isto só é possível na Pós-Graduação.

[[2]] A referência aos nazistas e não a Alemanha como um todo é que grande parte da população alemã foi forçada pela polícia política nazista a aceitar Adolf Hitler como seu condutor. Esta população temia as consequências de se discordar de tal sistema. O medo era ser enviado aos campos de concentração e aos campos de extermínio. Só para se ter uma idéia, mais de que 400.000 alemães foram esterilizados à força, ou seja, sem o seu consentimento pelo sistema nazista.

Ilustrações: Silvana Santos