Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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07/12/2014 (Nº 50) QUANDO A ESCOLA E O BAIRRO DIALOGAM: O ENSINO DE CIÊNCIAS E A ECOPEDAGOGIA
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QUANDO A ESCOLA E O BAIRRO DIALOGAM: O ENSINO DE CIÊNCIAS E A ECOPEDAGOGIA

 

Salatiel da Rocha Gomes

Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia/UEA. Brasil. E-mail: salatielrocha@yahoo.com.br – Avenida Djalma Batista, 2470, Chapada – CEP 69050-010 – Manaus – Fone: (092) 3878 7721

 

 

Ierecê Barbosa

Doutora em Educação, professora do Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia/UEA e do Programa de Doutorado em Educação em Ciências e Matemática –  REAMEC – Pólo Acadêmico da Universidade do Estado do Amazonas – UEA. E-mail: ierecebarbosa@yahoo.com.br - Avenida Djalma Batista, 2470, Chapada – CEP 69050-010 – Manaus – Fone: (092) 3878 7721

 

 

José Vicente de Souza Aguiar

Doutor em Educação pela UFRGS e Professor Adjunto do Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia/UEA. E-mail: vicenteaguiar@ig.com.br - Avenida Djalma Batista, 2470, Chapada – CEP 69050-010 – Manaus – Fone: (092) 3878 7721

 


 

 

QUANDO A ESCOLA E O BAIRRO DIALOGAM: O ENSINO DE CIÊNCIAS E A ECOPEDAGOGIA

 

Salatiel da Rocha Gomes[1]

Ierecê Barbosa[2]

José Vicente de Souza Aguiar[3]

 

Resumo: Este trabalho tem por objetivo apresentar as possibilidades de um diálogo em ensino de ciências, no bairro e na escola, partindo dos princípios da Ecopedagogia. Busca-se compreender os conceitos e as perspectivas da Ecopedagogia à luz dos textos de Gadotti (2000, 2009) e Gutierrez e Prado(2000), discorrendo sobre sua importância no contexto atual, principalmente para uma cidadania planetária. Caracteriza-se como uma pesquisa bibliográfica, de abordagem qualitativa. Enfatizamos no texto a potencialidade dos Espaços Não-Formais não institucionalizados para o ensino de Ciências, onde a proposta ecopedagógica torna-se significativa e viável, pois parte do cotidiano, dos entornos e da própria comunidade, o que é possível sensibilizar e adquirir um sentimento de pertencimento. Acredita-se que a Metodologia da Mediação Dialética (M.M.D.) é uma proposta metodológica possível para o diálogo da Ecopedagogia com a escola e o bairro e que a partir desse enfoque, urge a necessidade de reorientação dos currículos dentro da perspectiva interdisciplinar, visando uma tendência, em educação ambiental, mais crítica e problematizadora.

Palavras-chave: Ecopedagogia. Ensino de Ciências. Espaços não-formais.

Algumas palavras iniciais

            Os primeiros insights para escrevermos sobre essa temática vieram inicialmente a partir da leitura de duas reflexões teóricas: A primeira, de Gadotti (2009, p.85): “Ainda não utilizamos o potencial organizativo e transformador das escolas, mais de um bilhão de crianças e jovens estudam hoje no mundo e uma mudança no seu estilo de vida faria uma grande diferença”; a segunda, de Puíg e García (2010, p.55): “a escola multiplica seu efeito educativo quando propõe vincular-se ao entorno mais imediato – bairro ou vizinhança – e estabelecer relacionamentos com o meio social no qual está inserida”.

            Baseando-nos nessas afirmações, trazemos em pauta a Ecopedagogia, como uma proposta em Ensino de Ciências a ser trabalhada nos espaços não-formais não institucionalizados a partir do próprio cotidiano. Nisso, o objetivo basilar desse texto é apresentar a importância da inserção dos princípios da ecopedagogia como prática pedagógica a ser trabalhada no ensino de ciências a partir do diálogo entre a escola e o bairro.

As atividades em espaços não-formais

            Baseando-nos em Rocha (2008) e Jacobucci (2008) entendemos que Espaços Não-Formais são locais externos ao ambiente escolar, institucionalizados ou não, onde podem ocorrer práticas educativas, intencionais, planejadas e que facilitam o aprendizado de conteúdos ou temáticas que, devido a complexidade, podem ser melhor dialogadas em ambientes mais vivos. 

            Quanto à terminologia, Seiffert-Santos & Fachín-Terán (2013) informam que a expressão “espaços não-formais”, ganharam força a partir da ideia de Educação Não-Formal, principalmente com o pensamento pedagógico Freireano de educação Popular e libertadora. Mencionam que um das finalidades é ajudar na passagem de conhecimento científicos para escolares, melhorando constructos cognitivos do aluno.

            Como contribuição para o ensino de ciências, as atividades em espaços não-formais, possibilitam a aprendizagem significativa e ativa, onde os novos conhecimentos terão sentidos e possibilitarão ganhos cognitivos ao aluno (LORENZETTI e DELIZOICOV, 2001; KRASILCHIK e MARANDINO, 2004).

            Além disso, quando voltamo-nos ao ensino de Ciências, existe a possibilidade da reflexão mais dinâmica e mais próxima de temas, como: poluição, saúde, fauna e flora, dentre outros, que dificilmente seriam bem organizados e sistematizados no padrão comum da sala de aula.

            Mesmo assim, a sala de aula ainda é um espaço potencial. Nossa preocupação é que não haja a supervalorização do ensino nos espaços não-formais e diminuição da importância do ambiente escolar formal. Gohn (2011) destaca que não se trata de uma competição nem substituição, é uma possibilidade didática a mais para a escola. Entendemos com isso, que a escola mesmo com todos os problemas, principalmente os de infraestrutura, ainda é o principal meio onde o ensino acontece. Quanto a isso, Gohn (2008, p. 134), explicando o conceito de educação não-formal, sublinha que:

É aquela voltada para o ser humano como um todo, cidadão do mundo, homens e mulheres. Em hipótese nenhuma ela substitui ou compete com a educação formal ou escolar. Poderá ajudar na complementação desta, via programações específicas, articulando escola e comunidade educativa localizadas no território de entorno da escola. A educação não-formal tem alguns de seus objetivos próximos da educação formal, como a formação de um cidadão pleno, mas ela tem também a possibilidade de desenvolver alguns objetivos que lhes são específicos, via a forma e espaços onde se desenvolvem suas práticas, a exemplo de um conselho, ou a participação em uma luta social contra as discriminações, por exemplo, a favor das diferenças culturais, entre outras. Resumidamente, podem-se enumerar os objetivos da educação não-formal como sendo: a) educação para cidadania; b) educação para justiça social; c) educação para direitos (humanos, sociais, políticos, culturais etc.); d) educação para liberdade; e) educação para igualdade; f) democracia; g) educação contra discriminação; h) educação pelo exercício da cultura e para a manifestação das diferenças culturais (Grifo nosso).

            Complementando a ideia anterior, onde questiona-se tanto a Educação Formal, é comum ouvirmos discursos docentes relatando que os alunos não conseguem aprender devido à falta de recursos. Entendemos que isso pode ser um ponto problemático. O nosso receio é que dificuldades de aprendizagem possam ser sustentadas somente pela falta de recursos didáticos. Arriscamo-nos a dizer que muitos problemas de aprendizagem são gerados por deficiências pedagógicas como nos alerta Patto (2000). Nesse sentido, é necessário que não institucionalizemos os espaços não-formais.

é preciso ter cuidado para não se escolarizar as instituições. Acredita-se que o objetivo maior destes locais que expõem biodiversidade é o de despertar curiosidades, paixões, possibilitar situações investigadoras, gerar perguntas que proporcionem a sua evolução e não somente dar respostas às questões que são colocadas pelo ensino formal (PIVELLI e KAWASAKI ,2005, p. 9)

            Acreditamos que são muitas as perspectivas dos espaços não-formais para a Educação em ensino de Ciências, principalmente em refletir sobre questões e problemas sociais que terão de ser discutidos por toda humanidade no contexto do século XXI, como a Terra, o local onde vivemos, o que urge, portanto, a necessidade de repensar o ensino de ciências, numa perspectiva da Ecopedagogia – a vida com sentido, a pedagogia da Terra – abordando-a didaticamente a partir do bairro, da vizinha, dos entornos.

A Ecopedagogia: conceitos e perspectivas

            O principal conceito de ecopedagogia encontramos em Gutiérrez e Prado (2000), colocando-a como uma nova proposta educativa que promove a aprendizagem do sentido das coisas a partir da vida cotidiana. Diferentemente do conceito de Educação Ambiental (EA) que segundo Gadotti (2000, p.88) “limitou-se ao ambiente externo sem se confrontar com os valores sociais, com os outros, com a solidariedade, não pondo em questão a politicidade do conhecimento”; a ecopedagogia vem dar novos sentidos, afirmando que a transformação ambiental acontecerá no cuidar do cotidiano, do lugar onde moramos, do espaço onde há sentido para as pessoas, ou seja, da cotidianidade, aliando-se, portanto, a concepção Freireana do ato que pensa a prática. Outra crítica à Educação Ambiental, agora tecida por Gutiérrez e Prado (2000, p.33) é que:

Enquanto o ambientalismo superficial apenas se interessa em gestão mais eficazes do ambiente natural em benefício do homem, o movimento da ecologia fundamentada na ética reconhece que o equilíbrio ecológico exige uma série de mudanças profundas em nossa percepção do papel que deve desempenhar o ser humano no ecossistema planetário.

Gadotti (2000) salienta que a ecopedagogia não se opõe à Educação Ambiental, pelo contrário, para a ecopedagogia, a educação ambiental é um pressuposto básico que oferece estratégias, propostas e meios para a sua realização concreta. “Não se opõe à educação ambiental (EA.), ao contrário, incorpora-a e a estuda (como ciência da educação que é), os fins da EA, e os meios de sua realização completa”. (GADOTTI, 2000, p.240 – GRIFO NOSSO).

            Não se dirige apenas a professores e alunos, mas aos habitantes da terra em geral, pretendendo ir além da escola, envolvendo toda a sociedade. A população precisa conhecer a questão ambiental na sua significação mais ampla. Daí a necessidade de uma ecopedagogia, uma pedagogia para a educação sustentável (GADOTI, 2000). O mesmo autor (p.175-176) enumera seus princípios:

                          I - O planeta como uma única comunidade. II – A Terra como mãe, organismo vivo e em evolução. III Uma nova consciência que sabe o que é sustentável, apropriado, faz sentido para a nossa existência. IV – A ternura para com essa casa. Nosso endereço é a Terra.V – A justiça sociocósmica: a Terra é um grande pobre, o maior de todos os pobres. VI – Uma pedagogia biófila (que promove a vida): envolver-se, comunicar-se, compartilhar, problematizar, relacionar-se, entusiasmar-se. VII – Uma concepção do conhecimento que admite só ser integral quando compartilhado. VIII – O caminhar com sentido (vida cotidiana). IX – Uma racionalidade intuitiva e comunicativa: afetiva, não instrumental. X – Novas atitudes: reeducar o olhar, o coração. XI – Cultura da sustentabilidade: ecoformação. Ampliar nosso ponto de vista.        

            Medina (2013), quando discuti os princípios acima descritos, relata que precisamos de uma mudança cultural dependente da ecopedagogia, que necessariamente propõe novos comportamentos, ferramentas e valores, refletidos em atitudes e estilos de vida verdadeiramente consistentes.

            A Ecopedagogia expandiu-se a partir do RIO-92, fórum que originou a Carta da Terra. Tal documento é base para pensarmos a ecopedagogia e inspira-se em uma relação de diferentes temas, como a religião, ecologia, meio ambiente, sociedade e política, defendendo valores importantes como a liberdade, igualdade, solidariedade, tolerância, respeito à natureza e responsabilidade compartilhada (GADOTTI, 2009). Para o autor (p.11), a carta da terra tem um grande potencial educativo e ainda não foi suficientemente explorada, tanto na educação formal, quanto na educação não-formal.

Não é uma pedagogia a mais, ao lado de outras pedagogias. Ela só tem sentido como projeto alternativo global, ela está ligada portanto, a um projeto utópico: Mudar as relações humanas, sociais, ambientais que se tem hoje. Ela não tem pretensão de ser totalmente inédita. Ela se insere como movimento na evolução do próprio movimento ecológico ¨ (GADOTTI, 2000, p.237)

            A fim de verificarmos as principais concepções no contexto nacional, levantamos no banco de teses da Capes, as pesquisas desenvolvidas nessa perspectiva. Colocamos os termos “Ecopedagogia, pedagogia da terra e pedagogia do desenvolvimento sustentável”, que são segundo Gadotti(2009) sinônimos e tem os mesmos conceitos epistemológicos. Nisso, obtivemos 11 dissertações de Mestrado, concentradas na Região Nordeste (54 %), Centro- Oeste (36%) e Sudeste (10%). Em algumas regiões, como a Sul e Norte não há apontamentos de trabalhos nessas palavras-chaves. Dos resultados de nossa busca bibliográfica, destacamos as reflexões das seguintes pesquisas:

·        Numa abordagem ativa, dialógica e integradora, o processo ecopedagógico coaduna-se com os princípios norteadores da Educação Ambiental (MIRANDA, 2011);

·        A Ecopedagogia deve ser inclusa no currículo escolar do ensino fundamental e contribui para uma formação continuada dos indivíduos e para a formação de novos conhecimentos sobre o meio ambiente e para a conscientização sobre a necessidade do uso racional dos recursos naturais e da formação do cidadão planetário. (QUEIROZ, 2012);

·        A utilização da Permacultura como estratégia para educação para sustentabilidade mostrou-se eficiente, cumpriu os objetivos propostos e confirmou a hipótese de que a realização do turismo ecopedagógico baseado na Permacultura reflete bons atos para práticas de ocupação humana sustentáveis, promovendo atitudes voltadas à recuperação de áreas degradada. (JACINTHO, 2011);

            Os resultados das pesquisas acima descritas relatam consensualmente para a importância da Ecopedagogia como movimento que pode mudar práticas, conscientizar pessoas, recuperar aquilo que perdemos, destacando que não temos como nos distanciar da questão ambiental. Contraditoriamente à concepção de Gadotti(2000) e Gutierrez e Prado (2000), Miranda (2011) relacionou a ecopedagogia com os princípios da Educação ambiental. Acreditamos que a Ecopedagogia contribui para a realização da Educação Ambiental, ou seja, é um caminho para EA e possui seus próprios princípios e objetivos. Princípios de Ecologia, de Sustentabilidade, de comunidade ou até mesmo fatos básicos da vida, precisam de um currículo que ensine as crianças estes conceitos fundamentais (CAPRA, 2006)

            A escola precisa ressignificar-se, mudando, prioritariamente, seus currículos. Os PCN’s (Parâmetros Curriculares Nacionais) relatam que “o objetivo fundamental do ensino de ciências é dar condições para o aluno identificar problemas a partir de observações, fatos, hipóteses” (BRASIL, 1997, p. 120). É preciso ecoformar-se, conforme aponta Gadotti (2000), por isso, sugerimos a utilização dos espaços de convivência que segundo Jacobucci (2008) são espaços não-formais não institucionais, como praças, trilhas, jardins, encontrados ali logo, no próprio bairro.

O Ensino de Ciências: na escola e no bairro

            Uma das principais finalidades do Ensino de Ciências é contribuir para a formação cidadã, participativa, crítica e ativa na sociedade atual. No entanto, muitos desses objetivos não são alcançados devido a problemas políticos do sistema educacional, principalmente envolvendo questões de currículo e formação de professores. Ressaltamos que foi somente a partir de 1971 que o Ensino de Ciências passou a fazer parte obrigatória do currículo nas séries iniciais do ensino fundamental. As mudanças são necessárias e até mesmo sugeridas, mas se consolidam vagarosamente.

            Com isso, críticas ainda precisam ser feitas ao Ensino de Ciências na atualidade, principalmente nos seguintes pontos: na escola, começa demasiado tarde e termina demasiado cedo, é marcado por uma supervalorização dos conhecimentos acadêmicos, valorizando o cumprimento dos programas curriculares e a transmissão e reprodução de conceitos; pouco utiliza-se a interdisciplinaridade (CACHAPUZ et all, 2004).

            As reflexões dos Parâmetros Curriculares Nacionais, das Diretrizes Curriculares da Educação Básica apontam para o trabalho do Ensino de Ciências dentro do modelo interdisciplinar, principalmente na abordagem de temas transversais como o meio ambiente. Nessa relação de interdependência homem e sociedade, Gadotti (2000, p.93) destaca a necessidade de reorientação dos currículos, pois “os conteúdos curriculares têm que ser significativos para eles, se esses conteúdos forem significativos também para a saúde do planeta, para o contexto mais amplo”. Essa aproximação, além de capacitar os indivíduos a se tornaram cidadãos do mundo no próprio mundo, tem uma intencionalidade na ação, no ato de participar, de aprender e de transmitir ou trocar saberes, fortalecendo o exercício da cidadania (GOHN,2006)

            Uma das formas de fortalecer o exercício da cidadania, é pensar em uma nova escola, recolocando-a na cena urbana, rompendo com um certo lugar de invisibilidade. É preciso incentivar o diálogo, a participação e a cooperação no sentido de estimular a troca de experiências e saberes (MOLL,2000).

            A fim de incentivar a participação e cooperação para o exercício da cidadania, apresentamos alguns caminhos, partindo de atividades ecopedagógicas, que relacionam-se ao Ensino de Ciências.

NA ESCOLA

Ø  Fase da Sensibilização: Discutir junto com os alunos as relações sociais, políticas, econômicas e culturais que envolvem o meio ambiente. A Ecopedagogia trata não somente de como reduzir questões como os impactos ambientais, mas investigá-las em sua totalidade. Sugerimos a atividade em forma de círculo, trabalhando interdisciplinarmente. É importante que as atividades promovam a integração dos alunos e o sentimento de pertencimento e de cuidado com a Terra. De acordo com Gadotti (2000, p. 141), “os currículos escolares, numa visão ecopedagógica, deverão incluir, desde os estudos infantis, não apenas o estudo do ambiente natural, o entorno, os contextos urbanos, mas a história da Terra e do universo. A ecopedagogia nos ensina a olhar para o céu”.

Ø  Fase da coletividade:  A coletividade é uma das palavras-chaves em Ecopedagogia; nisso, os alunos quando trabalham em grupo, trocam ideias e opiniões, o que estimula a criação de hipóteses sobre variados temas, como: lixo, poluição, água, ar, queimadas e etc. Atividades como desenhos, produções textuais, paródias e teatros configuram-se como potenciais para desenvolver o espírito coletivo.

NO BAIRRO

            O bairro é um espaço privilegiado para tratar temas envolvendo a Geografia, História e o Ensino de Ciências. O espaço e a história do bairro instigam a criação de discussões, como: Como era o bairro antigamente? Como é como era a fauna e flora? As ruas, praças, calçadas são limpas? Como você gostaria que o bairro fosse? Tais discussões são importantes para iniciar um espírito eco, que promova a cidadania local e planetária.

            Nessa perspectiva, as aulas passeios constituem-se como valiosa ferramenta para sua consolidação. Para Freinet (1975, p. 23), esse tipo de aula difere do tradicional por desenvolver a ludicidade na educação, onde torna as atividades escolares mais “vivas”.

A aula-passeio constituía para mim uma tábua de salvação. Em vez de me postar, sonolento, diante de um quadro de leitura, no começo da aula, partia com as crianças pelo campo que circundavam a aldeia. Ao atravessarmos as ruas, parávamos para admirar o ferreiro, o marceneiro ou o tecelão, cujos gestos metódicos e seguros nos inspiravam o desejo de os imitar.

            As aulas-passeio possibilitam, portanto, o engendramento de novos olhares, uma vez que o contato concreto sensibiliza, conscientiza e desperta para novas atitudes em uma totalidade mais abrangente.

DE VOLTA À ESCOLA

            A continuidade dos estudos feitos no bairro é realizada quando volta-se à escola, é uma das atividades primordiais. Nesse momento, socializam-se as ideias, opiniões e proposições cunhadas pelos alunos, onde percebe-se a mudança daquilo que antes era curiosidade e depois tornou-se conhecimento.

A metodologia da Mediação Dialética (M.M.D) como proposta para o Ensino de Ciências

            A Metodologia da Mediação Dialética (M.M.D) é uma proposta metodológica para trabalharmos no bairro, o ensino de ciências e ecopedagogia, pois segundo Arnoni (2006, p.11), trata-se de:

Uma totalidade que envolve a operacionalização/aplicação do método dialético, a transformação do conceito científico em conceito para o ensino (conteúdo de ensino), a explicação dos processos de ensino e de aprendizagem e as relações entre ambos. A M.M.D. é um todo (totalidade mais abrangente) formado de etapas (totalidade menos abrangente), partes que articulam entre si e com o todo: o Resgatando, o Problematizando, o Sistematizando e o Produzindo.

            Didaticamente, as quatro partes apresentadas por Arnoni podem ser compreendidas da seguinte maneira:

Resgatando – É o momento em que o professor vai utilizar algumas estratégicas, como debates, músicas, desenhos, teatros para verificar o real conhecimento dos alunos sobre o assunto pretendido e a ser desenvolvimento pelo professor. Nesse instante, depreende-se a tensão entre ambos e é elaborada a problematização (ARNONI, 2006).

Problematizando -  É o momento que o aluno necessita perceber que, apesar de seu conhecimento inicial, o mesmo não é o suficiente para compreender o problema questionado. Ocorre, nesse processo, a necessidade cognitiva, através da motivação, que possibilita o aluno a investigar e buscar novas relações. (ARNONI, 2006). Pela problematização, “o educador estabelece contradição com o conhecimento parcial, equivocado que o aluno traz, possibilitando a superação deste estágio de conhecimento” (VASCONCELOS, 1992, p. 12)

Sistematizando -  É um processo mais complexo, onde o aluno relaciona aspectos do saber imediato com o saber mediato, intermediado pelo diálogo e pela ação do professor. Nesse momento, o aluno consegue elaborar sínteses cognitivas e internalizar o saber aprendido (ARNONI, 2006)

            Vasconcelos (1992) ressalta que é necessário sair do sincrético para o sintético através da análise, onde a síncrese corresponde a um conhecimento ou ideia indeterminada, inacabada, confusa e a síntese é o resultado da integração de todos os conhecimentos parciais num todo orgânico e lógico, e isso só se dará se houver a análise, ou seja, no desdobramento da realidade em seus elementos, a parte como parte do todo.

Produzindo -  Quando o professor propõe atividades que expressam o conhecimento e as sínteses elaboradas pelo aluno; é um outro ponto de partida para que o aluno tenha novas descobertas (ARNONI, 2006).

            Os quatro momentos apontados por Arnoni (2006) configuram-se como caminhos importantes para uma abordagem ecopedagógica em Ensino de Ciências. É onde os diálogos acontecem, as perguntas e inquietações surgem, gerando assim, a criação de hipóteses, reelaboração de conhecimentos e a possibilidade de posturas efetivas mais ecopedagógicas, mais planetárias, mais sustentáveis.

Considerações Finais

                                                                                                          Somente depois da última árvore derrubada, depois do último animal extinto, e quando perceberem o último rio poluído, sem peixe, o ser humano irá perceber que dinheiro não se come. (Provérbio Indígena)

            Tomamos tal provérbio indígena como epígrafe das considerações finais desse estudo, para refletir sobre a necessidade de romper com a visão antropocêntrica que ainda temos na sociedade atual e sensibilizarmo-nos que é preciso uma relação interdependente com a natureza, de totalidade universal. Nesse sentido, a ecopedagogia torna-se necessária, pois é preciso que a educação seja ecologizada, em todas as áreas, a fim de romper com a visão “ambientalista, reducionista e anti-harmônica” (GUTIERREZ e PRADO, 2000, p. 34).

            O movimento ambiental ou ecológico que tenta derrubar as barreiras citadas por Gutierrez, necessita ser analisado sob uma perscpectiva de um continnun. Nesse sentido, a Ecopedagogia firma-se como um passo inicial, tratando a partir do caminhar com sentido, do cotidiano, começando pela sala de aula e rompendo seus muros, aliando-se ao bairro, a comunidade e as suas proximidades. É preciso, portanto, de um diálogo urgente entre a escola e o bairro.

            Nesse texto, apontamos para a necessidade desse diálogo, recomendamos que esses caminhos ecopedagógicos não se tornem modismos; pelo contrário, que possibilitem atitudes ecológicas, de modo a possibilitar uma re ou eco orientação para nossas vidas. Discursos já temos bastante, é preciso agora praticarmos. Que tal começarmos, então, em nossa casa, no nosso bairro, em nossa escola?

Referências

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JACOBUCCI, Daniela Franco Carvalho. Contribuição dos espaços não-formais de educação para a formação da cultura científica. Revista em extensão, Uberlândia, V.7, 2008.

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[1] Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia/UEA. Brasil. E-mail: salatielrocha@yahoo.com.br – Avenida Djalma Batista, 2470, Chapada – CEP 69050-010 – Manaus – Fone: (092) 3878 7721

[2] Doutora em Educação, professora do Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia/UEA e do Programa de Doutorado em Educação em Ciências e Matemática –  REAMEC – Pólo Acadêmico da Universidade do Estado do Amazonas – UEA. E-mail: ierecebarbosa@yahoo.com.br - Avenida Djalma Batista, 2470, Chapada – CEP 69050-010 – Manaus – Fone: (092) 3878 7721

[3] Doutor em Educação pela UFRGS e Professor Adjunto do Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia/UEA. E-mail: vicenteaguiar@ig.com.br - Avenida Djalma Batista, 2470, Chapada – CEP 69050-010 – Manaus – Fone: (092) 3878 7721

Ilustrações: Silvana Santos