Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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07/12/2014 (Nº 50) EDUCAÇÃO AMBIENTAL, DESENVOLVIMENTO LOCAL E GESTÃO SOCIAL: PERSPECTIVAS PARA A ESCOLA
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EDUCAÇÃO AMBIENTAL, DESENVOLVIMENTO LOCAL E GESTÃO SOCIAL: perspectivas para a escola

ANDRADE, CLEUDES DIAS MARTINS¹; QUARESMA, ADILENE GONÇALVES²  

[1]Centro Universitário UNA                                                                                                          

Mestrado Profissional e Interdisciplinar em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local

cleo.martins37@hotmail.com

 

 

²Centro Universitário UNA

Mestrado Profissional e Interdisciplinar em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local

adilene.quaresma@prof.una.br

 

RESUMO

Este artigo enfoca aspectos da educação ambiental relacionados ao desenvolvimento local, como resultante de um processo da gestão social na escola. Para tal reflexão, serão apresentados os fundamentos teóricos e legais para as práticas de Educação Ambiental como perspectiva de caminho a ser trilhado para que esta se torne uma importante ferramenta de desenvolvimento local; os conceitos de desenvolvimento local e sua interface com a escola; considerações sobre a gestão social, especialmente na escola; as articulações possíveis entre educação ambiental, desenvolvimento local e gestão social. Para a percepção destes conceitos no ambiente escolar, foi descrito um estudo de caso sobre o resultado da educação ambiental desenvolvida por uma escola pública de Belo Horizonte, que faz parte do referencial teórico da pesquisa de mestrado intitulada: Educação Ambiental como função social da escola na perspectiva da Lei 9.795/1.999, aprovada em 27/02/2014. A abordagem da pesquisa foi de natureza qualiquantitativa, com questionários para alunos e entrevistas semiestruturadas para professores e gestores. Ao final, conclui-se sobre a dificuldade que as escolas têm para promover a Educação Ambiental, com possibilidades de desenvolvimento local, por não gerirem processos de gestão social.

Palavras-chave: Escola, Educação Ambiental, Desenvolvimento Local, Gestão Social.

 

 

Introdução      

As diretrizes da Política Nacional de Educação Ambiental - PNEA (Lei nº 9.795/1.999) colocam como parte dos objetivos fundamentais da educação ambiental o incentivo à participação, individual e coletiva, na preservação e equilíbrio do meio ambiente, como um valor inseparável do exercício da cidadania. E a escola precisa perceber a educação ambiental como instrumento que desperta a consciência para a cidadania e para melhoria da qualidade vida.

O processo educativo, principalmente no que se refere à temática ambiental, não se resume em transmitir informações sobre o que fazer para melhorar o ambiente: é preciso investir na formação de sujeitos que concretamente enfrentem a problemática ambiental e comprometam-se com as mudanças necessárias à qualidade de vida.

O resultado promoverá o desenvolvimento em escala local que, neste caso o local refere-se à comunidade (aqui entendida como a escolar), como construtora do seu destino em torno das potencialidades locais. Nesta direção, a gestão social escolar passa a ser vista como alternativa capaz de dar sentido e reconhecimento às experiências locais; se estabelece a partir de uma dinâmica com significados construídos a partir de experiências ligadas a escalas e contextos; compromete-se com o social (BOULLOSA; SCHOMMER, 2009).

Portanto, a gestão do desenvolvimento local compromete-se com o social, amparados pela cidadania em todo processo de planejamento, execução e avaliação do que foi almejado. Isto implica em uma reestruturação do pensamento, mudança de mentalidade, transformação do conhecimento e das práticas educativas para a construção de um novo saber para a construção de um mundo de sustentabilidade, de justiça e de democracia em busca da transformação de realidades locais (BATTASSINI; COSTA 2009).

Nesse sentido, as questões ambientais exigem abordagem interdisciplinar,, integra diversas ciências, contribui para proposição de soluções e mudanças de comportamento que levem ao crescimento e à emancipação humana (MANGINI; MIOTO, 2009).

 

1 Educação ambiental e a Lei 9.795/1999

O conceito de Educação Ambiental esteve, inicialmente, atrelado ao conceito de meio ambiente e à maneira como este era percebido. A partir da interdependência e da contribuição das ciências sociais e de outras ciências é que passou a relacionar-se à ideia de melhoria do ambiente humano (DIAS, 2010).

O conceito de educação ambiental que direciona esta reflexão é o que a Lei 9.795/1999 traz em seu Art. 1°:

[...] Processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (DIAS, 2010, p.202).

A Lei chama à responsabilidade, ou à eco-responsabilidade, tanto no âmbito individual quanto no coletivo, porque a dimensão ambiental se configura como uma questão que pressupõe o envolvimento de um conjunto de sujeitos do universo educativo. No universo educativo escolar este processo é ampliado para promoção de desenvolvimento com base local na medida em que estes sujeitos têm oportunidade de construir competências, habilidades e atitudes que levem à melhoria da qualidade de vida e à conservação do meio ambiente.

A educação ambiental, com perspectiva crítica e emancipatória, permite a criação de processos que envolvem uma busca individual e coletiva por mudanças culturais e sociais, colocando novamente o ser humano como foco principal e abordagem inicial de qualquer tema. Tais mudanças são concretizadas pelas normas e princípios da sustentabilidade, evidenciados pela legislação e preceitos da defesa ambiental que fomentam a formação da cidadania ambiental. (SORRENTINO et al, 2005).

Neste contexto, a Educação Ambiental se torna instrumento para o desenvolvimento sustentável, definido na Agenda 21 como:

Aquele que harmoniza o crescimento econômico, com a promoção da justiça social e a preservação do meio ambiente. Assim, busca-se garantir que as necessidades das atuais gerações sejam atendidas sem comprometer o atendimento das gerações futuras (DIAS, 2010, p.120).

A sustentabilidade preconiza uma consciência em que a apreensão da natureza pelas gerações do presente não pode comprometer o futuro das próximas gerações. A busca pela riqueza não pode desvincular-se do bem estar social e da qualidade de vida e devem ser acessíveis a toda população e não apenas a um pequeno grupo.

Em todos os artigos da PNEA são enfatizados a educação ambiental como um processo de conhecimento contínuo e permanente que permite a construção de valores, a discussão de paradigmas e, como principal premissa, a transformação socioambiental. Isso envolve o contexto sociopolítico por meio de ações interdisciplinares e intergeracionais pró-sustentabilidade. Assim, a educação ambiental preconiza a ideia da sustentabilidade dentro das suas principais diretrizes, conforme argumenta Jacobi (2003, p. 195):

Assim, a ideia de sustentabilidade implica na prevalência da premissa de que é preciso definir uma limitação definida nas possibilidades de crescimento e um conjunto de iniciativas que levem em conta a existência de interlocutores e participantes sociais relevantes e ativos através de práticas educativas e de um processo de diálogo informado, o que reforça um sentimento de corresponsabilização e de constituição de valores éticos.

Neste sentido, a perspectiva de educação ambiental prevista pela Lei 9.795/1999, aponta para propostas pedagógicas centradas na conscientização, mudança de comportamento, desenvolvimento de competências, capacidade de avaliação e participação de todos os sujeitos da comunidade escolar: docentes, discentes, pedagogos, direção, responsáveis e demais servidores da escola.

Tanto a educação, quanto a educação ambiental são vistas como mediadoras de processos de transformações sociais, culturais e ambientais, como coloca Tozoni-Reis (2006, p. 97):

Assim, se a educação é mediadora na atividade humana, articulando teoria e prática, a educação ambiental é mediadora da apropriação, pelos sujeitos, das qualidades e capacidades necessárias à ação transformadora responsável diante do ambiente em que vivem. Podemos dizer que a gênese do processo educativo ambiental é o movimento de fazer-se plenamente humano pela apropriação/transmissão crítica e transformadora da totalidade histórica e concreta da vida dos homens no ambiente.

Para imprimir à prática ambiental um caráter contestador, contextualizado e responsável faz-se necessário uma construção dialógica entre conhecimento sócio-histórico, estético e pessoal promovido  pela educação através de uma vivência cultural, ética e social.

 

 

2 Educação ambiental e desenvolvimento local

Na atualidade, o crescimento econômico do Brasil foi suficiente para colocá-lo entre as maiores economias do mundo, todavia, os avanços sociais não acompanharam o mesmo ritmo. O desenvolvimento, associado ao progresso material, procede de uma visão capitalista e positivista que só é percebido no crescimento de taxas e indicadores econômicos. A ideia de desenvolvimento deve estar atrelada aos vieses econômico e social, em que a atividade econômica é pensada como um meio e o bem-estar social um fim (DOWBOR, 2006). 

Os efeitos provocados regionalmente pela globalização levaram à necessidade de se refletir sobre o processo e o significado de desenvolvimento em uma escala local, de maneira que o crescimento aconteça de forma mais equitativa, que contemple a inclusão social e promova a cidadania. “E preciso promover o desenvolvimento inclusivo, solidário e sustentável” (CHRISTOFFOLI, 2010, p. 239).

O desenvolvimento, na perspectiva local, oferece maiores possibilidades de participação dos sujeitos, pois “é através do poder local que a sociedade decide o seu destino, constrói a sua transformação e se democratiza” (DOWBOR, 2006, p. 8).

Para responder às complexas relações entre os processos naturais e sociais no ambiente, em uma perspectiva global, cabe estabelecer um processo educativo que deva ser capaz de formar um pensamento crítico, criativo e sintonizado com a necessidade de propor respostas para o futuro a partir do respeito às diversidades socioculturais. Esta perspectiva educacional tem o objetivo de propiciar novas atitudes e comportamentos face ao consumo na nossa sociedade e de estimular a mudança de valores individuais e coletivos. 

Isto requer um pensamento crítico da educação ambiental, enquanto projeto educativo que pretende transformar a sociedade. Nesta direção, se torna um suporte de práticas educativas, em que todos os envolvido têm papel fundamental, segundo defendem: Jacobi; Tristão; Franco (2009, p.63):

Este é o caminho para incrementar o potencial educativo de ambientes, dentro e fora dos muros da escola, que propiciam situações de diálogos democráticos, mediando experiências de diferentes sujeitos que se tornam protagonistas na construção de projetos coletivos de intervenção coletiva.

 

A melhoria da qualidade de vida e o desenvolvimento local são resultados de experiências coletivas proporcionadas pela educação ambiental, conforme colocam Battassini; Costa (2009):

O processo de desenvolvimento local, como da educação ambiental, aparece como um caminho (que se faz ao caminhar) a ser seguido para se chegar à satisfação em qualidade de vida da coletividade, o qual permite perceber a importância do envolvimento de todos os setores da sociedade, considerando o trabalho integrador, assim como a sua autossustentabilidade.

Em outras palavras, educação ambiental para o desenvolvimento local se faz fazendo; se ensina vivendo; não cabe apenas em teorias e nem se aplica ao ditado: faça o que digo e não faça o que eu faço; remete à ideia de apropriação dos envolvidos de suas potencialidades locais, com vistas à melhoria da qualidade de vida e ao desenvolvimento (em sentido extra-econômico) de sua comunidade; leva em consideração sua cultura e as identidades sociais presentes.

A reflexão sobre o desenvolvimento local considera e incorpora  as necessidades humanas fundamentais (subsistência, proteção, afeto, pertencimento, entendimento, criação, participação, identidade e liberdade) que é um investimento no ser humano, segundo a visão de Dowbor apud Kon et al (2013, p. 5):

Nem a área produtiva, nem as redes de infraestruturas, e nem os serviços de intermediação funcionarão de maneira adequada se não houver investimento no ser humano, na sua formação, na sua saúde, na sua cultura, no seu lazer, na sua informação.

 

O investimento nos sujeitos resulta na melhoria das condições socioculturais e, por conseguinte, na qualidade de vida dos envolvidos.

Na atualidade, já há sinais de mudanças na visão tradicional de desenvolvimento para uma perspectiva baseada em termos como: sustentabilidade, ênfase no local, a promoção da cidadania e da participação. 

Na construção sobre o entendimento de desenvolvimento local e sua interface com meio ambiente, Tenório (2004) traz as seguintes considerações:

 

Pensar o desenvolvimento local requer o envolvimento de diversas dimensões: econômica; social; cultural; ambiental e físico-territorial; político-institucional; científico-tecnológica [...]; importa, necessariamente, uma profunda transformação das relações sociais – não apenas dos processos técnicos de produção – mas também incluída a preservação ambiental [...] implicam esforços articulados de sujeitos estatais, da sociedade civil e do capital [...]; a lógica do desenvolvimento local necessita do surgimento e fortalecimento de  sujeitos inscritos em seus territórios e com capacidade de iniciativa e proposta socioeconômica que capitalize as potencialidades locais (TENÓRIO, 2004, p. 2).

 

O comprometimento socioambiental com a realidade local possibilita transformações que podem levar à melhoria das condições gerais de uma comunidade, cujos resultados serão a melhoria da qualidade de vida e o cuidado com a natureza. E,   conforme colocam Battassini; Costa (2009, p.14):      

Para tornar a educação ambiental um instrumento de desenvolvimento local é necessário a formação de uma nova consciência através do conhecimento e da reflexão sobre a Educação Ambiental e social. Está voltada para o desenvolvimento de atitudes e condutas que favoreçam o exercício da cidadania, a conservação do meio ambiente e a promoção da saúde e do bem-estar.         

Para a consecução deste intento, no âmbito da educação ambiental, torna-se urgente e necessário oferecer mais formação e informações para capacitar os sujeitos, pois Dias (2010, p.16) completa: “a educação ainda treina a (o) estudante para ignorar as consequências ecológicas dos seus atos”.

A escola é uma instituição inserida no contexto social, portanto, é uma unidade que também provoca impactos ao meio ambiente; contribui com o crescimento dos problemas ambientais por gerar lixo, esgoto, pelo consumo e desperdício de energia e de água. Estes já são grandes motivadores para se pensar estratégias permanentes de educação ambiental com ações práticas, capazes de transformar a escola de forma que esta contribua para o consumo consciente, à correta destinação dos resíduos, ampliando o resultado deste processo com desenvolvimento local.

 

Outro motivo, esse percebido nas experiências das autoras na execução de projetos de educação ambiental em escolas públicas como professoras e, na coordenação, como pedagogas, é que existe um efeito multiplicador nas crianças e adolescentes, ou seja, estes educam e cobram de seus familiares comportamentos mais responsáveis em relação ao meio ambiente.

 

 

3 Noções e perspectivas da Gestão social

A gestão social, na sua essência, nega a existência de enfoques prescritivos e indicava variadas práticas sociais entre organizações governamentais, na sociedade civil, em movimentos sociais e empresariais. Na atualidade, tem adquirido solidez, “passando a representar um modo especial de problematizar e gerir realidades sociointeracionais complexas” (BOULLOSA; SCHOMMER, 2009, p.1).

É um modelo de gestão no qual o Estado revê sua suposta primazia na condução de processos de gestão e assume uma complexidade de atores e de interesses, como protagonistas dos próprios processos de elaboração e execução das políticas públicas.

Neste caminho, o público se constitui como um espaço de interação entre os diversos interesses que podem ser articulados na definição de valores e aspirações em comum, que na colocação de Boullosa; Schommer (2009, p.1):

O processo de construção da gestão social, como alternativa de governança e de relação entre atores, evidencia o propósito de avançar no sentido da democratização nas relações sociais, por meio de participação e engajamento de diversos atores em decisões e práticas que privilegiam a dimensão dialógica e relacional da gestão.

Este modelo contrapõe-se a modos de gestão fundados em hierarquia, controle e racionalização, que são característicos da gestão privada e da gestão pública tradicional. Constitui-se como construção estratégica capaz de dar sentido e reconhecimento a experiências localizadas e dispersas.

Nesse sentido, os processos de transformação social são conduzidos por diversos atores e interesses; são definidos em processos próprios que permitem conceituar e contextualizar experiências de gestão. Esta se desenvolve e se afirma segundo uma dinâmica particularizada, pois absorve e reelabora experiências de diferentes escalas e contextos  específicos, mas sem desprezar a questão técnico-gerencial, incorporando do mundo privado a racionalidade, contudo, preservando sua essência (BOULLOSA; SCHOMMER, 2009).

Cançado; Tenório (2011) argumenta que gestão social não significa negar a razão, mas sim utilizá-la a partir do consenso alcançado por uma ação social baseada não somente na estratégia, mas, sobretudo, na comunicação e no diálogo, em espaços nos quais todos compartilham o direito à fala, à participação nas decisões e sobre objetivos e meios para atingi-los. E, de acordo com (CANÇADO; TENÓRIO 2011, p.17):

A gestão social é apresentada como a tomada de decisão coletiva, sem coerção, baseada na inteligibilidade da linguagem, na dialogicidade e no entendimento esclarecido como processo, na transparência como pressuposto e na emancipação enquanto fim último.

 

Assim, a gestão social é entendida como processo dialógico em que a autoridade decisória é compartilhada entre os participantes da ação.

A gestão social na escola perpassa um caminho dialógico que deve contemplar as dimensões pedagógicas, políticas e administrativo-financeira, consubstanciada pela participação efetiva de todos no processo de tomada de decisão. Este processo requer o respeito às diferenças de cada segmento da comunidade escolar, bem como a preservação da sua autonomia.

O mais importante é o comprometimento com as questões e problemas que afligem a comunidade escolar,  ampliando sua visão de mundo e possibilitando-lhes agir no sentido de resolver os problemas e transformar realidades.

Neste contexto, a educação ambiental para a sustentabilidade extrapola o aspecto naturalista e incorpora saberes e fazeres que possam ter articulação em todas as disciplinas, servindo de base para experiências locais de desenvolvimento a partir da gestão social dos conhecimentos.

 

 

4 Gestão Social, Educação ambiental e Desenvolvimento Local – articulações possíveis

 

A perspectiva local enfoca a dinâmica particular do espaço, buscando entender como a história, a cultura, a territorialidade e as relações de proximidade influenciam no desenvolvimento. A ênfase na participação, por sua vez, ressignifica a prática do desenvolvimento que, no lugar de ser conduzida de maneira verticalizada, como consequência de políticas centralizadoras e afastadas das necessidades da população, passa a ser gerenciada coletivamente através de um processo de responsabilização dos diferentes sujeitos sociais, que envolve escolhas e decisões feitas a partir de uma articulação entre o local e o global, entre o indivíduo e o coletivo e entre as diferentes esferas sociais - Estado, mercado e sociedade civil organizada (ANDION, 2003) .

O modelo de desenvolvimento com base local e sustentável implica na formação e na educação da própria comunidade em matéria de cultura, capacidades, habilidades e competências que permitam a ela mesma agenciar e gerenciar todo o processo de desenvolvimento da localidade, ao invés de apenas participar (BATTASSINI; COSTA, 2009).

O importante é, principalmente, promover a iniciativa de desenvolvimento local autoproduzido, que no caso específico da escola, poderá promover iniciativas que levem à preservação do meio ambiente, desenvolvimento social e cultural, à melhoria da qualidade de vida e até de geração de recursos para comunidade escolar e seu entorno. Este processo serve de veículo condutor de experiências para o enfrentamento da pobreza e da marginalização, de forma mais sustentável e consistente, não de forma assistencialista (TENÓRIO, 2004).

Portanto, a gestão do desenvolvimento local se concretiza com o social, isto é, tendo-se a cidadania inserida em todas as etapas de planejamento, execução e avaliação do desejado e buscando, de fato, resolver os problemas que a comunidade enfrenta.

Devem-se fomentar atitudes que levem às crianças a se apropriarem da localidade em que vivem e, através do conhecimento organizado, dando sentido ao aprendizado, conforme coloca Dowbor (2007, p. 79):

Ao estudarem de forma científica e organizada a realidade que conhecem por vivência, mas de forma fragmentada, as crianças tendem a assimilar melhor os próprios conceitos científicos, pois é a realidade delas que passa a adquirir sentido.

É através do local que se percebe melhor os problemas, criam-se alternativas, aproveitam-se potencialidades. A escola tem um papel central a desempenhar neste plano, pois se constitui como uma articuladora entre as necessidades do desenvolvimento local e os conhecimentos correspondentes para assegurar instrumentos de intervenção (Dowbor, 2007).

Não há como fugir do compromisso que todos os cidadãos têm com o meio ambiente. No que tange ao compromisso da escola, contribuir para a melhoria da educação, especialmente com a educação ambiental, não é apenas obrigação legal, mas uma postura ética, pois  “precisamos construir uma geração de pessoas que entendam efetivamente o meio onde estão inseridos” [...] (DOWBOR, 2007, p.88).

 

 

Educação ambiental nos documentos oficiais e a realidade evidenciada por um estudo de caso

 

A PNEA regulamentou a educação ambiental como um componente essencial e permanente para estar presente, de maneira articulada nos níveis e modalidades do processo educativo, cuja incumbência de promovê-la, integradamente, é dada às instituições de ensino nos seus projetos institucionais e pedagógicos.

No entanto, um estudo de caso, realizado em uma escola pública de Belo Horizonte- MG, demonstrou que as diretrizes para a educação ambiental para o Ensino Fundamental, constantes dos documentos como: Conteúdos Básicos Comuns – CBC’s (diretrizes curriculares mineiras), Projeto de Desenvolvimento Pedagógico Institucional - PDPI (diretrizes pedagógicas da instituição pesquisada), relacionam-se às disciplinas de Geografia e Ciências.

Apesar dos esforços para inserir a educação ambiental no conjunto de conteúdos do currículo mineiro, ainda não tem sido suficiente. A educação ambiental prevista no CBC’s não é uma prioridade e nem se configura como uma perspectiva em torno de um projeto de educação com vista ao atendimento dos anseios da sociedade. Ainda, deixa de atender às prerrogativas da Lei 9795/99, uma vez que não se configura como componente essencial e permanente da educação, de forma multi, inter e transdisciplinar.

Isso se materializa também na constituição dos conteúdos obrigatório e complementares, pois muitas propostas de educação ambiental encontram-se nos conteúdos complementares (não obrigatórios), o que cria uma desobrigação no desenvolvimento dos mesmos. Seria necessário buscar uma abordagem curricular que levasse à conscientização, à formação de sujeitos críticos; que permitisse a apropriação do saber social para apreensão dos saberes historicamente produzido e que, principalmente, permitisse o efetivo exercício da cidadania (OLIVEIRA, 2009).

No que se refere ao projeto pedagógico da escola, as orientações da PNEA não estão presentes, de maneira que este tenha uma abordagem curricular que enfatize a natureza como fonte de vida; que relacione a dimensão ambiental à justiça social, aos direitos humanos, à saúde, ao trabalho, ao consumo e a de todas as formas de discriminação e injustiça social.

A educação ambiental está inserida no projeto pedagógico como parte de um “projeto guarda-chuva” que abriga todos os demais projetos da escola. Não há uma abordagem integrada e transversal, contínua e permanente em todas as disciplinas e entre elas para o desenvolvimento da temática, conforme pressupostos da PNEA.

Na pesquisa de campo, que teve como instrumento de coleta de dados as entrevistas a docentes e equipe pedagógica e questionários para os discentes, a análise dos dados demonstraram percepções diferentes quanto à educação ambiental oferecida. Enquanto a equipe pedagógica e os docentes supõem ofertar uma educação ambiental efetiva, 82% dos discentes respondeu que não considerava eficiente e, quando perguntados sobre as ações de educação ambiental desenvolvidas pela escola, 47% não percebiam nenhuma; dos 53% restantes, 30% responderam sobre colocação de “placas para separação do lixo”; 21%  o incentivo a não poluir a natureza; 2% economia de água.

O curioso é que, apesar da maioria dos 53% responderam sobre as placas do lixo, as lixeiras de coleta seletiva ficam em local de pouca circulação e não há destinação correta para os resíduos produzidos pela escola.

Nas afirmativas de alguns professores e equipe pedagógica sobre a importância da educação ambiental como exercício diário, os dados apontaram para práticas descontextualizadas das perspectivas da PNEA, pois tinham caráter sazonal, não contemplavam a inter e a transdisciplinaridade e abrangiam aspectos naturais.

Esta colocação foi ratificada por alguns entrevistados sobre a periodicidade dos projetos, conforme resposta a seguir: “Sim, relacionado com os conteúdos de Ciências e Artes onde as professoras desenvolvem o trabalho e também relacionado às datas comemorativas, onde desenvolvem o projeto de sustentabilidade (suj. 3).

Diante destes dados, as conexões possíveis entre educação ambiental e o desenvolvimento local não se estabeleceram. Na verdade, a instituição pesquisada desconhece as perspectivas que a educação, como um todo, pode usufruir ou contribuir para o desenvolvimento local e vice-versa.

A instituição conta com iniciativas isoladas de educação ambiental e necessita redimensionar sua gestão, com vistas a atender demandas locais; buscar soluções coletivas; dar voz a todos os sujeitos, chamando à participação os que não se envolvem. Ou seja, deve buscar na gestão social um modelo de gerenciamento mais participativo para permitir que o processo decisório seja exercido por meio de diferentes sujeitos sociais, de maneira que haja educação ambiental efetiva e que resulte em desenvolvimento.

 

 

Considerações finais

 

No mundo atual, os estudiosos da educação e dos sistemas escolares, de certa forma, consideram que é universal a necessidade de entender a função e o papel da escola frente aos novos desafios sociais. Há um consenso sobre as demandas para a educação: propiciar aos alunos condições de entendimento das novas condições do mundo do trabalho; desenvolver instrumentos para a compreensão da vida cotidiana; proporcionar condições para que os alunos, como pessoas, possam construir a identidade social e política como condição de exercício da cidadania, ampliando a visão de mundo, promovendo e cultivando o direito à diversidade como qualificações para a vida social.

E o que dizer do meio ambiente na escola? A educação ambiental, como as demais áreas de conhecimento, pode assumir uma parte ativa de um processo intelectual a serviço da comunicação, do entendimento e da solução dos problemas. Trata-se de um aprendizado social, baseado no diálogo e interação em constante processo de recriação e reinterpretação de informações, conceitos e significados, que podem se originar do aprendizado em sala de aula ou da experiência pessoal e coletiva do aluno.

A escola pode se transformar no espaço onde o aluno poderá analisar a natureza dentro de um contexto entrelaçado de práticas sociais, como componente de uma realidade mais complexa e multifacetada e evitar a simplificação da educação ambiental, na qual há uma relação pouco articulada entre os indivíduos e o meio ambiente.

Infelizmente, as práticas de educação ambiental desenvolvidas pela escola estudada problematizam pouco as causas e consequências dos problemas ambientais; não estabelecem relações entre estas e as decisões políticas e econômicas tomadas pelos governos; não situam o indivíduo como responsável cotidiano pela melhoria das condições ambientais da sua casa, do seu quintal, do seu bairro, da sua escola; enfim, do mundo como um todo.

As mudanças preteridas, a partir da incorporação de novos valores, hábitos e atitudes, requerem o protagonismo da escola, como parte de um esforço para o alcance de tais proposições, envolvendo um processo de aprendizagem social, ambientalmente orientada, cuja implicação é o reconhecimento do meio ambiente como um bem público e o entendimento de que o acesso a um ambiente saudável e à qualidade de vida se constitui como um direito, mas também um dever de todos os cidadãos.

 

Referências

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Ilustrações: Silvana Santos