Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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07/12/2014 (Nº 50) O QUE DIZEM PROFESSORES DE CIÊNCIAS NATURAIS SOBRE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL?
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O QUE DIZEM PROFESSORES DE CIÊNCIAS NATURAIS SOBRE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL?

 

Gardênia de Sousa Ferreira1 e Darlene Teixeira Ferreira2

 

1Licenciada em Ciências Naturais, Faculdade de Ciências Naturais, Campus do Marajó – Breves, Universidade Federal do Pará. Conjunto Bandeirantes, Avenida Anajás, s/n. Aeroporto. CEP 68800-000, Breves, PA, Brasil. Telefone/fax: 91 3783 1129.E-mail:gardeferreira@hotmail.com

2Mestre em Educação em Ciências. Faculdade de Ciências Naturais, Campus do Marajó – Breves, Universidade Federal do Pará. Conjunto Bandeirantes, Avenida Anajás, s/n. Aeroporto. CEP 68800-000, Breves, PA, Brasil. Telefone/fax: 91 3783 1129. E-mail: darfei1@yahoo.com.br

 

RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi investigar as concepções dos professores de Ciências que atuam nas séries finais do ensino fundamental em escolas do município de Breves, localizado no Arquipélago do Marajó, sobre desenvolvimento sustentável e seus múltiplos aspectos (econômico, ambiental, cultural, social) e verificar se os professores conhecem a Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável. Na busca desses objetivos solicitamos a 10 professores de ciências que respondessem a um questionário com cinco perguntas. As respostas foram organizadas e analisadas com base nos princípios da analise de conteúdo. Os resultados indicaram que os professores possuem conhecimentos sobre desenvolvimento sustentável, no entanto possuem dificuldades de articular discussões baseadas na multiplicidade de dimensões atreladas ao termo, utilizando em geral, duas dimensões, a saber: econômica e ambiental e ainda desconhecem a década.

Palavras-chave: Educação; Ensino de Ciências; Desenvolvimento Sustentável.

Introdução

A partir doséculo XIX, principalmente com a revolução industrial, as intervenções humanasna natureza têm assumido contornos de realidade preocupante para toda asociedade, dada a aceleração das transformações que elas provocam. Essa relação entre seres humanos e natureza, ao longo dos tempos, tem semostrado impactante para a natureza (SANTOS, 2008), pois segundo Leis (2001), as ações antrópicas estão acelerando os processos de instabilidades dos sistemas naturais, ocasionando uma desordem global dabiosfera.

Dado esse cenário, surgiu a necessidade de se repensar o modelo dedesenvolvimento pautado na exploração exarcebada dos recursos naturais. Nabusca de alternativas para reverter ou minimizar os efeitos da crise socioambiental epropagar estratégias que integrassem desenvolvimento econômico e proteçãoambiental, em 1983, a Organizações das Nações Unidas (ONU), instituiu aComissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), formada porrepresentantes de governos, Organizações Não-Governamentais (ONGs) ecomunidade científica de vários países (SCOTTO; CARVALHO; GUIMARÃES, 2009;SACHS, 2007; AFONSO, 2006).

Durante quatro anos essa comissão realizou estudos que buscavam relacionar os problemas ambientais e o modelo de desenvolvimento pautado na exploração crescente dos recursos naturais e, ainda, objetivava propor um novo caminho para o desenvolvimento. Em 1987, a Comissão concluiu seus trabalhos e divulgou odocumento intitulado Our common future (“Nosso Futuro Comum”). Esse trabalho foi presidido pela então primeira ministra da Noruega, Gro Harlen Brundtland, razão pela qual o documento ficou conhecido como Relatório de Brundtland (SCOTTO;CARVALHO; GUIMARÃES, 2009). O documento apresenta a definição dedesenvolvimento sustentável, como sendo aquele capaz de “[...] satisfazer asnecessidades das gerações presentes, levando em consideração as necessidadesdas gerações futuras” (CMMAD, 1991, p. 46).

Apesar da notoriedade e do alcance do conceito de Desenvolvimento Sustentável foi somente em 1992, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), conhecida como a Conferência Rio 92, realizada no Rio de Janeiro, que as discussões acerca de estratégias capazes de interromper ou reverter os efeitos da degradação ambiental tiveram inicio (AFONSO, 2006). Ainda nesse evento, 173 chefes de estado e de governo aprovaram o documento intitulado Agenda 21 Global, que preconiza mudança nos padrões de desenvolvimento para as próximas décadas, ou seja, a perspectiva era colocar o mundo na rota do desenvolvimento sustentável, um compromisso com as futuras gerações.

No âmbito educacional a Agenda 21, em seu capítulo 36, destaca a educação como principal instrumento para fomentar o Desenvolvimento Sustentável. Segundo o documento o

[...] ensino tem fundamental importância na promoção do desenvolvimentosustentável e para aumentar a capacidade do povo para abordar questõesde meio ambiente e desenvolvimento [...]. O ensino é também fundamentalpara conferir consciência ambiental e ética, valores e atitudes, técnicas ecomportamentos em consonância com o desenvolvimento sustentável e quefavoreçam a participação pública efetiva nas tomadas de decisões (CONFERÊNCIA, 1997, p. 533-534).

Para reforçar ainda mais o papel da educação na busca da sustentabilidade planetária, a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) lançou a Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável (DEDS), instituída em dezembro de 2002 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, compreendendo o período de 2005-2014. Para Gadotti (2008), a DEDS representa uma oportunidade de mudança nos currículos dos sistemas formais de ensino e se constitui ainda em um meio de realização do que foi proposto no capítulo 36 da Agenda 21 Global.

Então, consideramos que se a educação é fundamental na construção de um modelo de desenvolvimento que seja sustentável, e para isso os professores precisam estar preparados para discutir questões relacionadas ao tema. A intenção maior dessa pesquisa foi investigar as concepções dos professores de Ciências que atuam nas séries finais do ensino fundamental na rede de ensino público, no município de Breves, Arquipélago do Marajó, sobre desenvolvimento sustentável, identificar os aspectos (econômico, ambiental, cultural, social) ressaltados pelos professores durante as suas aulas quando abordam questões relacionadas ao desenvolvimento sustentável e verificar se os professores conhecem a Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável.

Ressaltamos que temas relacionados ao meio ambiente devem ser tratados de forma interdisciplinar, ou seja, devem ser discutidos em todas as disciplinas buscando abordar diferentes aspectos de um mesmo tema. Neste trabalho optamos em investigar apenas a concepções de professores de Ciências, por ser nossa área de atuação.

O ensino de ciências no contexto da DEDS

Todos os conteúdos curriculares da disciplina Ciências possuem relação direta ou indireta com temas socioambientais. Esse fato possibilita que o professor, ao apresentar conteúdos de Ciências, estabeleça conexões com o cenário socioambiental vigente oportunizando também discussões e reflexões sobre o modo de vida predatório da nossa espécie, mencionando a necessidade de adotar um modelo de desenvolvimento que seja sustentável.

Essas conexões podem contribuir de forma significativa para a formação de cidadãos críticos e atuantes em uma sociedade, marcada por uma crise ambiental (LEFF, 2002), pois favorecem uma compreensão mais complexa do estado do nosso planeta e possibilitam discussões relacionadas à sustentabilidade. Ademais, as questões socioambientais representam, ultimamente, motivo de preocupação para todas as sociedades e não podem ser excluídas do processo educativo. De acordo com Leff (2002, p.60),

[...] a crise ambiental problematiza os paradigmas estabelecidos do conhecimento e demanda novas metodologias capazes de orientar um processo de reconstrução do saber que permita realizar uma análise integrada da realidade.

Além disso, o professor pode incluir nas discussões questões relacionadas ao desenvolvimento da Ciência e da Tecnologia e as implicações desse desenvolvimento para a sociedade ressaltando que a ciência aliada a tecnologia trouxe muitos benéficos para sociedade, mas que também causa uma série de transtornos ao meio ambiente.

Discussões relacionadas às causas e às consequências da crise ambiental desviam o ensino das Ciências Naturais do caminho mais comumente utilizado que reside no “[...] enfoque abstrato, quantitativo, rigoroso, que suscita no dia-a-dia da sala de aula, um caráter demasiadamente acadêmico e distante das experiências dos alunos [...]” (PINHEIRO; MATOS; BAZZO, 2007, p. 151). Esse enfoque dificulta a percepção da importância dessa disciplina pelos estudantes.

Além disso, temos a considerar que a disseminação dos conhecimentos produzidos pela ciência não ocorre exclusivamente no ambiente escolar e nem é exclusividade de nenhuma camada da sociedade (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNABUNCO, 2009). Logo, os estudantes têm acesso a esses temas em diferentes ambientes e de diversas formas, cabendo aos professores utilizar os conhecimentos prévios apresentados em sala de aula para aprofundar as discussões.

Consideramos que ao incluir temáticas que possibilitem discussões relacionadas às questões referentes ao desenvolvimento sustentável em seus múltiplos aspectos, a escola estará contribuindo para uma leitura mais crítica das informações divulgadas pelos meios de comunicação. Essas discussões fazem emergir também a dualidade do conhecimento científico, pois é comum tornar evidente os benefícios alcançados pelo desenvolvimento científico, mas é incomum ressaltar todos os prejuízos que podem decorrer desse desenvolvimento.

Pensa-se na evolução dos meios de comunicação, na produção de novos aparelhos eletroeletrônicos, mas deixam-se de lado, por exemplo, a poluição dos rios, dos mares, do ar, do solo provocadas por produtos químicos utilizados e descartados no processo de produção. No entanto, essa percepção só será possível se o estudante tiver acesso a uma educação científica de qualidade, que possibilite a realização de discussões sobre as implicações da ciência e do modelo de crescimento adotado pela nossa sociedade.

Carvalho Filho (2009, p. 99) destaca que há

[...] razões adicionais para reforçar a tese de que uma formação científica é cada vez mais necessária. A sociedade atual é constantemente exposta aprodutos, processos e serviços intensivos em conteúdo científico-tecnológico. Vários deles podem afetar a saúde e o meio ambiente.

Assim, a associação entre os conteúdos disciplinares e os fenômenos relacionados à crise ambiental possibilitará aos educandos perceber que há uma finalidade maior nos conceitos e definições apresentados durante as aulasde ciências. Desse modo, serão capazes de compreender que a memorização e a repetição não são os objetivos da disciplina Ciências, e que, na verdade, ela serve para auxiliar na compreensão do funcionamento do mundo, tornando-o mais inteligível.

Caminhos da Pesquisa

A pesquisa ora apresentada insere-se na modalidade qualitativa que de acordo com Minayo (2011, p. 21), “[...] responde a questões muito particulares [...]”, uma vez que “[...] trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes”. A população da pesquisa foi constituída por professores de Ciências Naturais que atuam nas séries finais do ensino fundamental em escolas do município de Breves, Arquipélago do Marajó, Pará. Participaram desta pesquisa 10 professores. Utilizamos como critério para selecionar os professores apenas o interesse do professor em colaborar com a pesquisa.

Os professores que aceitaram participar assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE que é um termo no qual o participante deve atestar que está ciente e esclarecido quanto aos principais aspectos da pesquisa, como objetivos, e possíveis riscos, contribuições, etc. (OLIVEIRA, 2008, p. 83).

Como garantimos o sigilo acerca da identidade dos professores, os mesmos terão suas falas apresentadas nos resultados indicadas pela letra P de professor, seguida de números de 1 a 10. Os dados coletados através do questionário foram analisados de acordo com os princípios da análise do conteúdo, proposto por Bardin (2011).

Resultados e Discussões

As respostas dos professores foram organizadas em cinco categorias, elaboradas a partir da ideia central de cada pergunta. Assim, apresentamos as respostas em quatro categorias, a saber: 1) Desenvolvimento Sustentável é...; 2) Desenvolvimento sustentável nas aulas de Ciências; 3) As dimensões do desenvolvimento sustentável; e 4) A Década da Educação para o desenvolvimento sustentável.

Desenvolvimento Sustentável é...

Quando perguntamos aos professores o que é Desenvolvimento Sustentável obtivemos as seguintes respostas: para P3 DS

é utilizar os recursos naturais de forma racional, de modo que não se esgote, para que as gerações futuras possam vir a usufruir do mesmo. Atendendo as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras.

Já P5 afirmou que DS “é o processo pelo qual busca-se suprir as necessidades de um povo sem comprometer as necessidades das gerações futuras. É o desenvolvimento que não esgota os recursos para o futuro”.

 Para P4 o DS “É o caráter consciente das pessoas em relação ao desenvolvimento partindo do trabalho devidamente planejado e dentro dos parâmetros legais em relação ao aspecto ambiental”. Na concepção de P6, tal noção é referente “[...] A questão de utilizar os recursos disponíveis no meio ambiente de forma racional”.

Constatamos que todos os professores apresentaram respostas próximas a definição apresentada pelo relatório “Nosso Futuro Comum”, ou seja, indicaram que o Desenvolvimento Sustentável é aquele que se preocupa em desenvolver respeitando os limites da natureza e o direito das gerações futuras usufruírem também dos recursos naturais. As respostas satisfatórias podem ser explicadas pelo fato do termo ser bastante divulgado, principalmente pelos meios de comunicação.

Já em 1968, o Clube de Roma, formado por um grupo de economistas e cientistas começaram a advertir a humanidade sobre os perigos do ritmo acelerado do “crescimento” (Meadows, 2010). Assim, podemos destacar que na década de 60 já existiam preocupações com o modelo de desenvolvimento, pois já havia indícios que esse modelo poria em risco a sobrevivência dos seres vivos. De acordo com Gadotti (2008) a ideia de desenvolvimento sustentável também esteve presente na Conferência de Estocolmo, realizada em 1972, na Suécia.

Consideramos que o fato dos professores de ciências conhecerem o significado do termo já é um importante passo para introdução de questões relacionadas ao tema em sala de aula.

Desenvolvimento sustentável nas aulas de Ciências

Perguntamos aos professores de ciências se durante as suas aulas abordavam questões relacionadas ao DS, solicitando que se a resposta fosse positiva o professor descrevesse de que forma ele realizava essa abordagem. Dos 10 professores que responderam ao questionário 9 afirmaram que sim, e apenas 1 disse que apenas em algumas ocasiões.

Entre os professores que disseram abordar questões relacionadas a DS encontramos diferentes formas de abordagem. O P1 afirmou que aborda em “conversas e orientações sobre as ações dele no seu cotidiano” e ressaltou que faz isso apenas com os alunos da 5ª série, pois “[...] faz parte do conteúdo deles”. O fato de abordar questões relacionadas ao DS apenas na série que possui conteúdo com vínculo direto com o tema indica dificuldades em realizar articulações com outros conteúdos de ciências e uma percepção limitada acerca da ideia de DS.

Acreditamos que no ensino de ciências é mais fácil realizar essas articulações independente do conteúdo, pois a crise ambiental que desencadeou as discussões sobre DS é marcada pela destruição dos recursos naturais, que acelerou e continua acelerando as transformações ambientais ocasionado desequilíbrio de diferentes ordens. Esses processos de desequilíbrios podem ser explicados através dos conteúdos de ciências. Portanto, consideramos que a aliança entre os conteúdos e o contexto socioambiental favorecer o processo de ensino e de aprendizagem, posto que o conhecimento científico apresenta papel fundamental na resolução dos problemas socioambientais. Ademais, de acordo com a UNESCO (2003, p. 34) a educação em ciências “[...] é um requisito fundamental da democracia e também do desenvolvimento sustentável”. 

O P3 respondeu da seguinte forma: “eu abordo questões sobre DS em minhas aulas quando através da aula expositiva dialogada eu abordo assuntos como: cuidado com o corpo e com a mente, como agir no meio ambiente, como reutilizar materiais recicláveis. Saúde, qualidade de vida, a importância e a valorização da água, consumo consciente dos recursos naturais”. O P3 apresentou um exemplo de como abordar em sala de aula questões relacionadas a DS sem utilizar uma infinidade de recursos. Enquanto o P5 afirmou que “no ensino de Ciências é impossível não trabalhar a questão do desenvolvimento sustentável, pois a maioria dos assuntos enfatiza o tema”.

Notamos na resposta de P5 que há uma compreensão mais complexa da diversidade de tema relacionados ao DS, além da compreensão da intensa relação dos conteúdos de ciências com as ações necessárias para a implentação desse modelo de desenvolvimento. P10 complementando as ideias de P5 destacou que é possível abordar questões relacionadas a DS “relacionando o conteúdo estudado com a realidade do aluno, mostrando que é possível utilizar os recursos que a natureza oferece sem prejudicá-la”.

Notamos que os professores são sensíveis aos acontecimentos ambientais, e isso é fundamental para provocar as mudanças necessárias nas aulas de Ciências. Nesse sentido Amaral (2007, p. 113) afirma que

O processo de complexidade dos temas ambientais na sociedade obriga a reorientação dos temas escolares, pois necessitam de uma dinâmica pedagógica interdisciplinar de abordagem crítico-social e histórica. Essa postura metodológico-pedagógica estabelece uma nova ética entre o sujeito e o seu meio, porque a ele também é imputada a responsabilidade da ação, da prevenção e da solução de problemas ambientais, já que é visto como parte integrante do meio ambiente e não mais como seu dominador.

 As dimensões do desenvolvimento sustentável

Quando perguntamos aos professores sobre os aspectos (ambiental, social, cultural, econômico e político) que ressaltam quando falam em DS durante as suas aulas encontramos as seguintes respostas: Os professores P3, P4, P7, P9 e P10 ressaltaram que enfatizam apenas os aspectos ambiental e social. P9 ressaltou que esses aspectos “[...] estão interligados e não é possível separá-los”. Interessante que o professor destaca conexão entre esses dois aspectos e exclui a íntima relação que os aspectos cultural, econômico e político possuem com os aspectos ambiental e social. A ocorrência maior de respostas apontando os referidos aspectos pode está relacionado a ideia que a destruição dos recursos naturais afeta apenas o ambiente natural.

O Relatório Nosso Futuro Comum alerta que tratar apenas das questões ambientais seria ocultar os reais problemas do meio ambiente. Isso porque não existe nenhum campo que esteja dissociado das ações, das aspirações e das necessidades humanas (Comissão, 1991), daí a necessidade de considerar todas as dimensões envolvidas em questões relacionadas ao meio ambiente (social, ambiental, econômica, cultural, ética, política, entre outras).

P8 afirmou que enfatiza o aspecto ambiental e o econômico, como podemos atestar em sua fala “os aspectos mais citados são o ambiental, relacionado a essa questões da preservação dos recursos naturais e econômico voltado para a questão da utilização dos recursos naturais de forma a garantir a sobrevivência da população, mas sem prejudicar o meio em que está inserida”. As considerações de P8 são pertinentes, pois se ultimamente discute-se a necessidade de um novo modelo de desenvolvimento que consiga conjugar crescimento econômico e proteção ambiental,  é porque se constatou que um modelo de desenvolvimento pautado na exploração desordenada dos recursos naturais em algum momento tende a se tornar inviável, pois os recursos naturais são finitos.

O P1 e P2, afirmaram que enfocam os aspectos ambiental, social e econômico. Esses professores indicam possuir uma visão mais ampla do DS. Os três aspectos apontados por eles são os que mais comumente são identificados no conceito de DS. De acordo com a UNESCO (2005) esses aspectos foram ratificados na Cúpula de Joanesburgo, passando a ser considerados os três pilares do DS, dando forma e conteúdo ao aprendizado sustentável.

No âmbito social precisamos ter a “[...] a compreensão das instituições sociais e do papel que desempenham na mudança e no desenvolvimento, assim como nos sistemas democráticos e participativos que dão a oportunidade de expressar opiniões, eleger governos, criar consensos e resolver controvérsias” (UNESCO, 2005, p. 39); no aspecto ambiental a UNESCO (2005, p. 39), destaca que é preciso desenvolver a “[...] consciência dos recursos e da fragilidade do meioambiente físico e dos efeitos das atividades e decisões humanassobre o meio ambiente, com o compromisso de incluir as questõesambientais na elaboração das políticas sociais e econômicas” e no aspecto econômico, a UNESCO (2005, p. 39), é necessário desenvolver a “[...] consciência em relação aos limites e ao potencial docrescimento econômico e seus impactos na sociedade e no meioambiente, com o compromisso reduzir os níveis de consumo individuale coletivo, em relação à preocupação com o meio ambientee a justiça social”.

De acordo com a UNESCO (2005) a sociedade, o meio ambiente e a economia passam por frequentes transformações em longo prazo e o DS é um conceito dinâmico que reconhece que a sociedade humana está em constante transformação. É necessário destacar ainda que

A interdependência dessas destas três áreas e o desenvolvimento sustentável se fundamentam na dimensão cultural. A cultura, que consistenos modos de ser, de se relacionar, de se comportar, de acreditar aagir, que diferem de acordo com o contexto, a história e a tradição, noâmbito da qual o ser humano vive sua vida. Isto equivale reconhecerque as práticas, a identidade e os valores – o “programa informático”do desenvolvimento humano – exercem papel importante na escolhadas orientações e compromissos comuns (UNESCO, 2005, p. 39).

Ainda de acordo com a UNESCO (2005) a ênfase aos aspectos culturais no processo de DS e nos objetivos da educação para DS contribui para destacar, entre outras coisas, a importância de

• reconhecer a diversidade: a riqueza da experiência humana emmuitos contextos físicos e socioculturais do mundo;

• aumentar o respeito e tolerância em relação às diferenças: quandoo contato com os outros se torna enriquecedor, estimulante esuscite reflexão;

• reconhecer os valores em um debate aberto, com o compromissode manter o diálogo;

• integrar tanto na vida privada quanto na vida institucional valoresde respeito e dignidade inerente ao desenvolvimento sustentável;

• fortalecer a capacidade humana em todos os aspectos relativosao desenvolvimento sustentável; e

• reconhecer e trabalhar com enfoques da natureza, da sociedadee do mundo que se referem especificamente a uma cultura emvez de ignorá-los ou destruí-los, conscientemente ou inadvertidamente,em nome do desenvolvimento (UNESCO, 2005, p. 39-40).

São principalmente esses três aspectos que devem definir a forma e o conteúdo relacionado a aprendizagem pautada nos principio do DS. Para Sachs (2008, p. 36),

O desenvolvimento sustentável obedece ao duplo imperativo ético da solidariedade com as gerações presentes e futuras, e exige a explicitação de critérios de sustentabilidade social e ambiental e de viabilidade econômica. Estritamente falando, apenas as soluções que considerem estes três elementos, isto é, que promovam o crescimento econômico com impactos positivos em termos sociais e ambientais, merecem a denominação de desenvolvimento.

O P5 e o P6 afirmaram que enfocam todos os aspectos (ambiental, social, cultural, econômico e político). Apesar da UNESCO (2005) apontar apenas os aspectos ambiental, social e econômico como sendo os pilares do DS, Sachs (2008) destaca outros aspectos além desses, são eles

Social, fundamental por motivos tanto intrínsecos quanto instrumentais, por causa da perspectiva de disrupção social que paira de forma ameaçadora sobre muito lugares problemáticos do nosso planeta; Ambiental, com suas dimensões [...]; Territorial, relacionado à distribuição espacial dos recursos, das populações e das atividades; Econômico, sendo a viabilidade econômica a conditio sine qua non para que as coisas aconteçam; Político, a governança democrática é um valor fundador e um instrumento necessário para fazer as coisas acontecerem; a liberdade faz toda a diferença (Sachs, 2008, p. 15-16).

A Década da Educação para o desenvolvimento sustentável.

Quando perguntamos se os professores conheciam a DEDS, obtivemos a seguinte resposta: dos 10 professores que responderam ao questionário 7disseram que não conheciam a DEDS e 3 afirmaram conhecer, sendo que P5 afirmou que a DEDS “ é um conjunto de atividades que visa buscar o compromisso prático e coletivo de aprender  a viver de forma sustentável, integrando a educação e a aprendizagem na busca comum pelo desenvolvimento sustentável”, para P6 a DEDS “é a preocupação dos órgãos competentes em trabalhar de forma intensiva tanto nas escolas como na comunidade em geral o tema desenvolvimento sustentável, procurando reverter muitas questões atuais sobre recursos que estão se esgotando no meio ambiente”. O P4 disse “já ouvi falar, mas não tenho leitura sobre o assunto”.

Como podemos constatar a maior parte dos professores não conhece a Década. Isso claro interfere nos resultados esperados para a Década. Se os professores, principais agentes responsáveis pela efetivação dos princípios da Década não possuem as informações necessárias para aproximar os preceitos do DS dos conteúdos de suas disciplinas, os objetivos não serão alcançados. 

De acordo com a UNESCO (2005, p. 57),

O objetivo maior da Década é integrar princípios, valores, e práticas de desenvolvimento sustentável em todos os aspectos da educação e do ensino. Esse esforço educacional deveencorajar mudanças no comportamento para criar um futuro mais sustentável em termos da integridade do meio ambiente, da viabilidade econômica, e de uma sociedade justa para asatuais e as futuras gerações [...]. O programa Educação para o Desenvolvimento Sustentável exige que se reexamine a política educacional, no sentido de reorientar a educação desde o jardim da infância até a universidade e o aprendizado permanente na vida adulta, para que esteja claramente enfocado na aquisição de conhecimentos, competências, perspectivas e valores relacionados com a sustentabilidade.

 

Considerações Finais

Com a presente pesquisa foi possível perceber que os professores possuem conhecimento sobre o termo DS. Consideramos que o fato dos professores de ciências conhecerem o significado do termo já é passo importante para introdução de questões relacionadas a tema socioambientais e as questões relacionadas ao desenvolvimento sustentável em sala de aula.

No tocante a introdução de discussões relacionadas ao cenário socioambiental vigente nas aulas de ciências encontramos proposições incipientes na fala da maioria dos professores. Constatamos também, que a maioria dos professores, que responderam ao questionário, ao abordarem o tema durante suas aulas restringem as discussões em certos aspectos, mas não se limitam apenas ao aspecto ambiental, mais comumente discutido.

Quando perguntamos aos professores se tinham conhecimento sobre a DEDS verificou-se que a maior parte não possui conhecimento da Década. Isto interfere diretamente nos resultados esperados para a Década.

Os resultados obtidos indicam que os professores reconhecem a necessidade de introduzir questões socioambientais relacionadas ao processo de busca de um desenvolvimento que seja sustentável. No entanto, consideramos que se os professores, principais agentes responsáveis pela implementação dos princípios da Década, não possuem as informações necessárias para aproximar os preceitos do DS dos conteúdos de sua disciplina, os objetivos não serão alcançados. 

 

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Ilustrações: Silvana Santos