Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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20/12/2003 (Nº 7) PROPOSTA METODOLÓGICA PARA SENSIBILIZAÇÃO AMBIENTAL DE PRODUTORES RURAIS
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PROPOSTA METODOLÓGICA PARA SENSIBILIZAÇÃO AMBIENTAL DE PRODUTORES RURAIS

Julio Cesar Pascale Palhares - Zootecnista, Embrapa Suínos e Aves Br 153 Vila Tamanduá 89700-000 Concórdia-SC Fone (49) 442-8555 palhares@cnpsa.embrapa.br

Maria do Carmo Calijuri - Bióloga, EESC/USP Depto. Hidráulica e Saneamento

 

RESUMO

Uma proposta metodológica de sensibilização ambiental a qual teve como público-alvo produtores rurais do município de Jaboticabal-SP objetivou sensibilizá-los para importância dos recursos naturais. Iniciou-se o projeto realizando-se um estudo prévio das características agropecuárias regional. Para a sensibilização, utilizaram-se de palestras, com periodicidade quinzenal, nas quais os palestrantes abordaram temas de destacada importância na realidade agropecuária. Considerando-se o tipo de abordagem utilizada na qual o educando iria ao educador esta não se mostrou eficiente para este tipo de público. Em estudos futuros a abordagem utilizada deverá considerar visitas periódicas do educador ao educando, a fim de que uma relação de confiabilidade seja estabelecida entre produtor e projeto.

Palavras-Chaves: microbacia hidrográfica, criações animais, recursos naturais

 

INTRODUÇÃO

Quando se pensa em educação, a divisão entre público urbano e rural faz-se necessária, devido à enorme diferença entre estes dois, considerando-se principalmente, parâmetros sociais e culturais. Na população rural, a variabilidade de realidades é elevada, encontrando-se, desde o pequeno agricultor, que produz somente para subsistência de sua família em uma pequeno lote de terra, o grande latifundiário, que dispõe de uma enorme quantidade de terras, muitas delas improdutivas ou exauridas por cultivos sucessivos, até o produtor rural profissional, que utiliza das mais modernas técnicas agropecuárias, atingindo índices de produção similares aos melhores do mundo.

Mas as diferenças comuns entre a quantidade de terras que dispõem, os níveis de capitalização e técnico não são os mesmos quando se analisa o nível de escolaridade destes produtores, pois a grande maioria possui níveis baixos, sendo raro encontrar-se produtores rurais com terceiro grau completo.

Analisando-se o relacionamento produtor/meio ambiente, as diferenças também são pertinentes, pois um produtor, criando e cultivando de forma intensiva em sistemas de monocultura, será muito mais impactante do que aquele pequeno produtor que consome um mínimo de recursos naturais e gera uma reduzida quantidade de dejetos animais e resíduos agrícolas por área.

Considerando-se estas realidades produtivas inseridas no contexto ambiental da agropecuária nacional, pergunta-se: Quem devemos educar? A resposta mais simples e da grande maioria será, todos os produtores. Mas como citados são os latifundiários ou aqueles que produzem com altos níveis de concentração e intensificação que verdadeiramente degradam e consomem grandes quantidades de solo e água, que produzem uma enorme quantidade de poluição pontual e difusa, promovendo os maiores impactos ambientais. Porque a quase totalidade dos programas e projetos de educação ambiental no campo tem, como públicos alvo, os pequenos produtores, as populações ribeirinhas, ou seja, aqueles que ambientalmente não representam grandes problemas. Talvez uma resposta plausível seja a de que educar um produtor que tem poder econômico, altamente conservador e fechado a novos conceitos seja uma tarefa muito mais árdua do que educar uma pessoa descapitalizada e propensa a ser ajudada. Mas se este grande produtor não começar a mudar sua forma de utilizar o meio ambiente, não será somente ele que sofrerá as conseqüências mas, também, as pessoas e cidades a sua volta que necessitam dos recursos os quais estão sendo exauridos e/ou depreciados. Não se objetiva eleger os grandes produtores como os culpados dos problemas ambientais que enfrentamos, a grande maioria deles está somente perpetuando um sistema de produção imposto, no qual os interesses econômicos e financeiros são enormes, mas deve-se, através da educação ambiental, mostrar-lhes alternativas economicamente rentáveis e ambientalmente saudáveis.

Mas de nada adiantará identificarmos o público alvo se não soubermos responder à uma outra questão: Educar para quê? Ou na visão dos produtores a pergunta, poderia ser a seguinte: Mudar para quê? Além dos problemas educacionais do nosso país, os problemas agropecuários também são enormes, os quais vão, desde a distribuição de terras até a total ausência de uma política agropecuária condizente com o potencial que o país dispõe para produzir. Esses problemas originaram-se no início de nossa colonização e solidificaram-se com o decorrer de nossa história, onde a agricultura foi sempre feita em ciclos para suprir as necessidades de matérias-primas dos países dominantes. Mais recentemente, deu-se a "Revolução Verde", responsável pelos grandes problemas ambientais originados pela agropecuária no século XX. Atualmente, fala-se em globalização em produzir para mercados mundiais. Como um país que não dispõe de uma política agrícola, ou seja, onde o produtor sente-se totalmente abandonado e prisioneiro de interesses econômicos, poderá querer mudar a realidade ambiental de sua agropecuária? Assim, de nada adiantará promover a educação se educadores e educandos não conseguirem enxergar um horizonte comum, ou seja, mudar a estrutura produtiva, considerando as vertentes sociais, ambientais e econômicas, tendo para isto uma sustentação governamental e de mercado, onde a agropecuária seja vista como uma parceira do desenvolvimento e não um setor a ser explorado.

Este trabalho teve como objetivo desenvolver uma proposta metodológica para sensibilização ambiental de produtores rurais onde estes educandos dirigiam-se até o educador para que a sensibilização ocorresse, sendo delineada baseada em atividades comuns a este tipo de público alvo.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

O trabalho foi desenvolvido na cidade de Jaboticabal-SP com produtores rurais, que dispunham no mínimo de um tipo de cultura animal, localizados nas várias microbacias hidrográficas que fazem parte da Bacia Hidrográfica do Córrego Rico. O modelo utilizado na proposta de sensibilização teve como base para seu delineamento experiências documentadas em literatura da área e experiências passadas ao pesquisador por técnicos e líderes agropecuários atuantes na região.

            Seis meses antes de se iniciar o programa de sensibilização foram estabelecidos contatos com líderes rurais, técnicos e extensionistas de órgãos governamentais, profissionais do poder público municipal, representantes de entidades de classe, proprietários, enfim, pessoas que tivessem representação e/ou experiência dentro da comunidade rural do município.

            Esta estratégia objetivou: difundir o projeto para que, no momento de seu início, este fosse identificado como algo comum ao cotidiano agropecuário e benéfico às suas aspirações produtivas; identificar e conquistar os líderes rurais do município a fim de que estes servissem como multiplicadores dos conceitos e vantagens da proposta e dessem um maior respaldo ao projeto; levantar e analisar estudos que já tivessem sido feitos na região com esta classe de pessoas, identificando seus erros e acertos para que o programa fosse mais eficiente; estabelecer parcerias com entidades de representação, órgãos estaduais e municipais e comércio em geral, para que o projeto adquirisse maior confiabilidade perante a comunidade agropecuária e; formar um cadastro de todos os proprietários da região no qual constasse pelo menos, o endereço e atividade principal do produtor, servindo este de base para o estabelecimento das atividades da proposta e forma de contato com os produtores.

            Como resultado desta estratégia diversos contatos e 28 parcerias foram estabelecidas.

            Experimentou-se, através da utilização de um questionário composto por questões envolvendo somente a temática ambiental, conhecer e estabelecer as relações que os produtores rurais mantêm com o meio ambiente e a utilização dos recursos naturais. Por experiências prévias, estabeleceu-se que a forma de resposta a este questionário seria diretamente ao pesquisador. Como a respostas ao questionário seriam dadas de forma direta ao pesquisador, as informações tidas como informais, ou seja, comentários do produtor que fossem pertinentes ao tipo de informação requerida, seriam anotados e poderiam servir para enriquecer a discussão dos resultados.

            A utilização de palestras e dias-de-campo tiveram como objetivo sensibilizar os produtores para as questões produtivas, econômicas e ambientais. Estes tipos de atividades foram escolhidas em função de serem comuns e terem a aceitação dos produtores, sendo há muito utilizadas por extensionistas de órgãos públicos, empresas, etc., demostrando elevada eficiência na execução de seus objetivos quando utilizados para este tipo de público-alvo.

            Os temas das atividades foram estabelecidos com base no estudo prévio da realidade agropecuária do município. Para o delineamento dos temas iniciais, identificaram os principais problemas ambientais enfrentados pelos produtores naquele momento, de acordo, principalmente, com a Promotoria de Meio Ambiente de Jaboticabal e os oficiais do 10 GP da Polícia Florestal de Mananciais.

            As palestras tiveram periodicidade quinzenal, sendo realizadas sempre no horário noturno das 19:00 às 21:00h no auditório da Associação Regional dos Engenheiros e Arquitetos de Jaboticabal (AREA).

            As atividades de campo possuíam uma conotação mais técnica, sendo imprescindíveis para sua realização, uma unidade estrutural (fazendas, canteiros, instalações, etc.) e um parceiro econômico responsável pelos custos de promoção do evento. Sendo assim, a periodicidade desta atividade foi estipulada em decorrência da congruência destes dois fatores para sua execução.

            Foi criado um “nome fantasia” com seu correspondente logotipo para o projeto a fim de aumentar sua penetração na comunidade. O "nome fantasia" foi Projeto AMBIENTE RURAL - Parceria: Produtor/Meio Ambiente.

            Como forma de aumentar a adesão dos produtores ao projeto, foi elaborado um convênio com vários estabelecimentos comerciais de produtos e serviços de interesse a este público, os quais poderiam dar vantagens especiais ao produtor que participasse no projeto. Para que o produtor tivesse direito a estas vantagens ele tinha que possuir a carteirinha de identificação, distribuída pelo coordenador, e ter uma freqüência mínima nas atividades desenvolvidas de 75%. Buscou-se com isto, além das questões técnicas abordadas, disponibilizar um incentivo comercial, aumentando a possibilidade de integralização dos objetivos do programa de sensibilização.

            Além desta função as carteirinhas de identificação tinham a função de servir como uma forma de controle da presença do produtor nas atividades estabelecidas. Através do controle da presença, o coordenador podia identificar os produtores com baixa freqüência nas atividades e atuar no sentido de aumentá-la.

            Foram produzidos 500 cartazes para serem utilizados na divulgação das atividades da proposta. A utilização destes ocorreu da seguinte forma: uma semana antes da data da atividade, estes cartazes foram afixados em lugares públicos: cooperativas agropecuárias, associações rurais, órgãos públicos, casas comerciais, etc. Os cartazes continham as seguintes informações: título da atividade, palestrante, horário, local e data.

Com o intuito de aumentar a divulgação do nome e do logotipo da proposta confeccionou-se adesivos (500 adesivos), que foram distribuídos aos produtores participantes e outros interessados, para serem colocados em seus automóveis, identificando-os como um parceiro do meio ambiente. Estes também foram distribuídos nos estabelecimentos comerciais conveniados para que os produtores pudessem identificá-los como um parceiro e usufruir das vantagens.

As camisetas, com o mesmo objetivo dos adesivos, confeccionadas em número de 50, foram distribuídas somente aos produtores que disponibilizaram suas fazendas para coleta de amostras de água, palestrantes convidados, líderes rurais e autoridades que auxiliaram na divulgação do projeto.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Quanto aos questionários os dados coletados não serão discutidos pois o número de respondentes foi muito reduzido. Assim, estes não podem ser considerados como representativos da visão ambiental dos produtores de Jaboticabal-SP. A razão para o reduzido número de questionários respondidos reside no fato de que, pela proposta inicial, estes seriam respondidos durante os encontros, palestras e dias-de-campo. Como a participação dos produtores nas palestras foi muito baixa, isto refletiu na quantidade de questionários respondidos.

            Devido a este resultado, propõe-se que o pesquisador desloque-se até a fazenda e/ou residência do produtor para que este responda ao questionário, desta forma, a resposta aos questionários não estará condicionada a participação do público-alvo a qual não pode ser garantida.

            Nenhum dia-de-campo foi realizado pois o projeto não poderia garantir a presença dos produtores rurais a um possível patrocinador desta atividade. Esta certeza da não garantia de participação deu-se devido as experiências prévias com as atividades de palestras. Com isto, pensou-se que, caso fosse realizado um dia-de-campo e este tivesse um insucesso, poderia depreciar o nome do projeto frente ao patrocinador e a comunidade rural.

            Inicialmente as palestras ocorreram conforme o estipulado, mas a partir da quinta palestra, em decorrência da inexpressiva participação de produtores, este tipo de atividade foi cessado.

            Na Tabela 01 pode-se observar os temas abordados nas palestras, o palestrante, o número de produtores em cada palestra e o número de participantes.

 

Tabela 01- Temas abordados nas palestras, palestrante, número de produtores e o número de participantes.

 

Tema

Palestrante

Número de Produtores

Número de participantes

Lançamento do Projeto AMBIENTE RURAL

Julio Cesar Pascale Palhares (coordenador do projeto) e Francisco E. M. Bernal (L/Amorim)

12

34

Produtor Rural Você é Importante

Julio Cesar Pascale Palhares (coordenador do projeto)

4

4

Técnicas de Reflorestamento

Prof. Dr. Sérgio V. Valeri (FCAVJ/UNESP)

2

9

O trabalho da polícia florestal e as atividades agrícolas

Oficial do 10 GP da Polícia Florestal de Mananciais

1

3

Legalização de Propriedades Rurais

Dr. Pedro Cunha (DEPRN-04/Ribeirão Preto

0

0

 

            O elevado número de participantes no primeiro encontro, em comparação com os outros, ocorreu devido a coordenação do projeto e ao parceiro na atividade, empresa L/Amorim, distribuírem convites aos produtores, autoridades e personalidades do município. Além de terem sido feitos telefonemas a vários produtores, convidando-os pessoalmente a participarem. Foram distribuídos 250 convites e realizados aproximadamente 40 telefonemas. Considerando estes números, a participação pode ser considerada baixa para a divulgação realizada. Este tipo de divulgação não pôde ser feita nas outras palestras devido a impedimentos financeiros.

Apesar dos temas iniciais das palestras terem sido estipulados, considerando os principais problemas ambientais que atingiam os produtores do município, estes não despertaram o interesse dos produtores, mesmo sendo os proprietários constantemente penalizados por tais problemas.

Em conversas com os profissionais da CATI/Jaboticabal que realizam palestras periodicamente na cidade, muitas delas no mesmo local e horário, e que realizam a divulgação destas através de convites entregues em mãos aos produtores, pôde-se constatar que a freqüência deste tipo de público é sempre reduzida, em comparação ao número de convites distribuídos. Estes mesmos profissionais informaram que o único tema capaz de completar um auditório é a respeito de linhas de crédito para os produtores rurais.

Apesar do insucesso em relação a participação do público-alvo nas atividades propostas, estas não devem ser consideradas ineficientes para este tipo de público. Em projetos futuros estas devem ser mantidas modificando-se o tipo de abordagem, ou seja, indo o educador até o educando, estabelecendo-se uma relação projeto/produtor muito mais íntima. O aprofundamento desta relação dar-se-á através de visitas periódicas às fazendas, ocasião em que, não só as questões ambientais devem ser discutidas mas também as culturais, sociais, econômicas e produtivas. Estabelecendo-se esta relação de confiança do produtor no projeto, acredita-se que a participação nas atividades será potencializada. Shepard (1997), objetivando estabelecer um programa de educação ambiental para o controle de fontes de poluição difusa provenientes da agropecuária, utilizou entre outros os seguintes métodos para atingir os produtores rurais: estreita relação humana (entrevistas, visitas a propriedades, resolução de conflitos e problemas); condução de pesquisas experimentais a campo, estabelecimento de viagens e dias-de-campo, publicação de cartilhas e artigos, trabalho conjunto com a mídia, palestras, etc. O autor conclui que as atividades que estabelecem um estreito contato com os produtores proporcionam uma maior participação destes no programa, com conseqüente sensibilização e adesão a técnicas relacionadas à preservação ambiental.

            Apesar do número de parceiros ao projeto ter sido elevado, muitos destes dispondo de elevado grau de respeitabilidade frente a comunidade rural de Jaboticabal, o que levou a pensar que isto catalisaria a penetração da proposta no meio rural, este fato não ocorreu, pois as parcerias limitaram-se a um acordo verbal e, quando solicitadas para efetiva participação, esta não aconteceu. Ressalta-se que todas as parcerias foram oficializadas por meio de cartas assinadas por ambas as partes, nas quais estipulava-se o tipo de parceria estabelecida. Conclui-se que não basta somente estabelecer as parcerias: é preciso cobrar e viabilizar as responsabilidades de ambas as partes, pois se uma delas não cumpre com o acordado, compromete todo o projeto. Infelizmente observou-se que se não há um forte interesse político e/ou econômico, o estabelecimento da parceria e seu desenvolvimento é comprometido.

A adoção ou a modificação de práticas agrícolas geralmente não ocorrem como conseqüência de um programa educacional específico. As mudanças ocorrem vagarosamente, ao longo do tempo. Portanto, é essencial continuar a desenvolver estes programas educacionais que fornecem informações atualizadas e dados relativos à produção agropecuária, bem como, envolvem pesquisadores, extensionistas, agências governamentais, indústria, enfim toda sociedade em uma real parceria (Smith, 1997).

Considerando-se a metodologia utilizada para sensibilização ambiental dos produtores rurais contida na proposta os seguintes fatores foram relevantes para a não efetividade desta: como o objetivo era sensibilizar determinado público-alvo para as questões ambientais de suas atividades econômicas, o meio ambiente deve ser parte integrante do perfil social e principalmente econômico deste público, caso este não o seja o processo de sensibilização não ocorre ou desenvolve-se com dificuldades. Segundo Schumacher (1982), a missão precípua da educação é a transmissão de valores ela é fundamental para o enfrentamento das questões da vida através da formação de sujeitos críticos, significa propiciar o florescimento de algo que já está dentro da pessoa.

Inicialmente pensou-se ser uma vantagem ao desenvolvimento da proposta o fato de que somente 11,26% dos produtores rurais do município residiam na propriedade, pois as atividades iriam ocorrer quase que integralmente no meio urbano, onde residiriam a maior parte dos produtores. Mas no decorrer do projeto, o que poderia ser uma vantagem mostrou-se uma desvantagem. Acredita-se que esta desvantagem esteve intimamente relacionada com os valores sociais a econômicos que apresenta este produtor residente na cidade, ou seja, para este, a propriedade é apenas uma fonte de renda a qual propicia a conquista dos valores urbanos. Desta forma, o vínculo deste produtor com a terra (natureza) é praticamente inexistente. O proprietário que reside na fazenda possui um vínculo maior com a natureza, tendo conhecimento da importância desta para a continuidade de sua atividade e sustento de sua família, pois sua relação com o meio natural é extrema e contínua, ao contrário do proprietário que reside na cidade e visita a fazenda diariamente e/ou periodicamente, para o qual esta é somente uma unidade produtora que gera determinado produto e montante de capital. Este "produtor urbano" não tem o meio ambiente como algo pertencente a seu perfil.

Uma outra característica do município que pode ter contribuído para o insucesso da sensibilização foi a de que 32,66% das unidades produtoras estão com arrendatários. Assim, não se pode usar o termo produtor rural, mas sim, proprietário de imóvel rural, sendo que estes não desenvolvem as atividades agropecuárias, sendo a propriedade um simples veículo de renda. Estes arrendatários constituem-se principalmente em usinas de álcool e açúcar.

A questão da interação homem/natureza e valorização desta entre os produtores rurais também está relacionada com o tamanho da propriedade e o tipo de mão-de-obra utilizada para produção. Em programa de conservação do solo e da água desenvolvido no estado do Paraná denominado PARANÁ RURAL as propriedades até 100 ha correspondiam a 94,6% dos estabelecimentos do estado sendo que, nestas, a agropecuária era desenvolvida prioritariamente por mão-de-obra familiar. A realidade de Jaboticabal é o inverso, ou seja, as propriedades até 100 ha correspondem a 32,7% e há uma predominância de mão-de-obra contratada. Destaca-se que o programa paranaense atingiu seus objetivos e que segundo seus técnicos um dos motivos para isto foi o extremo vínculo que os produtores mantinham com a propriedade.

Um outro fator que deve ser considerado para o insucesso da sensibilização é a estrutura agrária de Jaboticabal onde 84,6% das unidades produtoras possuem o cultivo de cana-de-açúcar o qual ocupa 77% da área do município. Além de todas as questões históricas e políticas que envolvem o cultivo desta cultura em nosso país, deve-se ressaltar que as práticas culturais são as mais tecnificadas possíveis, geralmente geradas em institutos de pesquisa resultante de estudos das próprias empresas beneficiadoras e a cadeia de beneficiamento e comercialização está totalmente dominada por grandes usinas de álcool e açúcar. Com isto, o produtor de cana-de-açúcar resume-se a um simples fornecedor de matéria-prima, sendo seu único incentivo o aumento da produção e produtividade sem se preocupar com as conseqüências disto pois tem a garantia de assistência técnica e compra do produto pela usina. Assim, como sensibilizar este produtor que não dispõe da mínima consciência e responsabilidade para com o meio ambiente? Com isto, a mudança das práticas adotadas atualmente e visão de meio ambiente só se dará a partir da vontade das usinas. Talvez a estratégia mais recomendada para se atingir estes produtores fosse a sensibilização ambiental dos usineiros, pois são estes que determinam como, onde e quando plantar a cana-de-açúcar e detêm a confiança dos produtores.

Conclui-se que o período estipulado de seis meses para realização do estudo e conhecimento da realidade agropecuária do município foi insuficiente, tendo profundos reflexos no desenvolvimento do programa de sensibilização. Considerando-se os objetivos propostos a serem atingidos com a realização do estudo prévio, aquele com maior grau de dificuldade para se alcançar foi a conquista dos líderes rurais do município e entidades representativas dos produtores. Neste período foram estabelecidos contatos com três líderes rurais, todos mostraram-se confiantes na idéia do projeto e disseram apoiá-lo no que fosse necessário, mas este apoio não passou de um compromisso verbal sem reflexos práticos.

Para que um programa agropecuário sustentável seja implementado e tenha sucesso, além de um perfeito diagnóstico e manejo das condições ambientais, é extremamente importante uma perfeita comunicação entre os produtores rurais, pesquisadores e órgãos públicos (Waltner-Toews, 1996). Pelos resultados alcançados esta perfeita comunicação entre os atores do projeto e sua coordenação não foi integral refletindo no desenvolvimento e alcance dos objetivos do estudo.

Pelas experiências e contatos estabelecidos no decorrer do projeto o produtor rural de Jaboticabal enquadra-se em um dos perfis que Tacchini (1999) estipulou a fim de conhecer as características dos produtores rurais de acordo com seu sistema de produção. No primeiro, engloba os produtores extensivos, no segundo estão aqueles que possuem técnicas de produção mas sem muita organização econômica e administrativa e, no terceiro estão os produtores que usufruem de tecnologia, disponibilidade de capital e controle de mercado. Os produtores de Jaboticabal enquadram-se na segunda categoria, sendo as características desse grupo: produtores deterministas, suas técnicas culturais variam pouco em relação ao tempo, possuem uma sociabilidade média (procuram ajuda em casos extremos) mas são altamente individualistas, prudentes e conservadores, alta resistência a mudanças, não estão dispostos a trocar sua realidade por outra melhor mas de futuro incerto e imitam as técnicas e atitudes sem avaliá-las previamente.

 

CONCLUSÕES

Considerando-se a proposta metodológica conclui-se que a falta de um conhecimento mais aprofundado do público-alvo, considerando suas aspirações sociais, produtivas, econômicas e, principalmente ambientais, bem como, uma abordagem educando/educador contribuem significativamente para a não eficiência de projetos de sensibilização ambiental com produtores rurais.

            Quanto ao modo de abordagem conclui-se que para este tipo de público deva-se utilizar uma metodologia na qual o educador desloque-se até o educando, ou seja, o educador deverá periodicamente visitar a unidade de produção a fim de estabelecer uma relação de confiança entre produtor/projeto. Com isto a participação nas atividades e conseqüente sensibilização serão potencializadas e os objetivos alcançados.

            Com base nos resultados obtidos com esta proposta, projetos futuros em educação e sensibilização ambiental de produtores rurais deverão considerar no seu planejamento: que projetos como este não estejam vinculados a uma pessoa mas sim a uma instituição e que o estabelecimento de parcerias seja visto como uma obrigatoriedade, principalmente com as instituições e lideranças agropecuárias da região.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SCHUMACHER, E.F. O negócio é ser pequeno. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.

SHEPARD, R. (1997). What have we learned about our nonpoint source pollution education programs? In: PROCEEDINGS NATIONAL WATERSHED WATER QUALITY PROJECT, 1997. Symposium. Washington, p.53-60.

SMITH, M. (1997). The Missouri MSEA project: a model for “The partnership approach” to water quality concerns. In: PROCEEDINGS NATIONAL WATERSHED WATER QUALITY PROJECT, 1997. Symposium. Washington, p.9-14.

TACCHINI, J. Relación entre desarrollo agrario y comportamiento del agricultor. Revista de La Facultad de Ciencias Agrarias, n.1, 1999, p.13-24.

WALTNER-TOEWS, D. Ecosystem health: a framework for implementing sustainability in agriculture. Bioscience, v.46, n.9, 1996, p.686-89.

Ilustrações: Silvana Santos