Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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UTILIZANDO A DINÂMICA DA PIRÂMIDE NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL*
*Uma primeira versão deste artigo foi apresentada no I Colóquio de Educação Ambiental para o Semiárido Nordestino em 2011.
Resumo
A Dinâmica da Pirâmide foi criada para facilitar a reflexão com grupos que querem abordar o tema da relação entre a crise ambiental e o sistema capitalista. Ela busca oferecer uma formação integral sobre a questão ambiental de uma forma não superficial. Também estabelece um espaço de diálogo para que todos possam expressar suas experiências individuais com a natureza e educar-se para um consumo que respeite as potencialidades do planeta Terra.
Palavras-Chaves – Crise Ambiental Global, Dinâmica da Pirâmide, Sistema Capitalista
Introdução
A crise ecológica que se estende por todos os cantos do planeta Terra deveria nos levar a refletir sobre o fato de que estamos todos interconectados e, portanto, somos interdependentes nesta aventura chamada vida. Urge, então, reeducarmo-nos com vista a um outro relacionamento com a Mãe Terra. Nas últimas décadas os pesquisadores de todos os campos das ciências tem constatado o grave descontrole no que tange ao uso de agrotóxicos nos alimentos, produção excessiva do lixo provocado pelo consumo exagerado, desmatamento, etc. e seus resultados como o desequilíbrio ecológico e suas consequências. Todos estes problemas são provocados pela ação humana e tem como principal motivo a obtenção de lucros através da exploração da natureza, vista como apenas mais um produto a ser comercializado. A crise ambiental atual demanda formas alternativas de exercitar a Educação Ambiental (EA) na busca por meios que equacionem as ações comportamentais degradadoras do meio ambiente. É cada vez mais necessário o exercício de uma EA que questione o modelo atual de desenvolvimento e sua dinâmica destruidora (SILVA; ABÍLIO, 2011). Grande parte da população vive atualmente no mundo urbano vítima dos mais diversos desajustes socioambientais. Este é o resultado de um modelo de desenvolvimento imposto a estas populações e que é gerador de desigualdades nos mais variados campos sociais e ambientais (PORTO-GONÇALVES, 2004). Se a EA não é crítica deste modelo, não educará no sentido pleno da palavra. Para Silva e Abílio (2011), “(...) a educação deve tomar partido no que se refere ao modelo de desenvolvimento que alimentamos, pois se não existe neutralidade em nenhum campo da atuação humana, tão pouco o há na educação.” É neste sentido que a atividade de EA baseada na Dinâmica da Pirâmide (DP) propõe uma integração entre as perspectivas experienciais de cada participante e as práticas de dinâmicas de grupo como base para uma reflexão sobre os problemas socioambientais que enfrentamos no sistema capitalista e como poderemos buscar suas soluções. A crise ambiental ainda não recebe a atenção que merece. Muitas vezes, as reflexões sobre este tópico são superficiais e não tocam no motor da crise: o sistema capitalista. Esta dinâmica foi criada para facilitar a reflexão com os grupos que querem abordar este tema. Em poucas horas é possível discutir vários tópicos de forma eficaz e direta esta temática. Acreditamos, assim como Leff (2007, p. 259) que,
O desafio que se coloca à pedagogia ambiental é o de formar o ser humano, desde a infância e juventude, com um espírito crítico e construtivo, estimulando antes sua criatividade do que o submetendo aos desígnios de um mundo automatizado, armado por pedaços (bits) de informação, concatenado e encadeado pela tecnologia de uma ordem econômica supra-humana.
Pensar “um outro mundo possível” é uma necessidade imperativa nos dias atuais. Somente aprendendo a viver de forma sustentável, isto é, tirar da natureza apenas aquilo que é possível e não o que é desejável, é que atingiremos o verdadeiro equilíbrio socioeconômico em nossa sociedade. A mudança para este novo modelo de vida pode reverter o quadro de degradação que estamos assistindo. A DP enfoca a descoberta do ambiente que nos cerca e que muitas vezes passa despercebido. Como lidamos com este ecossistema? Que relação temos com o que nos cerca? Como encontraremos a convivência equilibrada e o respeito às potencialidades daquilo que a natureza pode nos oferecer e não o que dela queremos tirar? Esses são alguns dos questionamentos que serão suscitados durante a atividade proposta. Não é a busca por resposta uníssonas, mas o encontro da pluralidades das respostas baseadas nas experiências dos participantes que alimentará o caldo das possíveis soluções A DP foi desenvolvida para que os grupos abordem este tema em poucas horas, sendo possível discutir vários tópicos de forma eficaz, com uma linguagem inerente aos participantes. O ideal é que o grupo de reflexão tenha pelo menos dez pessoas e uma abertura ao diálogo para perceber a conexão entre o sistema capitalista, o modo de vida por ele imposto e a tão debatida crise ambiental global. É uma forma de fazer EA crítica e informal, com grupos de diferentes níveis educacionais e sociais na busca por um debate aberto sobre as veias que alimentam e degradam o nosso planeta. Refletir com o grupo, por exemplo, que é preciso não apenas plantar árvores, mas perceber porque elas são cortadas e a exploração a que é submetida o trabalhador que participa do processo de desmatamento. Enfim, refletir sobre todas as conecções do sistema que está assassinando a Terra.
Material e método
O material necessário é de fácil acesso. A escolha dos materiais, que descreveremos abaixo, deu-se em virtude da necessidade de materializar os conceitos de uma maneira que se aproximasse ao máximo das mais diversas realidades encontradas nos grupos populares. É preciso afirmar que os conteúdos pedagógicos e a aplicação dos instrumentos de formação utilizados no processo educativo para a reflexão, com o foco na realidade do participante de atividade formadora, devem estar em sintonia (FREIRE, 1996). O grupo precisará de uma cartolina com o desenho abaixo e outras cartolinas que serão utilizadas pelos pequenos grupos de três pessoas (o número de cartolinas deve ser baseado no número de participantes). Cada um dos seis itens (modelo de extração, modelo de produção, consumismo, rejeitos, relações de poder e multinacionais) pode ser representado por um símbolo como uma lata de refrigerante para as multinacionais ou a carteira de trabalho para o modelo de produção. Papel, caneta e lápis de cor para o uso dos pequenos grupos também serão necessários. Veja os passos seguintes:
Figura 1: O triângulo e a sua representação para a sociedade capitalista industrial
Conclusão A DP foi criada para facilitar a reflexão com grupos que querem abordar o tema da relação entre a crise ambiental e o sistema capitalista. Ela busca oferecer uma formação integral sobre a questão ambiental, com uma perspectiva crítica que possibilite o entendimento do problema da crise ambiental de uma forma não superficial. Também estabelece um espaço de diálogo para que todos possam expressar suas experiências individuais com a natureza e educar-se para um consumo que respeite as potencialidades do planeta Terra. Somente através de uma educação integral é possível reverter o quadro de degradação ambiental que estamos assistindo. É preciso ver a natureza como algo além de um recurso a ser utilizado pelos humanos. A ideia que nos foi repassada de domínio sobre os recursos naturais precisa ser urgentemente reposta por um conceito de convivência sustentável com todos os seres vivos no meio ambiente circundante. Concordamos com Silva (2012) quando ele afirma,
A Educação ambiental deve buscar todos os caminhos possíveis para conseguir atingir o seu alvo, isto é, a sensibilização de todos, principalmente dos jovens que buscam um novo sentido para a vida em um mundo que se apresenta em crise de valores. Ademais, somente de forma criativa é possível mostrar alternativas ao modelo capitalista de sociedade que causou a degradação a que assistimos atualmente.
A dinâmica de grupo aqui proposta lida diretamente com o aspecto lúdico inerente a cada ser humano. Tal dinâmica busca demonstrar as potencialidades daquilo que a natureza pode nos oferecer e não aquilo que dela queremos tirar, na busca por um mundo onde o social e o ambiental se complementam. A crise ambiental global é uma realidade. O sistema capitalista em que vivemos, e de certa forma alimentamos, é causador da crise. Os meios de comunicação de massa não trazem à tona o papel do sistema capitalista de produção como causador desta crise. Assim, é dever dos grupos que trabalham com uma EA crítica facilitar a discussão acerca do que é veiculado sobre o meio ambiente, levando em consideração a formação de uma opinião própria, comprometida e embasada na observação da realidade em que vivemos com todos os afetados por essa crise ambiental global. A DP ajudará na formação de pessoas críticas ao modelo capitalista de sociedade, guiando-lhes para uma nova perspectiva com o meio ambiente onde vivem, pois está essencialmente focada na experiência pessoal e em uma prática pedagógica onde o participante encontra as respostas para os problemas ambientais através da mudança das suas práticas cotidianas, em diálogo com outros participantes e revertendo o conceito de que “cada um faz a sua parte,” resultando daí em uma ação prática e comprometida por um outro mundo possível.”
Referências Bibliográficas
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo, Paz e Terra, 1996.
LEFF, Enrique. Saber Ambiental. Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Rio de Janeiro: Vozes. 1998.
LEONARD, Annie. A história das Coisas: da natureza ao lixo, o que acontece com tudo que consumimos. Rio de Janeiro: Zahar. 2011.
PORTO-GONÇALVES, Carlos Walter. O Desafio Ambiental. Rio de Janeiro: Record. 2004.
SILVA, Flávio José Rocha da. Juventude, Arte e Educação Ambiental. In Revista Educação Ambiental em Ação. N. 41. Setembro de 2012.
________; ABÍLIO, Francisco José Pegado. Por uma Educação Ambiental crítica ao atual modelo de desenvolvimento. Revista Eletrônica do Prodema. V. 6 N. 1 p. 45-52, março 2011.
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