Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
Início Cadastre-se! Procurar Área de autores Contato Apresentação(4) Normas de Publicação(1) Dicas e Curiosidades(7) Reflexão(3) Para Sensibilizar(1) Dinâmicas e Recursos Pedagógicos(6) Dúvidas(4) Entrevistas(4) Saber do Fazer(1) Culinária(1) Arte e Ambiente(1) Divulgação de Eventos(4) O que fazer para melhorar o meio ambiente(3) Sugestões bibliográficas(1) Educação(1) Você sabia que...(2) Reportagem(3) Educação e temas emergentes(1) Ações e projetos inspiradores(25) O Eco das Vozes(1) Do Linear ao Complexo(1) A Natureza Inspira(1) Notícias(21)   |  Números  
Artigos
04/06/2014 (Nº 48) PERCEPÇÃO DOS ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL EM RELAÇÃO AO USO DA ÁGUA EM SANTA CRUZ-RN
Link permanente: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=1810 
  

 

 

PERCEPÇÃO DOS ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL EM RELAÇÃO AO USO DA ÁGUA EM SANTA CRUZ-RN

 

 

 

Ana Paula Cardoso Silva1; Silone Pegado Gomes2

1Curso de Pós-graduação Lato Sensu em Educação Ambiental e Geografia do Semiárido na Modalidade a Distância – Instituto Federal do Rio Grande do Norte

anapaulacs.bio@gmail.com

2Instituto Federal do Rio Grande do Norte

silonepg@hotmail.com

 

 

 

RESUMO: O estudo tem por objetivo compreender a percepção ambiental de alunos do sexto ano dos anos finais do ensino fundamental a respeito da água na região semiárida. Para isso, apropriando-se da pesquisa qualitativa, optou-se por realizar um estudo de caso com a aplicação de questionários em duas escolas: uma municipal e outra estadual do município de Santa Cruz-RN, em cada escola, foi escolhida uma turma do sexto ano. Para a fundamentação teórica recorreu-se também à pesquisa bibliográfica, consultando autores que abordam a temática em questão. A pesquisa bibliográfica apontou o caráter pontual dos trabalhos realizados em educação ambiental e a fragmentação do conteúdo existente em relação à temática água. Portanto, considera-se, que os alunos desenvolveram importantes percepções sobre a temática água, no entanto, observou-se que estas, devido à fragmentação do currículo ficam restritas ao sexto ano, não sendo retomadas ou relacionadas a outros temas importantes durante os anos letivos seguintes do ensino fundamental.

Palavras-chave:Percepção Ambiental. Educação Ambiental. Água. Eutrofização.

 

INTRODUÇÃO

 

Apesar de ser essencial à vida humana e à economia de todas as regiões do planeta, existem permanentes ameaças ao ciclo hidrológico, bem como a quantidade e qualidade de água. Os usos múltiplos da água estão produzindo impactos sobre a economia, a saúde, o abastecimento e, de maneira geral, afetando a qualidade de vida das populações (TUNDISI, 2005).

Na região semiárida brasileira, as condições locais, como: eventos chuvosos irregularmente distribuídos, período de estiagem prolongado, altas temperaturas registradas ao longo do ciclo diário ou anual e intensa evaporação da água aliadas à contaminação por efluentes domésticos ou industriais não tratados e resíduos oriundos das atividades agrícolas constituem importantes fatores na determinação da ocorrência de eutrofização dos corpos hídricos bem como resultam na inviabilização do uso da água para múltiplas atividades humanas (BOUVY, et al., 2001; 2003; COSTA et al., 2009; OLIVEIRA et al., 2005; MOLICA et al., 2005).

Percebe-se que muitas são as discussões acerca desse bem e elas permeiam vários ambientes como empresas, indústrias, lares e comunidades. Outro ambiente que retrata as questões referentes à água é a escola. Entretanto, observa-se que no ensino fundamental, o tema água ainda é abordado de maneira descontextualizada. Nos conteúdos aplicados ao sexto ano do ensino fundamental (6º ano), praticamente inexistem correlações com temas como: vida, saúde, meio ambiente, química e física. Esses temas são detalhados durante outros anos desse nível de ensino sem que sejam retomados ou remetidos a conceitos estudados durante o 6º ano (VIEIRA et al., 2005).

 Isso decorre de um longo processo histórico que levou a uma fragmentação do conhecimento e a existência de uma separação profunda na relação do homem com a natureza gerando consequências sobre a degradação ambiental e a crise socioambiental moderna (BACCI; PATACA, 2008).

Diante do contexto, a problemática central desse estudo consiste em observar a seguinte questão: qual a percepção que os alunos do 6º ano dos anos finais do Ensino Fundamental da educação básica têm com relação à água na região semiárida? Para isso, o objetivo geral desse estudo é compreender a percepção de alunos sobre a qualidade de água presente nos corpos hídricos do município de Santa Cruz-RN.

O fato de esse objeto de estudo se fazer presente no cotidiano da sociedade e interferir em aspectos relacionados à saúde, economia e qualidade ambiental torna necessária a mobilização dos vários setores da sociedade: autoridades civis, instituições governamentais e não governamentais bem como a comunidade local para que discuta questões, compreenda o problema e se torne agente na conservação dos recursos hídricos e meio ambiente. Diante desse contexto, a percepção ambiental mostra-se relevante, tendo em vista que parte da realidade de um público-alvo, baseando-se em conceitos construídos a partir de conhecimentos, experiências; crenças; emoções; cultura e ações para compreender as relações do ser humano com o ambiente no qual está inserido, além disso, as percepções individuais ou coletivas resultam em respostas ou manifestações sociais (ROSA; SILVA, 2002; FAGGIONATO, 2005).

Aliada à percepção ambiental, a Educação Ambiental (EA) apresenta-se como uma ferramenta que visa a induzir dinâmicas sociais, de início na comunidade local e, posteriormente, em redes mais amplas de solidariedade, promovendo a abordagem colaborativa e crítica das realidades socioambientais como também uma compreensão autônoma e criativa dos problemas que se apresentam ou das soluções possíveis para eles (SAUVÉ, 2005).

Segundo Jacobi (2005) o desafio político-ético da Educação Ambiental, apoiado no potencial transformador das relações sociais, encontra-se estreitamente vinculado ao processo de fortalecimento da democracia e da construção de uma cidadania ambiental visando a despertar interesse pelas questões ambientais, no presente contexto, sobretudo às questões relacionadas à manutenção da qualidade de água, bem de uso comum da humanidade.

O presente artigo propõe uma análise das percepções de alunos pelo fato de elas resultarem de uma aprendizagem espontânea, social e culturalmente situada e condicionada que tem origem nas experiências e interações de cada indivíduo (KRÜGER; GIL, 2005). No contexto de crise ambiental global provocada pela intensa exploração humana dos recursos naturais, optou-se por estudar a percepção individual em relação à problemática da água em região semiárida, tendo em vista que esta já enfrenta problemas de escassez de recursos hídricos. A escolha do município Santa Cruz justifica-se pela ausência de estudos de percepção ambiental e educação ambiental com o objetivo de educar para a cidadania e preservação dos recursos naturais, além disso, o sexto ano apresentou-se como nível estratégico, uma vez que o tema água se faz presente no currículo das disciplinas de ciências e geografia.

Metodologicamente, fez-se uso da pesquisa qualitativa e realizou-se um estudo de caso em duas escolas, uma estadual e uma municipal localizadas na zona urbana do município de Santa Cruz-RN (figura 1). A pesquisa qualitativa perpassa por um campo transdisciplinar que envolve as ciências humanas e sociais, de maneira geral, está baseada na investigação de fenômenos humanos através da descrição de objetos de pesquisa ou do estudo de um caso particular (CHIZZOTTI, 2003). O estudo de caso tem sido muito utilizado na pesquisa qualitativa, tendo em vista permitir que uma situação particular seja observada em detalhes, dando ênfase ao esclarecimento de fatores intrínsecos ao objeto de estudo cuja situação torna-se melhor compreensível (YIN, 1989).

 

Description: Ficheiro:RioGrandedoNorte Municip SantaCruz.svg

Figura 1: Localização geográfica do Município de Santa Cruz-RN

Fonte: IBGE

 

Os alunos do 6º ano dos anos finais do ensino fundamental da educação básica foram considerados o público alvo da pesquisa tendo em vista o fato de o tema água ser conteúdo programático da disciplina de ciências durante esse ano letivo. A percepção ambiental dos alunos foi avaliada através da aplicação de questionários semiestruturados contendo questões abertas, semi-abertas e fechadas. As perguntas envolviam questionamentos sobre a importância da água para os usos humanos, qualidade de água, formas de poluição, microrganismos presentes no corpo hídrico e a interação dos alunos enquanto agentes de conservação e preservação.

Em um estudo de percepção, as questões fechadas possibilitam a avaliação de experiências, características, decisões individuais e coletivas. Enquanto as questões abertas fornecem informações sobre a identidade e a percepção sensorial dos indivíduos, agindo como um complemento para as questões estruturadas (WHYTE, 1977).

A coleta de dados ocorreu através da aplicação de questionários em visitas realizadas  a duas escolas: a escola municipal (em 11 de junho de 2013) e estadual (em 14 de junho de 2013). Foi permitido que os alunos respondessem aos questionários, sem que houvesse interferência do aplicador de modo a minimizar ou evitar o surgimento de tendências.

            Foram aplicados um total de 28 questionários, 15 aos alunos da escola estadual e 13 aos alunos da escola municipal. Em relação aos alunos, 57% pertenciam ao sexo feminino e 43% ao sexo masculino, com faixa etária compreendida entre 10 e 15 anos e moda de 12 anos.

Uma coletânea de artigos foi escolhida para trabalhar o tema em questão. Estudos de percepção ambiental, como os realizados pelos autores: Faggionato (2005), Rosa e Silva (2002) e Villar (2008) ou que analisam a percepção de professores e alunos sobre o tema água em região semiárida: Araújo et al. (2011), Petrovich e Araújo (2009), Sodré e Araújo (2008).

A relação entre os temas água, Educação ambiental e o ensino de ciências foi investigada de acordo com: Ferreira (2009), Jacobi (2005), Krüger e Gil (2005), Lucatto e Talamoni (2007), Marin (2008), Mattheus e Casteleins (2009), Mattos e Kuster (2004), Bacci e Pataca (2008).

 

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO FUNDAMENTAL BRASILEIRO

 

            A crise ambiental global, caracterizada pelo crescimento desordenado da população humana com consequente aumento da demanda por recursos naturais e degradação ambiental, tornou necessária uma análise abrangente tendo em vista envolver aspectos de natureza econômica, social e política. Nesse contexto, a Educação Ambiental surgiu como uma proposta interdisciplinar construída com diversos conceitos e abordagens para o desenvolvimento da cidadania e a formação da consciência ambiental tendo, na escola, um local adequado para sua realização através de um ensino ativo e participativo, que venha a integrar a conservação da natureza às práticas humanas.

            Na construção da EA, diversas contribuições podem ser citadas, destacando-se as resoluções e propostas geradas em espaços como a Conferência da ONU sobre o Ambiente Humano, a Conferência de Estocolmo, realizada em 1972, a Conferência de Belgrado organizada pela UNESCO, em 1975, que também em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) organiza a Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, a Conferência de Tbilisi, em 1977, a partir da qual se inicia um amplo processo em nível global orientado para criar as condições que formem uma nova consciência sobre o valor da natureza e para reorientar a produção de conhecimento baseada nos métodos da interdisciplinaridade e nos princípios da complexidade (JACOBI, 2005).

            Esse campo educativo tem sido fertilizado transversalmente de modo a possibilitar a realização de experiências concretas de educação ambiental de forma criativa e inovadora por diversos segmentos da população nos diversos níveis de formação. O documento da Conferência Internacional sobre Meio Ambiente, Sociedade, Educação e Consciência Pública para a Sustentabilidade, realizada em Tessalônica (Grécia), chama a atenção para a necessidade de se articularem ações em educação ambiental baseadas nos conceitos de ética, sustentabilidade, identidade cultural e diversidade, mobilização, participação e práticas interdisciplinares (SORRENTINO, 1998).

No Brasil, a Educação Ambiental passou a ser obrigatória em todos os níveis e modalidades de ensino, sem ser tratada como disciplina isolada, em 1988, após a aprovação da Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988). Além disso, a lei 9.795/1999 institui a Política Nacional de Educação Ambiental e defende a importância da educação ambiental para construção de valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente bem como a necessidade de abordá-la em caráter formal e não formal do ensino. 

Entretanto, a Educação Ambiental ainda é trabalhada de maneira restrita e pontual nas escolas brasileiras, geralmente, as atividades de Educação Ambiental estão principalmente centradas nas disciplinas de Biologia e Ciências, o que pode ser atribuído ao fato da EA ter surgido em um terreno marcado por uma tradição naturalista e preservacionista (CARVALHO, 2004; DIAS, 1993), além de ser promovida apenas nas datas comemorativas: Semana do Meio Ambiente, Dia da Árvore, Dia da Água ou restrita às visitas realizadas a parques e reservas ecológicas (MEDINA, 2000).

Entre as várias dificuldades encontradas para inserir a educação ambiental no ensino formal, destacam-se: a fragmentação do conhecimento em disciplinas teóricas, as quais geralmente são trabalhadas segundo a metodologia tradicional de ensino cuja ênfase recai sobre os conhecimentos teóricos em detrimento da contextualização com conhecimentos regionais e à falta de atualização dos docentes, que em sua maioria não são preparados para lidar com a temática ambiental durante a formação e sentem dificuldades em desenvolver projetos pedagógicos com essa temática (MININNI, 1994).

Nesse contexto, Marçal (2005) atenta para o fato de a escola representar um espaço privilegiado para a ocorrência de discussões socioambientais, principalmente no ensino fundamental, o qual se destina ao fortalecimento da cidadania e instrução de valores fundamentais à vida social.

Portanto, torna-se evidente a necessidade ampliar as práticas interdisciplinares de educação ambiental nas escolas, para que temas importantes presentes no cotidiano dos alunos sejam trabalhados de maneira crítica e participativa, proporcionando uma formação cidadã. No entanto, isso só será possível quando houver formação adequada para os professores, os quais devem estar preparados para discutir diferentes temas, tais como: a escassez hídrica, poluição, diminuição da qualidade e quantidade de recursos naturais sob o ponto de vista de sua disciplina bem como de maneira integrada com as demais.

 

 

A ÁGUA E SUA ABORDAGEM NO 6° ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL: PERCEPÇÕES SOBRE ESSA TEMÁTICA

 

A realidade dos recursos hídricos tem suscitado preocupações a nível mundial, principalmente, quando se trata das águas destinadas às múltiplas atividades humanas. Machado (2003) aponta que tal preocupação tem induzido a uma série de medidas governamentais e sociais, objetivando viabilizar a continuidade das diversas atividades públicas e privadas que têm como foco as águas doces, em particular, aquelas que incidem diretamente sobre a qualidade de vida da população. No campo da Educação ambiental, DIAS (1994) enfatiza a necessidade de o debate sobre a água incorporar dimensões sociais, políticas, econômicas, culturais, ecológicas e éticas tendo em vista a inviabilidade de abordar qualquer problema sem considerar as referidas dimensões.

Dado o caráter interdisciplinar da educação ambiental, ressalta-se a importância de abordar o tema água enquanto elemento da natureza transformado e utilizado no contexto da sociedade humana. Para tanto o conhecimento científico sobre o tema deve ser debatido no âmbito dos problemas sociais como a escassez e limitação de uso desse recurso, que tem ocorrido em nível mundial. Entretanto, segundo Loureiro (2003) esse contexto tem sido apontado de forma tênue nos livros didáticos do ensino fundamental e médio.

De acordo Petrovich e Araújo (2009), a não adequação do conteúdo programático das disciplinas à realidade ambiental vivenciada na região semiárida pode ser considerada uma justificativa para a existência dessa irregularidade. Freire (1980) já defendia a importância da relação com o contexto de vida para a formação plena e significativa dos indivíduos, por isso, a educação contextualizada com a realidade imediata do indivíduo assume importância primordial para que ele possa compreender o ambiente e os problemas nele encontrados.

 Sodré-Neto e Araújo (2008) também apontam a necessidade de uma maior divulgação científica, para complementar os conhecimentos já existentes sobre o assunto. Isto pode ser realizado por meio de ciclos de palestras para os professores ou da formação continuada sobre o tema dentro do campo da Educação ambiental.

            A educação ambiental e divulgação científica sobre a problemática da água em região semiárida apresentam-se como importantes estratégias para permitir uma melhor convivência das populações com o semiárido, por isso, há necessidade dessas estratégias se fazerem presentes em todos os níveis e modalidades de ensino, o tema água, por exemplo, não deve ser discutido apenas no sexto ano, mas retomado e remetido a outros conceitos pertencentes ao currículo de todas as disciplinas para que haja uma maior contextualização entre conhecimento científico e proveniente do senso comum. O capítulo seguinte apresenta as percepções de alunos do ensino fundamental contextualizando com outros estudos semelhantes realizados.

 

 

 

OS SABERES DOS ALUNOS DO 6º ANO DOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA NAS ESCOLAS ESTADUAL E MUNICIPAL ACERCA DA ÁGUA NA REGIÃO SEMIÁRIDA

 

Nas escolas escolhidas para obtenção dos dados dessa pesquisa, o questionário foi aplicado a um total de 28 alunos, 15 deles pertenciam à escola estadual e 13 à escola municipal. O questionário semiestruturado era composto por questões abertas, semiabertas e fechadas. As questões tinham por objetivo revelar percepções a respeito da importância da água para múltiplas finalidades, qualidade de água, poluição e biota dos corpos hídricos e atuação dos alunos enquanto cidadãos para preservação dos recursos.

Inicialmente, os alunos foram perguntados sobre qual a principal utilidade da água dos açudes Inharé e Santa Cruz para a população do município. Entre as alternativas, foram escolhidas: fonte de peixe (15%), local para lazer (25%), agricultura (35%), outras atividades econômicas (25%) (figura 2). Pode-se considerar, portanto, que os alunos apresentam a percepção da importância da água para os múltiplos usos humanos, semelhante a um estudo realizado por Maia e Guedes (2011), é notória a existência de concepção relacionada à dependência da água, uma vez que é reconhecida sua utilização para múltiplas atividades, como: consumo doméstico, agricultura, dessedentação de animais e lazer.

 

Figura 2: Respostas dos alunos sobre qual é a principal utilidade dos açudes do município para a população.

Fonte: Silva e Gomes (2013)

 

Em seguida, eles foram indagados se a água dos açudes poderia ser considerada de boa qualidade, contendo as alternativas: sim, não e não sei. 71% dos alunos consideram que a água não é de boa qualidade, 10% não souberam responder e, apenas 19% afirmaram ser de boa qualidade (figura 3). Deve-se atentar para o fato de os alunos associarem a qualidade da água com aspectos macroscópicos, como, presença de cor, principalmente. Nos açudes investigados, a água apresenta-se turva, além disso, deságuam em rios contaminados por efluentes domésticos. Lemos e Guerra (2004), em questionamento semelhante, afirmam haver a percepção de uma preocupação em relação à contaminação dos mananciais com decaimento progressivo da qualidade de água.

 

Figura 3: Respostas referentes à percepção sobre qualidade de água dos açudes.

Fonte: Silva e Gomes (2013)

 

 

A terceira questão tinha como objetivo identificar a percepção sobre quais as características de uma água de qualidade. Continha entre as alternativas opções, como: sem cor, coloração escura, coloração verde, sem cheiro, com cheiro forte, sem microrganismos causadores de doenças, sem substâncias domésticas provenientes de esgotos. Mais de uma alternativa poderia ser escolhida pelo público alvo. Em número de citações, entretanto, predominaram as explicitadas na figura 4. Estudo similar realizado por Araújo et al., (2011) demonstra que os alunos reconhecem as características organolépticas da água da forma como são abordadas nos livros didáticos: não tem cheiro, nem gosto, nem cor, sendo induzidos a tal resposta devido a repetição por parte dos professores dos conteúdos presentes no livro didático.

Figura 4: Número de citações referentes as características da água de boa qualidade.

Fonte: Silva e Gomes (2013)

 

Para averiguar se os alunos eram capazes de associar suas ações com as formas de poluição dos açudes, eles foram perguntados se achavam que o lixo e esgoto produzido em casa atingia os reservatórios. Em número de citações, 20 acreditam atingir, enquanto os demais não souberam responder a questão. Tal percentagem leva a acreditar que a esses alunos tem conhecimento da degradação dos mananciais devido à poluição oriunda da contaminação por esgotos doméstico, industrial e pluvial bem como da gerada pela falta de coleta e má destinação do lixo urbano (TUCCI; HESPANHOL; NETTO, 2000).

 

Figura 5: respostas referentes a percepção de que o esgoto e lixo produzido individualmente atingia o reservatório.

Fonte: Silva e Gomes (2013)

 

            Visando a identificar as concepções dos alunos sobre quais microrganismos vivos habitavam o açude, eles foram convidados a escolher mais de uma alternativa, entre as opções: fitoplâncton, cianobactérias, bactérias, algas, protozoários, todos esses, nenhum desses e não sei (figura 6). Todos esses microrganismos estão presentes, no entanto essa percepção foi obtida por apenas 9 participantes da pesquisa. De maneira geral, a dificuldade em reconhecer a existência desses organismos nos corpos hídricos reside no fato de eles não serem visualizados a olho nu. Na escola, vírus e bactérias são mais populares sobre o rótulo de microrganismos, enquanto os demais são pouco conhecidos embora possuam papel ecológico fundamental para a manutenção do equilíbrio ambiental. 

Figura 6: Respostas dos alunos sobre quais microrganismos estão presentes nos açudes.

Fonte: Silva e Gomes (2013)

 

Por último, foi aplicada uma questão aberta com o objetivo de identificar percepções sobre o que pode ser feito, enquanto cidadão, para melhorar os problemas da poluição dos açudes. Houve consenso nas respostas, as quais defenderam a importância de haver união da comunidade, cada um fazer sua parte, não poluindo, jogando lixo ou esgoto. No entanto, é perceptível que a população não adota ações para resolver os problemas ambientais, estudo realizado por Carvalho et al., (2012), no município de Vieirópolis PB, apontam que grande parcela da população também adotam uma posição passiva em

relação aos problemas do meio ambiente, embora seja considerável a importância e necessidade de estruturar ações coletivas com integração de diferentes atores sociais em uma prática comprometida de educação ambiental.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Os alunos desenvolveram importantes percepções sobre a temática água, no entanto, estas, devido à fragmentação do currículo ficam restritas ao sexto ano. De maneira geral, percebeu-se que os alunos reconhecem a importância dos reservatórios para as múltiplas atividades humanas, tendo em vista a relação de dependência existente em relação aos recursos hídricos

São capazes de caracterizar a qualidade de água, uma vez que reconhecem as características da água de boa qualidade da forma como são apontadas nos livros didáticos e inserem-se como agentes poluidores dos mananciais, identificando, portanto, as formas pontuais e difusas de poluição dos mananciais.

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

ARAÚJO, M. F. F.; DANTAS, C. M.; AMORIM, A. S.; SILVEIRA, M. L.; MEDEIROS, M. L. Q. Concepções prévias de professore do ensino básico de uma região semiárida sobre qualidade de água. Educação Ambiental em Ação, nº 38, 2011.

 

BACCI, D. L. C., PATACA, E. M. Educação para a água. Estudos avançados, v. 22, n. 63, p. 211-226, 2008.

 

BOUVY, M., PAGANO, M., TROSSELLIER, M. Effects of a cyanobacterial bloom (Cylindrospermospsis raciborskii) on bacterial and zooplankton communities in Ingazeira resevoir (northeast Brazil). Aquatic microbial Ecology [on line], v. 25, p. 215-227, 2001.

 

BOUVY, M. et al. Limnological features in Tapacurá reservoir (northeast Brazil) during a severe drought. Hydrobiologia [on line], v. 493, p. 115–130, 2003.

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988.

 

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: meio ambiente, saúde. Brasília, 1997b.

 

CARVALHO, I. C. M. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. Cortez: São Paulo, 2004.

 

CARVALHO, E. K. M. A.; SILVA, M. M. P. & CARVALHO, J. R. M. Percepção ambiental dos diferentes atores sociais de Vieirópolis, PB, Qualit@as Revista Eletrônica, v. 13, nº 1, 2012.

 

CHIZZOTTI, A. A pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais: evolução e desafios. Revista Portuguesa de Educação, v. 16, n. 2, p. 221-236, 2003.

 

COSTA, I. A. S. et al. Dinâmica de cianobactérias em reservatórios eutróficos do semi-árido do Rio Grande do Norte. Oecologia Brasiliensis, Rio de Janeiro, v. 13, p. 382-401, 2009.

 

DIAS, G. F. Educação Ambiental - princípios e práticas, Gaia: São Paulo, 1993.

 

DIAS, G. F. Educação Ambiental: princípios e práticas. 3. ed.  São Paulo: Gaia, 1994.

 

FAGGIONATO, S. Percepção ambiental. [on-line] 2005; [citado 26 out 2006]. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2013.

 

FREIRE, Paulo. Quatro cartas aos animadores de círculos de cultura de São Tomé e Príncipe, in: BRANDÃO, Carlos Rodrigues (org): A questão da educação popular, São Paulo, Brasiliense.

 

JACOBI, P. Educação, cidadania e sustentabilidade. Cadernos de Pesquisa, n. 118, p. 189-205, 2003.

 

JACOBI, P. R. Educação Ambiental: o desafio de um pensamento crítico, complexo e reflexivo. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.31, n. 2, p. 233- 250, 2005.

 

KRÜGER, V., GIL, R. L. A didática como referência das práticas de ensino: uma hipótese curricular para a formação inicial de professores. In: do IV ENCONTRO IBERO-AMERICANO DE COLETIVOS ESCOLARES E REDES DE PROFESSORES QUE FAZEM INVESTIGAÇÃO NA SUA ESCOLA, Anais... Lajeado, 2005.

 

LEMOS, C. A.; Guerra, T. Aspectos dos usos da água, agrotóxicos e percepção ambiental no meio rural, Maquiné, RS, Brasil. Geografia, v. 13, nº 2, jul/dez, 2004.

 

LOUREIRO, C. F. B. Movimento de cidadania pelas águas do rio Paraíba do Sul. Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa Databrasil; Ministério do Meio Ambiente, 1997. Relatório de Pesquisa.

 

MACHADO, C. J. S. Recursos hídricos e cidadania no Brasil: limites, alternativas e desafios.Ambiente & Sociedade, v. 6, nº 2, jul/dez, 2003.

MAIA, J. L., GUEDES, J. A. Percepção ambiental dos recursos hídricos no município de Francisco Dantas, RN. Sociedade e Território: Natal, v. 23, nº 2, p. 90-106, 2011.

 

MARÇAL, M. P. V. Educação ambiental e representações sociais de meio ambiente: uma análise da prática pedagógica no ensino fundamental em Patos de Minas – MG (2003-2004). 2005. 237 f. Dissertação (Mestrado)-Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2005.

 

MEDINA, H. V., GOMES, D. E. B. A indústria automobilística projetando para a reciclagem. In: Anais V P&D Design.UNB, Brasília: 2002. Não paginado

 

MININNI, N.M. Elementos para a introdução da dimensão ambiental na educação escolar – 1º grau. Amazônia: uma proposta interdisciplinar de educação ambiental. Brasília, IBAMA.  1994.

 

MOLICA, R. J. R. et al. Occurence of saxitoxins and an anatoxin-a(s)-like anticholinesterase in a Brazilian drinking water supply . Harmful Algae, United states of America, v. 4, n.4, p. 743-753, 2005.

 

OLIVEIRA, A. C. P. et al. Influence of drinking water composition on quantification and biological activity of dissolved microcystin (cyanotoxin). Environmental Toxicology [on line], v. 20, p. 126-130, 2005.

 

PETROVICH, A. C., ARAÚJO, M.F.F. Percepção de professores e alunos sobre os usos e a qualidade da água em uma região semi-árida brasileira. Educação Ambiental em Ação. n. 29, 2009.

 

ROSA L. G., SILVA M. M. P. Percepção ambiental de educandos de uma escola do ensino fundamental. In: 6º SIMPÓSIO ÍTALO BRASILEIRO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL; 2002, Vitória (ES), Brasil, Anais.... Vitória, 2002.

 

SAUVÉ, L. Educação ambiental: possibilidades e limitações Educação e Pesquisa, São Paulo, v.31, p. 317-322, 2005.

 

SODRÉ-NETO, L., ARAÚJO, M. F. F. Qualidade de água como tema para a socialização do conhecimento científico em região semi-árida brasileira. Educação Ambiental em Ação, n. 26, 2008.

 

TUCCI, C. E. M.; HESPANHOL, I.; NETTO, O. M. C. Cenários na Gestão da Água no Brasil: Uma Contribuição para a "Visão Mundial da Água". Revista Brasileira de Recursos Hídricos, v. 5, n. 3, p.31-43, 2000.

 

TUNDISI, J. G. Água no século XXI: enfrentando a escassez. São Paulo: Editora Rima, 2. ed., 2005.

 

VIEIRA, V., BIANCONI, M., DIAS, Monique. Espaços não-formais de ensino e o currículo de ciências. Cienc. Cult. [online], v. 57, n. 4, p. 21-23. 2005.

 

WHYTE, A. V. T. Guidelines for field studies in Environmental Perception.MAB Technical Notes. Paris: UNESCO, 1977.

 

YIN, Robert K. - Case Study Research - Design and Methods. Sage Publications Inc., USA, 1989.

 

Ilustrações: Silvana Santos