Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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16/12/2013 (Nº 46) PROJETO RECICLA RURAL: INICIATIVAS E LIMITES NA BUSCA POR UMA UNIVERSIDADE SOCIOAMBIENTALMENTE RESPONSÁVEL
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Projeto Recicla Rural: iniciativas e limites na busca por uma Universidade socioambientalmente responsável

Universidade Federal Rural de Pernambuco

 

Amanda Gonçalves Pereira

Gizele Lizete de Moura Martins Rocha

Geiza de Oliveira Lima

Elaine Cristiane

Karine Matos Magalhães

amanda_pereira88@hotmail.com

karinematosmagalhaes@gmail.com

 

1 Bacharelado em Ciências Sociais, Universidade Federal Rural de Pernambuco. Integrante do grupo de pesquisa        Desenvolvimento e sociedade. Fone: (81) 8644-6749. E-mail: amanda_pereira88@hotmail.com.

2 Engenharia Agrícola Ambiental, Universidade Federal Rural de Pernambuco. E-mail: gizelemartinsrocha@gmail.com

 

3Licenciatura em Ciências Biológicas, Universidade Federal Rural de Pernambuco. E-mail: geizablima@gmail.com

4 Licenciatura em Ciências Biológicas, Universidade Federal Rural de Pernambuco. E-mail: cris.elaine17@gmail.com

 

5 Professora Adjunto do Departamento de Biologia/Área de Ecologia da Universidade Federal Rural de Pernambuco. magalhaeskm@gmail.com  

 

Resumo

A Universidade Federal Rural de Pernambuco conta, desde o ano de 2008, com o projeto de extensão Recicla Rural (UFRPE). O projeto nasceu com o objetivo de unificar os esforços de separação e destinação adequados dos resíduos sólidos produzidos no Campus da UFRPE, de acordo com o decreto nº 5.940/2006 - Coleta Seletiva Solidária - que institui a separações dos resíduos recicláveis produzidos por instituições públicas federais e, a sua destinação a cooperativas e associações de catadores desses materiais. A proposta deste trabalho é resgatar a história de atuação do projeto na Universidade em suas ações de extensão, bem como pontuar as suas conquistas, desafios e obstáculos para garantir não só o seu funcionamento, mas, sobretudo, sua tão necessária expansão dentro de uma estrutura burocrática que é uma Instituição de Ensino Superior pública no Brasil.

Palavras-chave: Coleta Seletiva; Reciclagem; Responsabilidade Socioambiental.

 

1. Introdução

 

Em 2008 nasceu o Projeto Recicla Rural na sede da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). O projeto de extensão, de cunho socioambiental foi criado com o objetivo de evitar o descarte indevido de materiais que poderiam ser reciclados, mas que, por falta de ações voltadas para o reaproveitamento, acabavam no aterro sanitário. Sendo assim, foi dado início a cooperação da UFRPE com a Associação Trapeiros de Emaús, uma entidade social sem fins lucrativos com objetivo de gerar oportunidades a pessoas carentes da cidade do Recife, de conseguir sua dignidade através de um trabalho de coleta, recuperação e venda de objetos usados e reciclagem de resíduos sólidos. O referido Projeto busca unificar os esforços de coleta seletiva de resíduos sólidos urbanos e a sua reciclagem, a partir da separação dos materiais na fonte geradora, o Campus de Dois Irmãos da UFRPE, bem como a sua doação para a associação, como uma forma de aproximar a Universidade de um trabalho social com responsabilidade ambiental.

Além da iniciativa, o decreto nº 5.940/2006 - Coleta Seletiva Solidária, institui a separação dos resíduos recicláveis descartados pelos órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta, na fonte geradora, e a sua destinação às associações e cooperativas dos catadores de materiais recicláveis (Brasil, 2006). A UFRPE, como uma Instituição de Ensino Superior Federal, tem, portanto, a obrigação de estar dentro dos parâmetros legais, não apenas por uma imposição jurídica, mas, sobretudo, no âmbito educacional, por oferecer em seu programa de ensino disciplinas relacionada às questões ambientais e sociais. A Universidade deve estar atenta às necessidades sociais e evitar a degradação ambiental, já que a conservação do meio ambiente é uma das questões sociais mais urgentes da pós-modernidade. Dessa forma, o Projeto Recicla Rural se faz necessário e atuante. O seu bom funcionamento apresenta-se a cada dia mais importante para a difusão da sensibilização ambiental da comunidade acadêmica, transformando a UFRPE em uma Universidade mais comprometida em solucionar problemas socioambientais

Além desse compromisso com os Trapeiros de Emaús e com a comunidade acadêmica da UFRPE, o Recicla Rural colabora com a ONG Associação Projeto Criança (APC), através oficinas e aulas práticas sobre coleta seletiva, reutilização de materiais recicláveis, hortas suspensas mantidas com nutrientes advindos de restos orgânicos e a construção da composteiras. A cada oficina oferecida é explicado, às crianças participantes, a importância da preservação do meio ambiente. A APC funciona desde 2001 e tem como objetivo principal desenvolver um trabalho que reflita em uma melhor qualidade de vida às crianças e adolescentes em situação de risco e com dificuldade escolar, residentes na comunidade do Conjunto Beira Mar, município do Paulista-PE. A ONG atende diretamente 237 crianças, adolescentes e jovens entre 3 a 18 anos, estimulando suas habilidades naturais através de oficinas de música, dança, esportes, reforço escolar e orientações voltadas à espiritualidade e saúde. Além de oferecer um espaço sadio favorecendo o desenvolvimento criativo, físico, intelectual e espiritual das crianças, a APC também busca atender aos pais incentivando-os a participarem nas oficinas de promoção a Paz familiar, saúde, educação alimentar entre outras.

Dessa forma a proposta do presente trabalho é apresentar o Projeto Recicla Rural a partir de uma perspectiva social e ambiental, tendo em vista, a sua história dentro da UFRPE, suas ações, conquistas e obstáculos na busca de uma Universidade mais comprometida com o meio ambiente e com a sociedade.

 

Metodologia

Para a construção deste trabalho foram realizadas visitas periódicas ao Restaurante Universitário da UFRPE, a associação Trapeiros de Emaús, a ONG Associação Projeto Criança, bem com a comunidade de Sítio dos Pintos, vizinha à Universidade. Essas visitas aconteceram como parte da constituição do direcionamento das atividades do projeto e tinham o objetivo de apreensão das necessidades de cada local, para que dessa forma, possíveis soluções fossem construídas em parceria. Nelas utilizamos registros fotográficos e entrevistas com o os atores sociais envolvidos como uma forma de avaliação e compreensão da realidade com a qual nos encontramos.

Também foi elaborado um questionário piloto, que foi aplicado a professores e técnicos administrativos do departamento de biologia da UFRPE. O objetivo foi avaliar a percepção dos respondentes com relação à importância das atividades do projeto no que tange ao manejo de resíduos sólidos e a implementação da coleta seletiva dentro do Campus.

 

2. Resíduos sólidos: uma questão de ordem socioambiental.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT, 2004) conceitua os Resíduos Sólidos como sendo:

Resíduos nos estados sólido e semi-sólido, que resultam de atividades de origem industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços e de varrição. Ficam incluídos nesta definição os lodos provenientes de sistemas de tratamento de água, aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de poluição, bem como determinados líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou corpos de água, ou exijam para isso soluções técnica e economicamente inviáveis em face à melhor tecnologia disponível.

Se procurarmos a palavra lixo no dicionário encontraremos a seguinte definição: o que se varre de casa, da rua, e se joga fora; entulho. (FERREIRA, 2001, p.430). Uma definição, portanto, de algo que não tem nenhuma serventia, inútil. Contudo, o que essa definição não mostra é que muito do que jogamos fora ainda tem utilidade econômica, ambiental e social. Somente a cidade do Recife- PE- produzia no início do século XXI cerca de 1.300 quilogramas de lixo diariamente (IBGE, 2000). Sendo gastos aproximadamente R$ 8,2 milhões por mês com a sua coleta, transporte e manejo. Dados mais recentes indicam que Recife gera uma quantidade ainda maior, próxima de 2.300 kg/dia de resíduos sólidos. (PAZ. D.H.F.et al. 2011, P. 01)

Os investimentos, a nova ordem social e a urbanização da era industrial deram formas a uma civilização que se caracterizou por ultrapassar os limites da dimensão humana, por criar o tempo abstrato e aglutinar uma massa de miseráveis urbanos em substituição à pobreza rural. A modernidade, que eclodiu a partir do século XVI, com as expansões ultramarinas e as revoluções científica e industrial, transformou a cultura em um processo civilizatório e assim passou a estabelecer uma relação de oposição entre cultura/ civilização, de um lado, e natureza do outro. Lembremo-nos de que “civilizar” passa a ser a expressão usada para designar as conquistas mercantis-colonialistas da Europa sobre os povos “primitivos” dos demais continentes (HERCULANO, 1992, p. 10).

 Vivemos em uma sociedade em que boa parte do que compramos vai para a lixeira quase na mesma velocidade com a qual é produzido. Uma sociedade de obsolescências programadas, onde o ato de consumir, em si e não para si, é supervalorizado. A sociedade do risco, segundo o sociólogo alemão Ulrich Beck, onde: em todas essas novas tecnologias incertas de risco estamos separados da possibilidade e dos resultados por um oceano de ignorância (BECK, 2006, p.05). Nessa realidade produzimos toneladas de lixo diariamente, contudo:

Por outro lado, há uma consciência crescente de que o modelo de sociedade industrial avançada do Ocidente não poderá se manter a longo prazo com os padrões de produção e consumo baseados no esbanjamento de energia não-renovável, na degradação ambiental, na espoliação da mão de obra e dos recursos naturais dos países de Terceiro Mundo e no crescente fosso entre o Norte e o Sul. (DIEGUES, 1992,p. 22).

Uma pesquisa do Ministério do Meio Ambiente mostra que a preocupação da população brasileira com as questões ambientais vem aumentando nos últimos anos e já é a sexta maior preocupação da população brasileira, mesmo assim:

Na fase que de pós-consumo, os brasileiros ainda possuem hábitos prejudiciais, sobretudo no descarte incorreto de itens como pilhas, baterias e lixo eletrônico. Mas, em comparação a 1992, a preocupação com o lixo aumentou significativamente (29%), fato que pode ser atribuído à divulgação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, desde 2010. Segundo a pesquisa, 52% da população brasileira ainda não separam lixo, mas quase metade (48%) afirma fazê-lo. A disposição em separar o lixo é maior nas áreas urbanas (50%), contra 35% na área rural. A região Sul possui o maior percentual de coleta seletiva (76%), seguida pelo Sudeste (55%), Centro-Oeste (41%) e Nordeste (32%). A região Norte possui o menor índice de famílias que separam o lixo, 27%. A disposição para separar o lixo vem aumentando significativamente. Em 2001 era de 68%, em 2006, 78%, e em 2012 é de 86%. (MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE, 2012).

Com o advento da sociedade capitalista de consumo, que como ressalta a antropóloga Lívia Barbosa, ao observar a opinião de alguns autores, se caracteriza como sendo: “consumo de massa e para as massas, alta taxa de consumo e de descarte de mercadorias per capita, presença de moda, sociedade de mercado, sentimento permanente de insaciabilidade e o consumidor como um de seus principais personagens sociais.” (BARBOSA, 2003, p. 8), nos deparamos com uma realidade cada vez mais inquietante que é a dificuldade de manejar corretamente a grande quantidade de lixo gerado por essa sociedade.

O acúmulo desses resíduos vem causando preocupações, mesmo que insipientes,à administração pública no Brasil. Foi criada no governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Política Nacional de Resíduos Sólidos a Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010

Que dispõe sobre os princípios, objetivos e instrumentos, bem como sobre as diretrizes relativas à gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos, incluídos os perigosos, às responsabilidades dos geradores e do poder público e aos instrumentos econômicos aplicáveis. (BRASIL, 2010).

 

A lei prevê a responsabilidade compartilhada entre o poder público, as indústrias, empresas, comerciantes e a sociedade civil na gestão dos resíduos sólidos. Também destaca a importância das associações e cooperativas de catadores de materiais recicláveis como um valioso instrumento na busca de um manejo adequado dos resíduos (BRASIL, 2010).

A lei também se destaca por prever a extinção dos lixões e sua substituição pelos aterros sanitários, ou seja, o lixo não pode mais ser deixado ao ar livre e exposto, contaminando o solo e liberando gases tóxicos. Além de não ser permitida a entrada de pessoas nos aterros sanitários, realidade encontrada nos lixões, tendo os Estados que se adequarem a esta mudança até 2014. Essas medidas pretendem minimizar o problema gerado pelo consumo inconsciente e o descarte e manejo incorretos dos resíduos sólidos no Brasil, entretanto, para que essa realidade mude verdadeiramente é necessário mudar uma cultura de consumo e de exploração exacerbada dos recursos naturais tão presente nas sociedades capitalistas modernas.

 

3. Projeto Recicla Rural: importância, atuação e necessidade de expansão na UFRPE

 

Em princípio, o foco do projeto Recicla Rural era o papel, material descartado em grande quantidade na Universidade. O projeto piloto, que teve a parceria da prefeitura do Campus, com pontos de coleta de papel próximos ao Departamento de Biologia, sendo estes as copiadoras e a secretária da reitoria. Foram realizadas divulgações do projeto em páginas eletrônicas da UFRPE e do PET/Biologia, e também através de cartazes e palestras durante a semana de biologia deste mesmo ano. Também foi realizada a capacitação dos funcionários que trabalhavam na limpeza da Universidade, pretendendo o adequado manejo do material, e enfatizando a importância do projeto para o meio ambiente e para a Associação parceira do projeto.

Somente nas primeiras cinco coletas, realizadas semanalmente, foram obtidos cerca de meia tonelada de papel. Esse material foi doado a Associação Trapeiros de Emaús (Figura 1) e beneficiou cerca de 300 pessoas direta e indiretamente da comunidade de Dois Unidos em Recife – PE onde a Associação está localizada. A venda do papel auxilia a associação a promover suas ações beneficentes, como: cursos profissionalizantes para jovens e bazares de materiais reaproveitados. Atualmente o volume de papel varia de acordo com as atividades dos diversos órgãos administrativos da Instituição.

Figura 1. Coleta de papel pelos associados da Associação Trapeiros de Emaús, no Campus da Universidade Federal Rural de Pernambuco em 2012.

 

Desde então o projeto vem buscando expandir o seu campo de atuação para outros resíduos. No ano de 2011 o projeto contou com apoio do MEC através de financiamento do PROEXT, o que melhor equipou o grupo com a aquisição de contentores com rodas para recolhimento do papel, além da realização de treinamentos e palestras junto à comunidade em geral, além do financiamento de 6 bolsas de Extensão, indispensáveis para a execução das atividades.

Atualmente, há pontos de coleta de papel em quase todos os órgãos administrativos do Campus, contudo, ainda é necessária a expansão para os Departamentos Acadêmicos e salas de aula. A limitação de expansão de pontos vem de um grande problema estrutural e em sua logística enfrentado. O Campus de Dois Irmãos da UFRPE, localizada no bairro de Dois Irmãos Recife-PE, ocupa uma área de 147 ha e possui 132 prédios, o que vem dificultando a coleta e impedindo que o campo de atuação do projeto se expanda ainda mais, já que a área é muito grande e não há um local único de acondicionamento dos resíduos até a coleta definitiva pelos Trapeiros.

Desta forma a coleta vem sendo realizada com os trabalhadores da associação indo de local em local para o recolhimento do material. Ou seja, a coleta que poderia ser rápida se houvesse um único ponto de armazenamento. Atualmente a coleta está durando muito mais tempo do que o necessário e atrasando o trabalho dos associados, que dependem do tempo para aumentar a quantidade de coletas, bem como não está sendo eficiente como poderia ser, uma vez que poderíamos estar recolhendo uma quantidade muito maior de papel se houvesse um local apropriado para o seu acondicionamento. A solução também passa pelo engajamento dos responsáveis pela limpeza do Campus e da destinação do papel para o local de armazenamento.

Um galpão apropriado para o armazenamento de materiais recicláveis é fundamental para que o projeto possa ser expandido, pois além de aumentarmos o volume de papel coletado, também possibilitaria ao projeto recolher outros tipos de materiais recicláveis gerados no Campus da Universidade como plástico e metal, onde há uma grande demanda gerada, por exemplo, pelo Restaurante Universitário. Dessa forma o projeto expandiria consideravelmente a sua área de atuação dentro do Campus e, com isso, o número de parcerias com outras cooperativas e Associações que trabalhão com esses tipos de material. Além disso, a concentração de resíduos em um só local facilita a pesagem e controle da doação de material.

A nova gestão da reitoria e da prefeitura da UFRPE (2012-2016) fechou uma parceria com o projeto na tentativa de minimizar os problemas ambientais da Universidade no que tange aos resíduos sólidos e as questões socioambientais, inerentes a qualquer Instituição de Ensino. Uma das maiores preocupações da prefeitura do Campus diz respeito à adequação do Restaurante Universitário (RU) as normas socioambientais, que após ficar fechado durante quatro anos para reformas, reabriu no dia 22 de março de 2011.

Um dos problemas é que não há um reaproveitamento dos Resíduos Sólidos produzidos pelo RU, o que vem causando danos ambientais que poderiam facilmente ser minimizados apenas com o reaproveitamento ou substituição dos materiais descartados pelo restaurante como: copos plásticos descartáveis, papelão, alumínio, plástico, resto ingesta entre outros. A proposta do Recicla Rural, junto à administração do RU é a de realizar campanhas educativas tanto com o público quanto com os funcionários. Esta etapa está prevista para ter início imediatamente após a chegada do material solicitado pela Reitoria, que inclui coletores seletivos para a área externa do RU, além da instalação de um ponto de armazenamento do resíduo coletado.

Outro caso preocupante é que, quando chove, as caixas de gordura do RU trasbordam e restos alimentares escoam para a comunidade vizinha, Sítio dos Pintos (figura 2). O fato ocorre devido o sistema de armazenamento de gordura e o receptor de águas pluviais estarem interligados, não sendo, dessa forma, adequados a um restaurante do seu porte. Fato esse que vai de encontro à Resolução RDC nº 216, 15 de setembro de 2004 da ANVISA (2004) que define: “As caixas de gordura e de esgoto devem possuir dimensão compatível ao volume de resíduos, devendo estar localizadas fora da área de preparação e armazenamento de alimentos e apresentar adequado estado de conservação e funcionamento”. A ABNT (2004) também ressalta que a:

Prevenção de poluição, uso de processos, práticas, técnicas, materiais, produtos, serviços ou energia para evitar, reduzir ou controlar (de forma separada ou combinada) a geração, emissão ou descarga de qualquer tipo de poluente ou rejeito, para reduzir os impactos ambientais. A prevenção da poluição pode incluir redução ou eliminação de fontes de poluição, alterações de processo, produto ou serviço, uso eficiente de recursos, materiais e substituição de energia, reutilização, recuperação, reciclagem, regeneração e tratamento.

 

 


 


Figura 2. Vazamento do esgotamento sanitário do Restaurante Universitário para comunidade de Sítios dos Pintos, Recife, PE, registrado em agosto de 2012.

 

Esse vazamento vem prejudicando a comunidade do Sitio dos Pintos que está sofrendo com o mau cheiro, aumento de pragas urbanas como: mosquitos, ratos, entre outros, desde que o restaurante foi reaberto. No local há estabelecimentos comerciais e, os negociantes sentem-se lesados pelos problemas estruturais do restaurante e cobram da Universidade ações.

 

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Figura 3. Morador da comunidade de Sitio dos Pintos, Recife, PE, apontando o local de onde vem o mau cheiro (muro que divide a Universidade da comunidade) em agosto de 2012.

 

O projeto Recicla Rural vem fazendo visitas ao RU com o objetivo de realizar a análise do esgotamento sanitário na busca de uma possível solução para o problema do restaurante. Contudo, logo na primeira visita ao local percebemos que o problema é quase tão antigo quanto à construção original do restaurante. Ou seja, trata-se de um problema antigo na base estrutural da construção do restaurante, que precisa ser abordado definitivamente.

Diante deste cenário, a Instituição vem atuando nas limpezas das caixas, contudo ainda são necessários uma avaliação e um estudo aprofundado sobre o sistema de esgotamento sanitário, a fim de resolver definitivamente tal situação. Entendemos que o papel da Universidade é acolher a comunidade, estar a serviço da comunidade e não ao contrário, desta forma, ações junto a Prefeitura do Campus e aos órgãos responsáveis dentro da Instituição estão sendo encaminhadas.

Entendemos que a nova administração precisa estar verdadeiramente comprometida com o problema, para que se encontre uma solução que beneficie não apenas os usuários do restaurante, na sua maioria discentes da Universidade, mas também os moradores da comunidade de Sitio dos Pintos, vizinha a UFRPE, que anseiam por uma solução para os vazamentos. 

Diante destes e de outros problemas ambientais abordados pelo Recicla Rural e na tentativa de entender como a comunidade acadêmica percebe estes problemas e, em especial, os resíduos sólidos, foi aplicado um questionário piloto durante o mês de setembro de 2012. O questionário que possuía 36 questões e foi aplicado inicialmente, apenas a professores e técnicos administrativos do Departamento de Biologia com um total de 26 respondentes.

De acordo com os resultados observados, 100% dos questionados responderam que é importante a implementação da coleta seletiva no Campus da Universidade. Cerca de 77% dos questionados avaliaram os pontos de coleta de regular de resíduos sólidos como sendo péssimos ou ruins, assim como cerca de 86% avaliaram a limpeza do Campus como péssima e ruim.

Do total dos questionados, 71% acreditam que a UFRPE não é uma Universidade engajada com as questões ambientais da atualidade. Bem como 85% das pessoas acreditam que a UFRPE não realiza atividades de Educação socioambiental com a sua comunidade acadêmica focadas na questão dos resíduos sólidos.

Essa pequena amostra nos faz pensar sobre o quanto é necessário aprofundarmos nosso conhecimento com relação ao desejo da comunidade acadêmica em fazer parte de uma Universidade mais preocupada e engajada com as questões socioambientais. Além disso, este fato nos faz perceber o quanto é necessário que a própria Universidade aja rapidamente, para que o projeto Recicla Rural e outras iniciativas possam ganhar mais espaços de atuação nesse embate constante que é o trabalho dentro de uma instituição em geral, burocrática.   

As deficiências do projeto e suas conquistas são compartilhadas com a UFRPE, que vem investindo em pesquisa, ensino e extensão para manter-se como uma das melhores Universidades do Estado de Pernambuco. Encontrar nesse caminho cheio de obstáculos um espaço para implementar as suas ações vem sendo um dos maiores desafios do projeto, principalmente no que tange a sua permanência em uma instituição burocrática, que é o caso de uma Universidade Federal no Brasil. Todavia, entendemos que:

O papel de destaque assumido pelas IES no processo de desenvolvimento tecnológico, na preparação de estudantes e fornecimento de informações e conhecimento, pode e deve ser utilizado também para construir o desenvolvimento de uma sociedade sustentável e justa. Para que isso aconteça, entretanto, torna-se indispensável que essas organizações comecem a incorporar os princípios e práticas da sustentabilidade, seja para iniciar um processo de conscientização em todos os seus níveis, atingindo professores, funcionários e alunos, seja para tomar decisões fundamentais sobre planejamento, treinamento, operações ou atividades comuns em suas áreas físicas. (TAUCHEN. J, BRANDLI. L. 2006, p. 503).

 

 

Considerações finais

 

Diante do exposto constata-se que o Projeto Recicla Rural vem conquistando seu espaço dentro da UFRPE principalmente pela iniciativa ser a mais antiga dentro da Universidade ainda em funcionamento, sendo sua atuação fundamental na gestão de resíduos sólidos e na conscientização ambiental no meio acadêmico. O Projeto tem boa aceitação e apoio da comunidade, especialmente dos técnicos administrativos e alunos que contribuem com a coleta e aprovam a continuação e permanência do Projeto.

Em nosso questionário piloto, podemos perceber que a opinião dos respondentes é clara com relação à importância de uma Universidade comprometida com questões ambientais. Quando 100% dos respondentes concordaram com a importância de fortificar a coleta seletiva na Universidade nos mostra que a ensejo do projeto é legitimo e urgente.

Portanto, percebemos que o projeto é essencial na difusão da sensibilização ambiental entre a comunidade acadêmica e, também, como parte da integração entre a Universidade e a comunidade situada em seu entorno. Destacamos as suas atividades de extensão que ajudam na formação da educação ambiental das crianças de adolescentes da ONG APC e, nas atividades realizadas em conjunto com a Associação Trapeiros de Emaús, parceira do projeto. Entretanto, expandir as suas atividades vem sendo um obstáculo para o projeto, visto que é parte de uma instituição burocrática. Recentemente a nova administração tem abraçado o projeto, o que deve fazer com que as necessidades estruturais de crescimento do projeto sejam sanadas ou, pelo menos, agilizadas.

Ultrapassar esses obstáculos é essencial para o projeto, mas, sobretudo, é essencial para a Universidade como uma Instituição de Ensino Superior e que tem compromisso com a construção de uma sociedade mais comprometida com causas ambientais, tão essenciais, nesses tempos de consumo desmesurado.

 

 

Referências

 

ABNT- Associação Brasileira de Normas Técnicas – NBR 10004; Resíduos Sólidos: Classificação. São Paulo (SP), 2004.

ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. Sistemas da gestão ambiental – Requisitos com orientações para uso. NBR ISO 14001. Rio de Janeiro, 2004.

BARBOSA, Lívia. Sociedade de Consumo. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.

 

BECK, Ulrich. Incertezas Fabricadas. Entrevista concedida à revista eletrônica IHU OnLine. Disponível em:

http://www.ihuonline.unisinos.br/uploads/edicoes/1158345309.26pdf. Acesso em: 15 jan. 2010.

 

BRASIL. Decreto Nº 5.940, de 25 de outubro de 2006.

 

BRASIL. Lei nº 12.305, Política Nacional de Resíduos Sólidos. Altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Brasília, DF, 8 fev. 2010. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm. Acessado em: 03 de set. 2012.


DIEGUES, Antonio Carlos Sant’ana. Desenvolvimento sustentável ou sociedades sustentáveis. Cadernos FUNDAP, v. 6, p. 22-30, 1992.

 

FERREIRA, Aurélio Buarque. de H. Mini Aurélio Século XXI Escolar. 4ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 2001.

 

HERCULANO, Selene. Do desenvolvimento (in)suportável à sociedade feliz. In: GOLDENBERG, Miriam, Org. Ecologia, Ciência e Política. Rio de Janeiro: Revan, 1992, pp. 9 -48. Disponível em:http://www.uff.br/lacta/publicacoes/dodesenvolvimentoinsuportavel.htm. Acesso em 28 fev2011.

 

IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de População e Indicadores Sociais, Pesquisa Nacional de Saneamento Básico. 2000.

 

PAZ, Diego Henrique Fernandes da.  et al.Estudo da Valoração Econômica dos Resíduos Sólidos Domiciliares no Município de Recife/PE. In: II Congresso Brasileiro de Gestão Ambiental, 2011, Londrina-PR. II Congresso Brasileiro de Gestão Ambiental, 2011.

 

TAUCHEN, Joel; BRANDLI, Luciana Londero. A gestão ambiental em instituições de ensino superior: modelo para implantação em campus universitário. Disponível em: Acesso em: 05 de mar. 2013.

 

Ilustrações: Silvana Santos