Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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16/12/2013 (Nº 46) A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE NÍVEL SUPERIOR: ELEMENTOS PARA UM DEBATE
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A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE NÍVEL SUPERIOR: ELEMENTOS PARA UM DEBATE

 

Isonel Sandino Meneguzzo (imeneguzzo@hotmail.com) - Doutor em Geografia pela Universidade Federal do Paraná, Docente do Departamento de Geociências, Universidade Estadual de Ponta Grossa

Eloisa Aparecida Silva Ávila de Mattos (elomatos@utfpr.edu.br) - Docente, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campus Ponta Grossa

Adeline Chaicouski (chaicouski@hotmail.com) - Mestranda em Ciência e Tecnologia em Alimentos, Universidade Estadual de Ponta Grossa

 

 

 

RESUMO: Este texto tem por objetivo debater alguns elementos referentes à educação ambiental na educação tecnológica de nível superior a partir de aspectos da Lei 9.795/99 que institui a Política Nacional de Educação Ambiental e do Decreto 4.297/02 que trata do Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil. Para a consecução da pesquisa adotou-se como orientação teórico-metodológica a abordagem crítica. Destaca-se a dificuldade na realização de tal trabalho por parte do (a) docente na formação de um cidadão (ã) apto a compreender aspectos alusivos aos processos sociais e ambientais devido aos currículos serem específicos e os cursos tecnológicos de rápida duração. Diversos autores propõem mudanças significativas em relação à ética ambiental, aos valores relacionados à formação humana e a adoção de uma postura radical diante da problemática ambiental. Sugere-se utilizar uma abordagem de ensino pautada na interdisciplinaridade, com vistas a promover a conscientização socioambiental e formação dos acadêmicos levando-se em consideração os documentos supracitados.

Palavras-chave: educação tecnológica, educação ambiental, meio ambiente.

 

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas do século passado e anos iniciais do século XXI, a Educação Ambiental (EA) vem recebendo atenção especial dos governantes nas diferentes esferas (federal, estadual e municipal), de organizações não-governamentais, empresários, bem como da mídia em geral. Especificamente no âmbito da educação formal, envolvendo a educação básica e a educação superior se observa uma postura, com iniciativas ainda incipientes de se ambientalizar os currículos de cursos superiores de tecnologia que não possuem relação direta com a questão ambiental. Isso se deve ao fato da profunda crise civilizacional que atinge a humanidade (CAPRA, 2006; LEFF, 2008) e à emergência de possíveis soluções em relação aos problemas socioambientais contemporâneos.

Apesar dos esforços realizados por diferentes segmentos da sociedade, a EA ainda não teve sua consolidação em termos de efetividade na prática pedagógica e até mesmo enquanto política pública no Brasil, nos diferentes níveis de ensino, principalmente nos cursos superiores de tecnologia que não estão diretamente ligados a ela. Apesar do conceito de EA ter sido citado pela primeira vez na Grã-Bretanha, no ano de 1965 (DIAS, 1998) e se disseminado pelo mundo com diferentes roupagens, um longo caminho envolvendo diversas abordagens e concepções, vem sendo trabalhadas, tanto em nível mundial, quanto em nível nacional, de forma superficial no processo ensino-aprendizagem. Isto ocorre tanto na educação básica e superior, quanto no âmbito da educação não formal.

Diante disso vale destacar que o quadro econômico, político, social e educacional do Brasil é bastante complexo e contraditório (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2007) e a questão ambiental não foge a esse contexto.

É de suma importância se trabalhar a EA na educação tecnológica de nível superior, pois os estudantes além da formação acadêmica que recebem, pautada em conhecimentos específicos de sua área de formação, com caráter técnico e científico devem também ter acesso às informações sobre a questão ambiental. Dessa maneira, a formação tende a ser abrangente, permitindo também que o futuro profissional possa estar capacitado a compreender alguns aspectos que envolvem a dinâmica dos fenômenos ambientais e sua relação com a sociedade. Atualmente, urge a necessidade de incorporação de valores e atitudes aos conhecimentos sobre processos ambientais para que se constitua a definição de uma relação de equilíbrio dos indivíduos com o ambiente em que vivem (TOZZONI-REIS, 2008).

Nesse sentido o presente texto tem como premissa debater sobre alguns elementos alusivos a EA na educação tecnológica de nível superior a partir de aspectos da Lei 9.795/99 que institui a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA) e do Decreto 4.297/02 que trata do Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil (ZEE) visando contribuir para o processo ensino-aprendizagem na educação tecnológica. Para docentes e discentes de cursos tecnológicos é de vital importância a aplicação destes instrumentos na prática pedagógica, pois os conhecimentos envolvendo os processos produtivos e tecnológicos devem estar atrelados ao contexto ambiental e socioeconômico de um determinado recorte espacial, conforme preconiza o ZEE, por exemplo. Ressalta-se que o termo tecnologia aplicado à área educacional é aqui adotado na perspectiva da matriz conceitual apresentada por Tavares, onde este autor indica que a tecnologia é entendida como... construção social, produção, aplicação e apropriação de atividades práticas, saberes e conhecimentos(TAVARES, 2006, p. 37). Dessa forma, a educação envolvendo a tecnologia é fundamental para que um determinado espaço geográfico possa desenvolver-se do ponto de vista econômico, social, cultural e ambiental.

Partiu-se da problemática de que existem dificuldades de se trabalhar a EA no âmbito de cursos superiores de tecnologia, pois os mesmos constituem-se em cursos de rápida duração, com matrizes curriculares ainda específicas e voltadas essencialmente para a formação tecnológico-científica dos (as) acadêmicos (as). Assim a questão condutora da discussão ora apresentada foi a seguinte: Quais os elementos que compõem as práticas de educação ambiental na educação tecnológica de nível superior? Nesse sentido, o artigo busca responder tal questionamento a partir da premissa dos instrumentos legais, de cunho ambiental, aplicados ao contexto da educação tecnológica.

 

METODOLOGIA

 

A abordagem teórico-metodológica empregada para a consecução deste artigo esteve amparada na teoria crítica. A noção de criticidade adotada no estudo apoia-se naquela apresentada por Vesentini (2009). Para este autor, a abordagem crítica consiste em discernimento, apreciação e compreensão do objeto de estudo. Dessa forma, a adoção da teoria crítica auxilia no avanço e no aprimoramento do conhecimento, promovendo uma revolução no sentido de propor alternativas e/ou perspectivas (VESENTINI, 2009).

Nesse sentido, foram adotados os seguintes procedimentos metodológicos para a produção deste artigo: Revisão bibliográfica com o intuito de levantar aspectos teóricos da Educação Ambiental e da Educação Tecnológica no Brasil. Adicionalmente, foi realizada pesquisa documental com a utilização de publicações oficiais relacionadas a políticas públicas (leis, decretos e resoluções) emitidos pelo poder público federal com o intuito de sustentar as ideias apresentadas ao longo do artigo.

 

 

A EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA NO BRASIL: Algumas considerações a partir da legislação vigente

 

No processo de regulamentação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) promulgada no ano de 1996, foram criados os cursos superiores de tecnologia, que constituem cursos de graduação que conferem o diploma de tecnólogo, tendo duração menor do que a graduação tradicional (bacharelado e licenciatura) (NUNES, 2007).

O Decreto 5.154 de 2004 estabelece em seu arcabouço que a educação profissional tecnológica de graduação é regida pelas normas da educação superior e oferecida aos egressos do ensino médio e superior, respectivamente. Tal decreto visa atender o estabelecido no artigo nº 39 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), a qual prevê a educação profissional. A educação profissional deve estar integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia que por sua vez, conduzem ao desenvolvimento constante de aptidões para a inserção dos futuros profissionais na vida produtiva.

Lima Filho (2006) indica que a criação dos cursos superiores de tecnologia estão vinculados às reformas educacionais realizadas nos países da América Latina, a partir da década de 1990, com o intuito de expandir a oferta e atender às novas necessidades a custos inferiores aos das universidades. Este mesmo autor aponta ainda que organismos internacionais como o Banco Mundial (BM) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) vêm financiando esta modalidade de ensino, por ser mais integrado aos processos produtivos, mais flexível e de menor custo que os cursos universitários tradicionais, caracterizados como de alto custo e baixa adaptabilidade às demandas do mercado.

As reformas do Estado brasileiro ocorridas na década de 1990, principalmente no período de governo do presidente Fernando Henrique Cardoso imprimiram mudanças onde a lógica organizacional das grandes empresas serve de paradigma para, não somente as instituições estatais, mas para todos os segmentos da sociedade (BRUNO, 2001). Dessa forma, o estado visa atender a lógica do mercado, para que o sistema social e econômico continue funcionando de forma a atender os objetivos mercadológicos. Depreende-se, portanto, que as políticas públicas vêm de encontro aos anseios de um estado neoliberal pouco preocupado na formação profissional e humana que deveria ocorrer, conforme preconiza a própria LDB e a Resolução 5.154 de 2004.

Os cursos superiores de tecnologia, os quais desde suas origens estão atrelados aos termos flexibilidade, especificidade e inovação apresentam certa fragilidade e apenas comprovam que os mesmos são direcionados e pensados para suprir demandas específicas do mercado, e visam também atender as orientações do Banco Mundial (TAVARES, 2006). Além disso, no Brasil, os cursos superiores de tecnologia têm respondido por parcela da expansão da educação superior, mas com restrições das corporações profissionais (NUNES, 2007).

No paradigma econômico vigente, a tecnologia é reconhecida como um bem social e, juntamente com a ciência, é o meio para a agregação de valores aos mais diversos produtos, tornando-se um ponto-chave para a competitividade estratégica e para o desenvolvimento social e econômico de uma região (SILVEIRA; BAZZO, 2009).

No contexto brasileiro, destaca-se que as universidades públicas e privadas estão criando formas para possibilitar as relações entre academia e indústria, com vistas a garantir o desenvolvimento tecnológico dos próximos anos (SILVEIRA; BAZZO, 2009) e, conseqüentemente preparar os futuros profissionais para a atuação no setor de utilização e criação de tecnologias, envolvendo as mais diversas áreas de produção.

            Silveira e Bazzo (2009, p. 684) comentam que:

 

Vivemos num mundo em que a tecnologia representa o modo de vida da sociedade, na qual a cibernética, automação, engenharia genética, computação eletrônica são alguns dos ícones da sociedade tecnológica que nos envolve diariamente. Por isso, a necessidade de refletir sobre a natureza da tecnologia, sua necessidade e função social.

 

Dessa forma, os currículos dos cursos superiores de tecnologia devem ser pensados, elaborados e adaptados ao contexto em que o acadêmico esteja inserido, tal como é preconizado na Resolução do Conselho Nacional de Educação - CNE/CE 3 de 2002, ondeo atendimento às demandas dos cidadãos, do mercado de trabalho e da sociedade(BRASIL, 2002) devem estar presentes. Nesse sentido, a UNESCO aponta para que a educação superior deva estar atrelada às demandas sociais mediante um planejamento interdisciplinar para analisar os problemas e questões que permeiam a sociedade (UNESCO, 1998).

            Perante esse contexto, Kitzmann (2007, p. 554) argumenta que:

 

Ambientalizar o ensino significa inserir a dimensão socioambiental onde ela não existe ou está tratada de forma inadequada. É um processo que deve culminar em um produto. Mas este produto, concretizado geralmente em um novo currículo, não é acabado, estanque e único. Não pode estar baseado em ações isoladas e pontuais, sejam teóricas ou práticas, mas num compromisso institucional, o que demandará mudanças administrativas e estruturais, para que seja efetivamente implementado, pois não pode ser algo à parte da realidade educacional onde será inserido.

 

            O que se observa no plano prático, especificamente nos cursos superiores de tecnologia é a significativa diminuição de conteúdos de base científica, humanística e profissional, com o redirecionamento dos currículos para a ênfase de conteúdos técnicos aplicados e para a gestão e organização da produção no âmbito empresarial (LIMA FILHO, 2006).

Apesar dos esforços realizados por professores e pesquisadores para a superação da fragmentação do conhecimento, atualmente a educação tecnológica ainda é caracterizada por ser excessivamente especializada e compartimentada, onde tal peculiaridade é evidenciada pelas organizações curriculares dos cursos superiores de tecnologia. Discussões em eventos científicos, sempre trazem à tona tal assunto, porém, ainda persiste certa resistência por aquelas instituições e docentes mais conservadores, adeptos (muitas vezes inconscientemente) da pedagogia tradicional.

Com vistas a complementar a formação do (a) acadêmico (a) é fundamental o papel do (a) docente para que o mesmo possa passar de um (a) simples assimilador (a) de conhecimentos para um cidadão (ã) que compreenda e possa atuar efetivamente no meio onde vive, utilizando-se quando for pertinente, aspectos dos instrumentos legais representados pela Lei 9.795 e do Decreto 4.297.

Tal posicionamento deve estar presente no processo ensino-aprendizagem dos cursos superiores de tecnologia, pois a resolução do CNE 03 de 2002 estabelece em seu artigo 2º, inciso IV que os cursos superiores de tecnologia deverãoPropiciar a compreensão e avaliação dos impactos sociais, econômicos e ambientais resultantes da produção, gestão e incorporação de novas tecnologias(BRASIL, 2010).

É notório que a educação tecnológica possui seu foco e suas especificidades, pautados no conhecimento técnico-científico, na inovação tecnológica e na formação instrumental para atuação no mercado de trabalho. Desta forma, torna-se viável trabalhar a EA de forma interdisciplinar, onde não ocorra a descaracterização do próprio ensino tecnológico.

Uma das vertentes que pode ser aplicada na educação tecnológica é a corrente científica, a qual está fundamentada basicamente na abordagem rigorosa de realidades (problemáticas) ambientais com o intuito de compreendê-las melhor, identificando dessa maneira mais precisamente as relações de causa e efeito das ações antrópicas sobre o meio físico. Nessa mesma linha de raciocínio, cabe mencionar as palavras de Enrique Leff onde este autor comenta que deve haver nos países do hemisfério sul a priorização de uma capacidade científica e tecnológica própria, destinada a incrementar o potencial ambiental e o aproveitamento endógeno de seus recursos naturais (LEFF, 2008).

 

A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS CURSOS DE TECNOLOGIA DE NÍVEL SUPERIOR A PARTIR DA LEI 9.795/99 E DO DECRETO 4.297/02

 

A crise ambiental relacionada ao paradigma atualmente vigente (colonialista, civilizatório, progressista, economicista) é uma crise da relação sociedade/natureza, e os seus fatores deflagradores estão no modo de vida centrado na idéia de progresso e colonização (FERNANDES; SAMPAIO, 2008). Seguindo essa mesma linha de raciocínio Leff (2008) comenta que a humanidade passa por uma crise civilizacional, marcada por um modelo de modernidade regido pelo predomínio do desenvolvimento da razão tecnológica em detrimento da organização dos sistemas naturais.

Em razão disso, as discussões envolvendo as possíveis soluções a respeito da questão socioambiental que aflige todo o planeta têm sido direcionadas ao Desenvolvimento Sustentável e à Educação Ambiental (LEFF, 2008) onde diversos autores apontam para que haja uma postura crítica em relação a essa temática.

Nesse contexto um dos papéis fundamentais da EA é o de contribuir para a conscientização da sociedade civil, no sentido de reverter, ou ao menos amenizar a atual crise ambiental (BRÜGGER, 2004). Esta orientação vai de encontro ao que é preconizado pela Lei 9.795/99, pois a mesma estabelece em seu artigo 5º, inciso IV que um de seus objetivos é o de promover o incentivo à participação individual e coletiva, permanente e responsável, na preservação do equilíbrio do meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparável do exercício da cidadania (BRASIL, 1999).

Ainda sobre a EA na educação tecnológica de nível superior cabe destacar que uma das funções básicas dos docentes é também contribuir com a alfabetização científica dos educandos, ou seja, promover um nível mínimo de formação científica que torne possível a compreensão de problemas e de opções que devem e podem expressar-se numa linguagem acessível (VILCHES et al. 2007). Dessa forma, essa alfabetização constitui uma dimensão essencial de uma cultura de cidadania, para confrontar-se com os graves problemas que a humanidade enfrenta (VILCHES et al. 2007) nos dias atuais.

Além de toda a base legal (Constituição Federal e Lei 9.795/99, por exemplo) que fundamenta e justifica o trabalho em EA na educação formal, nos diferentes níveis de ensino, existem alguns instrumentos com caráter técnico-científico que podem ser perfeitamente utilizados no processo ensino-aprendizagem de cursos superiores de tecnologia e relacioná-lo a aspectos envolvendo a EA.

Um destes instrumentos é o denominado Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE). O ZEE é um instrumento utilizado para planejar e ordenar um determinado território, promovendo a harmonização entre as atividades culturais, educacionais, produtivas, sociais e ambientais que nele ocorrem. O decreto 4.297 de 10 de julho de 2002 regulamenta o art. 9o, inciso II, da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, estabelecendo os critérios para o ZEE do Brasil.

O conhecimento do ZEE por parte de docentes e discentes constitui um instrumento importante no que tange à vocação econômica de uma determinada região, levando-se em consideração o aspecto físico-ambiental da mesma. Dessa maneira, o potencial ambiental de cada região integra as condições ecológicas, culturais e tecnológicas que reorientam a produção na perspectiva do desenvolvimento sustentável (LEFF, 2008).

A EA deve contribuir para a compreensão dos processos sociais e naturais (LEFF, 2008), no âmbito da educação tecnológica sendo que esses possuem uma inter-relação constante e constituem a base de sustentação das pessoas que vivem sob a égide do modo de produção capitalista.

Nesse sentido, o artigo 4º, inciso II da Política Nacional de Educação Ambiental estabelece como um de seus princípios que o meio ambiente deve ser concebido em sua totalidade, considerando a interdependência entre o meio natural, o socioeconômico e o cultural, sob o enfoque da sustentabilidade (BRASIL, 1999). Cabe destacar que, desta forma aspectos da EA aliada ao ZEE, trabalhadas no processo ensino-aprendizagem contribuem enquanto instrumentos mediadores na compreensão da problemática ambiental envolvendo a educação tecnológica de nível superior no país.

Vale ressaltar nesse contexto que o campo educacional objetiva as múltiplas exigências e a uma plurivalência de informações e conhecimentos que a vida profissional exige (FAZENDA, 1995) tendo em vista que os meios produtivos apresentam-se cada vez mais complexos, exigindo conhecimentos provenientes dos mais diversos campos do conhecimento.

Assim, sugere-se aqui oexercícioda interdisciplinaridade como alternativa metodológica no processo ensino-aprendizagem, pois vigoram na educação tecnológica de nível superior os métodos científicos tradicionais adotados nas instituições de ensino, os quais ainda primam pela especialização do conhecimento e muitas vezes sem relação direta com a realidade do mercado de trabalho. Para tanto, é necessário que a interdisciplinaridade deva ser compreendida enquanto uma categoria de ação (FAZENDA, 1995) presente sempre que possível nas práticas pedagógicas dos (as) docentes.

Nesse sentido, adota-se aqui a definição apresentada por Carvalho (2006), onde esta autora coloca que a interdisciplinaridade deseja a abertura de um espaço para mediação entre determinados conhecimentos e a articulação destes, no qual as disciplinas estejam em situação de mútua coordenação e cooperação, para a compreensão da realidade que docentes e discentes estão inseridos. Portanto, a interdisciplinaridade é adotada e entendida no presente trabalho como uma prática pedagógica, onde o conhecimento é organizado no processo ensino-aprendizagem de uma forma que se possa responder melhor aos problemas socioambientais que vigoram no atual momento histórico.

Assim, a prática interdisciplinar permite uma melhor compreensão e administração de situações envolvendo tensão ou conflito entre as necessidades, as práticas humanas e as dinâmicas naturais (FLORIANI; KNECHTEL, 2003).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Perante o contexto aqui apresentado sugere-se utilizar uma abordagem pautada na interdisciplinaridade, com vistas a promover a conscientização socioambiental e contribuição para a formação dos (as) acadêmicos (as) utilizando-se como referência aspectos da Lei 9.795/99 e do Decreto 4.297/02. Sempre que possível e levando em consideração as disciplinas e os temas das aulas torna-se importante relacionar determinados itens com o contexto social, econômico, cultural, educacional e ambiental em que os (as) estudantes estão inseridos (as).

Aliado a isso o (a) docente pode tratar das supracitadas legislações utilizando-se desituações-problemapara a construção de conhecimentos científicos e a conquista de inovações tecnológicas suscetíveis de satisfazer as necessidades da sociedade (VILCHES et al. 2007).

Apesar de atualmente diversos autores, tais como, Brügger (2004), Sorrentino (2005), Castro e Baeta (2005) e Tozzoni-Reis (2008) realizarem propostas de mudanças substanciais em relação à ética ambiental, aos valores relacionados à formação humana e a adoção de uma postura radical diante da problemática socioambiental, vale destacar a dificuldade na realização de tal trabalho por parte do (a) docente. A questão ambiental é uma problemática social que transcende a incumbência das universidades (LEFF, 2008). Tratar desta problemática em cursos de curta duração que visam fundamentalmente formar profissionais aptos a atuarem de forma eficiente no mercado de trabalho é tarefa difícil e requer um comprometimento árduo e constante dos (as) docentes no sentido de relacionar a problemática ambiental com conteúdos específicos no âmbito de suas disciplinas e cursos.

A incorporação da dimensão ambiental implica um aspecto ainda pendente na educação superior, apesar das discussões se prolongarem por mais de trinta anos (GAUDINO, 2005). Assim, a universidade desempenha um papel fundamental neste processo de transformação do conhecimento e de mudanças sociais (LEFF, 2008).  No contexto das academias, a EA, raramente, é planejada levando-se em consideração conteúdos correlatos no âmbito das disciplinas e os Projetos Pedagógicos de Cursos. Nesse sentido, fica evidente que, por mais que a Lei 9.795/99 trate da obrigatoriedade da EA no ensino formal, a mesma fica à disposição da boa vontade dos docentes em fazer cumprir a legislação vigente.  

 

 

REFERÊNCIAS

 

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Ilustrações: Silvana Santos