Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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16/12/2013 (Nº 46) RECICLAGEM DE ÓLEO RESIDUAL PARA PRODUÇÃO DE BIODIESEL EM PALOTINA-PR
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Reciclagem de óleo residual para produção de biodiesel em Palotina-PR

 

Paulo André Cremonez¹, Franciele Vanessa Reckziegel², Laís Pastre Dill², Antonio Augusto Angheben², Helton José Alves³, Maria Cristina Milisnk³

 

¹Tecnólogo em Biocombustiveis. Mestrado em Energia na Agricultura. Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Rua Universitária, 2069, CEP: 85.819-130. Bairro Faculdade, Cascavel – PR, Brazil. Fone: (44) 9927-5099. E-mail: pa.cremonez@gmail.com.

 

 ²Graduando Tecnologia em Biocombustíveis. Universidade Federal do Paraná – Campus Palotina, Av. Pioneiro, 2153, Jardim Dallas, 85950-000, Palotina, Paraná, Brasil. e-mail: f.reckziegel@hotmail.com; lais_dill_@hotmail.com; antonioangheben@hotmail.com.

 

³Professor Adjunto. Universidade Federal do Paraná – Campus Palotina, Av. Pioneiro, 2153, Jardim Dallas, 85950-000, Palotina, Paraná, Brasil. e-mail: helton.alves@ufpr.br; mcmilinsk@hotmail.com.

 

 

 

Reciclagem de óleo residual para produção de biodiesel em Palotina-PR

 

Resumo: A demanda de energia no mundo industrializado tem resultado em uma crescente necessidade de fontes de energias renováveis de menor impacto ambiental. Uma alternativa para tal problemática é a reciclagem de óleos e gorduras residuais para a produção de biodiesel, o que caracteriza uma solução ambiental viável uma vez que evita o descarte incorreto deste tipo de resíduo no meio ambiente, e ainda, promove o uso de matérias-primas de baixo custo provenientes de fontes renováveis para a geração de energia. Com base neste cenário, o presente trabalho teve como objetivo a avaliação da coleta de óleos e gorduras residuais para produção de biodiesel, visando a integração da Universidade com as Escolas e a Comunidade.

 

Palavras Chave: Óleos e gorduras residuais. Reciclagem. Biodiesel.

 

 

 

Introdução

 

A necessidade de suprir a demanda energética sempre foi um grande desafio para a sociedade. Com a crise do petróleo na década de 70, motivou-se a implantação de programas de incentivo ao desenvolvimento de fontes alternativas de energia e biocombustíveis (SILVA, 2010). Ainda pelo interesse por questões ambientais tais como a redução de emissão de material particulado, monóxido e dióxido de carbono, isenção de enxofre e compostos aromáticos, fez crescer o número de pesquisas focadas no desenvolvimento e na produção de combustíveis oriundos de fontes renováveis menos poluentes tanto no âmbito industrial quanto acadêmico (FERRARI et al., 2008).

No Brasil, as fontes alternativas de energia como a solar, eólica e os demais biocombustíveis têm um enorme potencial para substituir as fontes convencionais trazendo impactos ambientais e sociais menores, além da geração de mais empregos. Em alguns casos os custos de produção dessas fontes são competitivos com as fontes tradicionais principalmente quando se consideram os custos sociais e ambientais (PARENTE, 2003).

O biodiesel pode ser considerado um exemplo da aplicação da biomassa para produção de energia, contendo diversas vantagens sobre o diesel de petróleo, pois não é tóxico, é proveniente de fontes renováveis e tem melhor qualidade das emissões durante o processo de combustão (LOTERO et al., 2005; CORREA e ARBILLA, 2006).

Este biocombustível líquido e biodegradável pode ser definido como derivado mono-alquil éster de ácidos graxos de cadeia longa e linear, produzido a partir de diferentes matérias-primas, tais como óleos vegetais, gorduras animais, óleos e gorduras residuais (OGR), tendo como coproduto o glicerol. A produção de biodiesel apresenta diversas rotas (LÔBO et al., 2009; PINTO et al., 2005).

Atualmente o país apresenta grande potencial para produção de biodiesel a partir de óleo vegetal principalmente devido à geografia favorável e sua tradição agrícola. Estes fatores contribuem para produção de diversas oleaginosas como: soja, palma, babaçu e girassol em escala capaz de suprir a demanda de matéria prima na cadeia produtiva de biodiesel (SORANSO et al., 2008; GERIS et al., 2007; CETINKAYA e KARAOSMANOGLU, 2004).

Uma das alternativas interessantes como matéria prima para a produção de biodiesel são os óleos vegetais residuais, como os óleos que são utilizados na cocção de alimentos, pois sua reciclagem é uma solução ambiental para evitar o seu descarte incorreto, que acaba por obstruir redes de esgoto sendo também potenciais poluentes de águas superficiais, alem reduzir muito os custos da cadeia produtiva do biodiesel tendo em vista que a maior parte dos custos, estão relacionados à matéria prima     (SORANSO et al., 2008).

A produção de biodiesel a partir de óleos e gorduras residuais já é muito estudada e apresenta viabilidade comprovada (COSTA NETO e ROSSI, 2000; RABELO, 2001). Nesse contexto, para a utilização de óleos e gorduras residuais, gerados pela comunidade e por estabelecimentos comerciais da área alimentícia (restaurantes, bares, etc.), na cadeia produtiva do biodiesel, é necessário que haja um trabalho de conscientização popular entre vários setores da sociedade englobando aspectos ambientais e sociais para que ocorra uma mudança de comportamento quanto ao descarte desses resíduos.

O presente trabalho teve como objetivo avaliação da conscientização do descarte correto de óleos residuais na comunidade do município de Palotina-PR, levando-se em consideração a problemática do descarte incorreto de óleos residuais, e levantamento do volume deste resíduo gerado visando a futura produção de biodiesel.

 

 

Material e métodos

 

Integração universidade, escola e comunidade

 

O desenvolvimento das atividades se iniciaram em duas escolas públicas, sendo que após um semestre foi ampliado à comunidade através do trabalho com clube de mães e comércio de Palotina – PR. Tanto nas escolas, quanto na comunidade e no comércio (lanchonetes, bares, restaurantes, supermercados e padarias) realizou-se um levantamento sobre o consumo de óleo pela população para estimar o potencial de reaproveitamento deste resíduo no município de Palotina – PR, visando à produção de biodiesel.

 

Escolas

 

Na etapa executada nas escolas envolveram-se no projeto os alunos de terceiro ano do ensino médio, oitava e sétima séries do ensino fundamental, com público alvo de 40 alunos. Foram realizados seis encontros em contra-turno às aulas nas escolas além de encontros na Universidade Federal do Paraná – Campus Palotina, como descrito na Tabela 1. Ministraram-se palestras relacionadas a temas de meio ambiente, reciclagem e OGR. Para a explanação dos encontros foram utilizados recursos como multimídia, vídeos, quadro negro, demonstração prática de experimentos químicos relacionados à reutilização de óleo residual.

 

Tabela 1: Temas dos encontros realizados nas escolas.

 Comunidade

 

O trabalho na comunidade foi realizado com o clube de mães situado próximo ao Campus da UFPR. Foram ministradas palestras educativas referentes ao tema meio ambiente, reciclagem e o descarte de OGR. A avaliação foi realizada através da aplicação de questionários visando obtenção de informações quanto ao volume de óleo consumido na residência e qual a forma de descarte dos OGR. Participaram do projeto 17 famílias, envolvendo em média 85 pessoas.

 

Comércio

 

Visitaram-se 30 estabelecimentos comerciais do município de Palotina registrados na associação comercial local, com intuito da aplicação de questionário levantando informações quanto ao volume de óleo utilizado no estabelecimento e qual o volume residual gerada, além da forma de descarte dos OGR e qual o conhecimento que os comerciantes tinham sobre esta problemática.

 

Resultados e Discussão

 

Escola

 

O desenvolvimento do projeto nas escolas possibilitou aos alunos a ampliação dos conceitos químicos trabalhados nas aulas regulares e a interdisciplinaridade com conceitos na área ambiental e social. A inserção da universidade no ambiente escolar promoveu entre os alunos uma troca de experiências e informações sobre o que está sendo desenvolvido no âmbito da extensão e da pesquisa científica. Esta relação provocou nos alunos o interesse em cursar o ensino superior.

A Figura 1 relata os encontros que ocorridos nas escolas (Fig.1ª) e na universidade (Fig.1b). Os alunos que participaram do projeto contribuíram com o levantamento do consumo de óleos em suas residências, sendo que o óleo coletado por eles foi utilizado na produção de sabão e de biodiesel na universidade. Nesses encontros, eles puderam conhecer os processos químicos envolvidos e avaliar as vantagens da reciclagem de OGR.

 

(a)                                                                  (b)

Figura 1. Fotos dos encontros realizados nas escolas (a) e na universidade (b).

 

Comunidade

 

Nos encontros realizados no Clube de Mães, o público envolvido participou da entrevistas e debates, na qual as seguintes informações foram levantadas: volume de óleo consumido semanalmente por residência, volume de Óleo Graxo Residual (OGR) descartado e conhecimento sobre a reciclagem de OGR. De acordo com a Figura 2, pode-se visualizar que o volume de OGR descartado no período de uma semana é inferior a meio litro por família, sendo que 70 % do resíduo gerado devem-se à cocção de alimentos.

 

Figura 2. Volume de óleo descartado semanalmente entre as famílias participantes do Clube de Mães.

 

A partir da observação da figura constata-se um consumo moderado de óleo pelas famílias. Pela característica da cidade apresentar população de origem interior, 82% das famílias envolvidas no projeto afirmaram que reutilizam o óleo para a fabricação de sabão destinando o produto para o próprio consumo como ensinado pelos seus pais e avós e passado de geração em geração.

 

Figura 3. Método de descarte do óleo residual gerado pelas famílias do clube de mães.

 

No entanto, ainda há famílias que fazem o descarte de maneira incorreta, o que evidencia que a conscientização ambiental é de extrema importância, pois o descarte incorreto deste material, ainda que em poucas proporções, causa mau cheiro e traz dificuldades referentes ao tratamento do esgoto, em rios cria uma camada que impede a entrada de luz e bloqueia a oxigenação da água, dificultando a vida aquática presente (PARAÍSO, 2008).

Vale destacar ainda que no clube de mães a abordagem de temas relacionados à coleta seletiva e reaproveitamento de resíduos é algo trabalhado já há alguns anos e que o elevado percentual de famílias que reciclam o OGR pode ser um indicativo disso. Dessa forma, este resultado não representa a população de uma maneira geral e exige cautela em sua interpretação.

 

Comércio

 

Nos estabelecimentos comerciais que participaram da entrevista realizada, foram abordados temas relacionados ao consumo de óleo no estabelecimento, volume de OGR descartado e conhecimento sobre a reciclagem do resíduo gerado. O consumo mensal de óleo nos estabelecimentos entrevistados situa-se entre 2700 e 3000 litros, representando diretamente um volume de OGR bastante expressivo. Isso revela que o município poderia investir em uma forma de coletá-lo e reaproveitá-lo para a produção de biodiesel. Na Figura 4 pode-se visualizar o consumo média semanal de óleo pelos estabelecimentos entrevistados.

 

Figura 4. Consumo de óleo semanal no preparo de alimentos nos estabelecimentos comerciais entrevistados.

 

De acordo com a Figura 5, cerca de 48,6% dos entrevistados reutilizam o óleo mais de três vezes no estabelecimento para fritura de alimentos. Com o uso continuo do óleo, este oxida-se, tornando-se mais viscoso e escuro comprometendo sua qualidade por processos de oxidação do material (COSTA NETO e ROSSI, 2000). A rancidez oxidativa ocorre de forma acelerada devido ao emprego de altas temperaturas sobre o óleo, como na utilização pela cocção, modificando as características do óleo, gerando ácidos graxos livres em sua composição, condição esta que prejudica diretamente a produção de biodiesel de forma convencional pela formação de emulsões no decorrer do processo (COSTA NETO e FREITAS, 1996). Esse aquecimento forma ainda compostos antinutricionais, dentre eles inibidores enzimáticos e destruidores de vitaminas (LIMA, 1997).

 Este fato pode estar relacionado com o custo do óleo, por outro lado, não existe nenhum cuidado com relação à quantidade de compostos oxidados produzidos com a reutilização do óleo, o que em termos nutricionais é preocupante. No entanto, não existe uma legislação que estabelece o número de vezes que um óleo pode ser reutilizado na fritura de alimentos.

 

Figura 5. Reutilização do óleo para fritura de alimentos nos estabelecimentos comerciais entrevistados.

 

De acordo com a Figura 6, do total de estabelecimentos entrevistados, 82% reciclam o óleo residual, sendo que 86,7% deste percentual afirmaram que fazem a reciclagem para a fabricação de sabão e 13,3% vendem o resíduo para uma indústria de biodiesel da região. Segundo os comerciantes entrevistados a opção pela reciclagem do óleo residual gerado está relacionada a fatores econômicos e práticos, visto que no município ainda não há uma coleta desse material.

 

Figura 6. Descarte de óleo residual dos estabelecimentos entrevistados de Palotina.

 

Conclusão

 

A partir da realização da pesquisa conclui-se que os objetivos iniciais e que os resultados alcançados subsidiam uma proposta futura de coleta seletiva envolvendo o município com a participação da Associação Comercial e a prefeitura municipal, visando-se a produção de biodiesel, garantindo o descarte correto e consciente do resíduo pela população e agregando valor a cadeia a partir de uma matéria prima de baixo custo.

 

 

 

Referências Bibliográficas

 

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CORRÊA, S.M., ARBILLA, G. Aromatic hydrocarbons emissions in diesel and biodiesel exhaust. Atmospheric Environment, v.40, p.6821–6826. 2006.

 

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FERRARI, R.A.; OLIVEIRA, V. S.; SCABIO, A. Biodiesel de soja — Taxa de conversão em ésteres etílicos, caracterização físico-química e consumo em gerador de energia. Química Nova. São Paulo, v.28, n.1, p.19-23. 2005.

 

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LIMA, J. R.; GONÇALVES, L. A. C. In: Anais do Simpósio sobre Qualidade Tecnológica eNutricional de Óleos e Processos de Frituras; Anais... Sociedade Brasileira de Óleos e Gorduras; SãoPaulo, SP, p.144. 1997.

 

LÔBO, I.P.; FERREIRA, S.L.C.; DA CRUZ, R.S. Biodiesel: parâmetros de qualidade e métodos analíticos. Quim. Nova, v.32, n.6, p.1596-1608. 2009.

 

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PINTO, A.C.; GUARIERO, L.L.N.; REZENDE, M.J.C.; RIBEIRO, N.M.; TORRES, E.A.; LOPES, W.A.; PEREIRA, P.A.P.; DE ANDRADE, J.B. An Overview. J. Braz. Chem. Soc., v.16, p.1313-1330. 2005.

 

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SORANSO, A.M.; FILHO, A.G.; LOPES, A.; et al. Desempenho dinâmico de um trator agrícola utilizando biodiesel destilado de óleo residual. Rev. Bras. de Engenharia Agrícola e Ambiental, v.12, n.5, p.553-559. 2008.

Ilustrações: Silvana Santos