Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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16/12/2013 (Nº 46) GESTÃO E USO PÚBLICO DOS PARQUES NACIONAIS DA REGIÃO NORDESTE, BRASIL
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GESTÃO E USO PÚBLICO DOS PARQUES NACIONAIS DA REGIÃO NORDESTE, BRASIL

Jacqueline Araújo de Oliveira

 

¹Especialização em Gestão Ambiental e Ecoturismo, Centro de Pós-Graduação e Extensão, Faculdade Montenegro.

 

 

RESUMO

 

As Unidades de Conservação – termo utilizado no Brasil para designar ‘áreas protegidas’, são áreas destinadas à proteção ambiental direcionadas a uso público de extrema importância para a manutenção do equilíbrio ambiental e para a pesquisa científica. Dentre as UCs estão inseridos os parques nacionais – PARNAS, onde uma boa gestão com a participação efetiva de todos os envolvidos se faz necessário para garantir a proteção dos seus recursos naturais existentes. Como os PARNAS, destinam-se principalmente ao uso público, através principalmente de ações de atividade turística se torna fundamental utilizar-se de planos de manejo com o intuito de apoiar tais ações. Com o objetivo de se conhecer melhor a realidade dos PARNAS da região Nordeste e as dificuldades encontradas na sua gestão e no seu uso público, foram enviados questionários semi-estruturados com perguntas abertas aos endereços eletrônicos dos gestores de cada UC. Um dos principais fatores da baixa efetividade da gestão dos parques envolvidos, relatados pelos seus gestores estão ligados a situação fundiária indefinida, conflitos com populações humanas dentro das UCs, escassez de recursos humanos e financeiros, instabilidade política das agências de meio ambiente, entre outros.

 

PALAVRAS-CHAVE: Parques Nacionais, Uso Público, Gestão Ambiental.

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

A procura por ambientes naturais para atividades recreativas e de lazer vem aumentando a cada ano em grandes proporções, sendo que, na maioria dos casos, o cenário ideal para este tipo de atividade se encontra em áreas naturais protegidas, as Unidades de Conservação (UCs). Essas áreas são componentes essenciais para a conservação da biodiversidade,alem de desempenhar um importante papel para o bem-estar da sociedade.

Segundo o Relatório de Gestão do Instituto Chico Mendes de Conservação da biodversidade-ICMBio (BRASIL, 2011), as unidades de conservação no Brasil, especialmente as do grupo de proteção integral, do qual os parques nacionais fazem parte, são consideradas instrumentos fundamentais para a proteção ambiental.

Estas áreas, por sua vez, contêm recursos raros ou únicos, geralmente frágeis e susceptíveis a perdas irreparáveis se não forem adequadamente manejados pelos órgãos responsáveis e, também, compreendidos e protegidos pelas próprias populações. Segundo Faria (2004), somente a criação de unidades de conservação não é suficiente para assegurar este patrimônio natural,é necessário gerí-las de modo eficaz para conservação dos recursos nelas existentes.

A gestão eficaz e eficiente das UCs depende primordialmente da existência, em volume adequado e regular, de recursos financeiros e humanos. As diversas formas de gestão, incluindo o uso público, em prol da conservação, é uma discussão que tem gerado diversas propostas de metodologia de manejo; o que cabe e deve ser ressaltado é a proteção e manutenção da biodiversidade, objetivo principal das UCs (MMA 2013).

Diante do pouco êxito governamental na proteção dos recursos e ecossistemas naturais, diversas instituições de âmbito nacional e internacional vêm discutindo estratégias de conservação capazes de envolver a população seja ela tradicional ou não, visando atingir planos de manejo e conservação realmente eficazes. Esses Planos de Manejo devem abranger a área da unidade de conservação, sua zona de amortecimento e os corredores ecológicos, incluindo medidas com o fim de promover sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas.

Essa discussão já estava presente desde a elaboração e publicação da Lei nº 9.985 de 2000 que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC, que estabelece os critérios e normas e necessários para a criação, implantação e gestão dessas unidades (BRASIL, 2000). Até que seja elaborado o Plano de Manejo, todas as atividades e obras desenvolvidas nas unidades de conservação de proteção integral devem se limitar àquelas destinadas a garantir a integridade dos recursos que a unidade objetiva proteger, assegurando-se às populações tradicionais porventura residentes na área as condições e os meios necessários para a satisfação de suas necessidades materiais, sociais e culturais.

Segundo o SNUC, (As categorias mais representativas no SNUC são os Parques e as Áreas de Proteção Ambiental, ambas protegem 53% de toda área abrangida por unidades de conservação no Brasil. Os Parques são muito conhecidos devido à importância que têm para a recreação, turismo ecológico e educação ambiental.

Com relação à população como um todo, o envolvimento da comunidade por meio de visitação pública é tido como uma das principais ferramentas para promover a valorização dos recursos naturais e socioculturais desses Parques, sendo uma forma de aproximar a sociedade e despertar o seu interesse sobre a conservação da natureza. Esse tipo de turismo é capaz de dinamizar as economias locais e incrementar os recursos financeiros para a manutenção de unidades de conservação.

Segundo o Relatório de Gestão do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBio (BRASIL, 2011), todos os esforços realizados para consolidação da visitação resultaram em um crescimento de 17% da visitação nas UCs federais, totalizando 4.858.491 visitantes em 2011, em relação ao ano de 2009.  Este número representa uma aceleração da já forte tendência de crescimento dos últimos anos, se comparado as dados de 2009 onde o numero de visitação foi de cerca de 3,8 milhões de visitantes. Mesmo diante disso, o planejamento e avaliação da influência da visitação sobre a conservação é uma preocupação recente, sendo que a maioria das áreas destinadas à recreação ainda são estabelecidas sem adequado planejamento, pondo em risco a estabilidade dos ecossistemas (TAKAHASHI, 2004).

Vale questionar, se na prática, as Unidades de Conservação brasileiras têm sido capazes de gerir eficientemente o uso público. Um dos grandes desafio existentes é desenvolver um turismo responsável e integrado à diversidade sociocultural, aos conhecimentos tradicionais e à conservação da biodiversidade. Para Pessoa e Rabinovici (2010) o desenvolvimento do turismo pode gerar diversos benefícios tais como econômicos, sociais, culturais, políticos, institucionais e ambientais, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida da comunidade residente. 

Nesse sentido o ecoturismo é tido por alguns autores (DAVENPORT et al. , 2002) como uma das poucas ferramentas de desenvolvimento sustentável que realmente funciona, contribuindo para a conservação in situ de áreas naturais, gerando retorno econômico e ajudando na educação da população.

Segundo Salvati (2004), educação, conscientização e capacitação compõem a base do turismo responsável. Nesse sentido, o ecoturismo deve ser baseado em ações educativas e de interpretação do meio, proporcionando o contato com a natureza e estimulando a consciência ambiental no sentido de uma maior aceitação da conservação do meio ambiente como uma prática possível e necessária para o adequado uso dos recursos.  A prática do ecoturismo precisa estar alinhada e ser compatível com a conservação das áreas naturais (SALVATI, 2004), tendo-se em mente que sua prática não regulamentada gera degradação (SOARES, 2007). Dentro desse contexto, a visitação deve ser planejada visando o turismo sustentável, no sentido de atender à demanda com o manejo da visitação, monitoramento e minimização de impactos negativos (TAKAHASHI, 2004).

Para tanto, são utilizadas algumas ferramentas de gestão consideradas úteis quando corretamente aplicadas segundo as especificidades de cada área, como sistemas de zoneamento, diversificação da infra- estrutura turística, otimização das estruturas de taxas pagas pelos usuários e partilha de rendas (TERBORGH et al. , 2002). 

O ecoturismo pressupõe participação ativa da comunidade local, e consequentemente uma gestão descentralizada da UC. Isso exige de um lado a mobilização das comunidades locais e de outro lado abertura dos gestores para um processo de gerenciamento compartilhado e descentralizado.

Diante disso a gestão participativa se torna uma ferramenta essencial ,para envolver diferentes setores da sociedade ,assegurando a participação ativa de diversos segmentos nas decisões e estabelecimento de diretrizes dessas UCs (IBASE, 2006).

Os objetivos deste estudo foram analisar a gestão e uso público os programas de manejo e o uso público referente aos parques nacionais brasileiros – PARNAS situados na Região Nordeste.Enfatizando sua relação com as populações de seu entorno,o destino dos recursos financeiros obtidos com o turismo e as dificuldades encontradas na sua gestão e no seu uso público.

 

2.MATERIAL E MÉTODOS

 

 Com a finalidade de obter informações de gestão e uso público das Unidades de Conservação, foi enviado aos Parques Nordestinos,um formulário de pesquisa com perguntas abertas que possibilitassem aos gestores descreverem a realidade e os conflitos enfrentados com relação à visitação e envolvimento da comunidade com a UC.

A pesquisa foi enviada nos endereços eletrônicos das Unidades, disponível no site do ICMBio. Foram enviados formulários a 16 Parques Nordestinos - ressaltando que não foram enviados questionários aos demais Parques, pois nem todos possuíam email divulgado.

 Do total de 16 questionários enviados, 8 foram respondidos por gestores da Unidade:Serra da Capivara (PI),Sete Cidades (PI),Lençóis Maranhenses (MA),Monte Pascoal (BA),Marinho de Abrolhos (BA),Boa Nova (BA),Ubajara (CE),Jericoacoara (CE) .

As questões enviadas aos parques foram: 1- a- Existe Programa de Uso Público estruturado ? b- Quais são os principais atrativos oferecidos?; 2- Quais os principais objetivos do programa de visitação da Unidade?;  3- Qual o número médio de visitantes por ano? 4- Qual o mês de maior visitação?; 5- Quais as principais dificuldades com relação a pessoas e parque?; 6- Quem gerencia a verba oriunda (arrecadada) do Uso Público?; 7- A questão fundiária está regularizada?;  8- Como é a relação da população do entorno com a UC?; 9- De modo geral, a população vê a UC como algo bom ou ruim?; 10 - Existem programas em parceria com a população (entorno) em prol da melhor conservação da UC?

 

3.RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

As questões elaboradas, enviadas aos Parques e respondidas pelos gestores, permitiram discutir dois principais aspectos : a gestão das áreas estudadas e os programas de uso público (questões 1,2,3,4,6,7) além da relação da área protegida com as comunidades de entorno (questões 5,8,9,10) .

Os resultados dos questionários foram sintetizados por meio das técnicas de eliminação de palavras secundárias (supressão) e adaptação de conteúdo (construção).Todos os resultados encontram-se apresentados na Tabela 1 . 

Quando questionados sobre a existência de um programa de uso público estruturado,apenas o Parque de Monte Pascoal (MA) respondeu que não possuem algum tipo de programa .Os Parques de Jericoacoara (CE) , o Parque Marinho de Abrolhos (BA) e o dos Lençóis Maranhenses (MA) responderam que seus programas de uso público estão incluídos nos Planos de Manejo de cada UCs.

Quando questionados sobre os objetivos principais do programa de visitação, os PARNAS se referiram ao fomento do ecoturismo, o aumento do controle e a proteção,a geração de renda ,o cumprimento de sua função de UC e principalmente a educação ambiental como forma de sensibilizar os visitantes,proporcionando –lhes informação sobre as UCs.O PARNA Marinho de Abrolhos (MA) definiu bem o objetivo do seu programa de visitação:

Os principais objetivos do programa de visitação da Unidade são preparar a UC para uso pelo público, de forma que fique garantida a conservação de seus recursos naturais e histórico-culturais, a sensibilização dos visitantes para com a natureza e o retorno de benefícios para as populações locais; favorecer o envolvimento das comunidades locais nas atividades relacionadas com o uso público, propiciando alternativas econômicas mais viáveis ecológica e economicamente e; proporcionar o conhecimento da UC, de seus objetivos de conservação, seus valores naturais, histórico-culturais e benefícios que traz para a sociedade.

Dos parques nacionais que participaram da pesquisa apenas o PARNA de Monte Pascoal (MA) diz não ter um controle da visitação relatando que há de se colocar em prática esse controle que atualmente eles não possuem.

 Os principais atrativos utilizados nos programas de uso público dos parques que integram a pesquisa são as trilhas,caminhadas e contemplação da natureza.  Os PARNAs de Abrolhos e da Serra da Capivara possuem site pessoal com divulgação de informações para visitantes,tais como horários de atendimento,formas de acessos e principais atrativos.

Os períodos de visitação mais citados são os meses de julho,dezembro e janeiro,ou seja ,o período de férias.O número de visitantes/ano é bastante alto em alguns parques ,como é o caso do PARNA de Jericoacoara (CE) que chega a receber 600.000 ,seguido dos PARNAS do Lençóis Maranhenses (MA),Sete Cidades (PI) e Serra da Capivara (PI) com 72.000, 29.000 e 15.000 visitantes/ano respectivamente.Apenas o do Monte Pascoal (MA) disse não haver estimativa do numero de visitação.

Sobre as dificuldades encontradas entre a relação população e parque os gestores relataram principalmente a visitação de locais proibidos .A falta de informação e sensibilização sobre as normas do PNJ foi uma das grandes dificuldades relatadas pelos parques. Quase todos responderam que o principal entrave entre a visitação e a conservação da biodiversidade é a falta de conhecimento sobre a importância da área, seja pelas comunidades do entorno ou pelos turistas. Partindo-se do princípio de “conhecer para conservar”, se o real objetivo de estar em uma área protegida não é compreendido, as normas nunca serão respeitadas e continuarão as inúmeras ocorrências de incêndios, invasões e usos indesejáveis de recursos. Giraldella e Neiman (2010) ressaltam que apesar dos avanços recentes no planejamento e implantação de programas de uso público, os gestores das áreas protegidas no Brasil ainda encontram muitas dificuldades em controlar e ordenar a visitação de modo a garantir o controle dos impactos. 

Para viabilizar financeiramente o programa de uso público, uma boa solução seria reverter parte da verba arrecadada com a visitação para a capacitação de profissionais e aprimoramento do programa de educação ambiental.  Giraldella e Neiman (2010) destacam a necessidade de um intenso e contínuo programa de capacitação de recursos humanos nas áreas protegidas, para garantir o sucesso das ações de uso público e de conservação.No entanto, parte significativa dos parques avaliados, não cobra pela visitação.É o caso do PARNA de Jericoacoara,que recebem anualmente cerca de 600 mil visitantes. Isto acaba favorecendo órgãos particulares, tais como agências de turismo ou guias autônomos, pois o turista acaba pagando por desfrutar das belezas dos parques, mas a renda nem sempre é revertida para a UC.

A visitação nesses parques é uma forma de aproximar a sociedade e despertar o seu interesse sobre a conservação da natureza, pois é uma oportunidade para a recreação e o aprendizado em contato com a natureza. Esse tipo de turismo é capaz de dinamizar as economias locais e incrementar os recursos financeiros para a manutenção de unidades de conservação. O grande desafio, no entanto, é desenvolver um turismo responsável e integrado à diversidade sociocultural, aos conhecimentos tradicionais e à conservação da biodiversidade.

Dados do SNUC mostram que a visitação nos 67 Parques Nacionais tem potencial para gerar entre R$ 1,6 bilhão e R$ 1,8 bilhão por ano.Com estes dados, e sabendo-se que atualmente menos de 50% dos parques nacionais estão abertos a visitação, e que parte deles não cobra taxa de ingresso, percebe-se que esta arrecadação poderia no mínimo ser muito ampliada originando mais recursos e dando suporte financeiro às ações de conservação.

Uma limitação para a implementação efetiva de programas de uso público bem como para toda a gestão da unidade é a regularização fundiária, um problema que afeta a maioria das unidades de conservação brasileiras. Segundo Rocha (2010), 66% dos Parques Nacionais criados até 2.000 possuem problemas registrados com relação à regularização fundiária.

 Dos parques envolvidos na pesquisa apenas os Parques Marinho de Abrolhos e de Sete Cidades estão com sua questão fundiária plenamente regularizada.  Enquanto os parques da Serra da Capivara e Ubajara estão em processo de regularização.

 Sendo um desafio complexo, a regularização fundiária está ligada a outros conflitos com as pessoas no entorno ou dentro dos limites das UCs, tais como o desrespeito lixo,esgoto,trafego desordenado de veículos no perímetro das UCs,,caça,trafico de aves,queimadas,pesca, entre outras dificuldades (questão 5) enfrentadas e relatadas pelos gestores dos parques. 

Analisando-se as respostas dos gestores (Tabela 1) pode-se observar que grande parte deles cita como uma das dificuldades (questão 5) a falta de entendimento apresentada pelas pessoas de maneira geral, sobre o que é uma UC e sobre sua importância, sendo citadas também falta de respeito às regras da área. Na tentativa de reverter essa situação, os parques analisados desenvolvem uma série de programas para as comunidades do entorno (questão 10), visando à conscientização e envolvimento das mesmas na conservação ambiental.  Dentre os projetos relatados, destacam-se a capacitação de condutores,contratação de pessoal para trabalhar na Uc,programas de educação ambiental e melhoria de renda e projetos de fomento ao ecoturismo,além de atividades desenvolvidas em parceria com ONGs e associações.Dentre esse projetos o gestor do PARNA Marinho de Abrolhos ressaltou bem seus programas em prol da melhoria da conservação:

 

O Parque possui uma Comissão de Educação Ambiental, Comunicação e Cultura no âmbito de seu Conselho Consultivo, onde são debatidos diversos programas de parceria com as populações do entorno da unidade. Entre estes se destacam o Programa Professores no Parque, realizado desde 2004 e que já levou mais de 300 professores dos municípios de entorno para conhecerem a UC, e o Programa Comunidade em Abrolhos, que já levou mais de 200 moradores locais dos mais diversos grupos sócio-culturais para conhecerem o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos.

Segundo Giraldella e Neiman (2010) o envolvimento comunitário na gestão das áreas protegidas deve reverter o distanciamento dos seres humanos em relação à natureza, fortalecendo os vínculos econômicos, sociais, espirituais, culturais e ecológicos entre as sociedades e os ecossistemas. 

Diante deste envolvimento comunitário ,deve –se considerar a relação população do entorno com a UC (questão 8),levando em conta a existência de conflitos e realidade e condições de vida dessas populações, já que muitas delas residiam na área antes da criação da UC e ainda dependem fortemente dos recursos locais.Os gestores dos parques relataram este fato em suas respostas, dizendo, em sua maioria, que possuem uma relação relativamente boa com as comunidades do entorno.Somente o PARNA de Jericoacoara relata ter uma relação conflituosa,como relata o seu gestor:

 

    A relação entre população do entorno com o parque é um tanto quanto conflituosa, devido a       uma série de fatores, como visitação desordenada, desrespeito e desinformação a respeito das regras de conservação do Parque, etc.

 

Sobre a visão da população em geral (questão 9),os gestores relataram respostas diferentes como pode ser visto na tabela 1.Alguns vêem a UC como algo bom,que pode promover o desenvolvimento local sustentável,sua importância para o desenvolvimento do turismo ,movimentando assim a economia regional,Outros vêem como algo ruim,negativo,onde a UC impede que a população possa usufruir da maneira que quiser .O gestor do PARNA de Sete Cidades relata bem,a mudança ocorrida da população em relação à UC:

 

Antes ruim. Hoje, o ruim se transformou em bom e somos vizinhos amigos. Sendo a educação o objeto transformador dessa mudança de comportamento. Hoje, qualquer mão de obra que surja na Unidade será absorvida pela população do entorno. Seja no setor de hotelaria, de condução de visitantes, na brigada de combate a incêndios florestal, etc.

 

Scherl et al. (2006) afirmam que, para os países em desenvolvimento, o grande desafio ainda é definir papéis apropriados para as áreas protegidas, papéis que lhes permitam continuar a dar sua contribuição fundamental para a conservação da biodiversidade e redução da pobreza.

 No caso do Brasil e das áreas analisadas neste estudo, acredita-se que o envolvimento comunitário nas atividades de uso público, seja de populações tradicionais ou locais, poderia ser um caminho de conciliação entre o uso indireto e sustentável dos recursos naturais e a gestão efetiva do uso público.   


Tabela 1.Repostas obtidas com os questionários respondidos pelos gestores dos PARNAS .

PARNA

Serra da Capivara

(PI)

Sete Cidades

(PI)

Ubajara

(CE)

Jericoacoara

(CE)

Lençóis Maranhenses

(MA)

Monte Pascoal

(BA)

Boa Nova

(BA)

Marinho de Abrolhos

(BA)

Programa de Uso Público Estruturado

Sim

Sim

Sim

Sim

Sim

Não

Sim

Sim

 

 

Atrativos Oferecidos

Trilhas.

Sítios Arqueológicos.

Sítios Históricos.

Cicloturismo

Contemplação da natureza

Trilhas.

Cachoeira

Afloramentos rochosos.

Pinturas rochosas Piscinas Naturais

 

Trilhas,

Cachoeira

Gruta e Teleférico

Pedra Furada,

Serrote,Árvore da Preguiça,as Lagoas Interdunares e o Campo de Dunas Móveis

Lagoa Azul, Lagoa Bonita, Lagoa da Esperança, Lagoa da Gaivota

 

 

 

Subida ao Monte Pascoal,

Trilhas

Observação de aves.

Caminhadas. Banhos de Cachoeiras e o Turismo Científico

 

 

 

 

Caminhada em trilha.

Mergulho

Número de visitantes/Ano

15.000

28.000 a 29.000

72.000

600.000

Não há estimativa

Não há o controle

500

3.500

 

 

Período de maior visitação

 

 

 

Dezembro

Julho

Novembro

Dezembro

Janeiro

 

Julho

Dezembro

Janeiro

Julho.

Agosto

Dezembro Janeiro

 

 

 

 

Dezembro

Julho

Novembro

Dezembro Janeiro

Julho,

Dezembro e Janeiro

Julho,

Agosto,

Dezembro e Janeiro

 

 

Continuação...

PARNA

Serra da Capivara

(PI)

Sete Cidades

(PI)

Ubajara

(CE)

Jericoacoara

(CE)

Lençóis Maranhenses

(MA)

Monte Pascoal

(BA)

Boa Nova

(BA)

Marinho de Abrolhos

(BA)

 

 

 

Dificuldades pessoas x parque

 

 

Alvo de pesquisa

Entrada de animais domésticos. Resistências por parte da não condução na área de visitação

 

 

Falta de conhecimento sobre o bem patrimonial

 

 

Falta de informação e sensibilização sobre as normas do PNJ

 

 

Alvo de pesquisa

Entrada de animais domésticos. Resistências por parte da não condução na área de visitação

 

 

Falta de conhecimento sobre o bem patrimonial

 

 

Falta de informação e sensibilização sobre as normas do PNJ

Gestão da Verba de uso público

Feita pelo ICMBIO de Brasília

Feita pelo ICMBIO

COOPTUR e SETUR

Não há arrecadação

Feita pelo ICMBIO de Brasília

Feita pelo ICMBIO

COOPTUR e SETUR

Não há arrecadação

Questão fundiária está regularizada?

 

Parcialmente

 

Sim

Não,apenas 1%

 

Não

 

Parcialmente

 

Sim

Não,apenas 1%

 

Não

 

Continuação...

 

PARNA

Serra da Capivara

(PI)

Sete Cidades

(PI)

Ubajara

(CE)

Jericoacoara

(CE)

Lençóis Maranhenses

(MA)

Monte Pascoal

(BA)

Boa Nova

(BA)

Marinho de Abrolhos

(BA)

Relação da população com o entorno?

 

Alvo de Pesquisa

“- De bons vizinhos”

Tem melhorado considerável-mente

 

Conflituosa

 

Alvo de Pesquisa

“- De bons vizinhos”

Tem melhorado considerável-mente

 

Conflituosa

 

De modo geral a população vê a Uc como algo bom ou ruim?

 

 

 

 

Alvo de pesquisa

 

 

 

Boa

 

 

 

 

Atualmente bom

 

 

 

Parte da população vê como algo positivo, outra parte como algo ruim

 

 

 

Vêem como algo extremamente ruim

 

 

 

 

 

Bom

 

 

 

 

 

Algo bom

 

 

 

 

 

Algo bom

 

 

 

 


4.CONSIDERAÇÕES FINAIS   

 

 Apesar de já existirem vários parques e outras UCs no Brasil, ainda existe um longo caminho para que a conservação destes ecossistemas seja realmente efetiva. Espera-se que as formas de gestão das áreas protegidas sejam otimizadas visando uma conservação mais eficaz. E que o Estado seja capaz de gerenciar e explorar o potencial dessas áreas de forma a contribuir para a educação e conscientização da população de que ela é parte integrante desses ecossistemas. Com isso espera-se que haja um maior estímulo ao uso público e pesquisas.

   Como observado nos resultados, à maioria dos parques ainda foca o uso público em poucas atividades ,o que acabada diminuindo o seu potencial de atrativos.Atividades diversificadas talvez contribuíssem mais para a interação da população com os ecossistemas e as rotinas de gestão do parque, aumentando a visitação e o interesse da população em contribuir com a conservação dos ecossistemas. 

 Muitos dos parques brasileiros , por falta de infra-estrutura, não controlam e nem cobram a visitação.Diante este contexto se torna essencial que haja uma maior participação do Estado, de forma direta, controlando todo o programa, treinando e contratando monitores e guias locais, ou indiretamente, exigindo que as empresas particulares o façam, e que parte dos recursos seja revertida para as Unidades de Conservação.

A gestão participativa se torna uma ferramenta necessária.A difusão e incentivo por parte do poder publico em manter as populações mais perto e presentes nessas unidades ,pode se tornar uma estratégia interessante.Sentindo-se parte integrante da UC e vendo que o turismo pode lhes trazer retorno financeiro, as populações ,principalmente as do entorno, poderiam atuar como agentes multiplicadores, uma vez que a conservação do ecossistema implica também na perpetuação de seus costumes e no manejo racional dos recursos naturais como fontes alternativas de renda. Esta prática poderia colaborar para que a conservação não fique apenas restrita aos pesquisadores, livros didáticos e publicações acadêmicas, mas passe a ser compreendida e praticada por toda sociedade.

O grande desafio, está em desenvolver um turismo responsável e integrado à diversidade sociocultural, aos conhecimentos tradicionais e à conservação da biodiversidade.

 

 

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Relatório de gestão 2011 . Brasília, DF: MMA; Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBio, 2011

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Gestão Participativa do SNUC: áreas protegidas do Brasil. Brasília, DF, MMA; Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio,2013.Disponível em :www.mma.gov.br/areas-protegidas/sistema-nacional-de-ucs-snuc/sustentabilidade-financeira.Acesso em 20 de junho de 2013.

DAVENPORT, L.; BROCKELMAN, W.Y.; WRIGHT, P.C. ;RUF, K.; DEL VALLE. F.B.R. Ferramentas de Ecoturismo para Parques.  In : TERBORGH, J.; SCHAIK, C.V; DAVENPORT, L.; RAO, M. Tornando os parques eficientes: estratégias para a conservação da natureza nos trópicos . Curitiba: Editora UFPR, 2002, 518p.

FARIA, H. H. Avaliação do desempenho gerencial de unidades de conservação: a técnica a serviço de gestões eficazes, p.139-160. In : ARAÚJO, M. A. R. Unidades de Conservação no Brasil : Da República à Gestão de Classe Mundial. Belo Horizonte: SEGRAC, 2007.

GIRALDELLA, H.; NEIMAN, Z. Planejamento e gestão em áreas naturais protegidas. In: NEIMAN, Z.; RABINOVICI, A. (Orgs.) Turismo e Meio Ambiente no Brasil. Barueri/SP. Ed. Manole... p. 124-148, 2010.

IBASE - INSTITUTO BRASILEIRO DE ANÁLISES SOCIAIS E ECONÔMICAS. Água: bem público em unidades de conservação . Parque Nacional da Tijuca - Programa Petrobrás Ambiental: Julho de 2006.

PESSOA, M.A; RABINOVICI, A. Inserção comunitária e as atividades do turismo. In : NEIMAN, Z.; RABINOVICI, A. (Orgs.) Turismo e Meio Ambiente no Brasil. Barueri/SP. Ed. Manole, p. 105-123, 2010.

ROCHA, L. G. M. da; DRUMMOND, J. A; GANEM, R. S. Parques nacionais brasileiros: problemas fundiários e alternativas para a sua resolução. Rev. Sociol. Polít. , Curitiba, v. 18, n. 36, p. 205-226, jun. 2010.

SALVATI, S.S (org.) Turismo Responsável: manual para políticas locais . WWF Brasil, Brasília, 2004.

SCHERL, L.M.; WILSON, A; WILD, R.; BLOCKHUS, J; FRANKS, P.; McNEELY, J. A.; McSHANE, T. O. As áreas protegidas podem contribuir para a redução da pobreza? Oportunidades e limitações. Gland, Switzerland, União Mundial para Conservação da Natureza - IUCN, 2006.

SOARES, M. Impactos do Turismo: os efeitos do ecoturismo em Unidades de Conservação. Revista Científica do Curso de Turismo do Instituto Cenecista Fayal de Ensino Superior - IFES , v. 02, n. 02, nov. 2007.

TAKAHASHI, L. Uso Público em Unidades de Conservação. Fundação O Boticário de Proteção a Natureza. Cadernos de Conservação , Curitiba, v.2, n. 2, out. 2004.

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Ilustrações: Silvana Santos