Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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16/12/2013 (Nº 46) HORTA ORGÂNICA COMO FERRAMENTA LÚDICA PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL
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HORTA ORGÂNICA COMO FERRAMENTA LÚDICA PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Ana Clara Giraldi Costa

Graduanda do curso de Agroecologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) – Setor Litoral. Bolsista do Projeto Agroecologia e Inclusão PROEC/UFPR. Rua Waldir Muller, 836, Matinhos-PR CEP: 83.260-000  acgiraldicosta@gmail.com

 

Afonso Takao Murata

Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP). Docente da Universidade Federal do Paraná – Setor Litoral. Rua Waldir Muller, 868, Matinhos-Pr. CEP: 83.260-000 afonsomurata@ufpr.br

 

 

 

 

RESUMO: O presente trabalho foi desenvolvido no contexto das atividades do Projeto de Extensão Agroecologia e Inclusão, da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da Universidade Federal do Paraná, a partir da demanda pela implantação de hortas orgânicas em quatro escolas da rede publica de ensino do município de Pontal do Paraná – PR. Nesse sentido, objetivou-se inicialmente com este trabalho atender às demandas das escolas, pretendendo-se com os objetivos específicos avaliar a aceitação por parte dos alunos e as potencialidades da implantação das hortas como ferramenta para a promoção da Educação Ambiental. Como consequência, verificou-se que as práticas em torno das hortas tem o potencial de estimular a ludicidade.

 

Palavras-chave: Educação Ambiental. Horta Orgânica. Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

 

Introdução

O surgimento da questão ambiental como um problema que afeta o destino da humanidade tem mobilizado governos e sociedade civil. Na esfera educativa, tem-se assistido à formação de um consenso sobre a necessidade de problematização dessa questão em todos os níveis de ensino (CARVALHO, 2008). Assim, temáticas relacionadas a práticas de sensibilização e consciência ecológica necessitam cada vez mais estar transversalmente presentes no ambiente escolar de maneira participativa e permanente, como disposto no Art. 10 da Lei n° 9.795/ de 27 de abril de 1999:

“a educação ambiental será desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal”  (BRASIL, 1999)

Ainda, o § 1o  do mesmo Art. dispõe que:

“A educação ambiental não deve ser implantada como disciplina específica no currículo de ensino”  (BRASIL, 1999)

Dessa maneira, compete às ações do âmbito educacional promover a educação ambiental integrada em todos os níveis e modalidades de ensino a fim da conscientização para a preservação do meio ambiente, entendendo-se por educação ambiental todos os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem competências para o desenvolvendo sustentável.  

Uma das estratégias que vem sendo aplicadas no âmbito escolar para promover a educação ambiental de maneira integrada e permanente, foi a introdução de hortas orgânicas. Para alunos que cursam o ensino fundamental e médio é sabido que elas têm o potencial de estar presente em disciplinas que envolvam temas como a fotossíntese, componentes do solo, relação campo-cidade, entre outros. Em geral, a implantação de hortas orgânicas tem se mostrado eficaz em escolas de ensino médio, porém estudos que evidenciem as potencialidades de canteiros orgânicos para alunos dos anos iniciais do ensino fundamental são ainda incipientes.

Nesse sentido, objetivou-se inicialmente com este trabalho atender às demandas de quatro escolas públicas de ensino fundamental do município de Pontal do Paraná – PR pela implantação de canteiros orgânicos, pretendendo-se com os objetivos específicos avaliar a aceitação por parte dos alunos e as potencialidades da implantação das hortas como ferramenta para a promoção da Educação Ambiental. Como consequência, verificou-se que as práticas em torno das hortas tem o potencial de estimular a ludicidade.

 

Metodologia

 

O presente trabalho foi desenvolvido no contexto das atividades do Projeto de Extensão Agroecologia e Inclusão, vinculado ao Programa Acessibilidade e Inclusão – Semeando Arte, da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da Universidade Federal do Paraná, a partir da demanda de implantação de hortas orgânicas em quatro escolas da rede publica de ensino do município de Pontal do Paraná – PR (Escola Municipal Benvinda de Miranda Lopes Correa, Escola municipal Ezequiel Pinto da Silva, Escola Municipal Ezequiel Junior e Escola Municipal Primavera

            Observando os preceitos da indissociabilidade Ensino, Pesquisa e Extensão as ações ocorreram no período de agosto a novembro de 2012, em horários do contra turno das escolas que fornecem educação em tempo integral, com alunos dos 2, 3, 4 e 5º ano do ensino fundamental básico. Segundo os professores, os alunos já esperavam há algum tempo pela implantação dos canteiros e por isso já possuíam conhecimentos acerca de temáticas ambientais como técnicas sustentáveis de produção, que foram agregados ao longo das disciplinas ofertadas na grade curricular e pela oficina de meio ambiente oferecida no contra turno. Participaram destas ações aproximadamente 467 alunos, 6 professores e 5 funcionários de serviços gerais.

Para a implantação dos canteiros foram utilizados conceitos e técnicas da Agroecologia, tais como compostagem e vermicompostagem (minhocas), plantas leguminosas para cobertura de solo e fixação de nitrogênio (feijão guandu, leucena e fava larga) e cobertura morta (ALTIERI et al., 2003).A escolha dos cultivos se deu de acordo com o calendário agrícola da região, por conseguinte, foram plantadas sementes e mudas agroecológicas (alface, rabanete, coentro, cebolinha, mostarda, endro, abobrinha, salsinha e árvores nativas de aroeira, araçá-pera e palmito juçara). Cada serie implantou um canteiro de 2m2 por 80cm, onde ficaram responsáveis não só pela implantação como também pelo seu manejo até a colheita.

Para avaliar a aceitação por parte dos alunos e as potencialidades das hortas como ferramenta para a promoção da Educação Ambiental foram feitas entrevistas semiestruturadas de cunho quali-quantitativo com 20 alunos, sendo 5 de cada serie, aleatoriamente em cada escola. Complementarmente foram feitas pesquisas etnográficas que puderam atingir todos os alunos envolvidos nas etapas da implantação dos canteiros. Os dados foram analisados, interpretados e discutidos a partir da técnica da análise de conteúdo Bardin (1977).

 

Resultados e Discussão:

            Ao perguntar para os 20 alunos se eles tinham gostado das atividades realizadas em torno da horta todos responderam que sim. Isso pôde ser constatado também nos demais alunos, ao ver a empolgação com que os mesmos se prestaram para fazer os trabalhos de limpeza e preparo do solo, plantar e regar as mudas, assim como dialogar e prestar atenção nos assuntos pertinentes à temática, e chamar atenção para os organismos existentes no solo, como mostra a Figura 01 e 02.

 

Figura 01 – Diálogo sobre temáticas relacionadas à horta

FONTE: Dados gerados pela pesquisa de campo (2012)

 

 

 

 

Figura 02 – Percepção dos organismos existentes no solo

FONTE: Dados gerados pela pesquisa de campo (2012)

 

 

Quando indagado por que gostaram de ter participado das atividades, obteve-se um expressivo resultado de palavras associadas à ludicidade, como pode ser visto na Tabela 01.

 

 

 

 

 

Tabela 01 – Percepção de 20 alunos de quatro escolas municipais de ensino do município de Pontal do

Paraná/PR em relação às práticas pedagógicas de educação ambiental.

 

Índice de resposta positiva

Categoria

 

Fatores que motivaram os alunos a gostarem das práticas pedagógicas.

 

 

 

Divertido 35%

Legal 25%

Emocionante 5%

 

Ludicidade

 

 

Preserva/ajuda a natureza/meio ambiente 20%

Consciência ecológica

 

 

Faz bem à saúde 5%

Conhecimento em educação alimentar/bem estar

 

Não sabe 5%

 

Para sair da sala de aula 5%

Mecanicismo

FONTE: Dados gerados pela pesquisa de campo (2012)

 

A partir da análise dos dados contidos na Tabela 01 observa-se que 100% dos alunos tiveram respostas positivas à proposta. Destes, 35% disseram ter gostado das práticas de implantação de hortas por serem divertidas, 25% legal e 5% emocionante, totalizando 65% de respostas positivas dadas através de palavras associadas à ludicidade.  Para Fortuna (2000), uma aula de caráter lúdico não é, necessariamente, aquela que ensina conteúdos com jogos, mas aquela em que as características do brincar estão presentes. Para a autora, uma aula ludicamente inspirada propicia a renuncia do professor à centralização, à onisciência e ao controle onipotente, reconhecendo a importância de que o aluno tenha uma postura participativa nas situações de ensino, sendo sujeito ativo de sua aprendizagem.

Corroborando com Salomão e Martine (2007), as atividades lúdicas ajudam a criança a entrar em contato com o mundo imaginário e ao mesmo tempo real, a desenvolver habilidades, criar, relacionar e assimilar melhor os conhecimentos obtidos. Para Hurtado (2001), a proposta de atividades lúdico-pedagógicas nas práticas educativas além de favorecer a relação das crianças com os adultos causa-lhes prazer, contribui para o desenvolvimento pleno da capacidade infantil, na formação humana e na transformação da realidade. Para Londero (2007), aprender por meio de brincadeiras, independente da idade, significa maiores chances de assimilação do conhecimento. 

Constata-se ainda, que 20% dos alunos gostaram das práticas agrícolas por estarem ajudando/preservando o meio ambiente/natureza. Para Capra (2005) as atividades na horta despertam para o não depredar, e sim conservar o ambiente. Conclui o autor, que aprender na horta escolar é aprender no mundo real em sua plenitude. Traz benefícios para o desenvolvimento individual e coletivo, sendo uma das melhores formas de tornar as crianças ecologicamente alfabetizadas, aptas a construção de modelos sustentáveis de vida.

É possível observar, contudo, que a implantação das hortas também pôde estimular a visão de uma vida saudável/bem estar. Segundo Nogueira (2005), a horta pode servir para estreitar relações com práticas saudáveis, tornando possível a discussão a respeito de uma alimentação saudável e fortalecendo o vínculo positivo entre educação, saúde e meio ambiente. Para Morgado e Santos (2008) a horta quando implantada nas escolas possui aportes para a educação alimentar e ambiental por constituir-se num laboratório vivo, que possibilita a práxis de forma contextualizada.

.

 

Conclusões:

 

            Conclui-se com este trabalho a grande eficiência da implantação de hortas orgânicas nas instituições de ensino fundamental básico no que tange a aceitação por parte dos alunos e revelando ser esta, sobretudo uma poderosa ferramenta lúdica para a promoção da educação ambiental. É de extrema importância que ações educacionais voltadas à conscientização socioambiental comecem desde as séries iniciais, pois para que a educação ambiental se desenvolva como um processo participativo e permanente é necessário que ela ocorra o mais depressa possível, a fim de que percepções críticas sejam afloradas. Assim, as crianças aprendem desde cedo a visão do mundo como um grande complexo sistêmico de interações entre as diferentes formas de vida e estas com o meio.

A implantação da horta através da demanda de alunos e professores foi fundamental para o sucesso deste trabalho, pois possibilitou um processo pedagógico participativo permanente, uma vez que os alunos já esperavam por isso com uma bagagem de conhecimento, curiosidade e vontade. Para Carvalho (1998), uma vez partindo do interesse dos alunos, professores e da proposta pedagógica da escola, a introdução de temáticas relacionadas ao meio ambiente se torna mais fácil.

Com efeito, os dados e as experiências obtidas neste trabalho servirão de base para novas ações do projeto de extensão mencionado, a fim de fazer com que a horta seja integrada de forma articulada e interdisciplinar nas disciplinas do turno e contra turno das escolas, como de fato pede a politica de educação ambiental, assim como aproveitar os resultados obtidos, de que as atividades ao entorno da horta são associadas ao lúdico, para potencializá-las através de atividades como hortas em espirais, mandala entre outros capazes de estimular tal potencialidade.

 

Agradecimentos

Secretaria da Educação do município de Pontal do Paraná/PR, bolsistas e voluntários do Projeto de extensão Agroecologia e Inclusão, vinculado ao Programa Acessibilidade e inclusão – Semeando Arte, professores, coordenadores e funcionários das escolas, Bio-natur e PROEC- UFPR.

 

Referencias bibliográficas:

ALTIERI, M. A.; SILVA, N. E.; NICHOLLS, C. I. O papel da biodiversidade no manejo de pragas. Ribeirão Preto: Editora Holos Ltda, 2003

 

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Trad. de Luís A. Reto; Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70; Martins Fontes, 1977.

BRASIL. LEI No 9.795, DE 27 DE ABRIL DE 1999. Política Nacional de Educação Ambiental. 1999.

CAPRA, F. Alfabetização ecológica: a educação das crianças para um mundo sustentável. São Paulo: Editora Pensamento/Cultrix, 2005.

 

CARVALHO, I. C. de M. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. São Paulo: Cortez, 2008.

 

CARVALHO, I. C. de M. Em direção ao mundo da vida: interdisciplinaridade e educação ambiental: conceitos para se fazer educação ambiental. Brasília, DF: IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas, 1998..

 

FORTUNA, T. R. Sala de aula é lugar de brincar? In: XAVIER, M. L. M. e DALLA  ZEN, M. I. H. (org.) Planejamento em destaque: análises menos convencionais. Porto  Alegre: Mediação, 2000.

HURTADO, J. L.  Un Nuevo Concepto de Educación Infantil. Havana: Editorial Pueblo y educación, 2001..

LONDERO, L. K. Museu e teatro como práticas de educação ambiental. Santa Maria, 2007. Dissertação (Mestrado em Educação Ambiental). Coordenadoria de Pós-graduação, Universidade Federal de Santa Maria. 

MORGADO, F. S; SANTOS, M.A.A. A horta escolar na Educação Ambiental e Alimentar: experiência no projeto horta viva nas escolas municipais de Florianópolis. EXTENSIO – Revista Eletrônica de Extensão. Florianópolis, n.6, p.1-10. 2008. Disponível em: < http://www.rebrae.com.br/experiencias/A_horta_escolar.pdf >. Acesso em: 20 jul. 2013

NOGUEIRA, Wedson Carlos Lima. Horta na escola: uma alternativa de melhoria na alimentação e qualidade de vida.  In: Encontro de Extensão da Universidade Federal de Minas Gerais 8., 2005, Belo Horizonte. Anais...Belo Horizonte: UFMG, 2005.

 

SALOMÃO, H. A. de S.; MARTINE, M.; MARTINEZ, A. P. A. A Importância do Lúdico na Educação Infantil: Enfocando a Brincadeira e as Situações de Ensino não Direcionado. Psicologia.com.pt. Disponível em: www.psicologia.com.pt/artigos/textos/A0358.pdf. Acesso em 15 jul. 2013.

TAVARES, A. M. B. N. et al. Educação Ambiental e horta escolar: novas perspectivas de melhorias no ensino de ciências e biologia. In: Encontro Nacional de Ensino de Ciências da Saúde e do Ambiente, 3., 2012, Niterói. Anais... Niterói: UFF, 2012. P 1-11.

Ilustrações: Silvana Santos