Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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16/12/2013 (Nº 46) A IMPORTÂNCIA DO USO DE BIODIGESTORES E FOSSAS SÉPTICAS BIODIGESTORAS
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UTILIZANDO BIODIGESTORES E FOSSAS SÉPTICAS BIODIGESTORAS EM PEQUENAS PROPRIEDADES: PRESERVAÇÃO AMBIENTAL E PERMANÊNCIA NO CAMPO

A importância do uso de biodigestores e fossas sépticas biodigestoras em pequenas propriedades rurais para o aumento da renda, preservação ambiental e permanência no campo

 

Rodrigo Claudino de Castro: formado em Geografia Licenciatura pela Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL-MG. Especialista em Meio Ambiente e Engenharia Sanitária pela Universidade José do Rosário Vellano – Unifenas. Mestrando em Ciência e Engenharia Ambiental pela UNIFAL-MG, unidade Poços de Caldas-MG. Atualmente é professor tutor da Universidade Federal de Alfenas – UNIFAL-MG.

Avenida Afonso Pena, 1640 – Jardim Boa Esperança – CEP: 37.130-000 – Alfenas/MG – Brasil – Tel: (35) 8825-0458 – rodrigocc_@hotmail.com.

 

Resumo

O presente trabalho visa demonstrar a importância do uso de tecnologias alternativas em pequenas propriedades rurais. Possibilitando unir crescimento econômico, justiça social e preservação ambiental, além de contribuir com a permanência do pequeno agricultor no campo. Procurando demonstrar a importância e os benefícios da implementação de Biodigestores e Fossas Sépticas Biodigestoras na produção do biogás, como fonte de energia, e do biofertilizante, possível substituto dos fertilizantes químicos, proporcionando aceso a uma nova fonte de renda e contribuindo para a diminuição do êxodo rural, aproveitando materiais antes descartados pelo produtor.

Palavras Chaves: tecnologia alternativa de baixo custo.

 

Introdução

 

Na atualidade o mundo se mobiliza em busca de tecnologias alternativas para substituir os combustíveis fósseis na produção de energia. Tecnologias limpas, renováveis e baratas minimizem os efeitos nocivos ao meio ambiente e contribuem para a melhoria da qualidade de vida no e do planeta.

Essa preocupação com o meio ambiente teve início na década de 1970 com a crise do petróleo, tendo a crise impulsionado o desenvolvimento de fontes alternativas de energia ou seja, no primeiro momento as pesquisas em alternativas energéticas não foram pensadas visando a melhoria do meio ambiente, mas sim para diminuir a dependência dos países para com o petróleo (DEGANUTTI et. al., 2002).

Não diferente do restante do mundo, o Brasil, mesmo possuindo uma base energética mais limpa em relação a maioria dos países, graças às hidroelétricas, também iniciou pesquisas para diversificar sua base energética e diminuir ainda mais sua dependência do petróleo. Exemplos de pesquisas alternativas realizadas no Brasil são: o etanol e o biodiesel. O Brasil também conta com grandes extensões de terras e sendo um país latitudinal destaca-se pela diversificação produtiva, e muito do que é produzido deixa de ser aproveitado, como a biomassa. Uma das opções de uso da biomassa é a queima do bagaço da cana-de-açúcar nas usinas de álcool e açúcar como fonte de energia.

Vimos então que assim como a base energética a produção agrícola no país também é diversificada, principalmente em pequenas propriedades, e um dos produtos dessa diversificação é o biodiesel, produzido a partir do cultivo de nabo forrageiro, mamona, entre outras plantas utilizadas na sua produção.  Essas culturas auxiliam na cobertura do solo, viabilizando o plantio direto, e a recuperação do solo com rotação de culturas.

Outras opções de diversificação produtiva nas propriedades são os derivados de materiais antes descartados, o biofertilizante e o biogás, oriundos da biodigestão dos dejetos de animais e seres humanos. Neste caso as principais opções de produção de energia e biofertilizantes são os biodigestores a base de esterco animal e as fossas sépticas biodigestoras. A implantação dessas tecnologias nas pequenas propriedades rurais é viabilizada pelos baixos custos dos materiais usados em sua construção. A EMBRAPA classifica esse tipo de tecnologia como, tecnologia social.

 

Entende-se como tecnologia social produtos, técnicas e equipamentos de baixo custo que podem ser aplicados em qualquer ponto do País, com o envolvimento e o interesse das próprias comunidades. [...] exemplos de tecnologia social: o clássico soro caseiro [...] e as cisternas de placas pré-moldadas que atenuam os problemas de acesso à água de boa qualidade à população do semi-árido [...] (EMBRAPA, p. 08, 2009)

 

Ao implementar esse tipo tecnologia nas pequenas propriedades o produtor disfrutará de fonte de energia barata, economia com fertilizantes, a diminuição do consumo de GLP, sua manutenção no campo e na preservação ambiental.

 

Materiais e Métodos

 

O desenvolvimento do trabalho se fez através da revisão bibliográfica de artigos e manuais de capacitação, esses abordando a construção e os benefícios do uso de tecnologias alternativos como os biodigestores.

O direcionamento da pesquisa foi traçado partindo da necessidade de material didático alternativo para o oitavo ano do ensino fundamental, durante o terceiro bimestre letivo, onde a sala de aula era composta por vários alunos residentes na zona rural do município de Alfenas-MG.

 

Biodigestor

 

O biodigestor é utilizado na produção de biogás e biofertilizantes, esse rico em metano e dióxido de carbono. Composto por uma câmara, totalmente vedada, exceto pelos tubos de entrada e saída dos materiais/dejetos, os biodigestores favorecem a fermentação dos dejetos através do processo anaeróbico, graças ao ambiente fechado que impede a entrada de ar no sistema.

Independente do modelo de biodigestor, batelada, indiano ou chinês, o material utilizado na produção do biogás e do biofertilizante são dejetos de animais como: bovinos, suínos, aves ou caprinos.

O biogás produzido é uma fonte de energia renovável e limpa, já que, o biogás não desprende fuligem quando é queimado, liberando uma quantidade mínima de poluição (DEGANUTTI et. al., 2002). Esse combustível pode ser usado em fogões, substituindo o gás GLP, e na produção de energia elétrica, através de motores a combustão interna. A tabela 1 demonstra a equivalência energética de 1 (um) metro cúbico de biogás.

 

 

 

Tabela 1: Comparação entre várias fontes de energia para gerar o equivalente a um metro cúbico de biogás

Fonte calorífica

Quantidade/unidade

Álcool carburante

Energia Elétrica

Gasolina

GLP (butano e propano)

Lenha

Óleo diesel

Querosene

0,80 litros

4,69 kWh

0,61 litros

0,43 kg

3,50 kg

0,55 litros

0,62 litros

Fonte: Colen (2003)

 

Já o biofertilizante, formado pela sobra do biodigestor, pode ser utilizado na adubação de hortas ou até mesmo substituindo a fertilização química que encarece a produção, possibilitando a comercialização dos produtos como alimento orgânico. Sabendo que alimentos orgânicos são vendidos por um preço mais alto que o convencional, por existir uma forte tendência no mercado em relação ao consumo desse tipo de alimento. Além é claro, da melhoria na qualidade de vida humana, animal e ambiental da propriedade.

 

Fossas sépticas biodigestoras

 

Desenvolvida pela EMBRAPA, a fossa séptica biodigestora, também se utiliza do processo anaeróbico, porém a matéria prima para o biodigestor aqui, são o dejetos humanos, fezes e urina.

A principal função dessa tecnologia é garantir o saneamento básico nas pequenas propriedades que sofrem com a falta de tratamento dos dejetos humanos. Atualmente os efluentes são descartados a céu aberto, nos leitos dos rios ou em fossas sem tratamento, também chamadas de “fossas negras”. Contribuindo, mesmo que sem intenção, ou por falta de opção e até mesmo por falta de informação com a contaminação dos córregos, lençóis freáticos e com a propagação de doenças.

No processo de tratamento dos efluentes é recomendado o uso de uma mistura comporta por 50% de esterco bovino, ou de qualquer outro animal ruminante, com 50% de água, totalizando 40 litros de mistura, acrescida na primeira caixa coletora da fossa. Essa mistura é utilizada para eliminar micróbios e bactérias existentes nos dejetos humanos recolhidos, com eficiência estimada em 90% (EMBRAPA, 2009).

Após o tratamento dos efluentes, é produzido o biofertilizante, um adubo natural livre de odores desagradáveis e patógenos nocivos à saúde humana, do rebanho e ao meio ambiente, rico em nitrogênio (N) entre outros nutrientes que são essenciais para reparação do solo e nutrição das plantas.

Esse tipo de fossa é constituída em três etapas, cada etapa composta por 1 (uma) caixa coletora de 1.000 litros, como demonstrado na figura 1.

 

Fig. 1 Desenho esquemático da Fossa Séptica Biodigestora

Fonte: Novaes et. al, 2001. apud. EMBRAPA, 2009

 

1 – Válvula de retenção

2 – Chaminé de alívio (válvula de escape)

3 – Curva de 90º

4 – “T” de inspeção

5 e 6 – Caixas de 1000 litros

7 – Registro

 

Todo o processo de construção e aplicação da fossa séptica está disponível em uma cartilha desenvolvida pela EMBRAPA, titulada “Saúde e renda no campo: saiba como reaplicar o sistema inovador de Fossas Sépticas Biodigestoras Cartilha Passo-a-Passo”, tendo sua versão on-line disponível nos sites: www.fundacaobancodobrasil.org.br, www.cnpdia.embrapa.br e www.rts.org.br.

 

 

 

 

Benefícios da utilização dos biodigestores e da fossa séptica biodigestora

 

Por se tratar de tecnologias sustentáveis, o biodigestor e a fossa séptica biodigestora, permitem aproveitar o máximo dos recursos locais da propriedade rural, uma vez que a matéria prima utilizada em ambas as tecnologias seriam descartadas, muitas vezes de maneira incorreta. Prejudicando o meio ambiente, a saúde humana e dos animais.

Além do baixo custo de instalação, a utilização dessas tecnologias contribuem na complementação da renda do pequeno agricultor, já que, os produtos gerados como o biogás e o biofertilizante, quando utilizados de maneira correta, geram economia com os gastos em energia elétrica e com fertilizantes químicos, esses responsáveis por grande parte dos gastos com o plantio.

Especificamente, os principais benefícios que os biodigestores possuem segundo, Oliver et.al, (2008), são:

a)    benefícios ambientais:

● redução da emissão de gases causadores do efeito estufa (GEE);

● preservação da flora e de fauna nativas. O biogás, como substituinte da lenha reduz a necessidade do corte de árvores;

● redução de odores desagradáveis. Os odores provêm principalmente dos estágios secundários da decomposição dos dejetos sob manejo inadequado (OLIVER et.al, 2007).

b) benefícios sociais e econômicos:

● o biogás gera economia de GLP, óleo diesel e lenha, além da redução na demanda da produção e distribuição de energia elétrica;

● aumenta na produção e o tempo de conservação dos alimentos;

● beneficia as mulheres do campo, as quais se queixam da laboriosidade do corte de lenha, da limpeza das panelas e da cozinha, enegrecidas fortemente pela fuligem, além da dificuldade para acender o fogo, no período mais úmido (OLIVER et. al, 2007).

c)    melhoria nas condições de higiene para os animais e as pessoas. A limpeza diária das instalações para recolher o esterco e seu tratamento adequado reduz a contaminação do ambiente por microrganismos nocivos e parasitos e reduz também a proliferação de moscas e mortalidade dos animais, aumentando, consequentemente, a produção de leite e o ganho de peso, bem como a qualidade dos produtos (OLIVER et.al, 2007).

No caso específico da fossa séptica biodigestora temos:

a)    benefícios na saúde e na preservação do meio ambiente:

● saneamento básico na propriedade. O tratamento dos dejetos humanos de forma correta ajuda a combater doenças além de contribuir com a preservação dos leitos dos rios, lençóis freáticos, etc;

● do ponto de vista econômico. Uma vez que produtor e sua família produzem alimentos mais saudáveis, com a utilização do biofertilizante produzido pela fossa, e diminui os riscos de doenças. Haverá economia com remédios e tratamentos de doenças que porventura viriam a surgir pela falta de saneamento básico, além de ampliar a capacidade de consumo e possibilitar a criação de vagas de emprego no campo.

Para melhor entendermos os benefícios que a implantação dos biodigestores pode proporcionar na preservação do meio ambiente, observemos a figura 2:

 

Fig. 2 Benefícios dos Biodigestores

Fonte: EMBRAPA, (2009)

 

Analisando a figura percebe-se a possibilidade de desenvolvimento sustentável, aplicando o mínimo de impacto no meio ambiente, acarretando melhoria na qualidade de vida. Dessa forma configura a tríade proposta na ECO 92 no Projeto Brasil 21, onde é proposto o paradigma do Desenvolvimento Econômico e Justiça Social em Harmonia com o Meio Ambiente.

 

Considerações finais

 

Este trabalho procurou discorrer sobre a necessidade de criação e implementação de novas tecnologias de baixos custos, na renovação da base energética nacional e a importância que a utilização dessas tecnologias tem quando instaladas em pequenas propriedades rurais.

Os exemplos dispostos no trabalho – o biodigestor e a fossa séptica biodigestora – são tecnologias que podem ser instaladas em propriedades de todos os tamanhos. Entre tanto, procurou-se demonstrar o quanto é importante à instalação dessas tecnologias nas pequenas propriedades, uma vez que, a população rural no país, ou a agricultura familiar, sofre com a falta de saneamento básico e com os altos preços de fertilizantes.

            Sanando essas dificuldades encontradas pelo pequeno agricultor, indiretamente a propriedade estará contribuindo com a preservação ambiental, pois passará a tratar os dejetos humanos e dos animais. Haverá diminuição na utilização de lenha e de fontes não renováveis de energia, graças ao biogás gerado, e a eliminação do uso de fertilizantes químicos, devido à produção de biofertilizantes. Essas medidas trarão benefícios a todos, seja na micro-região onde está localizada a propriedade ou em proporções maiores, como o planeta.

            Outro aspecto importante é a mudança na qualidade de vida da população rural, proporcionada pela economia com produtos que antes deveriam ser adquiridos em cooperativas e com preços mais elevados, caso dos fertilizantes químicos, agora produzidos de maneira biológica na propriedade. Evitando a contaminação do solo, dos rios e principalmente dos seres humanos. Essas medidas colaboram na melhoria na saúde da população com o tratamento dos efluentes, evitando doenças e consequentemente gastos com remédios.

             Finaliza-se demonstrando que ao desenvolver e facilitar o acesso as tecnologias de baixo custo para a população rural, estaremos contribuindo com o desenvolvimento social, econômico, sanitário, ambiental e principalmente fornecendo subsídios para que o pequeno produtor desenvolva suas atividades de forma sustentável, de maneira a contribuir com sua permanência no campo, evitando assim o êxodo rural.

 

Referências

 

ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica.   Atlas de energia elétrica do Brasil. 2.ed. ANEEL, Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.aneel.gov.br/arquivos/PDF/livro_atlas.pdf>. Acesso em: 07 mai. 2011.

 

COLEN, F.  Potencial energético do caldo de cana-de-açúcar como substrato em reator UASB. 2003. 85 f. Tese (Doutorado em Energia na Agricultura), Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista, Botucatu 2003. apud. TARENTO G. E. & MARTINEZ J. C.  Análise da implantação de biodigestores em pequenas propriedades rurais, dentro do contexto da produção limpa. XIII SIMPEP - Bauru, SP, Brasil, 2006.

 

DEGANUTTI R., PALHACI M. C. J., ROSSI M., TAVARES R., SANTOS C.  Biodigestores Rurais: modelo indiano, chinês e batelada. Bauru: UNESP, 2002. Disponível em: . Acesso em: 05 mai. 2011

 

EMBRAPA.  Saúde e renda no campo: Saiba como reaplicar o sistema inovador de Fossas Sépticas Biodigestoras Cartilha Passo-a-Passo. Brasília: PlanoMídia, 2009.

 

OLIVER A. P. M.  Manual de Treinamento em Biodigestão. Instituto Winrock – Brasil: Versão 2.0, 2008.

 

Rabinovici M. & Sabóia N.  Ecos da Rio-92: Conservacionismo. Folha de São Paulo, Rio de Janeiro – Brasil, junho de 1992. Disponível em: . Acesso em: 25 abr 2011.

 

SACHS, I.  A revolução energética do século XXI. In: Dossiê energia. Estudos Avançados, v. 21, n.59. São Paulo, 2007.

 

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Ilustrações: Silvana Santos