Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2018 (Nº 45) PERCEPÇÃO AMBIENTAL E ESTUDO DO MEIO COMO FERRAMENTAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL FORMAL
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Utilização de recursos hídricos como estudo de percepção ambiental de alunos

PERCEPÇÃO AMBIENTAL E ESTUDO DO MEIO COMO FERRAMENTAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL FORMAL

Cristiano Cunha Costa¹

                                                                                                          Paulo Sérgio Maroti²

¹Engenheiro Florestal, Especialista em educação ambiental e recursos hídricos (USP), Mestrando em Agroecossistemas (NEREN/UFS). Email: cristianocunha1982@hotmail.com

²Prof. Adjunto/UFS/Campus Prof. Alberto Carvalho/Itabaiana-SE/Email: dpsm@ufs.br

 

 

Resumo: Diante da degradação dos recursos naturais, os corpos d’água se tornam tema fundamental para as atividades de educação ambiental, no sentido de estudar a percepção de alunos e estimular maior contato com a natureza e ação cidadã. Assim, este trabalho teve como objetivo o estudo da percepção de alunos de uma escola, localizada no Povoado Cajaíba, Itabaiana-SE, tendo como foco a barragem daquele povoado. O estudo deu-se a partir do uso dos mapas mentais (MM) e análise dos landmarks, com alunos da 8ª série. Foi solicitado que desenhassem, à partir de suas percepções, a situação atual da barragem e daqui há 10 anos e, depois, fizessem comentários sobre seus MM . Pode-se observar, referindo-se à situação atual da barragem, eles sempre faziam associações da barragem com o cotidiano da comunidade, deixando explicita a importância da mesma para a vida de cada família, que depende desta para a irrigação das culturas e como meio de diversão para as pessoas das cidades vizinhas e do próprio povoado. As características da qualidade da água são precariedade associada a sujeira (lixo doméstico e das atividades de lazer) e contaminada. Poucos alunos representaram a presença de mata ciliar da barragem. Com relação à visão do futuro da barragem (10 anos) a maioria dos alunos adotou visão pessimista para a paisagem. Nos MM desses alunos foi possível verificar a barragem com maior quantidade de lixo em relação aos MM anteriores, águas escuras, muitos peixes mortos e pouca água para a irrigação das lavouras e para beber. Tais resultados preliminares denotam a importância e necessidade das atividades de educação ambiental e sensibilização do público, visando principalmente estimular a percepção e de alta estima relacionado ao seu espaço/território. 

Palavras-chave: percepção ambiental, educação ambiental, mapas mentais.

 

Abstract: Due to the degradation of the natural resources, the bodies of water become fundamental theme for the activities of environmental education, in the sense of to study the students' perception and to stimulate larger contact with the nature and action citizen. Thus, this work had as objective the study of the students' of a school perception, located in the Inhabited Cajaíba, Itabaiana-if, tends as focus the dam of that populated. The study gave him starting from the use of the mental maps (MM) and analysis of the landmarks, with students of the 8th series. It was requested that they drew, the starting from its perceptions, the current situation of the dam and of here 10 years ago and, then, they made comments on its MM. It can be observed, referring to the current situation of the dam, they always made associations of the dam with the daily of the community, leaving explicit the importance of the same for the life of each family, that depends on this for the irrigation of the cultures and as middle of amusement for the people of the neighboring cities and of the own town. The characteristics of the quality of the water are associated precarious the dirt (I sand domestic and of the lazer activities) and polluted. Few students represented the presence of ciliary forest of the dam. With relationship to the vision of the future of the dam (10 years) most of the students adopted pessimistic vision for the landscape. In the those students' MM it was possible to verify the dam with larger amount of garbage in relation to previous MM, dark waters, many dead fish and little water for the irrigation of the agriculture and to drink. Such preliminary results denote the importance and need of the activities of environmental education and the public's sensitize, seeking mainly to stimulate the perception and of discharge it esteems related to its space/territory.

                              

1. INTRODUÇÃO

 

            Assuntos relativos ao meio ambiente são constantemente abordados pelos meios de comunicação como forma de alertar a sociedade, de uma forma geral, dos abusos com relação ao uso dos recursos naturais.

            Os recursos hídricos são utilizados pelo homem para a pesca, turismo abastecimento doméstico e industrial, irrigação, dentre outros. Por outro lado, o uso indiscriminado deste recurso está se  tornando escasso.

Os corpos d’água podem ser utilizados como ferramenta no desenvolvimento de atividades de educação ambiental em meio escolar, por exemplo.

             As escolas como formadoras de cidadãos críticos e responsáveis com a realidade existente se tornam ferramenta no sentido de desenvolver programas de educação ambiental, com o objetivo de sensibilizar os alunos das questões ambientais, resultando na mudança de comportamentos e atitudes perante seu ambiente vivido.

            Através da educação ambiental é possível trabalhar o meio ambiente de forma interdisciplinar, fazendo ligação entre todas as disciplinas e abandonando a idéia de que os conhecimentos das disciplinas são fragmentados. O atual sistema de currículo não permite que a educação ambiental seja uma disciplina, devido a sua complexidade de fatores que interagem entre si. Assim, torna-se necessário que a educação ambiental seja trabalhada de forma interdisciplinar, onde as questões ambientais permeiem todas as disciplinas. 

            Não é de se negar que quando o homem é dotado de conhecimentos, atua como um ser de transformação da realidade local. Vale destacar que essa mudança deve ocorrer de fora para dentro, refletindo em mudanças na sociedade.

            A inserção da temática ambiental na rotina escolar deve permiti que alunos/professores tenham suas percepções ambientais aguçadas, pois a educação voltada para a conservação da natureza deve explicitar os fatores que estão relacionados com o meio ambiente.

            Dessa forma, este trabalho teve como objetivo o estudo da percepção de alunos na 8ª série do ensino fundamental, tendo como tema gerador os recursos hídricos da barragem do povoado Cajaíba, município de Itabaiana, SE.

           

2. REFERENCIAL TEÓRICO

 

Este trabalho foi alicerçado nas pesquisas em educação ambiental desenvolvidas pelo Grupo de Estudos e Ação Ambiental “Carneiro de Ouro”, da Universidade Federal de Sergipe, Campus Professor Alberto Carvalho em Itabaiana, SE que desenvolvem atividades de sensibilização e educação ambiental junto às escolas locais utilizando-se dos recursos hídricos como tema gerador. Durante todo o ano de 2007 (MAROTI et al, 2007; SANTOS, et al., 2007; REIS et al., 2008; ), alunos do curso de Ciências Biológicas desse campus, trabalharam com essa temática visando envolver o público docente e discente de duas escolas do município de Itabaiana/SE, buscando entender a percepção destes para com o Açude Marcela e Represa Jacarecica I.

            Esse projeto utilizou-se das práticas de campo visando à aproximação e compreensão de conceitos trabalhados em sala de aula, utilizando-se de atividades intituladas de expedições científicas.

            A educação ambiental deve prover os meios de percepção e compreensão dos vários fatores que interagem no tempo e no espaço para modelar o meio ambiente. Quando possível, o conhecimento em questão deveria ser adquirido por meio da observação, do estudo e da experimentação de ambientes específicos. Deve também definir os valores e motivações que conduzam a padrões de comportamento de preservação e melhoria do meio ambiente (DIAS, 2003).

O estudo do meio é definido por PONTUSCHKA (1983) apud MARTINS (2007) como uma metodologia em que alunos e professores são colocados em situação de pesquisa e juntos analisam o espaço humanizado e problematizam situações contatadas em busca de respostas, portanto professores e alunos juntos produzem o conhecimento.dessa forma, essa metodologia favorece a percepção e o estudo do meio por parte dos participantes da metodologia.

            Cada indivíduo percebe, reage e responde diferentemente frente às ações sobre o

Meio ambiente. As respostas ou manifestações são, portanto, resultado das percepções, dos processos cognitivos, julgamentos e expectativas de cada indivíduo. Embora nem todas as manifestações psicológicas sejam evidentes, são constantes, e afetam nossa conduta, na maioria das vezes, inconscientemente. Assim, o estudo da percepção ambiental é de fundamental importância para que possamos compreender melhor as inter-relações entre o homem e o ambiente, suas expectativas, satisfações e insatisfações, julgamentos e condutas (FAGGIONATO, 2005).

            Para HIGUCHI & AZEVEDO (2004) as capacidades e experiências pessoais são

formas de pensar que nos fazem serem distintos uns dos outros, de modo que, diante de

uma mesma situação, cada pessoa tem uma experiência única de percepção, que contribui para formar suas representações, idéias e concepções sobre o mundo.

KRASILCHIK (1986) expressa que a base dessa diversidade de percepções sobre as causas da degradação do meio e suas soluções, por sua vez, reside na variedade de pontos de vista sobre o processo de desenvolvimento e sobre o conceito de qualidade de vida, que não podem ser padronizados, mas dependem das aspirações de cada população, de cada comunidade.

Do ponto de vista científico, é interessante notar como o conceito de percepção ambiental tem estabelecido conexões entre um estudo sobre o meio físico, afeito aos métodos da geografia, e uma reflexão sobre as relações desse meio com a subjetividade, própria do instrumental psicológico.

Uma crítica epistemológica ao conceito de percepção ambiental suscita, então, a pergunta sobre até que ponto os estudos de percepção ambiental são instrumentos válidos para a escuta das comunidades e como a adoção de determinadas perspectivas metodológicas pode expressar os compromissos ideológicos dos agentes envolvidos na administração de áreas protegidas.

Discutir o conceito de percepção ambiental não é, portanto, uma questão de dizer quais das representações parecem corresponder melhor à realidade, mas elucidar as perspectivas científicas, sociais ou políticas veiculadas através da utilização desse conceito.

Para FERRARA (1993), a percepção ambiental é definida como a operação que

expõe a lógica da linguagem que organiza os signos expressivos dos usos e hábitos de um lugar. É uma explicitação da imagem de um lugar, veiculada nos signos que uma comunidade constrói em torno de si. Nesta acepção, a percepção ambiental é revelada mediante uma leitura semiótica da produção discursiva, artística, arquitetônica etc. de uma comunidade.

Quanto à metodologia para se avaliar a percepção, JACOBI et al. (2004) utilizaram questionários para avaliar o perfil de percepção ambiental individual, em unidades de conservação, com diferentes grupos etários, também se observou que, apesar da diferença de faixa etária, a percepção foi expandida e aguçada pela sensibilização ambiental.

A percepção e a interpretação dos níveis e dimensões das realidades ambientais, das singularidades e da importância do patrimônio paisagístico, das atitudes e condutas humanas, dos valores ambientais devem contribuir, essencialmente, para a compreensão

das transformações visíveis e não-visíveis, tangíveis ou não, da paisagem, percebida e interpretada como patrimônio de um povo, de um país, legado às futuras gerações, consideradas as várias instâncias e conjunturas, pois um horizonte de possibilidades individuais e coletivas é desvendado numa expressão de valores locais, regionais e universais (GUIMARÃES, 2007).   

Diversas são as formas de se estudar a percepção ambiental: questionários, mapas mentais ou contorno, representação fotográfica, etc. Existem ainda trabalhos em percepção ambiental que buscam não apenas o entendimento do que o indivíduo percebe, mas promover a sensibilização, bem como o desenvolvimento do sistema de percepção e compreensão do ambiente.

Elucidar como a utilização do conceito de percepção ambiental tem se inserido nesses debates é uma tarefa importante para a democratização da ciência e dos saberes, e para uma reflexão sobre instrumentos que dispomos e o quanto estes são adequados para garantir a escuta às comunidades na administração de áreas protegidas, visando garantir maior qualidade ambiental para todos.

A questão ambiental é, então, apontada como elemento comum a ser contemplado por diferentes correntes filosóficas e seus respectivos métodos, presentes no processo de conhecimento dos problemas sócio-ambientais atuais. Os métodos de interpretação da realidade surgem, nesse contexto, como a via de relacionamento entre essas formas de saber (GUARIM, 2002).

 

3. METODOLOGIA

 

3.1. Escola local

 

            A Escola Municipal Profª. Anailde Santos de Jesus, fundada no ano de 1960, está localizada no Povoado Cajaíba, zona rural do município de Itabaiana. Atualmente, a escola é constituída por um corpo docente de 12 membros e um total de 328 alunos, sendo que a oitava série possui 5 professores e 17 alunos, variando anualmente.

 

3.2. Barragem da Ribeira ou Cajaíba

 

O perímetro localiza-se no município de Itabaiana, na parte central do estado, distando 50 km de Aracaju e 13 km da sede municipal. O município de Itabaiana é considerado um grande centro produtor e distribuidor de hortigranjeiros. Com relação à estrutura fundiária, predomina os estabelecimentos com menos de 5 ha, onde se explora as culturas: amendoim, batata-doce, cebolinha, coentro, couve, maxixe, pimentão, pepino, quiabo e tomate.

Segundo SILVA (2001) o lago da barragem, batizado de Cajaíba (Ribeira), está localizado numa área afastada dos cultivos e de áreas urbanas, sendo assim, com poucas possibilidades de receber em suas águas resíduos de agrotóxicos oriundos de plantações e poluentes urbanos diversos. Contudo, um fator negativo é observado: a presença de pedreiras no local faz com que partículas de poeira, provenientes das explosões quase que diárias sejam lançadas em direção a barragem, mudando assim, o aspecto e o balanço físico-químico das suas águas.

Na barragem foram escolhidos três pontos com diferentes perfis, que correspondem aos pontos de coletas.

 

i)                    Ponto de turismo

 

Refere-se a um espaço com perfil turístico com bares, banheiros, pouca área de mata ciliar e lugar para estacionamento de carros;

 

ii)                  Ponto de agricultura:

 

Refere-se a uma paisagem de margem de represa com características agrícolas, com maior presença de mata ciliar;

 

iii)                Ponto mais selvagem:

 

Refere-se a uma paisagem mais nativa, com mata ciliar mais determinada e com pouca interferência antrópica.

 

3.3. Percepção dos alunos

 

Para o estudo da percepção dos alunos utilizou-se de metodologia baseada em BARRAZA (1999) também baseada em desenhos ou mapas mentais (MM) em um tempo atual e de um tempo futuro (10 anos). Foram entregues aos mesmos 2 folhas em branco, sendo solicitado que os mesmos representassem por meio de desenho (MM) a atual situação da barragem e no verso da folha fizessem comentário a respeito do seu desenho. Depois de terminado, solicitou-se em outra folha que fosse desenhada a barragem daqui há 10 anos e, também fosse feito comentário sobre o desenho. Os desenhos, ou mapas mentais (MM) foram feitos com lápis de cor, tendo a liberdade para a escolha das cores na sua confecção. Nada foi comentado à respeito da barragem para que não fossem influenciados em suas representações dos desenhos (MM).

            Depois desta atividade, foram informados detalhes sobre o projeto e algumas características do corpo de água que seriam estudadas.

            A análise dos desenhos compreendeu das seguintes etapas: desenhos da criança da situação atual da barragem, situação da barragem daqui há dez anos e  relatos feitos do respectivos desenhos. Por meio das gravuras feitas pelos alunos, buscou-se conhecer a percepção e a relação que a criança tem a com a barragem. Assim, os desenhos sobre a barragem nada mais são do que ferramentas de conhecimentos no sentido de expressar suas percepções e relações com o meio a sua volta.

Metodologia semelhante foi usada por KOSMINSKY (1998), ao realizar um estudo visando conhecer a visão da criança internada sobre a família e sobre a instituição e o relacionamento criança-família por meio de desenhos e relatos dos mesmos.

            BARRAZA op cit, ao estudar desenhos infantis sobre o ambiente, solicitou que os desenhos fossem feitos uma única vez no tempo de 45 minutos à 1 hora. Não houve discussão antes da sessão, exceto para introduzir a atividade. Em seguida, foram adicionadas informações, entrevistando a criança quando ela terminava seu desenho.

           

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO          

 

4.1. Os mapas mentais e a situação atual

 

            Após os alunos realizarem as atividades, foi perguntado se algum destes gostaria de fazer algum comentário público a respeito da sua gravura. Dois alunos se dispuseram a ir diante da turma e explicar o que queria dizer a respeito da barragem com seu desenho (inserir algo que fora comentado pelos mesmos).

            Em seus mapas mentais, referindo-se à situação atual da barragem, os alunos sempre fazem associações da barragem com o cotidiano da comunidade, ou seja, deixam clara a importância que a barragem tem para a vida de cada família que depende dela como irrigação das culturas, uma vez que a água da barragem é usada para irrigação na agricultura que é fonte de renda para várias famílias da comunidade e, ainda, como um meio de diversão para as pessoas das cidades vizinhas e do próprio povoado. Tanto é que há desenhos que retratam bares e banheiros existentes na margem da barragem e pessoas chegando ao local para se banhar (FIGURA 01).

                                                                          

 


 

Figura 01. Mapa Mental dos alunos em que a água da barragem é usada para irrigação.

 

            Por outro lado, em seus mapas mentais a água está suja e contaminada. São representadas garrafas, pneus, peixes, animais e automóveis sendo lavados, e pessoas tomando banho e pescando na água da barragem.  Poucos alunos desenharam mata ciliar margeando a barragem (FIGURA 02).

 

 


 

Figura 02. Mapa Mental dos alunos segundo a percepção deles com relação a qualidade da água da barragem.

 

            Um dos alunos em seu relato chega a afirmar que:

 

 “...isso acaba prejudicando nossa saúde, porque a água que foi poluída, vai para  as nossas casas, plantações, etc. Essa água é também transportada para a cidade de Itabaiana. Essa água poluída, que nós bebemos é cheia de bactérias, é uma coisa horrível, a água é tão ruim que a cor da água é amarelada com gosto de ferrugem e outras coisas”.

 

A mesma preocupação é relatada por outro aluno:

 

“...as pessoas que tomam banho, pessoas que tem doenças e tudo isso se acumula e devemos ver que é dessa água que nós bebemos”.” ...A água que está chegando em nossas casas é de má qualidade e oferecendo riscos a nossa saúde”.

 

            A água contaminada constitui-se como vetor de várias doenças como: hepatite, a amebíase e a esquistossomose ou barriga d’água (MOLLE, 1992).

            DORNELLES (2006) notou que seus entrevistados desconhecem resultados da qualidade da água do Rio Monjolinho em São Carlos, SP. Essa falta de informação é preocupante, uma vez que a população ribeirinha ainda pesca nesse rio ou usam suas águas para a irrigação de hortaliças, representando um fator de risco adicional à saúde.

            Nas descrições solicitadas, os alunos usam termos como: poluída, macabra, não tem aparência agradável, não está em boas condições, estado muito ruim, muito suja, e não tem aparência bonita, para descrever, nas suas visões, a respeito da condição atual da barragem.

            Apenas quatro alunos relatam da necessidade de cuidar da barragem, segundo eles os seres humanos são os responsáveis pela degradação desse recurso natural, necessitando a preservação e uma maior preocupação com relação a esse recurso natural.

            DORNELLES op. cit., ao estudar a percepção dos moradores da bacia hidrográfica do Monjolinho notou nos entrevistados, mesmo entre os mais jovens, uma preocupação com o meio ambiente, sua valorização, sua conservação e os problemas existentes.

           

4.2. Os mapas mentais e a percepção para daqui dez anos

 

A barragem daqui á 10 anos, a maioria dos alunos adotou visão pessimista. Nos mapas mentais é possível verificar a barragem com maior quantidade de lixo em relação aos desenhos anteriores, águas escuras, muitos peixes mortos e pouca água para a irrigação das lavouras além de pouca água para beber (FIGURA 03). Alguns alunos representaram a barragem associada com uma régua, demonstrando seu baixo nível após uma década.

 


Figura 03. Gravuras sobre a barragem daqui há 10 anos.

 

Segundo um dos alunos:

 

 “...a barragem se for indo como irá, tá muito poluída, com água pouca, água escura e não mais será uma área de lazer. Mas tudo isso por causa dos próprios banhistas, mas tomara que melhore muito”.

 

Outros mapas mentais retratam a barragem seca, dando lugar a vegetação. Por outro lado, apenas quatro alunos apresentam percepção mais otimista, representando a barragem com suas águas limpas, cheias de peixes, com vegetação ciliar; embora um deles faça associação com a visitação para banho e diversão, pois relata que:

 

 “... tudo mais bonito, a água limpa, nenhum lixo solto, e as pessoas mais contentes, com mais turistas irão vir pra prestigiar o novo espaço modificado”. “...se as pessoas pensassem no futuro, pensaria nos seus futuros filhos, futuros netos, etc.”              

 

Para BARRAZA op. cit., os mapas mentais de crianças são ferramentas úteis provendo valiosa informação para o estudo da percepção ambiental infantil, servindo, principalmente, como indicadores emocionais para especificar problemas ambientais.

A análise da representação gráfica não é suficiente. A fala sobre o desenho deve ser registrada. Essa correlação proporciona a unidade do desenho e da fala, e é essa unidade que torna possível a interpretação dos desenhos. Dessa maneira, a leitura dos desenhos infantis, por parte do pesquisador, não pode perder de vista os aspectos objetivos e subjetivos neles contidos (KOSMINSKY, 1998).

 

4.3. O uso de fichas de campo para a percepção da paisagem

 

O uso das fichas de campo permitiu que alunos e estudantes pudessem descrever os três ambientes (pontos de coleta), permitindo descrever diferenças entre os ambientes e a influência das características de cada ambiente nas variáveis que foram avaliadas no monitoramento participativo.

            O modelo da ficha de campo utilizada pelos alunos e professores permitiu fazer algumas observações sobre a paisagem de diferentes ambientes pertencentes a mesmo corpo hídrico. 

Com o uso das fichas de campo, foi possível caracterizar os ambientes segundo percepção dos grupos. Assim, o ponto de coleta 1 é caracterizado por uma vegetação natural, com  sinais de erosão em áreas próximas á barragem, com alterações antrópicas de origem doméstica (esgoto, lixo, como foi visto), sem odor da água e oleosidade ausente, além da água transparente, sem outro tipo de cascalho e com  mata ciliar, mas com sinais de alteração com largura de mais de 20 metros e com presença de plantas aquáticas (macrófitas ou algas filamentosas).

            O ponto de coleta 2, segundo a percepção do grupo, é caracterizado por uma vegetação natural, erosão ausente, alterações antrópicas de origem doméstica, sem odor e oleosidade na água, água turva,  há areia/lama como substrato, a vegetação ciliar bem desenvolvida e diferenciada da formação do entorno com largura superior a 20 metros, há presença de plantas aquáticas (macrófitas ou algas filamentosas).

            O 3 ponto de coleta, tem uma vegetação natural, com erosão ausente, alteração antrópica de origem doméstica, odor e oleosidade ausentes, água turva, lama e areia como substrato, mata ciliar presente, mas com sinais de alteração, numa faixa de 20 metros, pequenas macrófitas distribuídos pelo leito.

            Os alunos pouco percebem o local que faz parte da rotina delas, parecendo existir certa opacidade referente a percepção das condições ambientais locais. Geralmente, um visitante ocasional percebe mais o local, pois está com os olhos atentos vendo algo novo (MORAIS, 2004).

Considerado o “pai da educação ambiental”, o escocês Patrick Geddes, expressa que uma criança que vive em meio rural tem uma relação mais próxima com a natureza do que uma outra criança que vive no meio urbano, sendo necessário desenvolver na criança uma simpatia pela natureza, favorecendo uma interação com a fauna, com a flora e demais recursos naturais.

 

5. CONCLUSÕES           

 

Apesar do trabalho ainda estar em andamento, vale destacar que os resultados obtidos até então podem denotar que não se pode negar a importância da barragem para a população do povoado estudado e para as cidades circunvizinhas. Dessa forma, pelos mapas mentais feitos pelos alunos, evidencia-se a preocupação da situação atual com relação ao futuro da barragem, relatando a necessidade de atitudes voltadas para uma conservação e recuperação do corpo d’água local. 

A percepção ambiental, que antecede a educação ambiental, permite a estruturação de projetos mais consistentes cujo objetivo é que o ser humano adquira novas posturas ao lidar com o meio ambiente, adotando uma relação mais harmônica com os recursos naturais e com a natureza. Assim, como permite uma postura de integração e participação nas questões ambientais, sendo que cada pessoa exerce a cidadania. Além disso, a educação ambiental estimula a percepção necessária no sentido dos atores sociais envolvidos no processo sejam capazes de transformarem a atual situação ambiental existente.

 

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BARRAZA, L. Children’s Drawings About the Environment. Environmental Education Research. Vol 5 nº. 1, p 49-66, 1999.

 

DIAS, G.F. Educação ambiental: princípios e práticas. 8ª ed. São Paulo: Gaia, 2003.

 

DORNELLES, C. T. A. Percepção Ambiental: uma análise na bacia do rio Monjolinho, São Carlos, SP. Dissertação de mestrado. Escola de Engenharia de São Carlos – Universidade de São Paulo. 2006. 177p.    

 

FAGGIONATO, Sandra. Texto situado no site: http://educar.sc.usp.br/biologia/textos/m_a_txt4.html, 2005. Acesso em: 25.mar. 2007.

 

FERRARA, L. D. A. Olhar periférico: Informação, Linguagem, Percepção Ambiental. São Paulo: Edusp, 1993.

 

GUARIM, V. L. M. dos S. Barranco Alto: uma experiência em Educação Ambiental. Cuiabá, UFMT, 2002. 134p.

 

GUIMARÃES, S.T. de L. Percepção, interpretação e valoração ambiental. Departamento de geografia IGCE-UNESP, Rio Claro, 2007. (Notas de Aula – Disciplina Percepção e Interpretação Ambiental da Profª. Solange Guimarães proferida no curso do CRHEA – Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada).

 

HIGUCHI, M. I. G.; AZEVEDO, G.C. de. Educação como processo na construção da

cidadania ambiental. Revista Brasileira de Educação Ambiental, Brasília, nº. 0, 2004,

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JACOBI, C.M.; FLEURY, L.C.; ROCHA, A.C.C.L. Percepção ambiental em unidades de conservação: experiência com diferentes grupos etários no Parque Estadual da Serra do Rola Moça, MG. Anais do 7º Encontro de Extensão da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2004.

 

KOSMINSKY, E. V. “Aqui é uma árvore. Aqui o sol, a lua. Aqui um montão de guerra”: o uso do desenho infantil na sociologia. Cadernos Ceru. Série 2, nº. 9, 1998, p. 83-100.

 

KRASILCHIK, M. Educação ambiental na escola brasileira – passado, presente e futuro. Revista Ciência e Cultura, Rio de Janeiro, nº. 38, 1986, p.1958-1961.

 

MAROTI, P.S. “Monitoramento socioambiental participativo do açude Marcela e barragem do rio Jacarecica no município de Itabaiana/SE: produção do conhecimento”. Projeto de Extensão Universitária/ Pró Reitoria de Extensão/UFS, 2007.

 

MARTINS, A.K.S. As contribuições do estudo do meio para a inserção da educação

ambiental no contexto escolar. Trabalho de Monografia. Disciplina Pesquisa e Ensino de Ciências e Biologia, Universidade Federal de Sergipe, 46p., 2007.

 

MOLLE, F. Manual do Pequeno Açude. Recife, SUDENE-DPG-PRN-DPP-ARP, 1992, 523p.

 

MORAIS, F. M. R. de. Educação e fotografia: contribuições à percepção de problemas ambientais. Dissertação de mestrado. Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. Piracicaba, São Paulo, 2004, 309p.

 

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Ilustrações: Silvana Santos