Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2018 (Nº 45) DIFUSÃO CIENTÍFICA EM CONTEXTOS NÃO-FORMAIS: O PROJETO JOVEM PESQUISADOR
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DIFUSÃO CIENTÍFICA EM CONTEXTOS NÃO-FORMAIS: O PROJETO JOVEM PESQUISADOR

 

                                                              

 

 

Maria Inês Gasparetto Higuchi

Doutora em Antropologia Social

Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA)

Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental (LAPSEA)

mines@inpa.gov.br

 

 

 

Fernanda Bandeira Vieira

Especialista em Educação Ambiental

Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA)

Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental (LAPSEA)

bandeira@inpa.gov.br

 

 

 

Peter Weigel

Mestre em Planejamento do Desenvolvimento

Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA)

Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental (LAPSEA)

peter@inpa.gov.br

 

 

Resumo: O Projeto Jovem Pesquisador, desenvolvido ao longo de dez anos pelo Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental (LAPSEA), do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, constou de um encontro semanal durante três meses. Nos dois primeiros meses ocorreram palestras de pesquisadores sobre aspectos de uma temática específica de estudo, como entomologia, floresta, ecologia, botânica, entre outros. O último mês era dedicado aos trabalhos de pesquisa. Os participantes eram alunos da 5ª à 8ª séries do ensino fundamental, de escolas da rede pública de educação. O número de participantes variou entre 30 e 71 em cada turma e mais de 500 alunos participaram do projeto. Apresentamos aqui a trajetória desse projeto, suas conquistas e dificuldades em busca de eficiência e eficácia na difusão dos conhecimentos científicos produzidos por pesquisadores do INPA.

 

Palavras-Chave: difusão científica, educação ambiental

 

1. Introdução

 

      A aproximação entre a economia e a sociedade e a ciência ainda é um fato recente no país. Ocorre mais pela pressão das circunstâncias, como as mudanças climáticas, a necessidade de gerar meios para prover vida digna a um número crescente de pessoas e, também, não se pode infelizmente esquecer desse fato, a necessidade de manter em crescimento os níveis de consumo.

      Essa aproximação, porém, é necessária, principalmente para encurtar o caminho hoje percorrido pelos conhecimentos, desde a sua publicação até a sua incorporação pelas grades curriculares do ensino público e privado e sua assimilação correta pelos professores. Tendo em vista a organização atual do ensino, principalmente o público, mostra-se interessante a utilização de espaços não formais de educação, para melhorar o conteúdo recebido pelos alunos nas escolas e para tornar mais ricas as aulas ministradas pelos professores.

      A socialização de conhecimentos científicos sempre enfrentou problemas de comunicação e compreensão, ligados à linguagem científica.  Um entrave relevante, está situado na interação entre pesquisadores e difusores. Os primeiros não foram treinados para traduzir o que produzem e se mostram refratários e os segundos se veem às voltas com as dificuldades de transformar a tradução recebida em um instrumento que possa ser assimilado pelo público-alvo e, ao mesmo tempo, satisfaça as exigências de exatidão dos pesquisadores.

      O Projeto Jovem Pesquisador desenvolveu uma proposta que levasse à interação direta entre pesquisadores e alunos, com a mediação de educadores ambientais. Trata-se de uma experiência interessante, que durou dez anos, envolvendo, nesse período, mais de 500 alunos e que deixou lições e questões que precisam ser respondidas.

 

 

2. A ciência e a dificuldade da difusão dos seus resultados

 

      Pesquisadores formados apenas no conhecimento de suas especialidades, não vão conseguir situá-las no contexto mais amplo do conhecimento em sua totalidade, muito menos situar a sua necessidade no contexto do desenvolvimento regional (KNELLER, 1980). Isso acontecendo, vai ocorrer a multiplicação ad infinitum de pesquisadores alienados do contexto em que vão trabalhar, sem saber situar direito qual é o seu papel social (MORIN, 1982). Nessas condições, não vai lhes restar alternativa do que se dedicar aos problemas de suas respectivas especialidades, mantendo-se alheios ao papel mais amplo que poderiam vir a representar.

      Popularizar conhecimentos científicos em uma situação fragmentada e dispersa como essa exige muito esforço. Nesse sentido, se instala aí um contexto onde erros podem deformar a mensagem contida nos conhecimentos transmitidos, além de poderem ser, também, transmitidas imagens distorcidas do próprio funcionamento da instituição.

      A popularização passará a ser feita por pesquisadores atuantes próximos aos usuários finais, por instâncias de extensão, de difusão científica e de educação ambiental, entre outras possíveis, como, ainda, escritórios de negócios e de gestão de inovações. Será feita por pessoas que não tem a necessária compreensão das formas de comunicação mais adequadas a cada público nem as diferentes possibilidades de utilização de um conhecimento.

      A comunicação entre ciência e educação segue sendo um enigma de difícil compreensão e solução. .  Embora a socialização de conhecimentos científicos seja vista com muita cautela nos processos de educação ambiental, ainda vemos que muitos programas entendem a difusão de conhecimentos como suficiente para transformar comportamentos. Acredita-se que o conhecimento científico é necessário, mas não suficiente num processo de formação critica das pessoas envolvidas. Dessa forma, educação ambiental deve ser entendida como um espaço de formação ética, onde tais conhecimentos possam, junto com tantos outros, promover a emancipação dos indivíduos e dos grupos nessa relação pessoa-ambiente.

 

 

3. Educação ambiental em espaços formais e não-formais

 

      Quando a sociedade demanda a difusão de conhecimentos interdisciplinares a questão fica ainda mais complexa, porque vai desafiar o próprio formato curricular escolar que é unidisciplinar.

      Esse é o caso da educação ambiental, temática transversal, que tem encontrado dificuldades para ser inserida nas grades curriculares unidisciplinares e também para ser transmitida à população, por meio de atividades específicas em espaços não formais de aprendizado (JAPIASSU, 1976).

      Nesse ponto tem início, entre os estudiosos, uma discussão conceitual abrangente e complexa, que não será possível abordar aqui. Para simplificar a questão, pode ser adotada a definição de JACOBUCCI (2008, p.02), que considera que o espaço formal “(...) diz respeito apenas a um local onde a Educação ali realizada é formalizada, garantida por Lei e organizada de acordo com uma padronização nacional”. É, portanto, a escola e essa padronização nacional, introduz uma rigidez que dificulta o manejo pedagógico da transversalidade. Embora a legislação preveja a introdução da educação ambiental no currículo escolar, isso ainda não se realizou a contento.

      Já com relação aos espaços não formais, a mesma autora os divide em institucionais e não institucionais. Museus, Centros de Ciências, Parques Zoobotânicos, Aquários, Zoológicos, etc, são definidos pela autora como institucionais. A mesma autora define como não-institucionais “(...) os ambientes naturais ou urbanos que não dispõem de estruturação institucional, mas onde é possível adotar práticas educativas.”(JACOBUCCI, 2008, p.03)

      Embora a autora concentre as suas análises nos museus e centros de ciência como locais difusores de conhecimentos, ela enfatiza a necessidade de que os profissionais que irão interagir com o público sejam adequadamente treinados, assim como aponta para a necessidade de preparo adequado dos professores que levarão seus alunos a estes espaços.

      SPAZZIANI & MOURA (2008) questionam que processo educacional pode ser obtido a partir de resultados científicos, sem que estes passem por uma adequação aos interesses e necessidades das comunidades-alvo.  As autoras também alertam que é preciso definir bem o que irá ser feito nos espaços não-formais, para que não ocorra confusão entre divulgação e educação, termos que podem adquirir significados muito próximos e até podem chegar a confundir-se. De acordo com SPAZZIANI & MOURA (2008, p.02-03), “(...) educar pode referir-se a transmitir informações e, nesse sentido, pode estar bastante próxima do significado de divulgação. Com um propósito amplificado, educar significa cultuar, construir o espírito, a mente humana.”

      As autoras (2008, p.04) ainda apontam que “(...) o modo de divulgar uma informação traz implícita uma certa forma de entender o que é educar.”  Com isso, as autoras apontam que não basta divulgar um conhecimento científico, se o material pedagógico a partir dele elaborado não for adequado para ensinar e se o transmissor dessa proposta educativa não dominar um conteúdo pedagógico mínimo e não for dotado de uma capacidade didática básica.

      A respeito da educação, as autoras (2008, p.04) sumarizam a questão, dizendo que “ (...) educar implica transformar pela conscientiz(ação), ou ação consciente.”  Mostram ainda que há muitas controvérsias a respeito do conceito e que há uma apreciável diversidade de correntes teóricas sobre o assunto.

      Pode-se pensar na educação como um processo de formação e inserção do indivíduo na sociedade desde tenra idade, como um simples processo de reprodução e reposição de força de trabalho. Mas, pode-se pensar também na educação como uma possibilidade de transformar os indivíduos para que intervenham em dada realidade necessitada de mudanças. Nesse processo, o conhecimento científico pode desempenhar um papel relevante. SPAZZIANI & MOURA (2008, p.12) ressaltam que “(...)os processos selecionados para a divulgação do conhecimento científico, especialmente àqueles relacionados à biodiversidade, necessitam comprometerem-se com a perspectiva que ultrapasse simplesmente a informação.”

      Essa ressalva mostra as dificuldades que envolvem a utilização de conhecimentos científicos em processos educativos para a transformação da realidade, para obtenção de uma melhor relação homem-ambiente. É um desafio complexo, porque SPAZZIANI & MOURA (2008, p.13) mostram que “(...) se nas sociedades contemporâneas desenvolvemos uma cultura e uma consciência que nos desvinculou totalmente das leis da natureza, cabe a educação ambiental redimensionar essa relação (...)”.

      E ainda, ao mencionar especificamente a educação ambiental, as autoras (2008, p.14) refletem que “Não existe modelo único de realização dessa área temática, e ela também se encontra submersa em diversas formas de atuação de suas práticas educativas e expressando poucos avanços nas formas de divulgação de seus produtos.” E, querendo alertar para a dificuldade dessa atividade, apontam ainda que “Mudanças culturais, de atitudes e de comportamentos, bem como a ampliação e valorização da própria identidade são fundamentais para que as pessoas respeitem, compreendam e gostem da diversidade” (SPAZZIANI & MOURA, 2008, p.14-15).

      GUIMARÃES & VASCONCELLOS (2006, p.148) apontam para a “(...) intrínseca relação de complementaridade entre a Educação Formal e Não Formal e a importância da popularização da Ciência para se abordar a complexidade das atuais questões socioambientais”. Os autores também consideram importante o treinamento dos professores do ensino formal, para que possam realizar uma mediação adequada entre o que vai ser visto/tratado e os alunos. Os autores focam principalmente museus e centros de ciências, mas é fácil perceber que essa necessidade pode ser estendida para outros contextos não formais. Os autores analisaram o processo de formação de mediadores e mostraram que a fragmentação do ensino formal produz formandos com pensamento fragmentado, capazes apenas de avaliações fragmentadas da realidade, o que dificulta a busca da complementaridade entre educação formal e não formal, absolutamente relevante para a educação ambiental.  A questão da transversalidade enfrenta dificuldades para ser resolvida no âmbito da fragmentação unidisciplinar.

      Mesmo com essa dificuldade inerente ao esforço de formação de mediadores, GUIMARÃES & VASCONCELLOS (2006, p.156) ressaltam que “(...) o caráter de não formalidade (...) permite uma maior liberdade na seleção e organização de conteúdos e metodologias, o que amplia as possibilidades da interdisciplinaridade e contextualização”. Os autores acreditam, ainda, na complementaridade entre a escola e os espaços não formais, entendendo-a, porém, “(...) não como forma de uma instituição suprir deficiências da outra, e sim, como uma relação que amplie, pela interação, as possibilidades educativas numa perspectiva geradora de sinergia.” (GUIMARÃES & VASCONCELLOS, 2006, p.156) E acrescentam ainda que “(...) a educação não formal deve aliar informação, ensino-aprendizagem e entretenimento em prol da promoção da ampliação da cultura e construção de valores”. (p.157)

      Esses autores, pesquisadores do Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST) enfatizam que, para tentar aumentar as chances de sucesso de uma tentativa de integração entre espaços formais e não formais, o processo já tem início antes da própria visita ao Museu. Os professores da escola que solicitou uma visita são convidados para uma reunião no museu, onde são estimulados a escolher uma atividade a ser desenvolvida. Levam, então, de volta para a escola uma série de atividades a serem desenvolvidas pelos alunos, como uma forma de preparação e animação para a visita. E, após a visita, os professores levam outro conjunto de atividades a serem desenvolvidas na escola, com o intuito de consolidar o que foi visto e vivido.

      Esse pequeno referencial teórico mostra que, primeiro, há uma série de dificuldades para fazer o conhecimento científico chegar até a população diretamente, em espaços formais e, segundo, em espaços não formais. Outra constatação que emerge é que é imprescindível lidar com o conhecimento científico e transformá-lo em algo que possa ser compreendido pela população-alvo. E a evidência de que há necessidade de aplicar a transversalidade aos conhecimentos científicos, para que se consiga chegar a sínteses que possam ser aplicadas às situações abordadas, abrangendo a sua realidade multifacetada.

      Um último ponto merece reflexão e diz respeito a como avaliar a assimilação dos conhecimentos transmitidos, para que não se tornem meras acumulações culturais e, sim, para que consigam ser internalizados e passem a ser utilizados para agir sobre a realidade adversa em que as pessoas vivem ou para preservar áreas de proteção ambiental. Esse é um ponto que ainda desperta dúvidas, incertezas e falta de métodos adequados, assim como a educação ambiental em si, que, apesar de todos os esforços educativos e tecnológicos, ainda não conformou um paradigma  (KUNH, 1987) que consiga agregar os estudiosos do assunto.

     

 

4. O Projeto Jovem Pesquisador

 

   4.2 Estrutura do Projeto

 

      Os elementos que servem de base para  a elaboração dos pressupostos  teórico-práticos que baseiam as atividades do projeto derivam da abordagem construtivista, cuja metodologia  se baseia na investigação, no trabalho em equipe, na discussão, na autonomia e na interação entre os alunos. As atividades são cuidadosamente elaboradas com objetivos bem definidos objetivando conduzir os alunos participantes a uma descoberta de um conhecimento científico já conhecido. HENNING (1998, p. 191), coloca que o ato de descobrir gratifica e reforça o aluno para novas descobertas.

      As escolas selecionadas participam de uma reunião inicial, onde são apresentadas ao projeto. Com 30 dias de atividades, os pais ou responsáveis participam de uma reunião para conhecimento do projeto e para formalização da participação do seu dependente nas atividades.

      Neste tempo de permanência do aluno no projeto, a equipe deste fica à disposição para qualquer informação adicional. Os alunos que participam do projeto são solicitados a participarem e a representarem as suas escolas, quando da ocorrência de eventos da Secretaria Estadual de Educação e Qualidade de Ensino - SEDUC, em que se faz necessária a participação dos alunos.

      Para que sejam atendidos os objetivos propostos e expressos pelo projeto Jovem Pesquisador, o projeto se desenvolve em dois módulos educacionais, que são: Módulo Básico e Módulo Específico. De forma complementar a estas ações desenvolvem-se, ainda, a Monitoria e a Tutoria.  Estes módulos acontecem em um contexto de atividades que buscam e acentuam fatores relativos à compreensão da ciência, utilizando-se para tanto de toda uma sequência temática que é delineada a partir do tema geral que é selecionado para cada edição do Projeto. 

 

4.2.1 Módulo Básico

 

O módulo básico possui uma duração de dois meses. Os alunos participam de atividades em grupo, uma vez por semana, que duram duas horas e meia, que constam de uma palestra de um pesquisador, um aluno de pós-graduação ou um técnico, seguidas de uma avaliação do aprendizado atingido. Após um lanche, são realizadas atividades práticas no Bosque da Ciência ou feitas demonstrações e/ou experimentações relacionadas ao assunto apresentado.

As atividades visam despertar o interesse, a curiosidade e o senso de observação, sendo que os pesquisadores, técnicos, e educadores ajudam a discutir a temática e as palestras são  expressas  de forma  simples e clara, visando captar rapidamente a atenção dos alunos.

 

4.2.2 Módulo Específico

 

      O jovem pesquisador entra no exercício da investigação tendo uma vivência interativa com a forma de se fazer pesquisa. Tem início um trabalho com grupos que irão desenvolver em conjunto com os pesquisadores e sua equipe uma pequena investigação. Primeiro são realizadas oficinas, cada uma se ocupando com um aspecto do tema geral, que dará origem a um trabalho de pesquisa. São formados grupos de 6 a 8 escolares, que decidem por si mesmos em que grupos temáticos vão tomar parte. Ao comentar o papel de uma oficina pedagógica, S’ANTANNA e S’ANTANNA (2004, p. 73), colocam que é um local  onde podem ocorrer grandes modificações,  que favorecem uma descoberta,  e manifestação  de  aptidões até então não expressadas pelo seus integrantes.

      Cada grupo tem um tutor (pesquisador), que fica responsável pela orientação dos trabalhos de investigação. A equipe do projeto apresenta a Coordenação de Pesquisa que se ofereceu para participar de determinado ciclo do Projeto e orienta a escolha dos temas a serem pesquisados pelos participantes.

      Este módulo dura 4 meses e os escolares passam a dialogar diretamente com o pesquisador e equipe. Ocorre um exercício de construção do conhecimento, de envolvimento com as atividades de pesquisas e de interação direta com os pesquisadores em seu local de trabalho. Como recurso didático complementar, participam de excursões e visitas a locais relacionados à investigação desenvolvida, fazem observações, aplicam questionários, executam experimentos ou participam de coletas de material para análise.

      Ao se reportar ao aspecto relativo à promoção de aprendizagem, S’ANTANNA e S’ANTANNA (2004, p. 10), colocam que, independente da concepção pedagógica a ser  referenciada, a aplicação de variados recursos de ensino só irá favorecer o aprendizado. A imersão total no contexto de estudo, pode trazer ganhos adicionais para o processo de absorção de conhecimentos e minimizar os efeitos deletérios de impressões abstratas e hostis. Isto vem sendo avaliado em um curso de formação de professores da rede pública de ensino, realizado anualmente pelo INPA, no interior da floresta, em uma estação experimental. A imersão, por uma semana, na floresta, em uma programação que inclui aulas teóricas e práticas (excursões na mata), tem contribuído significativamente para mudar a atitude dos professores frente à floresta e enriquecido as suas aulas, conforme  constataram AZEVEDO e HIGUCHI (2012).

      Ao longo das atividades, os escolares  são solicitados a descreverem a investigação realizada e num workshop, cada grupo apresenta uma primeira versão da sua investigação para os seus pares, objetivando um processo de interação  mais intenso. 

 

4.3. Espaço Ambiental

 

      O resultado dos trabalhos de investigação são apresentados em um evento denominado Espaço Ambiental, que é realizado no Bosque da Ciência ou em outros locais de visibilidade pública. Sua realização exige todo um conjunto de providências e a vinda dos grupos, em dias alternados, para término da investigação com os seus tutores ou mesmo para preparação de uma maquete, confecção de convites a serem enviados aos financiadores, parceiros e escolas integrantes do projeto ou convidadas e aos responsáveis pelos alunos.

       A apresentação envolve a criatividade  dos escolares, que  utilizam recursos diversos como: teatro de bonecos, peça teatral, confecção de livrinhos, folhetos, CDs com joguinhos ou apresentação utilizando data show. Nesse dia,  chamamos um membro de cada grupo para fazer a entrega do certificado  de participação no projeto ao pesquisador tutor.

4.5. Monitoria

 

       A demanda de ex-jovens pesquisadores, visando continuar participando das atividades, levou à introdução da monitoria. O escolar pode ser indicado pela coordenação ou ter livre iniciativa. Após uma avaliação de seu desempenho, rendimento, tempo de participação, perfil e aptidão, o jovem é convidado a fazer parte da equipe executora. 

       O  monitor deve participar de um encontro semanal, com duração de no máximo 3 horas, em horários alternados aos da escola, para realização de leituras e tomar conhecimento das atividades a serem planejadas

      Todo monitor possui atribuições específicas como: ajudar a receber e encaminhar os novos participantes para o local de atividades; colaborar na formação dos grupos para as atividades; apoiar as dinâmicas de grupo; colaborar na distribuição do material necessário para as atividades; atuar como facilitador das atividades; participar do desenvolvimento de atividades esportivas, de lazer e culturais e colaborar na  confecção de material didático.

      Um monitor deve dedicar um tempo maior às atividades e por isso é necessária a anuência de seus pais ou responsáveis. Posteriormente, o monitor recebe crachá de identificação e camiseta para formalizar sua presença no INPA.

 

4.6. Tutoria

 

      Caracteriza-se por uma atividade educativa, na qual o aluno passa a acompanhar as atividades técnico-científicas desenvolvidas por um pesquisador, que passará a ser o seu tutor.

      A participação é voluntária e aberta a ex-participantes que  tenham interesse e o compromisso de participar das atividades a que se candidatam e o  consentimento dos pais e responsáveis.

      A tutoria se desenvolve por um período de 12 meses, com frequência de 2 dias por semana, por um período máximo de 3 horas diárias, em horários alternados aos da escola. Neste módulo tanto o tutor como o  tutorando possuem atribuições específicas.

      Nesse período, o tutorando é considerado membro integrante do grupo de pesquisas do pesquisador tutor. Este traça junto com o jovem pesquisador um plano de atividades educativas a ser desenvolvido.

      Os resultados provenientes da participação na tutoria são apresentados por ocasião da realização do Espaço Ambiental, nas escolas ou através de participação em eventos e concursos nacionais que envolvam a temática ambiental.

 

4.7.  Detalhamento das atividades realizadas

 

      Foram realizados ciclos anuais durante o período de 1997 a 2008, com abordagem dos seguintes temas: Noções Básicas sobre Botânica; Conhecendo a Flora Amazônica; Noções Básicas para o Estudo Fitoquímico de Plantas Medicinais; Meliponicultura para Adolescentes; Água – Por Que Preservar;  Floresta e Vida; Terra, Planeta Várzea; Os Insetos e a Saúde; Os Peixes e Seus Ambientes; Mamíferos Aquáticos; e, Socializando o Conhecimento Científico.

      Essas temáticas abrangeram uma parcela significativa das atividades de pesquisa, mas a definição da programação de cada ano demandou sempre muito trabalho aos pesquisadores, que aceitavam realizar curtas palestras, mas não queriam orientar os grupos de alunos. Devido a essa resistência, procurou-se sempre envolver os alunos de pós-graduação no projeto e nas atividades de orientação.

      Na fase das palestras, a temática era apresentada de acordo com um roteiro definido com os pesquisadores. Para os trabalhos práticos, a temática era dividida em número variável de sub-temas, de acordo com o número de participantes, para que o número em cada grupo não excedesse 8 participantes. Procurou-se também fazer excursões, para que os alunos pudessem vivenciar na prática o conhecimento transmitido pelas palestras.

      Ao final de cada ciclo, a equipe coordenadora sempre procurou realizar processos de avaliação do realizado. Aos alunos era distribuído um questionário, já com os pesquisadores e demais orientadores era realizada uma reunião de avaliação. Desse esforço, obtinha-se um conjunto de sugestões para melhoria do projeto e uma avaliação geral, ainda que genérica, dos trabalhos realizados. Chegou-se também à conclusão de que o número ideal de participantes deveria situar-se próximo de 40.

      Inicialmente, detectou-se que os participantes demonstravam dificuldades para assimilar os conhecimentos transmitidos. Com isso, passou-se a solicitar aos pesquisadores dos ciclos seguintes, que elaborassem apostilas de fácil entendimento, para que os participantes pudessem acompanhar as aulas com mais facilidade. Após poucos ciclos, por falta de tempo dos pesquisadores envolvidos, a equipe do projeto passou a elaborar Cadernos Temáticos, que sintetizavam as informações trabalhadas durante as palestras.

      Ressurgiu aí o problema de como avaliar a capacidade de transmissão de conhecimentos dos palestrantes e a capacidade de assimilação dos participantes. Para tentar resolver isso, foi elaborado um questionário para aferição do aprendizado, a ser distribuído logo após o término das palestras. Estes eram rapidamente analisados e diversas vezes se constatou que o aprendizado tinha sido deficiente. Nesses momentos, ficava evidente a rigidez da estrutura do projeto, pois não havia como realizar uma atividade de reforço de aprendizado, devido à agenda dos pesquisadores e à disponibilidade dos participantes. Assim, o projeto seguia em frente, deixando lacunas do ponto de vista da compreensão geral pretendida.

        Outras estratégias também foram utilizadas visando o reforço do aprendizado, mas não para possível preenchimento de lacunas detectadas na avaliação pós-palestra. Foram desenvolvidos jogos, dinâmicas de grupo, peças de teatro, excursões e visitas guiadas, que, além de trabalharem a transmissão de conhecimentos, também se revelaram boas oportunidades para aperfeiçoar a sociabilidade dos participantes.

      Esses Cadernos Temáticos, porém, eram elaborados apenas após o encerramento das atividades, estabelecendo-se um importante distanciamento entre a dinâmica do aprendizado e a recuperação e absorção das informações. Eram também enviados à Secretaria de Educação do Estado (SEDUC), que ajudava na seleção e motivação das escolas, para que fossem socializados entre os professores e alunos.

      As atividades realizadas estão de acordo com as reflexões de GUIMARÃES & VASCONCELLOS (2006), quando estes mostram que os espaços não formais oferecem maiores possibilidades de exercício de uma diversidade pedagógica e didática que facilite a assimilação dos conteúdos propostos. Em complemento, não pode ser esquecida a reflexão de que “(...) a educação não formal deve aliar informação, ensino-aprendizagem e entretenimento em prol da promoção da ampliação da cultura e construção de valores”. (id, p.157) Essa proposta, embora pareça simples e factível, é, na realidade, de complexa efetivação.

      O projeto foi organizado nestes moldes, com o objetivo de levar conhecimentos ambientais aos estudantes, em um contexto agradável e estimulador do aprendizado, com a preocupação adicional de transmissão de valores de sociabilidade.  Como era, entretanto,  baseado mais nas relações pessoais que a coordenação do projeto tinha com pesquisadores nas diferentes áreas de pesquisa do Instituto, começou a haver dificuldades para exploração de assuntos novos a cada ano.

Levando-se em consideração as reflexões de KNELLER (1980) e de MORIN (1982), mencionadas acima, esse projeto foi baseado na disponibilidade e no interesse genuíno pela divulgação de alguns pesquisadores, que não tinham nenhum treinamento nesse tipo de atividade, mas que acharam que fazia parte de sua responsabilidade social. Mesmo com essa consciência, seu tempo disponível para participação enfrentava limitações, uma vez que precisavam conduzir suas pesquisas e mostrar produção científica. Alguns ainda aceitaram exercer a tutoria para participantes que se interessaram em saber mais sobre o assunto do ciclo de que estavam participando. Assim, começou a haver dificuldades para exploração de assuntos novos a cada ano.

Finalmente, após dez anos de execução, o projeto começou a dar sinais de que sua proposta inicial estava atingindo o seu limite. Com isso, colocou-se, então, a necessidade de uma avaliação e de uma reformulação.

 

5. Conclusão

 

 Este projeto atendeu mais de 500 participantes, da 5ª à 8ª séries do ensino fundamental, de diferentes escolas públicas localizadas nas proximidades do INPA. Além disso, o projeto representou também um laboratório para teste de práticas educativas e de propostas didáticas, visando tornar mais fácil a assimilação dos conhecimentos científicos por uma população pouco escolarizada.

O Projeto Jovem Pesquisador foi uma experiência rica, pelos imprevistos instigadores da criatividade; pela observação dos diferentes níveis de envolvimento dos participantes; pela constatação da dificuldade de envolvimento de pesquisadores em atividades de difusão científica; pelos requisitos de planejamento envolvidos; pela constante incerteza das fontes de financiamento; pela dificuldade de constante inovação nos recursos pedagógicos, de forma a garantir a manutenção dos níveis de envolvimento dos participantes; e, pela necessidade de garantir que as escolas escolhidas fizessem uma boa seleção, que incluísse bons alunos.

 Apesar de seu sucesso indiscutível, inclusive como prática de gestão e como uma combinação interessante de difusão científica e educação ambiental, o projeto deixou uma questão inquietante, que, inclusive, contribuiu para a sua interrupção, que diz respeito à avaliação. Como avaliar se cada ciclo do projeto teve o efeito esperado e contribuiu efetivamente para melhorar a percepção dos participantes sobre os temas trabalhados? Foram feitas avaliações pós-ciclos e pós-palestras, mas elas não conseguiram ir ao âmago das necessidades de feedback dos executores, relativas ao desempenho dos palestrantes e à eficácia dos materiais pedagógicos desenvolvidos.

É importante ressaltar que esse não é um conjunto de problemas exclusivo desse projeto, mas que está presente em atividades de extensão e de educação ambiental. Além de não haver ainda estudos suficientes para desenvolvimento de técnicas de avaliação, há também necessidade de desenvolvimento de indicadores de desempenho universais, para que se possa começar a comparar as experiências e a eficácia dos métodos adotados.

A abertura dos institutos de pesquisa para a sociedade, para que esta tome conhecimento de sua produção e da serventia desta, ainda é um fato recente e estes ainda não sabem bem com agir. Contribui para isso o próprio processo de formação dos pesquisadores, que não os prepara para a necessidade de prestarem contas à economia e à sociedade e de mostrarem que estão empenhados também em resolver os seus problemas e reivindicações. Com isso, as instituições sentem muitas dificuldades de se comunicarem com o seu ambiente externo e por isso mesmo é muito importante que sejam muito bem aproveitadas todas as experiências que conseguem ser realizadas, para que haja um aperfeiçoamento contínuo de seus métodos e para que seja cada vez mais fácil remover as resistências dos pesquisadores. Isso implica também na formação de uma equipe de difusores, que tenha aprendido como se deve dialogar com os pesquisadores e, principalmente, como realizar a tradução das informações para uma linguagem acessível aos diversos estratos da sociedade.

 

 

Referências

 

AZEVEDO, Genoveva Chagas de e HIGUCHI, Maria Inês Gasparetto. A floresta amazônica como objeto de formação de docentes em educação ambiental. Em HIGUCHI, Maria Inês Gasparetto e Higuchi, Niro. A floresta amazônica e suas múltiplas dimensões: uma proposta de educação ambiental. Editores: Maria Inês Gasparetto Higuchi, Niro Higuchi. – 2ª ed. rev. e ampl. – Manaus: [s.n.], 2012.

 

GUIMARÃES, Mauro e VASCONCELLOS, Maria das Mercês N. Relações entre educação ambiental e educação em ciências na complementaridade dos espaços formais e não formais de educação. Educar, Curitiba, n.27, p. 147-162, 2006, Editora UFPR.

 

HENNING, Georg. J. Metodologia do ensino de ciências. Porto Alegre/RS: Mercado Aberto, 1998.

 

JACOBUCCI, Daniela Franco Carvalho. Contribuições dos espaços não-formais de educação para a formação da cultura científica. Em Extensão, v.7, Uberlândia, 2008.

 

KNELLER, G.F. A ciência como atividade humana. Rio de Janeiro: Zahar; São Paulo: EDUSP, 1980.

 

KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 1987.

 

MORIN, Edgar. Ciência com consciência. Portugal: Publicações Europa – América, 1982.

 

S’ANTANNA, Ilza Martins e S’ANTANNA, Victor Martins. Recursos Educacionais para o ensino: quando e por quê? Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.

 

JAPIASSU, Hilton. Interdisciplinaridade e Patologia do Saber. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1976.

 

SPAZZIANI, Maria de Lourdes e MOURA, Rita Helena. Troppmair de Almeida. Educação e divulgação: contribuições para produtos de pesquisas em educação ambiental. Revista Simbio-logias, v .1, n.1, mai/2008.

 

 

Ilustrações: Silvana Santos